Homilia na recepção à Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima

Transcrição

1 1.Estamos reunidos para celebrar Eucaristia, acompanhados pela presença da Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima, que hoje e a partir daqui inicia a visita à Diocese do Porto. Somos convidados pelo Seu Filho, o Senhor Ressuscitado, como fez com os Apóstolos na sua terceira aparição, depois da ressurreição, junto ao lago de Tiberíades. Nesse momento partilhou com eles os pães e os peixes. Alimenta-nos a nós, com o pão e com o vinho que, pela acção do Espírito Santo, se converterão no seu Corpo e no Seu Sangue. A Palavra de Deus diz-nos, na primeira leitura, que os Apóstolos foram perseguidos e presos, porque começaram a anunciar Jesus vivo e ressuscitado. Mas não temeram a perseguição nem se intimidaram com as ameaças. Deram testemunho corajoso da ressurreição de Jesus, acontecimento central da fé e fonte de vida para quem acredita n Ele (cf Act 5, 27-32, 40-41). 1 / 5

2 Escutamos, na segunda leitura, um belo texto do livro do Apocalipse e unimo-nos ao louvor que o autor deste livro presta a Jesus Cristo crucificado, sacrificado como um cordeiro imolado, e agora vivo e ressuscitado para sempre (cf Apoc 5, 11-14). No Evangelho vemos Pedro, agora confirmado como Pastor universal da Igreja. Seguem-se agora às três negações, na hora da Paixão de Jesus, as três afirmações de amor incondicional diante do Ressuscitado. Pedro é convidado a conduzir a barca de Jesus, que é a Igreja, e os Apóstolos congregam-se à volta de Pedro, reunindo a totalidade indivisível dos eleitos sobre a margem donde se vislumbra já o Reino novo que vai nascer, onde Deus preparou para os seus o banquete da bem-aventurança eterna e a alegria da Páscoa definitiva (cf Jo 21, 1-19). 2. Iniciamos hoje a Semana de oração pelas vocações à vida sacerdotal, religiosa e consagrada, sob o lema: A Igreja, Mãe de Vocações. Vamos viver esta semana com o acrescentado espírito de fé de quem reza ao Senhor da Messe para que envie operários para a sua Messe e com o renovado espírito de confiança de quem sabe que o Senhor continua a chamar servidores generosos do seu Povo. Coloco no coração da Mãe, a Virgem Peregrina, esta intenção, para que a tenha sempre presente em cada passo da sua visita à nossa Diocese. Muitas e abençoadas têm sido, ao longo da história da Igreja do Porto, as vocações nascidas neste chão fecundo das nossas terras, desde o Antuã ao Ave e desde o Mar ao Marão. Queremos agradecer a memória sagrada do passado e trabalhar para que os jovens de hoje, sempre generosos, acolham com alegria o chamamento de Deus para a vida sacerdotal e consagrada no futuro, que em cada dia começa com renovada esperança. 2 / 5

3 A vocação manifesta-se no encontro pessoal com Deus, como aconteceu com os discípulos de Jesus. Não são indiferentes a isso os conselhos oportunos e a ajuda imprescindível de quantos são mediadores de Deus nas famílias e nas comunidades. Asa características maiores de uma vocação ao ministério sacerdotal ou à vida consagrada são a disponibilidade permanente para ir ao encontro de Deus que nos escolheu, a pobreza interior de quem se sente frágil, a docilidade para acolher a misericórdia divina, a procura atenta de um Deus que se faz próximo, a paixão pela missão, por mais exigente que seja e a certeza de se sentir sempre sustentado pela Palavra de Deus, alimentado pelos sacramentos e ancorado pela comunhão da Igreja. A consequência lógica de ter encontrado Jesus Cristo é procurar que O encontrem e amem também os nossos familiares, amigos e vizinhos. Jesus serve-se, habitualmente do testemunho e da palavra dos cristãos para atrair a Si aqueles que chama para o ministério e para a missão. 3. Está connosco a partir de hoje e ao longo de todo este mês a Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima. É uma visita singular que queremos transformar em hora de bênção para a Igreja do Porto que quer aprender com a Mãe de Jesus a espelhar com ternura da mãe o amor de Deus pela Humanidade. Esta Imagem Peregrina já antes nos visitou, em março de 1948, quando regressava através do porto de Leixões, no navio Ribeira Grande, da sua primeira visita a vários países da Europa, em tempos difíceis do pós-guerra. Regressa 68 anos depois, após ter percorrido dezoito dioceses de Portugal, desde 13 de maio do ano passado, para daqui partir para a diocese de Leiria-Fátima. Agradeço a sua visita. Imploro a sua bênção de Mãe de Deus e nossa Mãe. Saúdo a sua presença com as palavras com que nós bispos, ao serviço desta Igreja do Porto, anunciámos a sua visita à nossa Diocese: Há quase cem anos, num gesto singular e sempre inefável, Deus, mais uma vez, quis acordar a Humanidade. Não escolheu um país poderoso, grande e rico: escolheu Portugal, escolheu Fátima; não procurou personagens conhecidas e influentes: procurou três crianças, pobres e simples; não enviou Anjos nem Arcanjos: enviou uma Mulher. A mesma Mulher que, ainda 3 / 5

