DETECÇÃO DE MASTITE SUBCLÍNICA DE ANIMAIS LACTANTES E CORRELAÇÃO DA CONTAGEM DE CÉLULAS SOMÁTICAS COM A COMPOSIÇÃO DE GORDURA E PROTEÍNA DO LEITE

Transcrição

1 DETECÇÃO DE MASTITE SUBCLÍNICA DE ANIMAIS LACTANTES E CORRELAÇÃO DA CONTAGEM DE CÉLULAS SOMÁTICAS COM A COMPOSIÇÃO DE GORDURA E PROTEÍNA DO LEITE Luryan Tairini Kagimura [Voluntária] 1, Ricardo Beffart Aiolfi 1, Simone Beux 2, 1 Coordenação do curso de Agronomia - COAGR 2 Coordenação do curso de Química - COQUI Câmpus Pato Branco Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR Via do Conhecimento Km 01 Pato Branco/PR, Brasil CEP luryan_tairini@hotmail.com, {simonebeux@gmail.com, aiolfe@hotmail.com} Resumo O leite é um dos principais produtos consumido pelos brasileiros. O Brasil encontra-se entre os 6 principais produtores de leite do mundo, contudo não é expressivo em exportação, uma vez que grande parte do leite produzido não atende a legislação vigente. Entre os fatores que afetam a qualidade do leite está a mastite, uma doença que afeta a glândula mamária e em consequência a composição de gordura e proteína do leite. Este trabalho objetivou avaliar a detecção da mastite subclínica e a correlação da contagem de células somáticas com a composição de gordura e proteína do leite. Para detecção de mastite foi realizado teste de CMT no momento da ordenha. Foram coletadas amostras de leite encaminhadas para análise de % gordura, % proteína e contagem de células somáticas (cel.ml -1 ) em laboratório credenciado pelo Ministério da Agricultura. Os resultados obtidos evidenciaram que há interação significativa entre os animais e as variáveis estudadas, que não há correlação significativa entre CCS e % de gordura e proteína e que há uma grande divergência de resultados entre diferentes autores. Palavras-chave: mastite; qualidade do leite. Abstract - Milk is one of the main products consumed by Brazilians. Brazil is among the six major milk producers in the world, however it is not significant in export, since much of the milk produced does not meet current legislation. Among the factors that affect the quality of milk is mastitis, a disease that affects the mammary gland and consequently the composition of milk fat and protein. This study evaluated the detection of subclinical mastitis and correlation of somatic cell counts with the composition of milk fat and protein. For detection of mastitis test was conducted CMT during milking. We collected milk samples sent for analysis of% fat,% protein and somatic cell count (cel.ml-1) in a laboratory accredited by the Ministry of Agriculture. The results showed that there is significant interaction between the animals and the variables studied, there is no significant correlation between SCC and% fat and protein and that there is a wide divergence of results between different authors. Keywords: mastitis; milk quality. INTRODUÇÃO O leite, um dos principais produtos consumido pelos brasileiros, vem ganhando grande destaque, não apenas por sua produção alimentícia, mas também pela geração de renda e empregos. Atualmente, o Brasil ocupa lugar entre os seis maiores produtores mundiais, gerando, aproximadamente, trinta bilhões de litros de leite por ano. Com esse volume

