TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito nº , da Comarca de, em que é recorrente/querelante HWU SU CHIU LAW, é recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, Querelados ELY AKKARI, GIHAD AYACHE e CESAR ELIAS ORTOLAN. ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores LUIS SOARES DE MELLO (Presidente sem voto), CAMILO LÉLLIS E EDISON BRANDÃO., 29 de agosto de 2017 IVAN SARTORI RELATOR Assinatura Eletrônica

2 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO nº (2) Comarca: SÃO PAULO FORO CENTRAL CRIMINAL DA BARRA FUNDA Juízo de Origem: 32ª Vara Criminal Juíza: Alessandra Teixeira Miguel Perino Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Criminal Recorrente/querelante: HWU SU CHIU LAW Recorridos/querelados: ELY AKKARI e OUTROS VOTO DO RELATOR Ementa: Recurso em sentido estrito Calúnia e difamação Rejeição da queixa crime, com base no art. 395, III, do CPP Inexistência do elemento subjetivo Animus narrandi e defendendi Inviabilidade, ademais, da responsabilização dos patrocinados pelo que escreveu o causídico Imunidade judiciária presente, inclusive Decisório mantido Recurso desprovido. Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pela querelante, em face da decisão de fls. 248/52, que, fundada no art. 395, III, do CPP, rejeitou a queixa que ofereceu contra Ely Akkary, Gihad Kamel Ayache e César Elias Otolan, por suposta infração aos arts. 138 caput e 139 caput, na forma do art. 70, todos do CP. Aduz a recorrente que presente justa causa à persecução penal, impondo-se a efetiva recepção da peça inaugural e o prosseguimento do processo criminal, em seus ulteriores termos, dês que inocorrente a renúncia tácita ao direito de queixa, por violação ao princípio da indivisibilidade, porquanto despicienda a presença no polo passivo da ação de todos os advogados do escritório contratados pelos demais querelados, bastando o endereçamento acionário contra o causídico que subscreveu a peça em que insertas Recurso Em Sentido Estrito nº VOTO Nº /6

3 as calúnias e difamações. Anota, ainda, que sua imunidade profissional não tem caráter absoluto (fls. 264/88). Processou-se o recurso regularmente, advindo manifestação do Parquet pelo desprovimento (fls. 291/3), contrariedade (fls. 297/305) e sustentação judicial tácita (fl. 306). A Procuradoria de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Raul de Godoy Filho, é pelo desprovimento (fls. 314/17). Recurso bem processado. É o relatório, adotado, no mais, o de primeiro grau. Em que pese o esforço dos combativos patronos da querelante, o inconformismo não prospera. A ilustre magistrada rejeitou a denúncia, firme no entendimento de que: (...) Primeiramente, vislumbra-se que a presente ação penal privada não preenche as condições necessárias para o seu recebimento e regular processamento, visto que não foi observado o princípio da indivisibilidade da ação penal, esculpido no art. 48 do Código de Processo Penal. Com efeito, no caso em tela, foram outorgados poderes para os advogados Ricardo Carriel Amary e Cesar Elias Ortolan, escritório de advocacia, Amary e Ortolan, de modo que não tem o querelante a faculdade de ajuizar a ação contra um ou outro, sob pena de infringir o princípio da indivisibilidade da ação penal. Operou-se, assim, o instituto da renúncia tácita, nos termos do art. 49 do Código de Processo Penal, que é causa extintiva da punibilidade (art. 107, inciso V do Código Penal). (...) E mesmo que se entendesse de forma contrária, sob o argumento de que o advogado Ricardo Carriel Amary não subscreveu a petição inicial, apesar de ter procuração com poderes para fazê-lo, além de seu nome figurar no logotipo de todas as páginas da peça inicial, mesmo assim, de rigor se reconhecer a ilegitimidade passiva dos sócios da empresa BBM Recurso Em Sentido Estrito nº VOTO Nº /6