4 jovem donzela, foi visitada por Gabriel (cf Lc 1, 26ss). Convidada para ser Mãe de Deus, compreendido o fundamental, respondeu: «Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lc 1, 38). Há dois mil anos. Há cem anos. Hoje. Fátima, Nossa Senhora do Rosário de Fátima, desde então, pela riqueza da Mensagem unida à simplicidade da sua representação, correram mundo e entraram no coração da Igreja, mormente dos mais pequeninos. O fascínio da Imagem que compendia este gesto de Deus encontra explicação na força atrativa de todas as representações maternas. Mas aqui é, certamente, potenciada pela inefável simplicidade das personagens: a Mãe e as crianças. E a Mãe é Mãe de Deus, em Jesus Cristo, e nossa Mãe por vontade do Filho (Jo 19, 26-27). Maria está indissociavelmente unida ao plano salvífico de Deus: por vontade de Deus, pela Sua fidelidade, pela condição de Mãe do Redentor, Jesus Cristo. Pelo dom e missão da maternidade divina, que a une a seu Filho Redentor, e pelas suas singulares graças e funções, está também a Virgem intimamente ligada, à Igreja: a Mãe de Deus é o tipo e a figura da Igreja, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo (LG 63). Podemos dizer que a correspondência à presença da Virgem Maria na Igreja e nas nossas vidas, por vontade de Deus, é mais que mera devoção. Criatura de Deus, a primeira e a mais fiel dos discípulos, sinaliza caminhos de busca e de encontro com Jesus Cristo. Não é meta, nem é caminho: é companhia e vereda para o Caminho. Quantas vezes a realidade ultrapassa os nossos limites e as explicações não explicam! Num diálogo, ao mesmo tempo fraterno e filial, podemos encontrar em Maria o conforto da força dos afetos Ninguém, como Maria, conheceu a profundidade do mistério de Deus feito homem. Na sua vida, tudo foi plasmado pela presença da misericórdia feita carne. A Mãe do Crucificado Ressuscitado entrou no santuário da misericórdia divina, porque participou intimamente no mistério do seu amor. Como nos recorda o Papa Francisco (EG ), «a piedade popular traduz em si uma certa sede de Deus, que somente os pobres e os simples podem experimentar ( ) Não coartemos nem pretendamos controlar esta força missionária!. Maria, Mãe de Misericórdia, não nos distrai dos acentos pastorais que temos à nossa frente. 4 / 5

5 Melhor do que ninguém, nos ajudará a abrir os olhos e o coração à Boa Nova de Jesus Cristo. A descobrir que «a alegria do Evangelho» é mais que uma frase: é o segredo de uma vida com sentido e é, por isso, «a nossa missão». Diante da Imagem Peregrina rezo a Deus por intercessão de Nossa Senhora de Fátima pela Igreja do Porto com as mesmas palavras e oxalá com igual firmeza de fé e exemplar confiança filial de minha mãe: «Mãe, tudo podes: és Mãe de Deus. Mãe, tudo deves: és nossa Mãe». Igreja matriz de s, Cristóvão de Ovar, 10 de abril de 2016 António, Bispo do Porto 5 / 5