RELAÇÃO ENTRE O ATAQUE DO ÁCARO-PLANO E DA MANCHA-ANULAR COM INDICADORES DA QUALIDADE DO CAFÉ

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1 RELAÇÃO ENTRE O ATAQUE DO ÁCARO-PLANO E DA MANCHA-ANULAR COM INDICADORES DA QUALIDADE DO CAFÉ RESUMO - Análises químicas de café beneficiado, proveniente de frutos no estádio de cereja com ataque do ácaro-plano Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) (Acari: Tenuipalpidae) e com sintomas da manchaanular, mostraram haver menor atividade da PAULO REBELLES REIS 1 SÍLVIO JÚLIO DE REZENDE CHAGAS 2 polifenoloxidase e maior porcentagem de compostos fenólicos e açúcares totais do que naqueles sem ataque do ácaro. Essas condições caracterizam uma redução da qualidade de bebida do café em decorrência do ataque dessa espécie de ácaro. TERMOS PARA INDEXAÇÃO: Acari, Brevipalpus phoenicis, Rhabdovirus, Coffea arabica, polifenoloxidase, compostos fenólicos. RELATIONSHIP BETWEEN THE FALSE SPIDER MITE AND THE RINGSPOT VIRUS ATTACK WITH COFFEE QUALITY INDICATORS ABSTRACT - Chemical analysis of green coffee from berry fruit stage with attack of false spider mite Brevipalpus phoenicis (Geiyskes, 1939) (Acari: Tenuipalpidae) and ringspot virus symptoms, showed minor activity of polyphenoloxidase and major percentage of phenolic compounds and total sugars than those without attack. These conditions characterize a beverage quality reduction in function of the mite attack. INDEX TERMS: Acari, flat mite, Brevipalpus phoenicis, Rhabdovirus, Coffea arabica, polyphenoloxidase, phenolic compounds. INTRODUÇÃO O ácaro-plano, Brevipalpus phoenicis (Geijskes, 1939) (Acari: Tenuipalpidae), tem sido relatado vivendo em cafeeiros (Coffea spp) no Brasil, pelo menos desde 1951 (A infestação..., 1951) e, posteriormente, foi correlacionado com a manchaanular (Chagas, 1973) causada por vírus do grupo dos Rhabdovirus (Chagas, 1988). Chagas (1973) conseguiu reproduzir os sintomas da mancha-anular em mudas de Coffea arabica L. cv. Mundo Novo, pela infestação com ácaros provenientes de lavoura de café apresentando a doença. Os resultados obtidos indicaram que o ácaro B. phoenicis, além de estar associado à leprose dos citros (Musumeci e Rossetti, 1963) e à clorose-zonada (Rossetti et al., 1965), estava também associado à mancha-anular do cafeeiro. Até 1988, a mancha-anular do cafeeiro não tinha representado ainda problema econômico, embora em 1986 tenha sido associada a uma intensa desfolha em período de inverno com baixa precipitação pluvial, condição muito favorável ao ácaro (Chagas, 1988). Desde 1990, com destaque para 1995, a infestação de B. phoenicis e da mancha-anular tem sido constatada em Minas Gerais, causando intensa desfolha em cafeeiros, principalmente na região do Alto Paranaíba (Figueira et al., 1996), sendo também constatada a presença do ácaro nas demais regiões cafeeiras do Brasil, tanto em cafeeiro arábica quanto em canéfora (Coffea canephora Pierre) (Matiello, 1987). Matiello et al. (1995) mencionaram que as plantas atacadas e com sintomas do ataque do ácaro ficam bastante desfolhadas, de dentro para fora, ficando ocas. Os frutos apresentam lesões cor de ferrugem (marrom claro), evoluindo depois para uma cor negra, alguns recobertos por fungos oportunistas, aparecendo um pó branco sobre as lesões. 1. Engenheiro Agrônomo, D.Sc., Pesquisador, EPAMIG-CTSM, Caixa Postal 176, Lavras - MG. 2. Engenheiro Agrônomo, M.Sc., Pesquisador, EPAMIG-CTSM.

