REVISTA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA ULBRA 2009/2010

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1 REVISTA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA ULBRA 2009/2010

2 Reitor Marcos Fernando Ziemer Vice-Reitor Valter Kuchenbecker Pró-Reitor de Administração Ricardo Müller Pró-Reitor de Graduação Ricardo Prates Macedo Pró-Reitor Adjunto de Graduação Pedro Antonio Gonzalez Hernandez Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Erwin Francisco Tochtrop Júnior Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários Ricardo Willy Rieth Capelão geral Gerhard Grasel DIRETORIA DE PESQUISA Nádia T. Schröder (Dir.) Ana Maria Pujol Vieira dos Santos Juliana da Silva Lemos Danielle Feijó de Sousa COMISSÃO EDITORIAL Ana Maria Pujol Vieira dos Santos Ana Lígia Trindade Nádia T. Schröder INDEXADOR LATINDEX EDITORA DA ULBRA Diretor Astomiro Romais Capa Juliano Dall Agnol Projeto Gráfico Isabel Kubaski Editoração Humberto Gustavo Schwert Coordenação de Impressão Gráfica Edison Wolf Av. Farroupilha, Prédio 29 - Sala Bairro São José CEP: Canoas/RS Fone: (51) Fax: (51) editora@ulbra.br Imagem da capa: Criação do Núcleo de Design da ULBRA

3 REVISTA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA ULBRA 2009/2010

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5 Índice ApresentAção...7 CiênCiAs AgráriAs taxas de concepção e prenhez de novilhas submetidas a diferentes métodos de inseminação artificial...11 Marcos Rosa de Almeida, Jéssica Magero, Carla Tiane Dal Cortivo Martins, Milena de Vargas Shuler, Hélio Hadke Bittencourt, Rodrigo Costa Mattos, Ricardo Macedo Gregory, Carlos Santos Gottschall CiênCiAs BiológiCAs Avaliação do efeito genotóxico do aripiprazol em camundongos...21 Taís Madelon Freitas, Franciele Brandelli Celso, Tatiana Grasiela da Silva, Patrícia Pereira, Jaqueline Nascimento Picada Herança da tolerância ao frio na fase vegetativa em arroz...31 Caroline Cabreira, Renata Pereira da Cruz Morfologia polínica dos gêneros Hebanthe Mart. e Pfaffia Mart. nativos do rio grande do sul...37 Julio Ricardo Bastos, Soraia Girardi Bauermann, Maria Salete Marchioretto Variabilidade genética do jaborandi (Pilocarpus pennatifolius lemaire; rutaceae) em populações naturais da região noroeste do rio grande do sul Ana Júlia Bandeira, Luis Irineu Deimling, Janaína Endres Georg-Kraemer Um modelo murino para tratamento de lesão por isquemia e reperfusão de retalhos cutâneos com o uso de células-tronco adiposo-derivadas André Vicente Bigolin, Antonio Francisco Ruaro Filho, Thiago dos Santos Pereira, Luciana Lima Martins Costa, Bruno Bellagamba, Melissa Camassola, Nance Nardi CiênCiAs da saúde Análise química e avaliação da atividade acaricida das folhas de Piper amalago, P. mikanianum e P. xylosteoides em larvas de Rhipicephalus (Boophilus) microplus Marcela Silva dos Santos, Gilsane von Poser, Sérgio Bordignon, Vera Lucia Sardá Ribeiro, Alexandre de Barros Falcão Ferraz estudo do perfil docente nos cursos de odontologia da região sul...73 Lucas Preussler dos Santos, Daniele Sigal Linhares, Talita Carniel, Carlos Alberto Feldens, Vania Regina Camargo Fontanella estudo do polimorfismo taqib do gene cetp em indivíduos dislipidêmicos...79 Cristiana Alves Martins, Carla d Avila de Assumpção, Fernanda Goulart Lannes Chula, Sabrina Esteves de Matos Almeida, Marilu Fiegenbaum, Maria Lucia Rossetti, Cláudia Maria Dornelles da Silva detecção de dna de Mycobacterium tuberculosis em amostras de sangue total utilizando o sistema FtA card...85 Carla Rossana dos Santos, Suelen Angeli1, Candice Michelon, Karen Schmid, Marcia Susana Nunes Silva, Maria Lucia Rosa Rossetti paracetamol induz radiossensibilidade na linhagem celular derivada de glioma humano U felipe Umpierre Conter, Luciana Brosina de Leon, Tatiane von Werne Baes, Fábio Dal Bello, Daniel Pretto Schuneman, Aroldo Braga Filho, Andréa Regner, Adriana Brondani da Rocha, Ivana Grivicich

6 CiênCiAs exatas e da terra Análise computacional da interação da isoniazida com as formas selvagem (wt) e mutante (g68r) da n-acetiltransferase de Mycobacterium tuberculosis Janaína Menezes Perez, Ricardo Martins Ramos, Millene Borges Coelho, Maria Lúcia Rossetti, Hermes Luis Neubauer de Amorim determinação da curva característica do solo de uma barreira capilar que compõem uma alternativa de um sistema de cobertura de aterros sanitários Alexandre Petry Carneiro, Julia Fanti, Rodrigo Moraes da Silveira, Albert Welzel, Flávia Schenato Mineralogia da mina Andreazza, Vila nova do sul, rio grande do sul, Brasil Darcson Vieira de Freitas, Luis Andre Baptista, Paulo César Pereira das Neves CiênCiAs HUMAnAs Aprendendo a ser criança nas canções Roberta de Cássia Larsen, Maria Lúcia Castagna Wortmann Casais que decidem não ter filhos: motivos, sentimentos e impressões amanda Dornel Ribas, Carla Meira Kreutz Construção e análise das propriedades psicométricas de um instrumento para avaliação de estratégias de enfrentamento (coping) de situações estressoras no contexto de trabalho Miriam Raquel Wachholz Strelhow, Cheila de Oliveira Bueno, Sheila Gonçalves Câmara, Mary Sandra Carlotto Contribuições da utilização de calculadoras gráficas na estruturação de conceitos relacionados a coordenadas polares Dienifer Kiak Scapin, Carmen Teresa Kaiber, Rodrigo Dalla Vecchia experiências de quase-morte e mudanças na vida Liane Maria Fagundes Pinto, Fernanda Barcellos Serralta percepções de alunos sobre educação a distância mediada por ambientes virtuais de aprendizagem Rodrigo Alcione Maia, Karla Saraiva projeto pró-memória: novos olhares sobre a história do esporte de Carazinho-rs Diacson Vieira Ribeiro, Patricia, Carlesso Marcelino Siqueira síndrome de Burnout em profissionais da saúde de Unidades Básicas de saúde Luanna Taborda, Ítala Chinazzo, Mary Sandra Carlotto CiênCiAs sociais ApliCAdAs o preço da bola: processo de formação de crianças e adolescentes das categorias de base do sport Club internacional.219 Zilka Vargas, Honor de Almeida Neto percepções urbanas em cidades periféricas: o caso de guajuviras em Canoas, rs, Brasil Ana R. F. Simão, Cláudia L. Z. Pires, Heloísa G. L. Lindau, Katia M. P. Pozzer, Lutiane Bom Berch, Samy Souza Resident evil e redes sociais: atualizações, virtualizações e audiovisualidades Taís Seibt, Nísia Martins do Rosário engenharias Aplicação de nanocatalisadores sintetizados em laboratório para remoção de fenol via fotocatálise Lucas Bystronski Abreu, Liliana Amaral Féris Aprimoramento de um motor a combustão interna Luís Fernando Backes de Leon, Luiz Carlos Gertz, Charles Rech, André Cervieri, Rafael Antônio Camparssi Laranja linguística, letras e Artes Contemporaneidade na pintura: o campo específico Jander Luiz Rama, Icleia Borsa Cattani registros de dança: a trajetória do grupo terra Míriam Medeiros Strack, Flavia Pilla do Valle

7 Apresentação A Revista de Iniciação Científica da ULBRA que apresentamos, revela o crescimento qualitativo dos trabalhos de iniciação científica selecionados no XV Salão de Iniciação Científica da ULBRA de 2009 que se constitui num espaço de convergência e irradiação do saber. A iniciação científica é um instrumento básico de formação de recursos humanos qualificados que possibilita introduzir os alunos de graduação em contato direto com a atividade científica e tecnológica e engajá-los na pesquisa. Nesta perspectiva, esta atividade caracteriza-se como instrumento de apoio teórico e metodológico à execução de uma pesquisa. Também garante, aos estudantes, uma maior visão do mundo permitindo com que imprevistos possam ser solucionados. Nesta atividade de pesquisa há estímulo para o desenvolvimento do espírito crítico e da criatividade. O Programa de Iniciação Científica e Tecnológica (PROICT/ULBRA) foi aprovado com o objetivo de efetivar este processo consistente de capacitação de recursos humanos visando estabelecer mecanismos adequados de auxílio para a formação de uma nova mentalidade no aluno, desenvolvendo nele a atitude científica, tornando-o um indivíduo preparado para ser o profissional diferenciado no mercado de trabalho. Além do programa institucional próprio contamos com o auxílio do CNPq por meio do PIBIC que tem por finalidade o despertar da vocação científica e incentivar talentos potenciais entre estudantes de graduação universitária, mediante participação em projeto de pesquisa, orientados por pesquisador qualificado. O Salão de Iniciação Científica da ULBRA, mais do que a difusão de conhecimentos é a ampliação das relações da Universidade com a comunidade em que está inserida e aberta a outras Instituições de Ensino Superior, constituindo-se numa oportunidade única para que o estudante possa perceber o sentido do fazer científico dentro da Universidade. Além disso, é uma oportunidade para estudantes participarem de eventos onde há trocas de experiências, de informações entre os participantes e avanço do conhecimento com a exposição dos resultados das pesquisas desenvolvidas por estes alunos. Dr. Erwin Francisco Tochtrop Júnior Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Dra. Nádia Schröder Diretora de Pesquisa

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9 Ciências Agrárias

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11 Taxas de concepção e prenhez de novilhas submetidas a diferentes métodos de inseminação artificial Ma r c o s ro s a d e al M e i d a 1 Jé s s i c a Ma g e r o 2 ca r l a Ti a n e da l co r T i v o Ma r T i n s 2 Mi l e n a d e va r g a s shuler 2 hé l i o ha d k e Bi T T e n c o u r T 3 ro d r i g o co s Ta MaT T o s 4 ri c a r d o Ma c e d o gr e g o r y 4 ca r lo s santos go T T s c h a l l 5 RESUMO Objetivou-se no experimento avaliar as taxas de concepção e prenhez de 104 novilhas acasaladas aos 24 meses. Foram formados dois grupos, grupo IATF (G-IATF) com 50 novilhas e grupo IA (G-IA) com 54 novilhas. Dos 54 animais do G-IA inseminou-se 28, sobrando 26, formando o grupo G-NãoIA. A taxa de concepção do G-IATF e G-IA a IA(TF) foi, respectivamente, 38,0% e 39,3% (p>0,05). A taxa de prenhez a IA(TF) foi, respectivamente, de 38,0% e 20,4% (p<0,05). As taxas de prenhez, ao final da estação de monta para G-IATF, G-IA e G-NãoIA foram, respectivamente, 80,0%, 85,7%, 1 Acadêmico do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA Bolsista PROICT/ULBRA 2 Acadêmica do Curso de Medicina Veterinária/ULBRA 3 Estatístico, Professor Assistente do Departamento de Estatística Da PUCRS 4 Médico Veterinário, Pesquisador do CNPq. Faculdade de Medicina Veterinária da UFRGS 5 Professor Orientador do Curso de Medicina Veterinária/ ULBRA (carlosgott@cpovo.net) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

