PROCESSO: RTOrd

Transcrição

1 CARGO DE CONFIANÇA. PERCEPÇÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. O parágrafo único do artigo 62 da CLT apenas sugere o pagamento de gratificação de função, porém não o impõe ao empregador, valendo-se o legislador da expressão se houver, para dirimir a questão. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário, em que figuram como recorrente CLARO S/A e recorrido MAURÍCIO DE MATTOS SANTOS. Inconformada com a r. sentença de fls. 293/295 da 24ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, proferida pelo MM. Juiz Gustavo Farah Corrêa, que julgou PROCEDENTE EM PARTE o pedido, recorre ordinariamente a ré. Embargos de declaração da ré e do autor acolhidos, à folha 215. O recorrente, às fls. 218/221, pretende a reforma da sentença, em síntese, sob o fundamento de que o parágrafo único do artigo 62 da CLT revela uma não obrigatoriedade de pagamento de gratificação aos que exercem cargo de confiança e que tal foi afirmado na contestação, restando equivocada a sentença que registro ausência de impugnação específica ao pedido. Representação processual regular, conforme instrumento de mandato de fl. 84. Custas processuais e depósito recursal recolhidos e comprovados às fls. 222/223. Contrarrazões às fls. 226/237, com preliminar de não conhecimento do recurso. Sem manifestação do Ministério Público, a teor do inciso II, do artigo 85, do Regimento Interno desta Corte. É o relatório. V O T O NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO, PRELIMINAR SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES (FOLHA 227) O autor requer, preliminarmente, o não conhecimento do recurso por ausência de dialética recursal e inovação recursal. Quanto ao primeiro aspecto, alega que a recorrente não ataca os fundamentos da sentença e, quanto ao segundo aspecto, sustenta que a recorrente aduz somente agora a

2 ausência de obrigatoriedade do pagamento da gratificação e lança mais a tese de que o autor tinha um padrão superior aos de seus subordinados. Certo é que a recorrente vem a juízo demonstrar seu inconformismo com o deferimento do pedido sucessivo de gratificação de função, por ter enquadrado o MM. Juiz o autor na previsão do artigo 62, parágrafo único da CLT, indeferindo o pedido principal de horas extras. As preliminares suscitadas esbarram no mérito do recurso, razão pela qual são rejeitadas, prosseguindo se no exame do inconformismo do recorrente. Rejeito as preliminares e conheço do recurso, porquanto presentes os pressupostos legais de admissibilidade. PRELIMINAR DE QUITAÇÃO GERAL APLICAÇÃO DA SÚMULA 330 DO C.TST ARGUIDA PELO RECORRENTE Aduz a recorrente que a rescisão do contrato de trabalho homologada com assistência do sindicato impede posterior interposição de reclamação trabalhista, para haver eventuais diferenças das parcelas objeto da rescisão homologada. O C. TST, ao editar a Súmula 330, não teve a intenção de ferir o que preceitua o parágrafo segundo do artigo 477 da CLT, que garante ao trabalhador a quitação dos valores pagos de cada parcela discriminada no Termo de Rescisão Contratual. Tampouco pretende inibir a apreciação pelo Poder Judiciário de lesão ou ameaça a lesão de direito, sob pena de ofensa ao princípio constitucional consagrado no artigo 5º, inciso XXXV. Logo, a homologação da resilição do contrato de trabalho não significa a quitação ampla pretendida pela empresa, mas apenas alcança os valores referentes às parcelas nele consignadas. Rejeito. MÉRITO GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO Inconforma se a recorrente com o deferimento da gratificação de função, pedido formulado sucessivamente ao pedido de horas extras, este rejeitado. O MM Juiz assim decidiu: Sucessivamente, requer a parte autora a