2 Nas folhas, foi observado que os ácaros localizam-se na página inferior, próximo às nervuras, principalmente a central. Nos frutos, ácaros e ovos são encontrados principalmente na coroa e pedúnculo, sendo também encontrados em fendas e lesões na casca dos frutos com aspecto de cortiça. Nos ramos, são freqüentemente encontrados abrigados em fendas existentes na casca e também nos entrenós. Após o ataque do ácaro, os frutos ficam pré-dispostos à penetração de microorganismos, como é o caso do fungo Colletotrichum gloeosporioides, que é comum ser encontrado em condições saprofíticas em cafeeiro (Reis et al., 1997) e por outros gêneros de fungos, como Fusarium, Penicillium, Cladosporium e Aspergillus, também correlacionados com a qualidade de bebida de café (Alves e Castro, 1998; Scavanachi e Patrício, 1998; Carvalho e Figueira, 1998). No Brasil, a qualidade do café é avaliada pelas características físicas (aspecto e pureza) e pelo aroma da bebida (Carvalho et al., 1994). Segundo Amorim e Teixeira (1975), a bebida é o principal aspecto considerado na comercialização do café, e entre os cafés considerados finos e os de pior qualidade pode haver uma desvalorização no preço do produto de até 30%. Objetivou-se com este trabalho verificar se o ataque do B. phoenicis e da mancha-anular são fatores que predispõem os frutos de café a alterações na qualidade de bebida. MATERIAL E MÉTODOS Em um cafezal 'Catuaí' com 11 anos de idade, município de Lavras (MG), apresentando infestação do ácaro e sintoma da mancha-anular, foram colhidos frutos de café no estágio de cereja com e sem sintoma do ataque, perfazendo duas amostras compostas, com 2 kg de cada tipo. Os frutos foram postos para secar ao sol separadamente e, após a seca, foram beneficiados. As determinações da atividade da polifenoloxidase, fenólicos totais e açúcares totais, para análise química da qualidade de bebida, foram realizadas, com três repetições, no café beneficiado moído em moinho tipo Croton, Mod. TE-580, utilizando-se peneira de 30 mesh. Atividade da polifenoloxidase. Determinada pelo método descrito por Ponting e Joslyng (1948), utilizando-se o extrato da amostra sem o 2-3,4 dihidroxifenil-alanina (DOPA) como branco, em U/minuto/g de amostra. Uma Unidade de Polifenoloxidase (PFO) é definida como a quantidade de enzima que causa um aumento na absorbância de 0,001 unidade por minuto nas condições do teste. Fenólicos totais. Extraídos pelo método de Goldstein e Swain (1963), utilizando-se como extrator o metanol 50%, e identificados de acordo com o método de Folin Denis, descrito pela AOAC (1970). Açúcares totais. Extraídos pelo método de Lane-Enyon, citado pela AOAC (1970), e determinado pela técnica de Somogy, adaptada por Nelson (1944). RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Tabela 1 encontram-se relatados os resultados obtidos de compostos fenólicos totais, atividade de polifenoloxidase e açúcares totais. Observou-se maior teor de compostos fenólicos no café com ataque do ácaro B. phoenicis e com sintomas da mancha-anular (Tabela 1). Fato semelhante foi mostrado por Kennedy e Waterkeyn (1994) para ataque da mesma espécie de ácaro em folhas de chá-da-índia, por meio de análise visual em cortes histológicos de folha. Sob microscópio, esses autores observaram o acúmulo de compostos fenólicos no interior e entre células do mesófilo, substâncias produzidas em razão da interação entre o ácaro e a planta. A presença desses compostos no café foi observada por Carvalho et al. (1989) em uma