12 61,5% (p>0,05), resultando em prenhez geral de 76,9%. O resultado de prenhez a inseminação do G-IA foi influenciado pelo menor número de animais inseminados. palavras-chave: novilhas, inseminação artificial, taxa de prenhez. ABSTRACT The objective of this trial was to evaluate the conception rates and pregnancy rates of 104 heifers bred at 24 months. Two groups were formed, group FTAI (G-FTAI) with 50 heifers and group AI (G-AI) with 54 heifers. Of the 54 animals of the G-AI, 28 was inseminated, leaving 26 who formed the group G-NotAI. The conception rate to G-FTAI and G-AI to AI(FT) was respectively 38.0% and 39.3% (p>0.05), while the pregnancy rate to AI(FT) was respectively 38.0% and 20.4% (p<0.05). Pregnancy rates at the end of the breeding season for G-FTAI, G-AI and G-NotAI were respectively 80.0%, 85.7%, 61.5% (p>0.05), resulting final pregnancy rate in 76.9%. The result of pregnancy rate to the G-AI was influenced by the smaller number of animals inseminated. Keywords: heifers, artificial insemination, pregnancy rate. INTRODUÇÃO Sistemas de produção de cria de bovinos de corte podem ser avaliados através de indicadores reprodutivos, tais como taxas de prenhez e natalidade (QUADROS; LOBATO, 2004). Contudo, para a obtenção de resultados reprodutivos satisfatórios é necessária a associação de fatores envolvendo manejo, sanidade, nutrição e genética (VALLE; ANDREOTTI; THIAGO, 1998). Segundo Faria (1999), a técnica da inseminação artificial pode contribuir para o aumento de eficiência produtiva dos rebanhos de gado de corte, pois possibilita incremento do mérito genético do rebanho através do uso de sêmen de touros comprovadamente superiores. O controle de doenças e a padronização dos animais também são vantagens atribuídas à utilização da inseminação artificial (IA) (PAIVA, 2007). Entretanto, a técnica de inseminação artificial apresenta algumas limitações, como a necessidade da observação do cio. Ausência de manifestação de estro ou deficiências na detecção do estro prejudicam a eficiência reprodutiva e o uso da IA, desta forma, o número de fêmeas inseminadas não representa o número total de fêmeas concentradas no rebanho para a prática da IA (SILVA, 2005). A inseminação artificial a tempo fixo (IATF) tem como objetivo suprimir a necessidade de visualização do estro, além de concentrar a utilização da mão-de-obra em um período pré-determinado. (VALLE; ANDREOTTI; THIAGO,1998). Conforme Gregory e Rocha (2004), a sincronização e a indução de estro na primeira estação reprodutiva melhoram o desempenho de novilhas, pois antecipa a primeira estação de monta e proporciona a concentração de concepções. Além disso, a utilização 12 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

13 da IATF permite a indução de estro e da ovulação em novilhas que não atingiram a puberdade. A falha na observação de estro e a puberdade tardia em novilhas afetam diretamente as taxas de concepção e prenhez. (COSTA et al., 2008). Objetivou-se neste experimento avaliar a eficiência reprodutiva, expressa pelas taxas de concepção e prenhez, em novilhas acasaladas aos 24 meses de idade. MATERIAL E MÉTODOS O trabalho foi realizado na cidade de Lavras do Sul/RS entre 10/12/2008 e 02/05/2009. Foram avaliadas 104 novilhas, base racial Hereford e Braford, acasaladas aos 24 meses de idade. O experimento iniciou com a inseminação artificial convencional (IA) de um único lote de animais (104 novilhas). No segundo dia de IA formaram-se aleatoriamente dois grupos, G-IA e GIATF. O grupo G-IA constituiu-se de 54 novilhas e o grupo G-IATF de 50 novilhas. Dos 50 animais do G-IATF inseminou-se 50 e dos 54 animais do G-IA inseminou-se 28, sobrando 26 que formaram o grupo G-NãoIA. Estes animais foram discriminados para relacionarmos a taxa de concepção e a taxa de prenhez a IA(TF) entre as técnicas de IA e IATF. O protocolo utilizado para o G-IA foi o 7+5, onde nos primeiros 7 dias foram observados os estros e realizada a inseminação 12 horas após a visualização do mesmo, no 7 dia foi aplicado 0,375 mg de cloprostenol sódico pela via intramuscular (IM) nas novilhas não inseminadas, prosseguindo a inseminação por mais 5 dias. O protocolo do G-IATF partiu do dia 0 com a colocação do dispositivo intravaginal, indicado para novilhas, impregnado com 0,558 g de progesterona e a aplicação de 2 mg de benzoato de estradiol (BE) (IM). No dia 6,5 os animais receberam 0,375 mg de cloprostenol sódico (IM). No dia 8 foram retirados os dispositivos intravaginais. No dia 9 foi aplicado 1 mg de BE (IM) e no dia 10 a tarde foi realizada a IATF. Sete dias após o término da IATF unificouse os grupos realizando-se o repasse por 45 dias com touros na proporção de 2,88%. Para fins de cálculos convencionou-se como taxa de concepção o número de novilhas que emprenharam dividido pelo número de novilhas inseminadas, multiplicado por cem. Enquanto a taxa de prenhez a IA(TF) foi calculada através da divisão do número de novilhas inseminadas sobre o número total de novilhas do grupo, multiplicado por cem. A taxa de prenhez final foi calculada através da divisão do número total de novilhas prenhes pelo total de animais do grupo, multiplicado por cem. A taxa de concepção, taxa de prenhez a IA e IATF e a taxa de prenhez final foram testadas pelo método estatístico do Qui-quadrado entre os distintos grupos, com nível de significância de 5%. RESULTADOS E DISCUSSÃO A taxa de concepção do G-IA e G-IATF, foi respectivamente, 39,3% e 38,0% (p>0,05), enquanto a taxa de prenhez a IA(TF), foi respectivamente de 20,4% e 38,0% (p<0,05) (Tabela 1). Esta diferença entre a taxa de concepção e a taxa de prenhez a IA(TF) no G-IA deve-se ao fato de que nem todas as novilhas foram inseminadas, pois de 54 novilhas que formaram o G-IA, 26 (48,15%) estavam acíclicas e/ou o estro não foi identificado. Entretanto, no caso do G-IATF, todas as novilhas foram inseminadas ao mesmo tempo, não havendo diferenças na taxa de concepção e taxa de prenhez a IA(TF) para este grupo. Esses resultados confirmam afirmações de Gottschall et al (2008) que destaca como beneficio da IATF a inseminação de maior número de animais. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

14 Gonzales, Fuquay e Bearden (1985) mostraram que novilhas leiteiras inseminadas no sistema a.m./p.m. obtiveram 62,9% de prenhez. Xu, Burton e Macmillan (1997) demonstraram em vacas leiteiras no pós-parto submetidas a sincronização de estro 61,1% de concepção. Pursley et al. (1997) verificaram 74,4% de prenhez em novilhas inseminadas no turno subseqüente ao do estro observado. López-Gatius (2000) obteve 44,8% de prenhez em um protocolo de inseminação convencional. Donavan, Bennett e Frederick (2003) observaram 47,1% de concepção em novilhas leiteiras. Os distintos resultados da literatura em comparação as taxas de concepção e prenhez a IA(TF) do G-IA pode ser explicada pela não sincronização precisa do ciclo estral quando empregado um protocolo que usa apenas da administração de PGF2α (PURSLEY et al., 1997). Segundo Gottschall et al. (2008), a falta de resposta aos tratamentos de sincronização de estros utilizando a PGF2α está relacionada à ciclicidade do rebanho (presença de corpo lúteo). O dia do ciclo estral também influencia na resposta à administração da PGF2α, relacionando o grau de maturidade do corpo lúteo e do folículo dominante (XU; BURTON; MACMILLAN 1997; BORGES, 2007). Tabela 1 Taxa de concepção e prenhez de novilhas submetidas a IA e IATF. Concepção Prenhez Tratamento N % N % IA 28 39,3 a 54 20,4 b IATF 50 38,0 a 50 38,0 a Geral 78 38, ,8 a, b - Proporções na mesma coluna seguidas de letras distintas, diferem estatisticamente pelo teste do Qui-quadrado (P<0,05); Em relação a IATF em novilhas, outros experimentos demonstram resultados variáveis em comparação aos encontrados no presente trabalho (CALLEJAS et al. 2007a; CUTAIA, 2007b; PINCINATO et al. 2007). Pincinato et al. (2007), citado por Cutaia (2007a), obervaram 54,7% de prenhez em novilhas submetidas a IATF utilizando um implante com 0,5 g de progesterona. Cutaia et al. (2007b), citado por Cutaia (2007a), obtiveram 48,3% de prenhez em um protocolo de IATF semelhante ao usado neste experimento. Callejas et al. (2007a) verificaram em novilhas Braford 49,3% de prenhez a IATF com o uso de implantes com 0,558 g de progesterona. Chaves, Chayer e Callejas (2007) obtiveram 55,0% de prenhez em novilhas de corte submetidas a IATF. Callejas et al. (2007b) observaram em novilhas leiteiras 63,0% e 73,1% de prenhez a IATF, respectivamente para 7 e 8 dias de uso do implante com meia grama de progesterona. Em contrapartida, Pegorer, Ereno e Barros (2007) observaram 30,7% de prenhez a IATF em novilhas de corte tratadas com implante de 0,558 g de progesterona. Diversos estudos comprovam que a exigência de progesterona sérica em novilhas é menor do que em animais adultos, sendo assim, implantes com menor dosagem de progesterona são indicados para essa categoria. Segundo Dias et al. (2007), novilhas tratadas com implantes (1,9 g de P4) de 3º uso apresentaram menor concentração sérica de progesterona e maior folículo dominante do que novilhas tratadas com o implante de 1º uso. Corroborando, Burke, Macmillan e Bolland (1996), demonstraram que alta concentração sérica de progesterona prejudica a pulsatilidade de LH, refletindo sobre o desenvolvimento folicular. Conforme Dias et al. (2007), a taxa de concepção das novilhas efetivamente sincronizadas com implantes de 1º, 2º e 3º uso, foram respectivamente, 37,2%, 37,8% e 53,2%. Estes resultados denotam e ratificam a proposição de Burke, Macmillan e Bolland (2006), de que altos níveis de progesterona em novilhas refletiram negativamente sobre a resposta reprodutiva. Com resultados semelhantes aos anteriores, Rodrigues et al. (2009) não verificaram diferenças entre a taxa de prenhez de novilhas tratadas com implante de 14 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

15 1,9 g de progesterona de 3º uso e 0,558 g de progesterona, respectivamente, 39,7% e 37,5%. Pincinato et al (2006) relataram que novilhas tratadas com implante de 0,5 g de progesterona obtiveram 48,3% de prenhez a IATF. Sugerindo que há benefícios na relação entre baixos níveis plasmáticos de progesterona, crescimento folicular e prenhez de fêmeas bovinas (PERES, 2008; PFEIFER et al. 2009). Tabela 2 Taxa de prenhez, ao final da EA, de novilhas submetidas a IA e IATF. Tratamento N Prenhes % IATF ,0 a IA Normal ,7 a Não IA ,5 a Geral ,9 a Proporções na mesma coluna seguidas de letras iguais, não diferem estatisticamente pelo teste do Qui-quadrado (p>0,05). Na Tabela 2 estão expostas as taxas de prenhez ao final da estação de acasalamento para G-IATF, G-IA e G-NãoIA, estas foram respectivamente, 80,0%, 85,7%, 61,5% (p>0,05), resultando em prenhez geral de 76,9%. Azeredo et al. (2007) observaram ao final da estação de acasalamento 91,7% de prenhez em novilhas submetidas a IA por 45 dias e repasse com touros por 23 dias. Gottschall (1999) observou ao final da estação de acasalamento 90,5% de prenhez em novilhas submetidas a IA e repasse com touros numa estação de acasalamento de 61 dias. Gottschall (1999) relata ainda que novilhas não inseminadas obtiveram 68,9% de prenhez somente com o repasse de touros, embora superior esse resultado pode ser considerado semelhante ao do presente experimento. A superioridade das taxas de prenhez apresentados por novilhas inseminadas em relação à novilhas não inseminadas, provém da ciclicidade desses animais no início da estação de acasalamento, resultando em maior fertidade e maior probabilidade de conceberem no início da estação (GOTTSCHALL, 1999). Baruselli et al. (2002) verificaram num período de acasalamento de 90 dias 79,0% de prenhez. Madureira et al. (2005) relataram que durante uma estação de monta de 45 e 90 dias, respectivamente, 75,3% e 92,7% de ventres tornaram-se prenhes. A sincronização do estro e ovulação em decorrência da manipulação hormonal promove uma maior taxa de retorno e concentração de estros, permitindo que haja acréscimo na prenhez final (PEREZ et al. 2003). Entretanto, o planejamento e manejo racional dos touros é indispensável para que não ocorra redução na eficiência reprodutiva no sistema de inseminação artificial (GOTTSCHALL et al. 2008). CONCLUSÃO Conclui-se que as taxas de concepção foram similares para os grupos G-IATF e G-IA. As taxas de prenhez à inseminação artificial foram superiores para o G-IATF, pois o resultado do G-IA foi influenciado pelo menor número de animais inseminados. Não houve diferença entre a prenhez ao final da estação de acasalamento entre as novilhas inseminadas e não inseminadas. REFERÊNCIAS AZEREDO, D.M. et al. Efeito da sincronização e da indução de estros em novilhas sobre a prenhez e o índice de repetição de crias na segunda estação reprodutiva. ciência Rural, v. 37, n. 1, p , BARUSELLI, P.S. et al. Efeito de diferentes protocolos de inseminação artificial em tempo fixo na eficiência reprodutiva de vacas de corte Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

