Este Boletim Interno de Segurança de Voo traz importantes informações sobre estresse e os elementos contribuintes para o surgimento deste

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1 Destinatário: Assunto: DIRETORIA DE SEGURANÇA OPERACIONAL SAODQ BOLETIM INTERNO DE SEGURANÇA DE VOO BISV 05/2009 Emissão: 22.Dez.2009 TODOS OS TRIPULANTES Vigência: 22.Dez.2009 ESTRESSE ALÉM DOS LIMITES Prezados Colaboradores, Este Boletim Interno traz importantes informações sobre estresse e os elementos contribuintes para o surgimento deste limitador humano. Boa leitura. Atenciosamente, Cmte. Sérgio Quito Diretor de Segurança Operacional SAODQ Original Assinado Elaborado por SAODQ Página 1 de 5

2 Estresse além dos limites Sempre que um piloto entrar num flight deck, ele deve se perguntar quanto à sua total capacidade de tomar decisões e agir corretamente no caso de emergências. Tomada de decisão o passo final no processo cognitivo é fator contribuinte em 30 a 40 por cento de todos os acidentes aeronáuticos na aviação. Um fator físico, psicológico ou emocional, que degrade alguma porção do processo cognitivo, levará a uma degradação do processo decisório. Frequentemente estes fatores são apontados como estressores, quando considerados seus efeitos nas funções cognitivas combinado com o ambiente de voo. Uso e desgaste O termo estressor é derivado de estresse, um conceito identificado no início do século XX por Hans Selye, endocrinologista austríaco. Ele identificou o que acreditava ser um consistente padrão de reações corporais e mentais, denominandoo de reações não específicas do corpo frente a alguma demanda. Mais tarde referiuse a estes padrões como taxa de uso e desgaste do corpo. A definição de estresse é ampla: estresse é uma resposta normal do corpo. Uma resposta psicológica e fisiológica (não especificamente física) a uma demanda. O estresse prolongado pode afetar a cognição (percepção, conhecimento, atenção, memória, solução de problemas e tomada de decisão), assim como afeta as emoções e o comportamento. Este é um assunto sério para pilotos, uma vez que problemas com julgamento, atenção ou concentração constituem grande risco à aeronave e às pessoas dentro dela. Por exemplo, sob condições de grande estresse, há uma tendência de minimizar, de simplificar a solução de problemas e a tomada de decisão, assim como de ignorar informações relevantes, ou seja, tomar o caminho mais curto e fácil. Muitos indivíduos sob condições de elevado estresse tendem a esquecer habilidades e procedimentos aprendidos, revertendo suas atitudes a antigos hábitos que podem não ser apropriados. Por exemplo, aplicam técnicas e conhecimentos adquiridos em treinamentos anteriores em outros tipos de aeronaves. Outro efeito do estresse relacionado a erro cognitivo é a percepção (visão) de túnel, que ocorre quando o piloto (ou a tripulação), sob grande estresse, tornase focado em um estímulo como, por exemplo, a luz de master caution e negligencia informações ou tarefas importantes. Visão de túnel esteve no coração do acidente da Eastern Air Lines (um Lockheed L1011 nos Everglades, Florida) em 29 de Dezembro de A tripulação executou uma aproximação perdida porque não havia indicação de trem de pouso dianteiro baixado. A partir daí, ficaram tão envolvidos em identificar o problema com o sistema indicador de posição que deixaram de perceber, até segundos antes da colisão, que a aeronave não estava voando nivelada a Ft. Além de afetar memória, julgamento e a atenção, estresse também pode diminuir a coordenação visual, motora e o controle muscular. É importante controlar o estresse através da identificação e gerenciamento dos fatores estressores potenciais. Os estressores podem ser classificados em internos e externos. Estressores externos originamse fora do indivíduo e podem ser divididos em subcategorias ambientais e psicossociais. Estressores externos Ambientais Condições marginais de voo Calor ou frio excessivo Elevado nível de ruído Vibração excessiva Efeitos de altitude Ambiente congestionado de pessoas Poluição do ar Umidade extrema Alguns exemplos de estressores ambientais na aviação: condições de voo adversas, temperaturas extremas na cabine, excesso de claridade ou insuficiente luminosidade, altos níveis de ruído e efeitos de altitude. 2