2 produzido, a cadeia leiteira, possui forte influência na produção agropecuária do país, sendo considerado um dos principais produtos. Dessa forma, o leite gera grande parte do valor de produção do setor agropecuário, e ainda com perspectivas de crescimento a cada ano [1,2]. Hoje, sabe-se que apesar da crescente produção de leite existente no Brasil, ainda existem problemas que afetam a qualidade e produtividade. Problemas como baixa produção de leite e alterações químicas, físicas e microbiológicas podem estar diretamente relacionados à mastite, uma doença que provoca a infecção do úbere [3]. Tais alterações no leite são derivadas da modificação da permeabilidade de vasos sanguíneos da glândula, que por sua vez modifica a capacidade de sintetizar compostos e pela ação de organismos e enzimas sobre o que já foi secretado. Desse modo, a diferenciação da permeabilidade permite que proteínas, como também células do animal sejam transferidas para o leite, sendo assim a contagem de células somáticas (CCS) do leite é um indicativo quantitativo do nível de infecção do animal com mastite [4, 5]. A mastite pode ser classificada como clínica e subclínica, sendo a subclínica predominante. A mesma não apresenta sinais visíveis, porém é a que causa maiores prejuízos à produção e a composição do leite [6]. A mastite subclínica pode ser a causa do declínio de 25 a 42% da produção de leite em cada quarto mamário, resultando assim em grandes perdas [7]. Leite de animais com mastite subclínica apresentam valores mais elevados de CCS do que normalmente é encontrado no leite de animais sadios [8]. Por outro lado, sobre os outros elementos, como a gordura e proteína, não existe um consenso na literatura sobre influências positivas ou negativas. Com base no efeito da doença sobre os elementos componentes do leite, o presente trabalho teve como objetivo avaliar a detecção de mastite subclínica de animais lactantes e a correlação da contagem de células somáticas com a composição de gordura e proteína do leite. METODOLOGIA O estudo foi realizado em uma propriedade leiteira do município de São Domingos/SC entre os meses de julho e agosto de As amostras de leite foram coletadas de vinte e dois animais em lactação das raças holandesa e jersey em quatro etapas, sendo uma etapa por semana, totalizando oitenta e oito amostras. Foram utilizados os números de identificação dos animais para organização dos dados. Para detecção da mastite subclínica o leite foi coletado no momento da ordenha após a prática de manejo de pré-dipping e, posteriormente foi realizado o California Mastitis Test (CMT). Os resultados para CMT foram obtidos por nota visual considerando: amostra negativa (N) ausência da doença; amostra suspeita (S) com presença de traços da doença no leite; amostra positiva uma cruz (+) doença leve/moderada; amostra positiva duas cruzes (++) doença moderada e amostra positiva três cruzes (+++) doença intensa. Em seguida, as amostras de leite de cada animal foram encaminhadas para o laboratório da APCBRH Curitiba/PR onde foram feitas análises da porcentagem de gordura e proteína pelo método de infravermelho e a contagem de células somáticas (CCS) pelo método de citometria de fluxo por meio do equipamento eletrônico Somacount 300. O resultado de CMT de todos os animais foi agrupado de acordo com a nota visual e comparado ao número médio de CCS dos animais para obtenção de valores de relação das variáveis. Os valores de gordura, proteína e CCS de todos os animais foram submetidos à análise de variância a 5% de significância e as interações significativas foram submetidas à