16 lactantes. Revista Brasileira de Reprodução Animal, v. 26, n. 3, p , BORGES. J.B.S. Tópicos de manejo reprodutivo em rebanhos de corte. In: CICLO DE PALESTRAS EM PRODUçãO E MANEJO DE BOVINOS, 12, 2007, Canoas. Anais... Canoas: Ed. ULBRA, BURKE, C.R. et al. Some effects of prematurely elevated concentrations of progesterone on luteal and follicular characteristics during the oestrous cycle in heifers. Anim. Repr. Sci., v. 35, p , BURKE, C.R.; MACMILLAN, K.L.; BO- LAND, M.P. Oestradiol potentiates a prolonged progesterone-induced suppression of LH release in ovariectomised cows. Anim. Repr. Sci., v. 45, p , CALLEJAS, S. et al. Efecto de la permanencia (7 u 8 días) de un dispositivo intravaginal con 0,558 g de progesterona sobre el porcentaje de preñez a la IATF, retorno y final em vaquillonas Holando Argentino. In: SIMPOSIO INTERNACIONAL DE REPRODUCCION ANIMAL, 7, 2007, Córdoba. Anais Córdoba, 2007a. p.227. CALLEJAS, S. et al. Efecto de administrar media dosis de un agente luteolítico al colocar y retirar um dispositivo intravaginal com progesterona sobre el porcentaje de preñez a La IATF em vaquillonas Braford. In: SIMPOSIO INTERNACIONAL DE REPRODUCCION ANIMAL, 7, 2007, Córdoba. Anais Córdoba, 2007b. p.229. CHAVES, S.G.; CHAYER, R.; CALLEJAS, S. Efecto de administrar media dosis de un agente luteolítico al momento de colocar y retirar um dispositivo intravaginal com 0,5 g de progesterona sobre el porcentaje de preñez a la IATF em vaquillonas para cria. In: SIMPOSIO INTERNACIO- NAL DE REPRODUCCION ANIMAL, 7, 2007, Córdoba. Anais Córdoba, COSTA, N.L. et al. Sincronização do estro em novilhas girolandas: Comparação entre os protocolos CIDR-B e OVSYNCH. Rev. ciênc. Agron., Fortaleza, v. 39, n. 1, p , jan./ mar CUTAIA, L.E. et al. Programas de sincronizacion de celos en vaquillonas de carne: puntos críticos a tener en cuenta. In: SIMPOSIO INTERNACIONAL DE REPRODUCCION ANIMAL, 7, 2007, Córdoba. Anais Córdoba, 2007a p CUTAIA. L. et al. Effect of time of prostaglandin F2α administration on pregnancy rates in Bos inducus cross-bread heifers treated with progesterone vaginal devices and inseminated al a fixed time. In: JUENGEL, J. L.; MURRAY, J. F.; SMITH, M. F. (Eds.). Reproduction in Domestic Ruminants. [S.l.]: Nottingham University, 2007b. (Nottingham University Press; 519). DIAS, C.C. et al. Avaliação da influência da concentração de progesterona e de estratégias para aumentar a prenhez em protocolo de IATF em novilhas Nelore ciclando. Acta Scientiae Veterinariae, v. 35, p. 947, Supl. 3, DONAVAN, G.A.; BENNETT, F.L.; FREDER- ICK, S.S. Factors associated with first service conception in artificially inseminated nulliparous Holstein heifers. theriofenology, v. 60, p , FARIA, N.R. Programa de inseminação artificial em grande escala em bovinos de corte/ Produção de novilho precoce e super precoce. 16 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

17 In: SIMPÓSIO DE PRODUçãO DE GADO DE CORTE, 1, 1999, Viçosa. Anais Viçosa, p GONZALEZ, L.V.; FUQUAY, J.W.; BEARDEN, H.J. Insemination management for a one-injection prostaglandin F 2 α synchronization regimen. I. One daily insemination period versus use of the a.m./p.m. rule. theriogenology, v. 24, p , GOTTSCHALL, C.S. Desempenho reprodutivo de novilhas submetidas a um programa de sincronização de cios e avaliação do trato reprodutivo. Arq. Fac. Vet. UFRGS, v. 27, n. 1, p , GOTTSCHALL, C.S. et al. Aspectos relacionados à sincronização do estro e ovulação em bovinos de corte. A Hora Veterinária, n.164, p , GREGORY, R.M.; ROCHA, D.C. Protocolos de sincronização e indução de estros em vacas de corte no RS. In: SIMPÓSIO INTERNACIO- NAL DE REPRODUçãO ANIMAL APLI- CADA, 1, 2004, Londrina. Anais... Londrina: [s.n.], LÓPEZ-GATIUS, F. Short synchronization system for estrus cycles in dairy heifers: A preliminary report. theriogenology, v. 54, p , MADUREIRA, E.H. et al. Inseminação artificial em tempo fixo (IATF) possui custo benefício favorável? Acta Scientiae Veterinariae, v. 33, p , Supl. 1, PAIVA, T.A. Manejo Reprodutivo de fêmeas de corte: Inseminação artificial Monografia (Especialização em Produção e Reprodução em Bovinos) - Universidade Castelo Branco, São Paulo, PEGORER, M.F.; ERENO, R.L.; BARROS, C.M. Taxas de ovulação e prenhez em novilhas da raça Nelore, após utilização de protocolos para inseminação artificial em tempo fixo (IATF), com diferentes concentrações de progesterona. Acta Scientiae Veterinariae, v. 35, p. 1311, Supl. 3, PEREZ, G.C. et al. Avaliação de protocolos de inseminação artificial em tempo fixo utilizando MGA em vacas Nelore paridas. Rev Bras Reprod Anim, v. 27, p , PERES, R.F.G. efeito da concentração pré e pós-ovulatória de progesterona em protocolos de IAtF em fêmeas Nelore f. Dissertação (Mestrado em Zootecnia) Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, PFEIFER, L.F.M. et al. Effects of low versus physiologic plasma progesterone concentrations on ovarian follicular development and fertility in beef cattle. theriogenology, v. 72, n. 9, p , PINCINATO, D. et al. Efecto del contenido de progesterona del dispositivo intravaginal bovino DIB sobre las tasas de preñez obtenidas em vaquillonas cruza Bos indicus inseminadas a tiempo fijo. In: CONGRESO MUNDIAL DE REPRODUCCIÓN EN RUMIANTES, 2006, Nova Zelândia. Anais... Nova Zelândia, PINCINATO, D. et al. Effect of progesterone content in a vaginal insert n pregnancy rates in Bos indicus cross-bread beef heifers inseminated al a fixed time.. In: JUENGEL, J. L.; MURRAY, J. F.; SMITH, M. F. (Eds.). Reproduction in Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

18 Domestic Ruminants. [S.l.]: Nottingham University, 2007b. (Nottingham University Press; 518). PURSLEY, J.R. et al. Pregnancy rates per artificial insemination for cows and heifers inseminated at a synchronized ovulation or synchronized estrus. J. Dairy Sci., v. 80, p , QUADROS, S.A.F.; LOBATO, J.F.P. Bioestimulação e comportamento reprodutivo da novilha de corte. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 33, p , RODRIGUES, L.A. et al. Efeito do implante de progesterona (CIDR e CRONIPRESS MONO- DOSE) e da avaliação prévia com ultrasonografia na taxa de prenhez de novilhas Nelore (Bos taurus indicus) submetidas a IATF. In: REUNIãO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 46, 2009, Maringá, PR. Anais... Maringá, PR: [s.n.], SILVA, A.S. Avaliação da eficiência econômica da inseminação em tempo fixo e da inseminação convencional de fêmeas bovinas pluríparas de corte Dissertação (Mestrado em Veterinária) - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, VALLE, E.R.; ANDREOTTI, R.; THIAGO, L.R.L.S. estratégias para aumento da eficiência reprodutiva e produtiva em bovinos de corte. Campo Grande: EMBRAPA-CNPGC, XU, Z.Z.; BURTON, L.J.; MACMILLAN, K. L. Reproductive performance of lactating dairy cows following estrus synchronization regimens with PGF2α and progesterone. theriogenology, v. 47, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

19 Ciências Biológicas

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21 Avaliação do efeito genotóxico do aripiprazol em camundongos Ta í s Ma d e lo n Fr e i Ta s 1 Fr a n c i e l e Brandelli ce l s o 2 TaT i a n a gr a s i e l a d a silva 2 PaTrícia Pe r e i r a 3 Ja q u e l i n e na s c i M e n T o Pi c a d a 3 RESUMO Aripiprazol é um fármaco antipsicótico utilizado no tratamento da esquizofrenia. Neste trabalho, foi analisado o potencial genotóxico da administração aguda do fármaco em camundongos CF-1. Os animais receberam injeções intra-peritoniais de aripiprazol nas doses de 1, 3, 10 mg/kg. Amostras de sangue periférico foram coletadas 3 e 24 h após a administração das doses e tecido cerebral ao final do experimento (24 h), para a realização do ensaio cometa. Amostras de medula óssea foram coletadas para o teste de micronúcleos. Os resultados mostraram que o fármaco não apresentou efeitos genotóxicos e mutagênicos. palavras-chave: aripiprazol, ensaio cometa, genotoxicidade, teste de micronúcleos. ABSTRACT Aripiprazole is an antipsychotic drug useful in schizophrenia treatment. This study evaluated its genotoxic effects after acute treatment in CF-1 mice. Animals were given one intraperitoneal injection of aripiprazole (1, 1 Acadêmica do Curso de Biomedicina/ULBRA Bolsistas BIC/ FAPERGS 2 Acadêmica do Curso de Biomedicina/ULBRA 3 Professora - Orientadora do Curso de Farmácia e Biomedicina e do Programa de Pós-Graduação em Genética e Toxicologia Aplicada (jnpicada@cpovo.net) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

22 3 or 10 mg/kg). Peripheral blood samples were collected 3 h and 24 h after the administration and brain tissue at the end of the experimental procedure (24 h) to perform the comet assay. Samples of bone marrow were collected to perform the micronucleus test. The results showed that this drug was not able to induce genotoxic or mutagenic effects. Keywords: aripiprazole, comet assay, genotoxicity, micronucleus test. INTRODUÇÃO Aripiprazol (7-(4-(2,3-diclorofenil)-1-piperazinil]- butoxi-3,4-dihidro -2(1H)-quinolinona) (Figura 1) é um fármaco de última geração, aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA), em novembro de 2002, para o tratamento da esquizofrenia e outros distúrbios (ABILIFY, 2008). Sendo classificado como antipsicótico atípico, aripiprazol difere dos antipsicóticos convencionais ou típicos, em termos de efeitos sobre os sintomas positivos e negativos da esquizofrenia, sobre a cognição e perfil dos efeitos adversos (MEZA, et al., 2005; NAGAI et al. 2009). Figura 1 - Estrutura química do aripiprazol (ABILIFY, 2008). O mecanismo de ação deste fármaco dá-se, principalmente, através de agonismo parcial de receptores D2 de dopamina, regulando sua atividade, proporcionando agonismo em casos de hipoatividade dopaminérgica e antagonismo em situação de hiperatividade da mesma. Em relação ao sistema serotoninérgico, o fármaco atua como antagonista em receptores 5-HT 2A e agonista parcial nos receptores 5-HT 1A (MARDER et al., 2003; TRAVIS et al., 2005; KESSLER et al., 2007). O fármaco é bem absorvido, atingindo o pico de concentração plasmática (t max ) em 3 a 5 horas após administração, por via oral (WINANS, 2003). Os valores de C max, obtidos em estudos de pacientes submetidos a tratamento durante 14 dias, com dose diária crescente de 5 a 30 mg, foram de 77 a 302 µg/l, respectivamente (WINANS, 2003). É amplamente distribuído, apresentando um volume de distribuição (Vd) em torno de 4,9 L/kg. Nas concentrações terapêuticas, sua ligação a proteínas séricas é maior que 99%, principalmente em relação à albumina (LIE- BERMAN, 2003). Aripiprazol é metabolizado pelo fígado, por três rotas principais de biotransformação: desidrogenação, hidroxilação e N-desalquilação, sendo que as duas primeiras ocorrem através dos complexos enzimáticos CYP3A4 e CYP2D6, e a terceira apenas por CYP3A4 (URICHUK et al., 2008; WAADE et al., 2009). Estudos atuais demonstram que aripiprazol é bem tolerado durante o tratamento agudo e de manutenção da esquizofrenia. Sua segurança foi comprovada em ensaios-controles demonstrando mínimo potencial de aumento de peso, nenhum efeito sobre o aumento da prolactina, potencial mínimo de sedação, nenhum risco de desenvolver diabetes mellitus, e os efeitos secundários mais freqüentes, porém moderadamente transitórios, foram cefaléia, insônia, náuseas, vômitos e acatisia (CARSON et al., 2002; KASPER et al., 2003; PI- GOTT et al., 2003; POTKIN et al., 2003; TRAVIS et al., 2005). Os estudos de genotoxicidade representam um papel importante no desenvolvimento de novos 22 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