3 Psicossociais Conflitos no trabalho Conflitos familiares / conjugais Tempo de voo reduzido Baixa satisfação no trabalho Sentimento de falta de suporte Descontrole Doença ou morte na família Expectativas não realistas Problemas financeiros Solidão Baixa autoestima Estressores psicossociais relacionamse a eventos ou condições ligadas às características sociais do indivíduo ou da família, posições e papéis. Isso inclui: conflitos no trabalho, sentimento de falta de suporte por parte dos colegas e problemas relacionados ao ambiente familiar, como conflitos conjugais, problemas com filhos, doença ou morte de familiar. Estressores internos são originados por condições fisiológicas e cognitivas do indivíduo e, tipicamente, são considerados como de controle do indivíduo. Podem ser divididos em fisiológicos e cognitivos. Os fisiológicos incluem dieta pobre, uso de fumo, fadiga muscular, privação de sono, uso abusivo de álcool e perda auditiva. A subcategoria cognitiva inclui tédio, alta carga de trabalho, sobrecarga de informações, falta de informação e emoções como medo e desespero. Estressores internos Fisiológicos Dieta pobre (nutrição) Fumo Fadiga muscular Privação de sono Uso abusivo de álcool Pressão arterial alta Uso abusivo de medicação com ou sem prescrição Cafeína Diminuição da visão Perda auditiva Doenças Raiva Desidratação Cognitivos Falta de informação Sobrecarga de informações / Fadiga mental Tédio Medo Sentimento de falta de suporte Alta carga de trabalho Construindo regras Alguns destes estressores têm sido longamente conhecidos pelos seus efeitos degradantes na função cognitiva e, por consequência, na habilidade para a tomada de decisão. Por esta razão os órgãos reguladores da aviação civil estabeleceram regras considerando alguns dos mais óbvios estressores, incluindo consumo abusivo do álcool e de drogas, e continuam a debater sobre os melhores métodos para lidar com outros estressores como, a fadiga. No passado, a fadiga foi tratada quase que exclusivamente com regras que limitavam o número de horas a serem trabalhadas em determinado período. Nos anos mais recentes, entretanto, os especialistas começaram a reconhecer outros fatores igualmente importantes e contribuintes para a fadiga tais como: tempo de sono inadequado, qualidade do sono inadequada, alteração do ritmo circadiano, irregularidade na rotina de trabalho e efeitos do deslocamento até o local para assumir o voo. A fadiga, tipicamente, causa um acréscimo no tempo de reação, um decréscimo na precisão da operação e uma redução na atenção. Pilotos fatigados podem deixar de perceber, ou executar erroneamente, ações da rotina operacional, tais como desconsiderar itens de checklist, ou tornarse tão preocupados com uma única tarefa que podem negligenciar outras mais críticas. A fadiga também afeta a memória. Embora a memória de longo prazo seja razoavelmente bem preservada na presença de fadiga, a memória de curtoprazo e a capacidade de processamento cognitivo serão bastante reduzidas. A comunicação também é afetada pela fadiga. A fala pode se tornar menos clara e pilotos fatigados estão sujeitos a entenderem mal as mensagens. A fadiga, invariavelmente, degrada a habilidade para a tomada de decisão, algumas vezes resultando em respostas incorretas para situações de emergência. Estressores ocultos Um conjunto de outros fatores estressores, frequentemente mal entendidos ou ignorados, possui efeitos mais sutis na performance cognitiva. Estes fatores incluem a inadequada nutrição e a falta de exercícios físicos; uso de medicamentos (com ou sem orientação do médico especialista em medicina aeroespacial); desidratação; uso de fumo; exposição ao calor e ao frio; ruídos e vibrações. Como resultado da exposição a estes fatores, os pilotos poderão não estar em condições adequadas para o voo. Em caso de emergência, poderá não ser possível apresentar o tempo de reação adequado juntamente com 3