média de 8,37% de fenólicos totais nos frutos colhidos cerejas e de 9,66% nos derriçados no pano, teores bem mais elevados que os encontrados no presente trabalho (Tabela 1). Esses resultados podem ser em função de não ter havido frutos verdes e semimaduros nas amostras em estudo, os quais possuem maiores teores desses compostos. Segundo Amorim e Silva (1968), os compostos fenólicos, principalmente os ácidos clorogênico e caféico, exercem uma ação protetora antioxidante dos aldeídos. Quando há qualquer condição adversa aos grãos, ou seja, ataque de insetos, injúrias mecânicas, infecção por microorganismos, colheita inadequada, problemas no processamento e armazenamento, as polifenoloxidases agem sobre os polifenóis, diminuindo sua ação antioxidante sobre os aldeídos, facilitando a oxidação destes, ao mesmo tempo que produz quinonas, as quais agem como substrato inibidor da polifenoloxidase. Por esse motivo, os cafés de pior qualidade, ou seja, os que tiveram seu sabor afetado por condições adversas, têm também baixa atividade de polifenoloxidase. Carvalho e Chalfoun (1985) relataram que com a diminuição nos compostos fenólicos, há um 73

3 74 decréscimo na adstringência do café, o que é desejável para obtenção de cafés finos. Segundo Carvalho et al. (1994), citando diversos autores, os fatores que tendem a melhorar a qualidade da bebida de café proporcionam aumento na atividade de polifenoloxidase. Pelos resultados obtidos (Tabela 1) constatase que houve menores valores da atividade da polifenoloxidase e maior porcentagem de fenólicos totais nos grãos de café provenientes de frutos que exibiam sintoma da mancha-anular. Comparando-se os resultados da atividade da polifenoloxidase obtidos neste trabalho com os apresentados na Tabela 2, pode-se inferir que o café sofreu alteração na qualidade de bebida, passando de bebida mole para dura, demonstrando que o ataque do ácaro e, conseqüentemente, da mancha-anular é um fator que prejudica a qualidade da bebida. Foram também constatados maiores teores de açúcares totais na amostra de café com ácaro, que podem ter favorecido a infecção por microorganismos nas lesões causadas pelo ataque do ácaro (Tabela 1). Conforme Carvalho (1997), esses microorganismos em seu desenvolvimento produzem suas próprias enzimas que agem sobre os compostos químicos da mucilagem, principalmente sobre os açúcares, produzindo álcool, que se desdobra em ácido acético, láctico, butírico e outros ácidos carboxílicos superiores. Ao iniciar a produção de ácido butírico, começa haver prejuízo na qualidade do café. Os carboidratos podem contribuir para o sabor e aroma do café, conforme cita Amorim (1972), que observou, no entanto, que esses componentes não influem nas classificações por qualidade da bebida. TABELA 1 - Atividade da polifenoloxidase (U/minuto/g de amostra), açúcares totais (%) e fenólicos totais (%) em grãos de café provenientes de frutos com e sem ataque do ácaro Brevipalpus phoenicis e da mancha-anular. Lavras, MG. Atividade da Parâmetros analisados polifenoloxidase Açúcares totais Fenólicos totais 1 Erro-padrão da média Repetição I II III Média ± EP 1 Com ácaro 62,99 60,66 60,66 61,43 ± 0,78 Sem ácaro 65,32 67,66 67,66 66,88 ± 0,78 Com ácaro 9,16 8,62 8,62 8,80 ± 0,18 Sem ácaro 5,63 6,93 5,93 6,16 ± 0,39 Com ácaro 7,07 5,70 5,67 6,15 ± 0,46 Sem ácaro 6,48 5,31 5,38 5,72 ± 0,38 TABELA 2 - Atividade da polifenoloxidase, em U/minuto/g de amostra, em cafés previamente classificados pela prova de xícara. Classificação pela prova Atividade de polifenoloxidase de xícara Média Faixa de variação Estritamente mole 68,94 67,66-74,66 Mole 65,96 64,16-67,66 Apenas mole 63,77 62,99-66,94 Dura 60,98 55,99-62,99 Riada 44,00 37,33-53,66