23 fármacos, devendo ser realizados nos estágios iniciais desse desenvolvimento a fim de prognosticar uma potencial atividade genotóxica e/ou carcinogênica e para auxiliar na obtenção de novas estruturas químicas menos tóxicas (FRÖHNER, 2003). Os testes de genotoxicidade detectam efeitos de substâncias tóxicas para o genoma. Nas ultimas décadas, inúmeros testes vem sendo rotineiramente utilizados para a determinação do espectro genotóxico de compostos químicos e medicamentos (DHAWAN et al., 2009) O ensaio cometa vem sendo proposto para avaliar genotoxicidade em diversos tecidos e/ou tipos de células. Os danos mais facilmente mensuráveis por este ensaio são quebras no DNA (simples e duplas), danos álcali-lábeis, ligações cruzadas e quebras resultantes de reparo por excisões não concluídas (TICE et al., 2000; HARTMAN et al., 2003). O teste de micronúcleos é um dos ensaios mais recomendados e aceitos internacionalmente para avaliação de mutagenicidade (GARCÍA et al, 2004). Este teste pode sugerir a presença de fragmentos cromossômicos ou de cromossomos inteiros que não se integraram ao conjunto de cromossomos de uma célula, formando deste modo, um pequeno núcleo em separado chamado de micronúcleo (MN). A observação de MN no interior das células é utilizada para a detecção de agentes clastogênicos (que quebram cromossomos) e agentes aneugênicos (que induzem aneuploidia ou segregação cromossômica anormal). Esses agentes aumentam a freqüência de micronúcleos (MN) em eritrócitos policromáticos (EPC) na medula óssea de roedores tratados (HAYASHI et al., 1994; SALAMONE et al., 1994). A citotoxicidade também pode ser avaliada neste teste, através da medida da proporção entre eritrócitos jovens e maduros. Apesar dos trabalhos já realizados endossarem a questão da eficácia do aripiprazol no tratamento da esquizofrenia, percebeu-se a necessidade de investigar sua habilidade de induzir mutações e toxicidade ao genoma. Brambilla et al. (2009) compilaram os resultados do testes de genotoxicidade e carcinogênese de antipsicóticos e antidepressivos. Aripiprazol foi um dos fármacos que apresentou resultado positivo para ambos os testes. O mesmo estudo apresenta resultados negativos para testes de detecção de lesões no DNA (in vivo e in vivo), sem especificação dos alvos teciduais e o método utilizado para avaliação; e resultados positivos para o teste de micronúcleos realizado em camundongos. Face ao exposto, o presente estudo tem como objetivo avaliar os efeitos genotóxicos do aripiprazol em tecido cerebral e sangue periférico pelo ensaio cometa, bem como seus possíveis efeitos mutagênicos pelo teste de micronúcleos, após tratamento agudo do fármaco em camundongos. MATERIAL E MÉTODOS Animais Foram utilizados 27 camundongos CF-1 machos, com 2 meses de idade, peso entre 25-30g, provenientes do biotério da ULBRA, mantidos a temperatura constante, ciclo claro/escuro de 12/12h, tratados com água e alimento à vontade. Grupos experimentais Aripiprazol foi extraído e purificado de Abilify (Bristol), suspenso em água contendo 5% tween. Os animais receberam injeções intra-peritoniais de aripiprazol nas doses de 1, 3 ou 10 mg/kg, salina (solução NaCl 0,9%), veículo (tween 5%) ou ciclofosfamida (controle positivo). Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

24 Amostras Foram coletadas amostras de sangue total da cauda dos animais 3h, e ao final do período experimental (24h), através de uma pequena incisão na veia caudal, e colocado em tubos tipo Eppendorf contendo heparina (12µL para 50 µl de sangue total) para avaliação da atividade genotóxica pelo teste cometa, além de amostras de cérebro, que também foram coletadas ao final do período experimental e colocados em 500 µl de PBS (salina tamponada, ph 7,4). Para análise da freqüência de micronúcleos, utilizaram-se amostras de medula óssea dos animais, a partir dos fêmures, ao final do período experimental. Ensaio Cometa Para o estudo do potencial genotóxico do aripiprazol em tecido cerebral e sangue periférico de camundongos, foi utilizada a versão alcalina do ensaio cometa, descrito em Tice et al. (2000). O ensaio consiste basicamente em: 1) preparação das lâminas com células em gel agarose; 2) lise das células para a liberação do DNA; 3) exposição por 20 minutos ao tampão alcalino (ph > 13) para obter fitas simples de DNA; 4) eletroforese nas seguintes condições: 300 ma e 25 V (0,90 V/cm) por 15 minutos em ph alcalino; 5) neutralização em tampão ph 7,5; 6) coloração das lâminas com solução de prata; 7) visualização e contagem dos cometas com auxilio de um microscópio óptico (TICE et al.; 2000). Os resultados foram expressos em índice de danos (ID) e freqüência de danos (FD). O ID foi obtido pela avaliação visual das classes de dano (de 0 4), extraindo-se um índice que expressou o dano geral sofrido por uma população de células. Os núcleos intactos apareceram redondos (classe 0 sem dano), já as células lesadas foram classificadas entre classes um (dano mínimo) a quatro (dano máximo). A FD foi calculada baseada no número de células com cauda versus aquelas sem cauda (RODRIGUES et al., 2009). Teste de micronúcleos O teste de micronúcleos em medula óssea de camundongos foi utilizado para a avaliação da atividade mutagênica do fármaco em estudo, no qual foram analisados eritrócitos policromáticos (EPC), procurando avaliar a freqüência de micronúcleos (MNEPC). A citotoxicidade do composto testado também foi avaliada através da razão entre o número de EPC e o número de eritrócitos normocromáticos (ENC) em mil eritrócitos por animal (PICADA et al., 1997). Foi utilizado procedimento padrão, descrito em Mavournin et al (1990). As amostras de medula óssea foram coletadas de ambos os fêmures. A medula óssea foi extraída e misturada a uma gota de soro fetal bovino previamente colocado sobre uma das extremidades de uma lâmina de microscopia identificada, obtendo-se uma suspensão de células. Em seguida, foi realizado esfregaço da suspensão celular sobre a lâmina. A coloração foi feita com o corante de Giemsa (Merck) em tampão fosfato 0,2 M, ph 5,8 (proporção de 1:9). Para contagem dos eritrócitos normocromáticos (ENC), eritrócitos policromáticos (EPC) e micronúcleos nos EPC (MNEPC) foi utilizado microscópio ótico com objetiva de imersão (RODRIGUES et al., 2009). 24 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

25 Análise Estatística Todos os dados obtidos foram submetidos a cálculos estatísticos comparando o resultado dos animais tratados com as diferentes concentrações do aripiprazol e animais dos grupos veículo e salina (controles negativos). Aos resultados obtidos foram empregados tratamentos estatísticos ANOVA (Analysis of Variance), seguido pelo teste de Tukey, para estudo das diferenças entre doses e comparações entre os grupos. Foram considerados significantes os valores de P< 0,05. RESULTADOS A Tabela 1 mostra os efeitos das três doses de aripiprazol sobre a migração do DNA em tecido sanguíneo, coletado 3h e 24h, e cerebral, coletado 24h, após a administração do fármaco. No sangue periférico coletado 3 h e 24 h, aripiprazol não aumentou ID nem FD em nenhuma das doses testadas, quando comparado ao grupo controle veículo, sugerindo que não acarretou aumento significativo de danos ao DNA neste tecido. Em relação ao tecido cerebral, apesar dos resultados indicarem aumento do ID e FD em comparação ao controle veículo, os mesmos não foram estatisticamente significativos. Tabela 1 - Ensaio cometa em amostras de tecidos sanguíneo e cerebral de camundongos machos CF-1 coletadas 3 h (sangue) e 24 h (sangue e cérebro) após a administração pela via intraperitoneal de salina (solução NaCl 0,9%), veículo (tween 5%) ou aripiprazol (1, 3 ou 10 mg/kg). Ciclofosfamida (25 mg/kg) foi utilizada como controle positivo. Tecido/coleta Grupo Índice de danos média±dp Freqüência de danos média±dp Salina 9,6±7,1 3,9±2,4 Sangue/3h Veículo 8,5±5,6 3,8±1,2 Aripiprazol 1 mg/kg 7,0±2,8 4,3±1,3 Aripiprazol 3 mg/kg 6,0±5,8 3,1±1,8 Aripiprazol 10 mg/kg 6,1±1,7 3,8±1,5 Salina 9,3±5,6 3,3±1,9 Veículo 10,6±9,5 5,0±4,9 Sangue/24 h Aripiprazol 1 mg/kg 9,5±9,4 4,6±3,9 Aripiprazol 3 mg/kg 15,9±9,2 7,9±4,1 Aripiprazol 10 mg/kg 5,6±4,2 3,5±3,4 Ciclofosfamida 25 mg/kg 62,0±27,6 *** 37,2±22,4 ** Salina 49,8±30,9 19,5±11,7 Veículo 45,5±16,5 25,1±10,4 Cérebro/24 h Aripiprazol 1 mg/kg 59,7±16,4 30,3±8,4 Aripiprazol 3 mg/kg 82,8±30,3 35,8±13,8 Aripiprazol 10 mg/kg 72,8±22,9 33,1±11,3 Ciclofosfamida 25 mg/kg 105,0±40,6 * 55,3±7,2 ** N= 4-5 animais por grupo Índice de dano: de zero (sem dano, 100 células X 0) a 400 (com máximo de dano, 100 células X 4). Freqüência de dano: percentual de células com danos. * P<0,05; ** P<0,01; *** P<0,001: significância estatística em relação ao grupo salina. ANOVA, Teste de Tukey. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

26 Na Tabela 2 são apresentadas as médias de eritrócitos policromáticos micronucleados (MNEPCs) para cada grupo. A tabela mostra também a média da razão entre o número de EPC e ENC em 1000 células analisadas por animal. Aripiprazol não aumentou a freqüência de micronúcleos. Ciclofosfamida, utilizada como controle positivo, acarretou um aumento significativo no número médio de células com micronúcleos (p<0,001). A análise da relação entre os EPC e ENC permite avaliar efeito citotóxico que cause a diminuição do número de mitoses das células eritropoéticas (MAVOURNIN et al., 1990). Não houve diferença estatisticamente significativa dos grupos tratados em relação ao controle veículo, portanto, o fármaco, nas condições testadas, não causou efeito citotóxico para as células da medula óssea dos camundongos. Tabela 2 - Teste de micronúcleos em medula óssea de camundongos CF-1 machos. Amostras da medula óssea de fêmur foram coletadas 24 h após as administrações pela via intraperitoneal de salina (solução NaCl 0,9%), veículo (tween 5%) ou aripiprazol (1, 3 ou 10 mg/kg). Ciclofosfamida (25 mg/kg) foi utilizada como controle positivo. Grupo MNEPC em 2000 EPC média±dp Razão EPC/ENC média±dp Salina 1,14±0,38 2,80±0,86 Veículo 1,20±0,45 2,63±0,75 Aripiprazol 1 mg/kg 1,80±1,79 3,24±0,59 Aripiprazol 3 mg/kg 2,25±1,50 2,45±0,40 Aripiprazol 10 mg/kg 1,40±0,89 1,83±0,79 Ciclofosfamida 25 mg/kg 10,0±5,29*** 1,77±0,48 N= 4-5 animais por grupo MNEPC: micronúcleos em eritrócitos policromáticos EPC: eritrócitos policromáticos ENC: eritrócitos normocromáticos *** P<0,001: significância estatística em relação ao grupo salina. ANOVA, Teste de Tukey. DISCUSSÃO Os dados da Tabela 1 mostram que aripiprazol não aumentou significativamente os danos ao DNA das células sanguíneas, em relação ao grupo controle negativo, coletadas 3 h e 24 h após o tratamento agudo dos animais. Também não se observou diferença estatisticamente significativa de danos ao DNA, comparando-se as três doses do fármaco testadas. A versão alcalina do ensaio cometa utilizada neste trabalho é capaz de detectar quebras em uma ou nas duas fitas do DNA, assim como sítios álcali-lábeis, bem como ligações cruzadas entre DNA-DNA e DNA- proteínas (HARTMANN et al., 2003). O tecido sanguíneo foi analisado em dois intervalos de tempo, com o intuito de avaliar a cinética de danos e o reparo ao DNA, após o tratamento agudo. Porém, não foram observadas diferenças entre os dois tempos de amostragem. No tecido cerebral dos animais tratados com as três doses de aripiprazol, foi observado um pequeno aumento de ID e FD em comparação ao controle veículo, no entanto, o aumento não foi estatisticamente significativo, sugerindo que o fármaco também não foi genotóxico para o tecido cerebral. As células que sofreram danos pelo tratamento com aripiprazol foram de classes 1 e 2 (baixo e médio 26 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