4 coordenação visual e motora, com capacidade de comunicação e de tomada de decisão eficazes. Uma nutrição pobre e a falta de exercícios físicos são fatores estressores que contribuem para dificultar o enfrentamento de outros estresses. Uma dieta adequada provê ao organismo vitaminas e minerais essenciais, além de auxiliar na manutenção da função cognitiva. Medicação A maioria dos órgãos reguladores de aviação civil proíbe voar enquanto se faz uso de alguma medicação que possa afetar a performance do piloto e a segurança de voo. Condições médicas e medicamentos (mesmo os que não apresentam problemas se utilizados em solo) podem ter efeitos colaterais adversos, variáveis com a altitude. Muitos medicamentos utilizados sem prescrição médica podem afetar significativamente a cognição, o julgamento e a percepção sensória. Por exemplo, alguns medicamentos para resfriado e alergia contêm ingredientes que podem causar sonolência, perda da memória de curto prazo e visão embaçada. Antes de utilizar tais medicamentos, os pilotos devem solicitar orientação a um médico especialista em medicina aeroespacial, além de lerem cuidadosamente as bulas. Quando pesquisadores do Civil Aeromedical Institute do FAA (agora Civil Aeroespace Medical Institute) examinaram amostras patológicas de 1683 pilotos falecidos em acidentes aéreos entre 1994 e 1998, encontraram medicamentos não prescritos em 301 amostras, enquanto os com prescrição estavam presentes nas restantes 240. Fumo Atrualmente, o uso de fumo é largamente difundido. Numerosos estudos têm demonstrado uma associação entre fumar e doenças cardiovasculares, além de vários tipos de câncer, doenças pulmonares e outras disfunções. Como um estimulante, a nicotina tem sido associada a um aumento da performance cognitiva na atenção e tarefas que demandem memória e parece aumentar a atenção visual ambas importantes na atividade aérea. Outros estudos têm mostrado que a nicotina pode aumentar a habilidade para focar nas informações auditivas e na filtragem de ruídos de fundo. Entretanto, outros estudos têm mostrado que: Fumar cigarros contribui para hipóxia, um problema que aumenta com a altitude. Três cigarros fumados ao nível do mar aumentam a altitude fisiológica para o equivalente a entre Ft e Ft. Em altitude, tarefas complexas requerendo tomada de decisão, utilização de estratégias mentais e retenção de memória, podem ser mais difíceis de serem executadas do que se fossem ao nível do mar. Para um piloto que está artificialmente colocado em maior altitude fisiológica, devido fumo, o problema é aumentado. Fumar reduz acuidade visual à noite e este efeito aumenta com a altitude. A visão noturna decresce 5% a Ft, 20% a Ft e 35% a Ft, se oxigênio suplementar não for utilizado. Fumantes de cigarros estão duas vezes mais suscetíveis a perdas auditivas do que não fumantes, especialmente nas altas frequências. A nicotina também está associada com tontura momentânea e náusea, o que pode ser agravado na movimentação. Desidratação A desidratação é o maior fator contribuinte para a fadiga e para o decréscimo das condições mentais e físicas. Pilotos desidratados são mais suscetíveis a doenças descompressivas (disbarismos), desorientação espacial, ilusões visuais, enjôo e perda de consciência situacional. Pilotos com problemas de saúde, e os que voam em pequenas aeronaves sem ar condicionado são os mais suscetíveis, mas o problema também pode afetar pilotos que operem aeronaves comerciais com baixos níveis de umidade. A indicação mais comum de desidratação é a sede. No momento que o indivíduo sente sede, ele já está cerca de 1,6 L abaixo do nível ideal de hidratação ou aproximadamente 2% desidratado. E o percentual é ainda maior se este indivíduo tiver ingerido cafeína ou consumido bebida alcoólica um dia antes. Um nível de desidratação de 3 % pode levar o sujeito a sentir sonolência, náusea, deterioração mental e fadiga física/mental. 4

5 Estressores Psicossociais Estressores psicossociais são aqueles que envolvem relacionamentos, carreira e finanças, assim como outros fatores que influenciam estas três áreas, por exemplo, a saúde física. O estresse psicossocial pode ser positivo, como uma promoção no trabalho, casamento ou nascimento de um filho; ou negativo como o divórcio, separação, morte de uma pessoa querida, doença e acidente do próprio indivíduo ou de algum familiar. A boa saúde psicológica aumenta a performance do piloto e a presença de fatores estressores negativos a compromete. Estes estressores provocam distrações e podem baixar o tempo de reação em situações críticas, comprometendo o processo de tomada de decisão. Enquanto alguns estressores são bem conhecidos pelos pilotos, outros não são. As autoridades da aviação civil, dentre outras, têm desenvolvido checklists pessoais para auxiliar os pilotos, por si mesmos, na identificação destes estressores. Por exemplo, o FAA desenvolveu um modelo chamado I m Safe, visando avaliar as condições para o voo. Ilness doença Medicati edication medicação Stress estresse Alcohol álcool Fatigu atigue fadiga Eating Alimentação I M SAFE Eu tenho sintomas de alguma doença? A frase mnemônica em inglês (I m safe) associase a um conceito contraditório à idéia de estar safe na medida em que doenças, uso abusivo de medicação, estresse, uso abusivo de álcool, fadiga ou má alimentação são fatores que afetam este estar safe. Muitos destes estressores originandose uma variedade de fontes (ambientais, psicossociais, fisiológicas e cognitivas) podem degradar os processos cognitivos e comprometer as habilidades para a tomada de decisão. A vigilância por parte dos pilotos pode ajudar e prevenir estes fatores estressores para que eles não venham a colocar as operações de voo em risco. Ninguém embarcaria em uma aeronave e que não estivesse segura. Da mesma forma, não faz sentido voar quando você não está em condições de voo. O I M SAFE é, acima de tudo, um exercício de autoconhecimento. Quem conhece os limites do equipamento, do meio e, principalmente, de seu próprio corpo o e mente, é um profissional mais SEGURO. Bons voos! Original publicado na Revista FLIGHT SAFETY FUNDATION AEROSAFETYWORLD Agosto 2009 Eu tenho usado medicação (com ou sem prescrição) sem avaliação de especialista em medicina aeroespacial? Eu estou sob pressão psicológica no trabalho? Eu bebi nas últimas 8 horas? Nas últimas 24h? Eu estou cansado ou não descansei adequadamente no pernoite? Eu me alimentei saudavelmente e estarei satisfeito durante o voo? Fonte: U.S. Federal Aviation Administration; Clarance E. Rash e Sharon D. Manning Diretoria de Segurança Operacional VRG Linhas Aéreas Grupo GOL Human Factors (11) fatoreshumanos@golnaweb.com.br (11) (fax) 5