3 comparação de médias através do programa Sisvar. As mesmas três variáveis dependentes foram submetidas à análise de correlação simples de Pearson pelo programa Genes. RESULTADOS E DISCUSSÃO Como pode ser observado na tabela 1, na detecção da mastite subclínica utilizando o CMT, houve relação direta entre os resultados de CMT e CCS. Os valores mais altos de CCS foram para as amostras que apresentaram notas visuais que caracterizam a doença de moderada a intensa. Em trabalho realizado usando a mesma metodologia, [9] encontraram valores distintos para a relação entre CMT e CCS. Em amostras negativas encontraram uma média de células.ml -1, amostras suspeitas com média de células.ml -1 e as positivas variaram de células.ml -1 a células.ml -1. Essa distinção de valores encontrados em diferentes trabalhos pode ser decorrente da nota visual, uma vez que essa nota é dependente do avaliador e pode ocorrer confusão entre avaliadores classificando, por exemplo, amostras suspeitas como negativas ou vice versa, o que provoca alterações nos valores médios de CCS. Tabela 1. Médias do resultado de CMT agrupado de acordo com a nota visual e comparado ao número médio de CCS. CMT* Nº amostras CCS (cel.ml -1 ) Negativo Suspeito * +: doença leve/moderada; ++: doença moderada; +++: doença intensa. Visto que há relação entre o número de células somáticas com a composição química do leite, e que essa relação é dependente de animal pra animal, a tabela 2 mostra a análise de variância entre a CCS e a % de gordura e proteína x animais. Os resultados obtidos com a tabela 2, afirmam está relação, em que CCS, % gordura e proteína formam interações significativas com os animais testados. Tabela 2. Análise de variância para as variáveis CCS, % gordura e proteína relacionadas as fontes de variação. Fonte de variação CCS % Gordura % Proteína Animais * 0.392* 0.418* Coleta Erro Média CV (%) *: valores significativos a 5% de probabilidade. As tabelas 3, 4 e 5 são referentes às comparações de médias entre as interações significativas da análise de variância. Para CCS (tabela 3), a diferença entre animais é bastante notória. Isso foi decorrente dos animais testados estarem em diferentes números e estágios de lactação. Essa informação fica evidente quando se comparam os extremos da tabela 3, em que o animal 304, na época de coleta, se encontrava no 7 mês de lactação enquanto que o animal 310 estava no 1 mês de lactação. As variáveis gordura e proteína também são afetadas por esses eventos, mas também podem variar de acordo com a nutrição e a raça dos animais. Na tabela 4, o animal com o maior valor de % gordura foi um animal da raça Jersey.

4 Para porcentagem de proteína (tabela 5), houve maior relação com o estágio de lactação, uma vez que o animal 310, que se encontrava no 1º mês de lactação, apresentou o maior valor (4,27). Tabela 3. Médias da contagem de células somáticas de diferentes animais. Animal a CCS (x1000 cel/ml) b c c c c c c c d d d d d d d d d d d d d Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si pelo teste de Scott-Knott a 5% de significância. Na correlação entre as variáveis dependentes (tabela 6), houve apenas correlação significativa para % gordura x % proteína (0.57). [11], avaliaram a correlação entre as mesmas variáveis e encontraram resultados que corroboram com esta pesquisa, em que a maior correlação foi entre % gordura x % proteína, contudo no mesmo trabalho, esses autores encontraram também, correlação entre % gordura x CCS e % proteína x CCS. Em relação à porcentagem de proteína correlacionada com CCS, os dados obtidos neste trabalho concordam com [11], que acreditam não haver um consenso na literatura, em relação ao aumento da porcentagem de proteína total no leite de animais com alta CCS, isso porque ocorre redução na síntese de caseína e concomitante passagem de proteínas séricas para o leite, fato que é dependente de animal para animal. Há autores como [12], que relataram resultados em que quanto maior o valor de células somáticas no leite, maior o teor de gordura, dados não encontrados neste trabalho. [13], avaliando a relação entre a CCS e composição centesimal do leite, chegaram a valores de correlação significativa entre % gordura x CCS, resultado que não concorda com o presente trabalho, porém encontrou valores negativos para a correlação entre % proteína x CCS.

5 Tabela 4. Média da % gordura de diferentes Tabela 5. Média da % proteína de diferentes animais lactantes. animais lactantes. Animal % Gordura Animal % Proteína a a b b c c d d d d d d d d e d e d e d e d e e e e e e e e e e e e e e e e e f f f g f Médias seguidas pela mesma letra não Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si pelo teste de Scott-Knott diferem entre si pelo teste de Scott-Knott a 5% de significância. a 5% de significância. Tabela 6. Correlação simples de Pearson entre as variáveis % Gordura, % Proteína e CCS. % Gordura % Proteína CCS % Gordura ** 0.16 % Proteína CCS 1 CONCLUSÕES Há interação significativa entre as variáveis, % gordura, % proteína e CCS x animais. A composição química do leite é alterada por animais que apresentam altos valores de CCS, ou seja, que estão infectados com a doença. Há enorme divergência entre diferentes autores para correlações que envolvem estas variáveis, deixando claro que cada resultado é dependente das condições do material de coleta, animais, entre outros. AGRADECIMENTOS A Laticínios Novo Horizonte Novo Horizonte/SC e a todo o grupo de trabalho do Sítio Beffart Aiolfi de São Domingos/SC.