27 níveis de danos). Conforme estudos recentes, o aumento de danos ao DNA observado no tecido cerebral, induzidos por fármacos que agem no SNC, pode ser interpretado como um efeito neurotóxico (PICADA et al., 2003; PEREIRA et al., 2005; 2006; 2009). Os resultados sugerem, portanto, que aripiprazol não foi neurotóxico. Prévios estudos mostraram efeitos benéficos de aripiprazol sobre as funções neuronais. Fármacos antipsicóticos como o aripiprazol aumentaram os níveis de N-acetil-aspartato (NAA), como uma resposta terapêutica comum sobre o aumento da viabilidade neuronal (McLOUGHLIN et al., 2009). Aripiprazol inibiu a liberação de glutamato em terminais nervosos corticais de rato, provavelmente pela sua ação sobre os receptores de dopamina D2 e de serotonina 5-HT 1A. Essas atividades poderiam contribuir para seus possíveis efeitos neuroprotetores (YANG; WANG, 2008). Em células de neuroblastoma humano SH-SY5Y, aripiprazol também apresentou efeitos sugestivos de neuroproteção (PARK et al, 2009). O fármaco foi capaz de diminuir a peroxidação lipídica em córtex cerebral e plasma de ratos, demonstrando efeito protetor contra o estresse oxidativo (EREN et al., 2007; GAMA et al., 2008; MARTINS et al., 2008). Em relação a freqüência de micronúcleos em EPC, os grupos tratados com aripiprazol não mostraram aumento significativo (Tabela 2), sugerindo que o fármaco não apresentou efeito clastogênico e/ou aneugênico, nas condições testadas, ao contrário de outros estudos que indicam atividade mutagênica de aripiprazol pelo teste de micronúcleos (revisado em BRAMBILLA et al., 2009). A Tabela 2 também mostra que os valores da razão EPC:ENC dos grupos tratados foram estatisticamente semelhantes entre si e ao valor obtido pelo grupo controle negativo, indicando que aripiprazol não afetou a multiplicação celular dos eritrócitos da medula óssea e, portanto, não se mostrou citotóxico. CONCLUSÃO O conjunto dos resultados sugere que o fármaco não foi genotóxico e nem mutagênico, após administração aguda em camundongos. Adicionais experimentos deveriam ser realizados para avaliar estas atividades em tratamentos sub-crônico e crônico, uma vez que aripiprazol é utilizado no tratamento da esquizofrenia por longos períodos podendo apresentar efeitos tóxicos cumulativos. AGRADECIMENTOS Este trabalho teve o apoio financeiro da Universidade Luterana do Brasil ULBRA, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul FAPERGS, Brasil. REFERÊNCIAS ABILIFY. Monografia Aripiprazol. Bristol- Mayers Squibb, BRAMBILLA, G.; MATTIOLI, F.; MARTEL- LI, A. Genotoxic and carcinogenic effects of antipsychotics and antidepressants. toxicology, v. 261, p , CARSON, W.H. et al. Meta-analysis of prolactin effects with aripiprazole. the International Journal of Neuropsychopharmacology, v. 5 (Suppl.), S186, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

28 DHAWAN, A.; BAJPAYEE, M.; PARMAR, D. Comet assay: a reliable tool for the assessment of DNA damage in different models. cell Biology and toxicology, v. 25, p. 5-32, EREN, I.; NAZIROGLU, M.; DEMIRDAS, A. Protective Effects of Lamotrigine, Aripiprazole and escitalopram on depression-induced oxidative stress in rat brain. Neurochemical Research, v. 32, p , FRÖHNER, C.R.A. Avaliação da citotoxicidade, da genotoxicidade e da potencial atividade antiviral da violaceína, produzida pela chromobacterium violaceum Dissertação (Mestrado em Farmácia) - Universidade Federal de Santa Catarina, GAMA, C.S. et al. Elevated serum thiobarbituric acid reactive substances in clinically symptomatic schizophrenic males. Neuroscience Letters, v. 433, p , GARCIA, O. et al. Sensitivity and variability of visual scoring in the comet assay. Results of an inter-laboratory scoring exercise with the use of silver staining. Mutation Research, v. 556, p , HARTMANN, A. et al. Recommendations for conducting the in vivo alkaline Comet assay. Mutagenesis, v. 18, p , HAYASHI, M. et al. In vivo rodent erytrocyte micronucleus assay. Mutation Research, v. 312, p , KASPER, S. et al. Efficacy and safety of aripiprazole vs. haloperidol for long-termmaintenance treatment following acute relapse of schizophrenia. the International Journal of Neuropsychopharmacology, v. 6, p , KESSLER, R.M. et al. Aripiprazole: what is the role of dopamine D(2) receptor partial agonism? the American Journal of Psychiatry, v. 164, p , LIEBERMAN, J.A. Aripiprazol e esquizofrenia. São Paulo: Science Press Brasil Latin América, MARDER, S.R. et al. Aripiprazole in the treatment of schizophrenia: safety and tolerability in short-term, placebo-controlled trials. Schizophrenia Research, v. 61, p , MARTINS, M.R. et al. Antipsychotic-induced oxidative stress in rat brain. Neurotoxicity Research, v. 13, p , MAVOURNIN, K.H. et al. The in vivo micronucleus assay in mammalian bone marrow and peripheral blood. A report of the US Environmental Protection Agency Gene-Tox Program. Mutation Research, v. 239, p , McLOUGHLIN, G.A. et al. Analyzing the effects of psychotropic drugs on metabolite profiles in rat brain using 1H NMR spectroscopy. Journal of Proteome Research, v. 8, p , MEZA, E.L.; CHOW, A.R.; BERMUDEZ, J.R. Aripiprazole in Psychosis Associated With Parkinson s Disease. the Journal of Neuropsychiatry and clinical Neurosciences, v. 17, p , NAGAI, T. et al. Aripiprazole ameliorates phencyclidine-induced impairment of recognition memory through dopamine D1 and serotonin 5-HT1A receptors. Psychopharmacology, v. 202, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

29 PARK, S.W. et al. Differential effects of aripiprazole and haloperidol on BDNF-mediated signal changes in SH-SY5Y cells. european Neuropsychopharmacology, v. 19, p , PEREIRA, P. et al. Neurobehavioral and genotoxic aspects of rosmarinic acid. Pharmacological Research, v. 52, p , PEREIRA, P. et al. Neurobehavioral and genotoxic parameters of duloxetine in mice using the inhibitory avoidance task and comet assay as experimental models. Pharmacological Research, v. 59, p , PEREIRA, P. et al. Neuropharmacological analysis of caffeic acid in rats. Basic & clinical Pharmacology & toxicology, v. 99, p , PICADA, J.N. et al. DNA damage in brain cells of mice treated with an oxidized form of apomorphine. Molecular Brain Research, v. 114, p , PICADA, J.N. et al. Genotoxic effects of structurally related beta-carboline alkaloids Mutation Research, v. 379, p , PIGOTT, T.A. et al. Aripiprazole for the prevention of relapse in stabilised patients with chronic schizophrenia: a placebo-controlled 26-week study. the Journal of clinical Psychiatry, v. 64, p , POTKIN, S.G. et al. Aripiprazole, an antipsychotic with a novel mechanism of action, and risperidone vs placebo in patients with schizophrenia and schizoaffective disorder. Archives of General Psychiatry, v. 60, p , RODRIGUES, C.R. et al. Mutagenic and genotoxic effects of Baccharis dracunculifolia (D.C.). Journal of ethnopharmacology, v. 124, p , SALAMONE, M.F. et al. Bone marrow micronucleos assay: a review of the mouse stocks used and their published mean spontaneous micronucleos frequencies. environmental and Molecular Mutagenesis, v. 23, p , TICE, R.R. et al. Single cell gel/comet assay: guidelines for in vitro and in vivo genetic toxicology testing. environmental and Molecular Mutagenesis, v. 35, p , TRAVIS, M.J. et al. Aripiprazole in schizophrenia: consensus guidelines. International Journal of clinical Practice, v. 59, p , URICHUK, L. et al. Metabolism of atypical antipsychotics: involvement of cytochrome P450 enzymes and relevance for drug-drug interactions. current Drug Metabolism, v. 9, p , YANG, T.T.; WANG, S.J. Aripiprazole and its human metabolite OPC14857 reduce, through a presynaptic mechanism, glutamate release in rat prefrontal cortex: possible relevance to neuroprotective interventions in schizophrenia. Synapse, v. 62, p , WAADE, R.B. et al. Influence of comedication on serum concentrations of aripiprazole and dehydroaripiprazole. therapeutic Drug Monitoring, v. 31, p , WINANS, E. Aripiprazole. American journal of Health-system Pharmacy, v. 60, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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31 Herança da tolerância ao frio na fase vegetativa em arroz ca r o l i n e ca B r e i r a 1 re n ata Pe r e i r a d a cr u z 2 RESUMO A temperatura baixa nas fases iniciais de desenvolvimento do arroz é um limitante para o estabelecimento uniforme e rápido da lavoura. Sendo a tolerância ao frio geneticamente herdável, este estudo objetiva determinar a herança da tolerância ao frio na fase vegetativa de desenvolvimento do arroz. Foram utilizados três genótipos da subespécie Japônica e três da subespécie Indica que foram cruzados em um dialelo parcial dando origem a dez populações F 2. Os dados obtidos após exposição das populações a um período de dez dias a 10 C revelaram que nas populações tolerante x sensível estudadas há dois genes independentes e com alelos dominantes segregando para tolerância ao frio. Já nas populações envolvendo os genótipos sensíveis ou com reação intermediária ao frio há um a dois genes complementares com alelos recessivos segregando para esta característica. palavras-chave: temperatura baixa, sobrevivência de plantas, estádio V 4. ABSTRACT The low temperature at early stages of rice development is a limiting factor for the rapid and uniform establishment of crops. As the cold tolerance is genetically inheritable, this study aims to determine the inheritance of cold tolerance during the vegetative stage of rice development. Three genotypes of the three subspecies Japonica and Indica 1 Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas (Bacharelado)/ UNISINOS, Bolsista CNPq. Equipe de Melhoramento Genético, Instituto Rio Grandense do Arroz (IRGA) ccabreira@ pop.com.br 2 Pesquisadora Equipe de Melhoramento Genético, Instituto Rio Grandense do Arroz (IRGA) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

32 subspecies were used, which were crossed in a partial diallel giving rise to ten F2 populations. The data obtained after the exposure of the populations for a period of ten days at 10ºC revealed that there are two independent genes and dominant alleles segregating for cold tolerance in the sensitive x tolerant populations studied. In relation to the genotypes involving populations with sensitive or intermediate reaction to cold there are two additional genes with recessive alleles segregating this trait. Keywords: low temperature, survival of plants, stadium V 4. INTRODUÇÃO O arroz é uma espécie altamente cultivada em diversas regiões do mundo e temperaturas inadequadas para seu desenvolvimento condicionam um dos principais limitantes à expressão do potencial de rendimento dos cultivares no Rio Grande do Sul (RS). Segundo Yoshida (1981), a faixa de temperatura ótima se encontra entre 25ºC e 30ºC e temperaturas inferiores a 20ºC podem ser prejudiciais. As baixas temperaturas podem ocorrer em todas as fases de desenvolvimento da cultura, sendo que os maiores danos ao rendimento de grãos são observados quando o frio ocorre na fase reprodutiva. Além das perdas em rendimento, deve-se considerar também a elevação dos custos de produção como um componente importante deste problema em arroz irrigado, uma vez que com a ocorrência deste estresse os insumos aplicados deixam de ser traduzidos em rendimento de grãos. No RS, a necessidade de tolerância ao frio está principalmente relacionada à origem tropical (Indica) dos genótipos e à localização geográfica (subtropical). Assim, a obtenção de genótipos tolerantes ao frio nas fases de germinação e vegetativa é de extrema importância para que se garantam os benefícios do plantio antecipado, considerado um dos principais fatores para obtenção de altos níveis de rendimento de grãos. O melhoramento genético para tolerância a baixa temperatura é uma forma de minimizar os danos causados por esse estresse. Na fase vegetativa, a tolerância ao frio relacionada à prevenção da clorose em cultivares Japônicas é controlada por um a dois genes maiores (KWAK et al., 1984) e segregação monogênica na geração F 2 também foi relatada (NAGAMINE; NAKAGAHRA, 1991). Em um estudo de detecção de QTLs (Quantitative Trait Loci) para tolerância ao frio na fase vegetativa, um QTL responsável por aproximadamente 40% da variação fenotípica observada foi localizado no cromossomo 12 (ANDAYA; MACKILL, 2003). Os resultados disponíveis parecem apontar, portanto, para uma herança simples da tolerância ao frio, porém foram desenvolvidos com genótipos distintos dos usados nos programas de melhoramento do RS. A análise da tolerância ao frio na fase vegetativa (SRINIVASULU; VERGARA, 1988; KAW, 1991; BERTIN et al., 1996, ROSSO et al., 2007) submete as plantas a estresse, combinando temperaturas que variam de 10 a 20 C por períodos de três até 22 dias. A avaliação da tolerância ocorre através da medição da estatura e índice de emergência, porcentagem de sobrevivência das plântulas (após um período sob temperatura normal) e grau de descoloração foliar. A instabilidade da temperatura é um dos problemas enfrentados para seleção a campo de genótipos tolerantes ao frio e este fator tem contribuído para um avanço lento nas pesquisas. Nesse sentido, o Instituto Rio Grandense do Arroz (IRGA) dispõe de 32 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