3 condenação da reclamada no pagamento de gratificação, visto que enquadrado na previsão do art. 62, parágrafo único da CLT. Não há impugnação específica da reclamada ao pedido sucessivo de gratificação. A testemunha ouvida à fl. 281 informa que o autor dispunha de poderes para indicar ou sugerir contrato e demissão de empregado. Dos recibos salariais de fls. 104 e seguintes não se depreende que ocorresse pagamento de gratificação por exercício de cargo de confiança, principalmente se considerado o contrato de trabalho acostado aos autos (fls.95/97). Julgo procedente o pedido da alínea f para condenar a reclamada no pagamento de gratificação pelo exercício de função de confiança, inclusive nos reflexos das verbas do contrato, tais como férias indenizadas com adicional de 1/3, FGTS e multa de 40%, aviso prévio,13º salário e contribuições previdenciárias, cujos valores serão apurados em liquidação. (folha 293 verso) O recorrente entende que o artigo 62, parágrafo único da CLT, não determina a obrigatoriedade do pagamento de gratificação pelo exercício do cargo de confiança e diz que assim sustentou na contestação. Feita uma nova leitura da contestação, destaco, folha 87: Não há também no que se falar em qualquer gratificação, não só pelas idênticas razões já dispendidas, como também porque manifestamente INEPTO o pleito, tal como confuso e insuficientemente formulado, notadamente porque o parágrafo único do artigo 62 da CLT, ao contrário do que tenta fazer crer, não determina o seu pagamento, como verificase do dispositivo abaixo reproduzido, verbis: Parágrafo único. O regime previsto neste capítulo será aplicável aos empregados mencionados no inciso II deste artigo, quando o salário do cargo de confiança, compreendendo a gratificação de função, se

4 houver, for inferior ao valor do respectivo salário efetivo acrescido de 40% (quarenta por cento) Negrito e sublinhado feito pelo recorrente. De fato, o recorrente apontou a ausência de obrigatoriedade ou facultatividade da gratificação de função. E esse é o entendimento doutrinário de Sergio Pinto Martins, em Comentários à CLT, 16ª ed., 2012, pág. 104: Para caracterização do cargo de confiança, não é preciso o pagamento de gratificação de função, que é facultativa, podendo ou não ser paga ao empregado, pois a lei emprega a expressão se houver, denotando exemplificatividade. O empregador, contudo,vai ter de demonstrar que o empregado recebe a gratificação de função, nos casos em que houver o pagamento, que não são muitas pessoas que o possuem, pois mesmo muitos gerentes ou outros administradores empregados têm um salário maior, mas não têm gratificação de função, ou então deverá mostrar que o gerente tem um padrão mais elevado de vencimentos do que os demais empregados. Assim também decisão os autos do ROAR , decisão publicada em DJ 23/08/2002, sendo Relator o Ministro Aloysio Silva Corrêa da Veiga, guardadas as devidas diferenças quanto ao caso concreto: Não existe qualquer obrigatoriedade, fixada por norma legal ou coletiva, de que os exercentes de funções de chefia têm o direito de perceber gratificação de função. A informação do parágrafo único do artigo 62 da CLT é clara no sentido de que o pagamento de gratificação pode existir ou não e isso fica a cargo do empregador que detém o poder diretivo de seu negócio. No contrato firmado pelo empregado com a empresa, folha 95, não consta o pagamento de gratificação e dos depoimentos colhidos nada se falou a respeito. O contrato reza, folha 95: Cláusula 4ª. O (A) EMPREGADO(A) receberá remuneração mensal fixa de R$2.200,00 (Dois mil e duzentos reais). Por tudo exposto, acolhe se o inconformismo do recorrente quanto

5 à afirmação na sentença de que não havia impugnação específica ao pedido e, considerando os termos da lei, determina se a exclusão do pagamento da gratificação de função. Dou provimento, para excluir da condenação a gratificação de função e, em consequência, reformar o julgado para declarar IMPROCEDENTE o pedido. CONCLUSÃO Ante o exposto, rejeito as preliminares de não conhecimento do recurso suscitadas pelo autor e CONHEÇO do recurso. Rejeito a preliminar de quitação geral arguida pela ré e, no mérito, DOU LHE PROVIMENTO, para excluir da condenação o pagamento de gratificação de função e reflexos, assim reformando a sentença para julgar IMPROCEDENTE o pedido, na forma da fundamentação. Invertido o ônus da sucumbência, dispensado o autor do recolhimento de custas. A C O R D A M os Desembargadores que compõem a Oitava Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares de não conhecimento do recurso suscitadas pelo autor e CONHECER do recurso. Rejeitar a preliminar de quitação geral arguida pela ré e, no mérito, por unanimidade, DAR-LHE PROVIMENTO, para excluir da condenação o pagamento de gratificação de função e reflexos, assim reformando a sentença para julgar IMPROCEDENTE o pedido, na forma da fundamentação. Invertido o ônus da sucumbência, dispensado o autor do recolhimento de custas. Fez uso da palavra, pelo autor, o Dr. Fernando Lapoente de Azevedo. Rio de Janeiro, 15 de Outubro de Maria Aparecida Coutinho Magalhães Desembargadora Relatora

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