6 REFERÊNCIAS [1] CARVALHO, L.A.; NOVAES, P. L.; MARTINS, C. E.; ZOCCAL, R.; MOREIRA, P.; RIBEIRO, A. C. C. L.; LIMA, V. M. B. Sistema de Produção de Leite (Cerrado). Embrapa Gado de Leite [2] IBGE. Pesquisa Trimestral do Leite [3] BATTISTON, W. C. Gado Leiteiro. Instituto Campineiro de Ensino Agrícola. p. 282, DOMINGUES, P. F.; LANGONI, H.; PADOVANI, C. R.; GONZALES, J. A. H.; FREGONESI, O. B. Determinação de gordura, proteína, cobre, ferro, manganês, zinco e contagem de células somáticas no leite de vacas com mastite subclínica. Semina: Ci. Agrárias, Londrina, v.22, n. 2, p [4] MACHADO, P. F.; PEREIRA, A. R.; SARRÍES, G. A. Composição de tanques de rebanhos brasileiros distribuídos segundo sua contagem de células somáticas. Revista Brasileira de Zootecnia, v.29, n.6, p [5] SANTOS, M. V. Efeito da mastite sobre a qualidade do leite e dos derivados lácteos parte 1. Milkpoint, [6] VIANNA, L.C; MÜLLER, E. E; FREITAS, J. C. de; PRETTO-GIORDANO, L. G; SALVADOR, R; DIAS, J.A. Duração das infecções naturais da glândula mamária por estafilococos coagulase negativos em vacas primíparas. Semina: Ci. Agrárias, Londrina, v.21, n.1, p [7] BRITO, M. A.; BRITO, J. R.; ARCURI, E.; LANGE, C.; SILVA, M.; SOUZA, G. Mastite. Embrapa. Disponível em: < >. Acesso em: 16 set [8] ZAFALON, L. F.; NADER FILHO, A.; AMARAL, L. A. do; OLIVEIRA, J. V. de; RESENDE, F. D. de. Alterações da composição e da produção de leite oriundo de quartos mamários de vacas com e sem mastite subclínica de acordo com o estágio e número de lactações. Arquivos do Instituto Biológico, São Paulo, v72, n.4, p [9] PHILPOT, W.N., NICKERSON, S.C. Mastitis: conter attack. Naperville, IL, Babson Bros. Co. 1991, 150p. [10] CUNHA, R.P.L., MOLINA, L.R., CARVALHO, A.U., FACURY FILHO, E.J., FERREIRA, P.M., GENTILINI, M.B. Mastite subclínica e relação da contagem de células somáticas com número de lactações, produção e composição química do leite em vacas da raça Holandesa. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.60, n.1, p.19-24, [11] AULDIST, M. J., HUBLE, I. B. Effects of mastitis on raw milk and dairy products. Austr. J. Dairy Technol., v.53, p.28-36, [12] SCHALLIBAUM, M. Impacto of SCC on the quality of fluid milk and cheese. Annual Meeting Proceedings National Mastitis Council, 2001, p.39. [13] BUENO, V. F. F., MESQUITA, A.J., NICOLAU, E. S., OLIVEIRA, A. N., OLIVEIRA, J. P., NEVES, R. B. S., MANSUR, J. R. G., THOMAZ, L. W. Contagem celular somática: relação com a composição centesimal do leite e período do ano no estado de Goiás. Ciência Rural, Santa Maria, v.35, p , jul-ago, 2005.