33 uma metodologia para avaliar a tolerância ao frio na fase vegetativa (ROSSO et al., 2007) em ambiente controlado. Para maximizar o uso dessa ferramenta, é vital o conhecimento da herança da tolerância ao frio, definindo a melhor estratégia de seleção. O objetivo desse trabalho é verificar a herança da tolerância ao frio na fase vegetativa de desenvolvimento do arroz. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado na Estação Experimental do Arroz no IRGA em Cachoeirinha/ RS. Foram utilizados seis genótipos de arroz, sendo três pertencentes à subespécie Japônica (Alan, Rizabela e L2825CA) e tolerantes ao frio e três pertencentes à subespécie Indica (INIA Olimar, IRGA 424 e IRGA V), sensíveis ou com tolerância intermediária ao frio. Foram avaliadas dez populações resultantes dos cruzamentos entre esses seis genótipos. As sementes F 1, obtidas na safra 2007/08, foram cultivadas no inverno de 2008 em casa-de-vegetação para obtenção das sementes F 2. A instalação do experimento iniciou pela seleção das sementes F 2 e dos genitores A instalação do experimento foi iniciada pela seleção das sementes da geração F 2 e dos dois genitores, utilizando-se somente sementes bem formadas e livres de contaminação aparente por fungos. As mesmas foram distribuídas sobre papel germinador em placas de Petri. Foi preparada uma solução fungicida (Vitavax Thiram 200 SC) na concentração de 50mg/L para umedecimento do papel germinador e a seguir as placas de Petri foram colocadas em câmara BOD à 28ºC durante sete dias. Após, as sementes pré-germinadas foram transplantadas para bandejas contendo solo orgânico. Foram utilizadas três bandejas por população, cada bandeja com 130 plantas F 2 e dez plantas de cada genitor. Os genitores foram incluídos como testemunhas nos experimentos por apresentarem reação conhecida ao frio. Após os transplantes, as bandejas foram mantidas em casa-de-vegetação (28 C) até as plantas atingirem o estádio V 4 da escala de Counce (COUNCE et al., 2000). Neste momento, as bandejas foram transferidas para a sala climatizada e permaneceram dez dias sob estresse de 10ºC. Ao fim deste período, o material foi levado para a casa-de-vegetação e após sete dias de recuperação, foi feita a avaliação da sobrevivência das plantas. Os genitores foram avaliados pela análise de variância da porcentagem de sobrevivência de plantas em um delineamento em blocos casualizados com número variável de repetições. O número de repetições para cada genitor variou devido ao fato de que alguns genitores estavam incluídos em três cruzamentos (o que equivaleu a três repetições) e outros, por exemplo, estavam incluídos em seis (equivalendo a seis repetições) e todas as repetições (cruzamentos) em que apareciam foram incluídas na Anova. A comparação de médias dos genitores foi feita pelo teste dos mínimos quadrados (SAS, 2000). Nas populações F 2 foi feita contagem do número de plantas sobreviventes e não sobreviventes e os dados foram submetidos ao teste de Qui-quadrado para verificar seu ajuste às proporções teóricas esperadas para um e dois genes independentes segregando e dois genes com epistasia. Os valores do Qui-quadrado foram obtidos pela fórmula: χ 2 = Σ [(F o F e ) 2 / F e ], onde: F o = freqüência observada para cada classe; F e = freqüência esperada para cada classe, com base na proporção mendeliana. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

34 RESULTADOS E DISCUSSÃO A avaliação da porcentagem de sobrevivência de plantas dos seis genitores utilizados neste estudo demonstra uma ampla variação, conforme análise Anova (Tabela 1). Obteve-se desde 2,5% de sobrevivência no genitor sensível IRGA 424 até 97,7% no genitor tolerante Rizabela (Tabela 2). Observase que os genitores Rizabela, L2825CA e Alan apresentaram tolerância ao frio, com sobrevivência acima de 70%; a cultivar INIA Olimar apresentou reação intermediária ao frio, com sobrevivência entre 30 e 70% e a cultivar IRGA 424 e a linhagem IRGA V se mostraram sensíveis ao frio com sobrevivência abaixo de 30% (Tabela 2). Tabela 1 - Análise de variância da porcentagem de sobrevivência dos genitores estudados. IRGA, Causas de Variação GL QM Genótipo ,17** Bloco 8 145,97 Erro ,74 Total 40 ** Significativo ao nível de 1% de probabilidade. CV(%)= 19,8% R 2 = 0,94 Os resultados de sobrevivência da geração F 2 revelaram que nos cruzamentos em que há pelo menos um genótipo tolerante houve elevada sobrevivência de plantas (Tabela 3), o que indica claramente uma relação de dominância da tolerância sobre a sensibilidade ao frio nos cruzamentos estudados. Nos cruzamentos envolvendo genótipos intermediários e sensíveis, houve, como esperado, predomínio de plantas mortas, sendo que no cruzamento entre os dois genótipos sensíveis, não houve sobrevivência de plantas (Tabela 3). Os cruzamentos entre os genótipos tolerantes evidenciaram um gene e dois genes dominantes para tolerância ao frio segregando nas populações ALAN x RIZABELA e RIZABELA x L2825CA, respectivamente, enquanto que o cruzamento ALAN x L2825CA não se adequou a nenhuma das proporções testadas (Tabela 3). Tabela 2 - Porcentagem de sobrevivência de plantas dos seis genitores utilizados no estudo da tolerância ao frio na fase vegetativa em arroz. IRGA, Genótipo RIZABELA L2825CA ALAN INIA OLIMAR IRGA V Média 97,7 a 83,3 b 81,8 b 56,6 c 22,2 d Ir IRGA 424 2,5 e Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si pelo teste dos mínimos quadrados (α = 0,05) 34 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

35 Tabela 3 - Número de plantas sobreviventes, não-sobreviventes, total e teste Qui-quadrado para dez populações F 2 de arroz avaliadas para tolerância ao frio na fase vegetativa. (IRGA, 2009) Cruzamento Sobreviventes Número de plantas Qui Quadrado Não sobreviventes Total 3:1 15:1 9:7 ALAN (T) x RIZABELA (T) ,7 306,1** 39,4** ALAN (T) x L2825CA (T) ,1** 11,3** 168,0** RIZABELA (T) x L2825CA (T) ,7** 5,1 249,6** ALAN (T) x IRGA 424 (S) ,4** 2,0 238,2** ALAN (T) x IRGA V (S) ,7** 2,2 241,3** RIZABELA (T) x IRGA V (S) ,8** 5,6 163,6** L2825CA (T) x IRGA V (S) ,0** 2,2 242,1** IRGA 424 (S) x INIA OLIMAR (I) ,3** 4,1 219,0** IRGA V (S) x IRGA 424 (S) ,0** 23,4** 279,6** IRGA V (S) x INIA OLIMAR (I) ,6* 696,8** 1,4 χ 2.01(1) = 6,64 ** Significativo ao nível de 1% de probabilidade, portanto, cruzamentos não enquadrados nas hipóteses testadas. Os cruzamentos envolvendo um genótipo tolerante e um genótipo sensível ao frio apresentaram segregação compatível com a esperada no caso de dois genes independentes com alelos dominantes para tolerância (Tabela 3). O cruzamento entre o genótipo intermediário INIA Olimar e o sensível IRGA 424 evidenciou dois genes independentes com alelos recessivos segregando para tolerância ao frio, enquanto que no cruzamento IRGA V x INIA Olimar, dois genes recessivos complementares explicaram a segregação observada. Apesar da cultivar IRGA 424 e a linhagem IRGA V serem consideradas sensíveis, esta última apresentou porcentagem de sobrevivência em torno de 20%, enquanto que o genótipo IRGA 424 praticamente não apresentou sobrevivência. Os resultados parecem indicar que a cultivar INIA Olimar apresenta dois genes recessivos para a tolerância ao frio que se manifestam no cruzamento com IRGA 424. Já quando cruzada com a linhagem IRGA V parece haver complementaridade de genes, indicando que esta linhagem deve possuir um gene recessivo que interage com os genes de INIA Olimar, aumentando a porcentagem de sobrevivência de plantas (Tabela 3). Este gene não se manifesta quando a linhagem IRGA V é cruzada com a cultivar IRGA 424, que não apresenta nenhum gene de tolerância. A análise de Qui-quadrado realizada mostra que nas populações estudadas há um a dois genes conferindo a tolerância ao frio, caracterizando uma herança qualitativa, conforme já relatado anteriormente (KWAK et al., 1984; NAGAMINE; NAKAGAHRA, 1991). Assim, a seleção para este caráter pode ser realizada em gerações segregantes precoces, como a F 2 ou F 3. Porém, o fato da tolerância ser condicionada por genes dominantes, implica em utilizar populações maiores e teste de progênie para o avanço das gerações e fixação desta característica. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

36 CONCLUSÃO A tolerância ao frio na fase vegetativa em arroz apresenta uma herança simples condicionada por um a dois genes dominantes com segregação independente no caso dos genótipos tolerantes, ou por genes recessivos e complementares no caso dos genótipos com reação intermediária ou de sensibilidade ao frio. AGRADECIMENTOS Ao PIBIC/ CNPq pela concessão de bolsa para desenvolvimento desse trabalho. REFERÊNCIAS ANDAYA, V.C.; MACKILL, D.J. QTLs conferring cold tolerance at the booting stage of rice using recombinant inbred lines from a japonica x indica cross. theoretical and Applied Genetics, v. 106, p , BERTIN, P. et al. Evaluation of chilling sensitivity in different rice varieties. Relationship between screening procedures applied during germination and vegetative growth. euphytica, v. 89, p , COUNCE, P.A.; KEISLING, T.C.; MITCHELL, A.J. A uniform, objetive, and adaptive system for expressing rice development. crop Science, v. 40, p , KAW, R.N. Genetic parameters of cold tolerance in rice. Indian Journal of Genetics, v. 51, p , KWAK, T.S. et al. Inheritance of seedling cold tolerance in rice. Sabrao Journal, v. 16, p , NAGAMINE, T.; NAKAGAHRA, M. Genetic control of chilling injury in rice seedlings detected by low-temperature treatment. In: INTERNATIONAL RICE GENETICS SYM- POSIUM, 2, 1991, Los Baños. Proceedings... Los Baños: International Rice Research Institute, p ROSSO, A.F.de et al. Phenotypic characterization of an indica x japonica irrigated rice (Oryza sativa L.) population for cold tolerance. In: TEMPERATE RICE CONFERENCE, 4, 2007, Novara. Proceedings... Novara, SAS INSTITUTE. System for Information: Versão 8.0. Cary: Statistical Analysis System Institute, SRINIVASULU, K.; VERGARA, B.S. Screening of upland and short duration rice varieties for cold tolerance at seedling emergence stage. Oryza, v. 25, p , YOSHIDA, S. Growth and development of the rice plant. In:. Fundamentals of rice crop science. Los Baños: International Rice Research Institute, cap.1, p Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

37 Morfologia polínica dos gêneros Hebanthe Mart. e Pfaffia Mart. nativos do Rio Grande do Sul Ju l i o ri c a r d o Ba s T o s 1 so r a i a gi r a r d i Ba u e r M a n n 2 Ma r i a sa l e T e Ma r c h i o r e T T o 3 RESUMO A família Amaranthaceae está representada no Rio Grande do Sul por nove gêneros e 40 espécies. Foram estudados os gêneros nativos de Pfaffia e Hebanthe no que diz respeito à morfologia, em microscopia óptica, como forma de contribuir para o conhecimento da diversidade polínica, além de fornecer subsídios para o entendimento da dinâmica paleovegetacional do Estado. A partir de coleta de exsicatas extraiu-se grãos de pólen que foram processados pelo método de acetólise. Para análise das amostras foram utilizados atributos individuais como tamanho, âmbito, forma, número de aberturas, ornamentação e espessura da exina. Os grãos apresentam forma esférica, âmbito circular, fenestrados, pantoporados, reticulados e tamanho pequeno. palavras-chave: Amaranthaceae, morfologia polínica, paleovegetacional. ABSTRACT The family Amaranthaceae is represented in Rio Grande do Sul for nine genus and 40 species. It was studied native genus of Pfaffia and Hebanthe with respect to morphology, in optical microscopy, as a contribution to 1 Acadêmico do Curso de Ciências Biológicas/ULBRA-Bolsista PROICT/ULBRA 2 Professor-Orientador do curso de Ciências Biológicas (soraia. bauermann@ulbra.br) 3 Pesquisadora e Curadora do Herbarium Anchieta, Instituto Anchietano de Pesquisas/UNISINOS Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