4 75 Rio 41,36 36,16-47,83 FONTE: Carvalho et al. (1994) CONCLUSÃO O ataque do ácaro Brevipalpus phoenicis e da mancha-anular em frutos de café é um fator que altera, para pior, a qualidade de bebida. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, E.; CASTRO, H.A. de. Fungos associados ao café (Coffea arabica L.) nas fases de pré e pós-colheita em lavouras da região de Lavras. Summa Phytopathologica, São Paulo, v.24, n.1, p.4-7, AMORIM, H.V. Relação entre alguns compostos orgânicos do grão do café verde com a qualidade da bebida. Piracicaba: ESALQ, P. (Tese Doutorado). AMORIM, H.V.; TEIXEIRA, A.A. Transformações bioquímicas e físicas dos grãos de café verde e a qualidade da bebida. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 3., 1975, Curitiba. Resumos... Rio de Janeiro, MIC/IBC, p.21. AMORIM, H.V.; SILVA, O.M. Relationship between the polyphenol oxidase activity of coffee beans and the quality of the beverage. Nature, London, v.219, p , ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS. Official methods of analysis of the Association of Official Analytical Chemists. 11. ed. Washington, p. CARVALHO, V.D. de. Cafeicultura empresarial: produtividade e qualidade do café. Lavras: UFLA/FAEPE, p. CARVALHO, V.D. de; CHALFOUN, S.M. Aspectos qualitativos do café. Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v.11, n.126, p79-92, CARVALHO, V.D. de; CHALFOUN, S.M.; COSTA COUTO, A.; CHAGAS, S.J. de R.; VILELA, E.R. Efeito do tipo de colheita e local de cultivo na composição físico-química e química do grão beneficiado de café. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 15., 1989, Maringá. Resumos... Rio de Janeiro, MIC/IBC, p CARVALHO, V.D. de; CHAGAS, S.J. de R.; CHALFOUN, S.M.; BOTREL, N.; JUSTE JÚNIOR, E.S.G. Relação entre a composição físico-química e química do grão beneficiado e a qualidade de bebida do café. I. Atividades de polifenoloxidase e peroxidase, índice de coloração de acidez. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v.29, n.3, p , CARVALHO, C.M.; FIGUEIRA, A. dos R. Situação do vírus da mancha anular em Minas Gerais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 24., 1998, Poços de Caldas. Trabalhos apresentados... Rio de Janeiro: MAA/SDR/PROCAFÉ/PNFC, p CHAGAS, C.M. Associação do ácaro Brevipalpus phoenicis (Geijskes) à mancha anular do cafeeiro. O Biológico, São Paulo, v.39, n.9, p , CHAGAS, C.M. Viroses, ou doenças semelhantes transmitidas por ácaros tenuipalpídeos: mancha anular do cafeeiro e leprose dos citros. Fitopatologia Brasileira, Brasília, v.13, n.2, p.92, FIGUEIRA, A.R.; REIS, P.R.; CARVALHO, V.L.; PINTO, C.S. Coffee ringspot virus is becoming a real problem to brazilian coffee growers. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF VIROLOGY, 10., 1996, Jerusalem, Israel. Abstracts... Jerusalem, p.203. GOLDSTEIN, J.L.; SWAIN, T. Changes in tannins in ripening fruits. Phytochemistry, Oxford, v.2., p , A INFESTAÇÃO de ácaros nos cafezais. O Biológico, São Paulo, v.17, n.7, p.130, KENNEDY, J.S.; WATERKEYN, L. Histology of feeding injury caused by Brevipalpus phoenicis Geijskes (Acari: Tenuipalpidae) on tea leaves. Mededelingen Faculteit Landbouwkundige en Toegepast Biologishe Wetenschappen Univesiteit Gent, Belgium, v.59, n.2a, p , 1994.

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