4 Administração de Bens e Participações Ltda, Ely Akkario e Gihad Kamel Ayache, para responderem pelos delitos a eles imputados na queixa-crime, uma vez que estes não subscreveram a inicial da ação possessoria. Ora, no caso dos sócios da empresa a situação é totalmente diferente. Isso porque, como bem lançado pelo Ministério Público em seu parecer nada há nos autos que indique que tinham conhecimento de tais afirmações. E, como se sabe, em processo penal a responsabilidade objetiva é exceção. Como se não bastasse, pela leitura da queixa crime, as afirmações realizadas na peça inicial da ação possessória, as quais foram descritas na inicial da queixa-crime, nada mais são do que fatos, fatos estes que foram narrados pelo advogado imbuído de 'animus narrandi' e 'animus defendendi' com o escopo de alcançar a tutela civil pretendida. Não há na peça inicial da ação possessória qualquer afirmação em que se posa vislumbrar a intenção, dolo, de ofender ou difamar. Nesse sentido é o entendimento do STJ: A falta de justa causa para o exercício da ação penal implica na rejeição da queixa-crime (art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal). Verificado apenas o animus narrandi, ou seja, a intenção de narrar ou relatar um fato, na conduta dos querelados, inviabiliza-se a persecução penal. Queixacrime rejeitada (APn 616/DF, Rel. Min. MASSAMI UYEDA, Corte Especial, Dje 04/08/2011). E mais: Há que se se ponderar, ainda, como bem lembrado pelo brilhante Promotor de Justiça, Dr. Luis Cláudio de Carvalho Valente, que a conduta do advogado no que tange a eventual difamação - está inserida na imunidade judiciária do inciso I do artigo 142 do Código Penal. Além disso, o Estatuto da OAB, em seu artigo 7, parágrafo 2 º estabelece que o advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das Recurso Em Sentido Estrito nº VOTO Nº /6

5 sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer. Ocorre que, no caso examinado, não vislumbro qualquer excesso ou abuso por parte dos advogados, como já dito, os fatos foram narrados no bojo do direito de ação que é protegido constitucionalmente (...) (fls. 249/51). Mais não é preciso dizer. Ainda que discutível o argumento da quebra à indivisibilidade, os demais insertos no decisório são insuperáveis. As invectivas teriam ocorrido no documento trasladado às fls. 20/37, que retrata petição em ação possessória entre a querelante e a empresa BBM Administração de Bens e Participações Ltda., representada por seus sócios, os querelados Ely Akkari e Gihad Kamel Ayache. Entanto, eventual abuso profissional não pode ser imputado aos patrocinados, mesmo porque responsabilidade objetiva em sede criminal é excepcionalíssima, não ocorrendo isso na espécie. Ademais, da leitura do documento aludido não se extrai o dolo de caluniar ou difamar, mas simples animus narrandi e defendendi, em que o advogado aponta fatos que, segundo sua convicção enquanto causídico, permitiriam o ganho da causa por seus clientes, sem qualquer intenção de denegrir a honra da recorrente. Realmente, retira-se mera descrição de diversos embates entre a querelante e os querelados Ely e Gihad, narrativa essa necessária ao esclarecimento da questão possessória. Nada além disso. Não há, definitivamente, indício algum do dolo de macular a honra da inconformada. Recurso Em Sentido Estrito nº VOTO Nº /6

6 Como se não bastasse, presente a imunidade profissional garantida pelo art. 7º, 2º do EOAB, em relação à difamação. Acertado, portanto, o r. decisório objurgado, tanto que nesse sentido foram as manifestações do Parquet de fls. 116/9, 244/6 e 291/3. Destarte, mantém-se a rejeição da peça de incoação, encampados, no essencial, a fundamentação singular e o entendimento ministerial (art. 252 do RITJ). Nega-se provimento. IVAN SARTORI Desembargador Relator Recurso Em Sentido Estrito nº VOTO Nº /6