38 the knowledge of pollen diversity and provides subsidies for understanding the dynamics paleovegetational of the State. From the collection of herbarium specimens were extracted pollen grains that were processed by acetolysis. For analysis of the samples were used individual attributes such as size, amb, form, number of apertures, ornamentation and exine thickness. The grains have spherical shape, amb circular, fenestrated, pantoporated, reticulate and small size. Keywords: Amaranthaceae, pollen morphology, paleovegetational. INTRODUÇÃO A família Amaranthaceae, no Brasil, compreende 20 gêneros e aproximadamente 100 espécies nativas (SOUZA; LORENZI, 2008). Para o Rio Grande do Sul são citados nove gêneros e 40 espécies (VAS- CONCELLOS, 1986). Seus representantes são predominantemente ervas, subarbustos, arbustos ou trepadeiras e ocorrem nos mais variados ambientes: campos rupestres, cerrados, beira de matas, restingas sendo mais comuns em ambientes abertos (SIQUEI- RA, 2002; SOUZA; LORENZI, 2008). O gênero Pfaffia Mart. é constituído por ervas ou subarbustos eretos ou semiprostrados que ocorrem em cerrados, campos rupestres, campos limpos, orlas de matas, beiras de rios e capoeiras (MARCHIO- RETTO et al., 2009). Hebanthe Mart. é um gênero neotropical com representantes predominantemente em formações florestais, em orla e interior de matas (MARCHIORETTO et al., 2008). Estudos com pólen de Amaranthaceae foram realizados pela primeira vez por Martius em Mais tarde, Erdtman (1952) identificou dois tipos polínicos para a família denominados tipo Amaranthus e tipo Gomphrena. A partir de então vários estudos foram realizados, Livingstone (1972), Livingstone et al., (1973), Townsend (1974, 1978, 1979a 1979b, 1993) Riollet e Bonnefille (1976), Srivastava et al., (1977), Cuadrado (1988, 1989), Leach et al., (1993), Li et al. (1993) e Borsch (1995, 1998). No Brasil há poucos estudos sobre morfologia de grãos de pólen de Amaranthaceae (BARTH et al. 1976; CRUZ; MELHEM, 1979) e para o Rio Grande do Sul pode-se citar Bauermann et al., 2009, Evaldt et al., Com intuito de ampliar o conhecimento polínico sobre estas espécies ainda não estudadas, são descritas espécies de Pfaffia e Hebanthe nativas para o Rio Grande do Sul. Os resultados são comparados com os já existentes para a família e para o gênero Pfaffia bem como são discutidas implicações taxonômicas sobre a morfologia polínica. MATERIAL E MÉTODOS Pólen das espécies analisadas foi obtido a partir de exscicatas depositadas no Herbarium Anchieta (PACA) do Instituto Anchietano de Pesquisas. Foram estudadas as espécies nativas no Rio Grande do Sul dos gêneros Pfaffia e Hebanthe totalizando quatro espécies: Hebanthe eriantha (Poir.) Pedersen, Pfaffia glomerata (Spreng.) Pedersen, Pfaffia gnaphaloides (L.f.) Mart. e Paffia tuberosa (Spreng.) Hicken. Para cada espécie foram analisadas 5 amostras (Tabela 1). 38 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

39 Tabela 1 - Relação de espécies estudadas e local de coleta das amostras. Espécies Amostra 1 Amostra 2 Amostra 3 Amostra 4 Amostra 5 Pfaffia glomerata Pfaffia gnaphalioides Pfaffia tuberosa Hebanthe eriantha Porto União/SC Porto União/SC Cachoeira do Sul/RS Cachoeira do Sul/ RS Vila Alta/ PR Lages/SC Uruguaiana/RS Uruguaiana/RS Rosário do Sul/ RS Bagé/RS Caçapava do Sul/RS Santana do Livramento/ RS Lapa/PR Rosário do Sul/ RS Lages/ SC Cerro Largo/RS Cerro Largo/ RS Marcelino Ramos/ RS Itapiranga/ SC Florestal/ PR A partir de coleta das exsicatas extraiu-se material polinífero que foi processado para confecção de lâminas permanentes pelo método de acetólise. As lâminas encontram-se depositadas na Palinoteca do Laboratório de palinologia da Ulbra. Para análise dos grãos de pólen foram utilizados atributos individuais como tamanho, âmbito, forma, número de aberturas, ornamentação e espessura da exina. As medidas foram feitas utilizando-se 25 grãos de pólen provenientes de cada uma das amostras integralizando 125 medidas para cada espécie. A análise dos grãos de pólen foi realizada em microscópio óptico modelo Leica DMLB, em aumento de 1000x e mensurados os diâmetros equatorial (DE) e polar (DP). A partir da relação diâmetro polar pelo equatorial foi estabelecido o formato dos grãos de pólen. RESULTADOS Dentre o gênero Pfaffia, a espécie P. gnaphalioides é a de menor tamanho enquanto P. tuberosa é a de maior (Tabela 2). Incluindo Hebanthe nesta comparação, H. eriantha passa a ser o grão de pólen de maior tamanho. H. eriantha é também a espécie com exina mais espessa ao contrário de P. gnaphaliodes que apresenta a mais fina. Tabela 2 - Síntese das medidas dos grãos de pólen. DP=diâmetro polar, DE=diâmetro equatorial, P/E=relação DP por DE e Exina=espessura da exina. Espécies DP (µm) DE (µm) P/E (µm) Exina (µm) Pfaffia glomerata Pfaffia gnaphaloides Pfaffia tuberosa Hebanthe eriantha 14,42 14,42 1,00 1,92 12,68 12,68 1,00 1,69 16,00 16,00 1,00 2,18 21,13 21,13 1,00 2,99 As espécies dos dois gêneros estudados apresentaram grãos de pólen em mônades, pequenos, forma esférica, âmbito circular e pantoporados. Poros circulares, distribuídos equitativamente por toda a superfície do grão de pólen (Figura 1). Grãos semitectados, reticulados (metarreticulados), com um poro em cada lúmen. Sexina mais espessa que nexina. Sexina reticulada, com 10 a 12 malhas visíveis numa face, malhas grandes, pentagonais, de lados retos. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

40 muitos gêneros, considerando muitas características e utilizando microscopia eletrônica. Os dados obtidos por ele, permitiram o estabelecimento de subcategorias distribuídas dentro dos dois tipos polínicos anteriormente propostos por Erdtman (1952). O tipo Pfaffia sugerido por Borsch (1998) apresenta características que permitem o enquadramento das quatro espécies estudadas neste tipo polínico. Figura 1 - Grãos de pólen de Amaranthaceae. A. Pfaffia glomerata em corte óptico. B. Pfaffia glomerata, detalhe do retículo. C. Pfaffia. ganaphaliodes em corte óptico. D. Pfaffia Ganaphaliodes, detalhe do retículo. E. Pfaffia tuberosa em corte óptico. F. Pfaffia tuberosa, detalhe do retículo. G. Hebanthe eriantha em corte óptico. H. Hebanthe eriantha, detalhe do retículo. DISCUSSÃO As características exibidas pelos gêneros Pfaffia e Hebanthe confirmam o caráter estenopolínico da família Amaranthaceae onde os grãos de pólen são em sua maioria esféricos e com poros distribuídos por toda a superfície. Erdtman (1952), baseado em atributos polínicos, caracterizou a subfamília Gomphrenoideae como tendo poros situados em lúmens (metarreticulados) enquanto nas Amaranthoideae estes lúmens estão ausentes. A estas características correspondem tipo Gomphrena e tipo Amaranthus, respectivamente. Pfaffia e Hebanthe estão incluídos na subfamília Gomphrenoideae e como tal também apresentam os poros situados em lúmens, enquadrando-se, portanto, no tipo Gomphrena proposto por Erdtman (1952). Na década de 90, Borsch (1998) fez um extenso estudo sobre pólen das amarantáceas baseado em Cuadrado et al. (1988) descreveram grãos de pólen de Pfaffia glomerata, P. gnaphalioides e P. tuberosa sendo que as características registradas neste estudo concordam com as descritas pelas autoras, diferindo ligeiramente no que diz respeito ao tamanho do grão de pólen e espessura da exina. As autoras citadas colocaram os grãos de pólen das três espécies de Pfaffia como tipo Gomphrena, subtipo Gomphrena perennis, porém este subtipo não abrange Hebanthe eriantha. Estudos de macro e micromorfologia realizados por Borsch e Pedersen (1997) mostraram diferenças entre os gêneros Hebanthe e Pfaffia os quais suportam o caráter monofilético do gênero Hebanthe. O tamanho maior e a exina mais espessa em Hebanthe podem indicar um caráter basal para esta espécie, como já constatado em outros grupos (EVALDT et al., 2008), fortalecendo a hipótese daqueles autores. As características morfológicas polínicas encontradas em Hebanthe, Pfaffia e na família Amaranthaceae em geral são muito próximas daquelas encontradas na família Chenopodiaceae. Tal fato apóia os recentes estudos de filogenia que reuniram estas dua famílias em Amaranthaceae e suporta, portanto, a existência de um único tipo polínico para as mesmas. Embora os vários estudos polínicos, botânicos e moleculares realizados com Amaranthaceae sua 40 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

41 filogenia não está ainda completamente entendida. A subfamília Gomphrenoideae está bem estabelecida sob a óptica da morfologia polínica, sendo a presença de grãos de pólen metarreticulados considerada uma sinapomorfia deste clado (MüLLER; BORSCH, 2005), porém as afinidades genéricas ainda necessitam melhores esclarecimentos. Fazem falta ainda estudos de microscopia eletrônica tanto de varredura quanto de ultra-estrutura, além de detalhamento em microscopia óptica e maior abrangência do número de espécies analisadas. Neste contexto, o pólen pode contribuir com valiosas informações sobre a filogenia, uma vez que certas características morfológicas como diâmetro e aberturas dos grãos de pólen podem indicar a ocorrência de características homoplásticas. REFERÊNCIAS BARTH, O. M.; CORTE-REAL, S.; MA- CIEIRA, E. M. Morfologia do polén anemófilo e alergizante no Brasil: II. Polygonaceae, Amaranthaceae, Chenopodiaceae, Leguminosae, Euphorbiaceae e Myrtaceae. Memórias do Instituto Oswaldo cruz, Rio de Janeiro, v. 74, p , BAUERMANN, S. G.; EVALDT, A.C.P.; BRANCO, S. C. Atlas de pólen e esporos do Vale do Rio Caí, RS, Brasil. Revista Árvore, v. 33, n. 5, p , BORSCH, T. Three new combinations in Pfaffia (Amaranthaceae) from the New World Tropics. Novon, v. 5, p , Pollen types in the Amaranthaceae. Morphology and evolutionary significance. Grana, v. 37, p , BORSCH, T.; PEDERSEN, T. M. Restoring the generic rank of Hebanthe Martius (Amaranthacaea). Sendtenera, v. 4, p , CUADRADO, G. A. Granos de polen de Amaranthaceae del nordeste argentino: 2. Genero Pfaffia. Boletín de la Sociedad Argentina de Botánica, v. 25, n. 3-4, p , Granos de polen de Amaranthaceae del nordeste argentino: 3. Generos Alternanthera, Froelichia, y Gomphrena. Boletín de la Sociedad Argentina de Botánica, v. 26, n. 1-2, p , CRUZ, M. A. V. E MELHEM, T. S. Grãos de Polen de Plantas Alergógenas. Amaranthaceae e Chenopodiaceae. Hoehnea, v. 8, p , ERDTMAN, G. Pollen morphology and plant taxonomy. Leiden: The Chronica Botanica, EVALDT, A. C. P. et al. Grãos de pólen e esporos do Vale do Rio Caí, nordeste do Rio Grande do Sul, Brasil: descrições morfológicas e implicações paleoecológicas. Gaea, v. 5, n. 2, p , EVALDT, A. C. P.; BAUERMANN, S. G.; LUCHETA, F. Características morfológicas da parede dos grãos de pólen de Asteraceae, RS, Brasil, implicações taxonômicas. In: SIMPÓSIO DE PALEOBOTâNICA E PALINÓLOGOS, 7, 2008, Florianópolis. Resumos. Florianópolis: [s.n.]: p. 60. LEACH, G. J.; TOWNSED, C. C.; HARDLEY, M. M. Omegandra a new genus of Amaranthaceae from Australia. Kew Bulletin, v. 48, n. 4, p , LI, X.; HANG, X.; ZHAN, Y. Scanning electron Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

42 microscopic observation of the pollen morphology of Althernanthera from China. Journal of Wuhan Botanical Research, v. 11, n. 2, p , LIVINGSTONE, D. A. The pollen morphology of African Amaranthaceae. In: ANNUAL MEETING OF AMERICAN ASSOCIATION OF STRATIGRAPHY PALYNOLOGISTS, 3, 1972, Toronto. Proceeding... Toronto: AASP, p LIVINGSTONE, D.A. et al. Stellate pore ornamentation in pollen grains of the Amaranthaceae. Pollen et Spores, v. 15, n. 3-4, p , MARCHIORETTO, M. S.; MIOTTO, S. T. S.; SIQUEIRA, J. C. de Padrões de distribuição geográfica dos táxons brasileiros de Hebanthe Mart. (Amaranthaceae). Pesquisa Botânica, n. 59, p , Padrões de distribuição geográfica das espécies brasileiras de Pfaffia (Amaranthaceae). Rodriguésia, v. 60, n. 3, p , MüLLER, K.; BORSCH, T. Multiple origins of a unique pollen feature: stellate pore ornamentation in Amaranthaceae. Grana, v. 44, p , RIOLLET, G.; BONNEFILLE, R. Pollen des Amaranthaceaedu Benin e du Lac Rodolphe (Afrique Orientale) determinations générique et spécifique. Pollen et Spores, v. 18, n. 1, p , SIQUEIRA, J. C. Amaranthaceae. In: WANDER- LEY, M. G. L.; SHEPHERD, G.; GIULIETTI, A. M. Flora Fanerogâmica do estado de São Paulo. São Paulo: Fapesp-Hucitec, p SRIVASTAVA, V., PAL, M.; NAIR, P. K. K. A study of the pollen grains of Amaranthus spinosus L. and A. dubius Mart. ex Thell and their hybrids. Reviem of Paleobotany and Palynology, v. 23, n. 4, p , SOUZA, V. C.; LORENZI, H. Botânica Sistemática: guia ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. Nova Odessa: Instituto Plantarum, TOWNSEND, C. C. Notes on Amaranthaceae: 2. Kew Bulletin, v. 29, n. 3, p , The genera Dasysphaera and Volkensintia. Notes on Amaranthaceae: 7. Kew Bulletin, v. 33, p , A second species os Nelsia Schina. Notes on Amaranthaceae: 8. Kew Bulletin, v. 34, p , 1979a.. The generic position of Centena stefaninii Chiov. Notes on Amaranthaceae: 8. Kew Bulletin, v. 34, p , 1979b.. Amaranthaceae. In: KUHITZKI, K. (Ed.) Familias and Genera of vascular Plants. Berlin: Springer, v. 2, p VASCONCELLOS, J. M. O. Amaranthaceae do Rio Grande do Sul. Brasil.-V. Gêneros Pfaffia Mart. e Gomphrena Mart. Roessléria, v. 8, n. 2, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

43 Variabilidade genética do jaborandi (Pilocarpus pennatifolius Lemaire; Rutaceae) em populações naturais da região noroeste do Rio Grande do Sul an a Jú l i a Ba n d e i r a 1 lu i s ir i n e u deimling 2 Ja n a í n a en d r e s ge o r g-kr a e M e r 3 RESUMO O presente trabalho foi realizado com o objetivo de avaliar a diversidade e a estrutura genética de cinco populações naturais de P. pennatifolius, utilizando marcadores ISSR. Os dados de distância genética mostraram que as maiores identidades genéticas não ocorreram necessariamente entre as populações mais próximas geograficamente. Os resultados da AMOVA mostraram que a diversidade genética dentro das populações foi mais elevada do que a diversidade genética entre as populações. O baixo valor de Φ ST obtido indica não existir uma estruturação entre as populações, ou seja, ocorreria fluxo gênico entre as mesmas. Sugere-se que a baixa diferenciação genética detectada entre as populações seja devido ao isolamento recente das mesmas, considerando-se o tempo de geração da espécie em estudo. palavras-chave: espécie nativa, marcador ISSR, diversidade genética. 1 Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas/ULBRA. Bolsista PIBIC/CNPq 2 Técnico do Laboratório da Biodiversidade Vegetal/PPGGTA ULBRA 3 Professora Orientadora do Curso de Ciências Biológicas e do PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA (janaina. endres@ulbra.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

44 ABSTRACT The present study aimed at assessing the genetic diversity and structure of five natural P. pennatifoluis populations using ISSR markers. The genetics distance data showed that the higher genetic identities do not necessarily occur between the populations geographically closest to one another. The AMOVA results revealed that the genetic diversity within populations was higher than the value found between populations. The low Φ ST value obtained indicates that there is no interpopulation structure, which means that gene flow occurs between P. pennatifolius populations. The present study suggests that the low genetic differentiation observed between populations is due to the fact that isolation is relatively recent, considering the species life cycle in study. Keywords: native species, ISSR markers, genetic diversity. INTRODUÇÃO O gênero neotropical Pilocarpus compreende dezessete espécies, das quais catorze são encontradas no Brasil. Entre estas espécies, está o jaborandi (Pilocarpus pennatifolius Lemaire) (Dr. José Rubens Pirani, comunicação pessoal, 18 de junho de 2008). O jaborandi é uma arvoreta perene e pouco ramificada. Apresenta flores monoclinas e a sua polinização ocorre por entomofilia, preferencialmente por insetos do grupo das moscas e das vespas (BARBOSA, 1999). Produz anualmente grandes quantidades de sementes (REITZ et al., 1988), que são dispersas por autocoria (SOUZA et al., 2005), isto é, sem a participação de agentes externos. É uma planta da flora nativa brasileira de grande interesse econômico, pelo seu valor medicinal e cosmético. Esta espécie apresenta vários alcalóides como a pilocarpina isopilocarpina, jaborina, joboridina, pilosina, entre outros (ROCHA; ROCHA, 2006). As plantas do gênero Pilocarpus são as únicas fontes naturais da pilocarpina, um alcalóide ativador do sistema nervoso autônomo parassimpático. Este alcalóide é utilizado na oftalmologia para contração da pupila, um procedimento importante em cirurgias ópticas e em outros tratamentos. A pilocarpina tem se mostrado clinicamente eficaz também no tratamento da acne, da queda de cabelo, da seborréia e em outras afecções do couro cabeludo (LORENZI; MATOS, 2002). A importância do jaborandi não está relacionada somente aos fatores econômicos, mas principalmente ao seu papel ecológico. Com relação à sua ecologia sucessional, esta espécie nativa é considerada secundária e ombrófila e em programas de reflorestamento deve ser utilizada para o enriquecimento das espécies (LOPES; GONçALVES, 2008). Nativa da América do Sul, a espécie em estudo é encontrada predominantemente no Paraguai, na Argentina e no Brasil. Em nosso país, ocorre nos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (FLORA BRASILIENSIS REVISI- TADA, 2008). Em nosso Estado, a sua distribuição é irregular e descontínua podendo ser encontrada em solos úmidos e rochosos, abrangendo regiões de Floresta Ombrófila Densa, Campos Sulinos e Floresta Estacional Decidual. Esta ocorrência natural inclui a Região Noroeste do Estado, a qual, nas últimas décadas, vem sofrendo intensa degradação e fragmentação de suas florestas como resultado 44 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

45 do desenvolvimento e expansão da pecuária e da agricultura. Desta forma, populações de espécies vegetais que antes mantinham níveis adequados de indivíduos, hoje, encontram-se drasticamente reduzidas, podendo levar à perda da variabilidade genética e ao declínio destas populações. A compreensão dos padrões de variabilidade intrapopulacional e da distribuição da diversidade genética entre as populações de espécies florestais é de fundamental importância para a definição de estratégias de conservação e uso sustentável desses recursos (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). A avaliação da variabilidade genética em um germoplasma depende da disponibilidade de marcadores polimórficos e neutros do ponto de vista do efeito ambiental. Já foram desenvolvidas diferentes técnicas que utilizam vários tipos de marcadores moleculares baseados na análise direta do DNA. Em nosso estudo foi utilizado o marcador molecular ISSR (Inter Simple Sequence Repeat) (ZIETKIEWICZ et al., 1994). Na técnica utilizada para este tipo de marcador, é amplificada a região de DNA entre dois microssatélites que estejam proximamente espaçados e inversamente orientados, por meio de um único primer, composto de uma curta sequência microssatélite (tipicamente, pares de bases) com um a quatro nucleotídeos degenerados ancorados na extremidade 5 ou 3 (ZIETKIEWICZ et al., 1994; MALTAGLIATI et al., 2006). Sua amplificação não requer informação prévia da sequência do genoma e leva a um padrão multilocus e altamente polimórfico (ZIETKIEWICZ et al., 1994). Este estudo teve como objetivo verificar a variabilidade genética e o grau de diferenciação de 24 progênies em cinco populações naturais de Pilocarpus pennatifolius Lemaire, da Região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, utilizando marcadores moleculares ISSR, e assim gerar conhecimento para a espécie e subsídios para o estabelecimento de bancos de germoplasma e estratégias de conservação. MATERIAL E MÉTODOS Foram analisadas 24 progênies de cinco populações naturais de jaborandi da Região Noroeste do Rio Grande do Sul, dos municípios de Catuípe (1 e 3) (duas populações), Augusto Pestana (2), São Martinho (4) e Crissiumal (5) (Figura 1). Em cada população, sementes de polinização aberta foram coletadas de árvores identificadas como plantas-matriz. As sementes foram germinadas no Viveiro Regional de Produção de Mudas Florestais do Instituto Regional de Desenvolvimento Rural (IRDeR), em Augusto Pestana, RS, para obtenção das plântulas. Quando as plântulas alcançaram 10 cm foram coletadas folhas de cinco indivíduos (progênie) de cinco plantas-matriz, para a maioria das populações, totalizando 118 indivíduos analisados. As folhas coletadas foram armazenadas em sacos plásticos com sílica gel para a desidratação e para posterior extração do DNA. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

46 Extração e Quantificação do DNA A extração do DNA total foi baseada no método descrito por Doyle e Doyle (1987), com pequenas modificações necessárias para a obtenção de DNA com boa qualidade. O DNA extraído foi quantificado através da comparação da intensidade da banda das amostras com a intensidade das bandas de DNA de fago-λ, com diferentes concentrações conhecidas. As análises de quantificação foram feitas por eletroforese em gel de agarose 0,8%, contendo brometo de etídeo (1 µg/ml) e tampão TBE 1X (Tris-Borato, EDTA), sob corrente elétrica de 100 V por 10 minutos e mais 20 minutos a 80 V. Amplificação ISSR Figura 1 - Vista aérea das cinco populações analisadas. As distâncias geográficas foram calculadas em quilômetros. (Imagem Google EarthTM modificada). Foram testados 11 primers ancorados na extremidade 3 (pertencentes ao set 9 da University of British, Columbia, Canadá), em três condições diferentes de reação e amplificação, conforme Lei et al. (2006), Rizza et al. (2007) e Yao et al. (2008) (Tabela 1). Tabela 1 - Condições da reação em cadeia da polimerase e de amplificação conforme os autores Lei et al. (2006), Rizza et al. (2006) e Yao et al. (2008), utilizados na análise das cinco populações. Lei et al. (2006) Rizza et al. (2007) Yao et al. (2008) Mix Programa PCR Mix Programa PCR Mix Programa PCR 10 ng DNA 94 C - 5min 80 ng DNA 94ºC - 7min 20 ng DNA 94ºC - 5min 10 mm dntps 0.25 µm Primer 1 unidade Taq 94 C - 1min 54.5 C - 1min 72 C - 2min } } } 40 ciclos 200 µm dntps 0.2 mm Primer 1 unidade Taq 94ºC - 30s 52ºC - 45s 45 ciclos 72ºC - 1.5min 200 µm dntps 0.5 µm Primer 1 unidade Taq 94ºC - 1min 52ºC - 45s 45 ciclos 72ºC - 2min 1 X Tampão de reação 72 C - 7min 1 X Tampão de reação 72ºC - 7min 1 X Tampão de reação 72ºC - 7min Os produtos da amplificação foram separados por eletroforese horizontal em gel de agarose 1,5%, contendo brometo de etídeo (1 µg/ml) e tampão TBE 1X, a uma voltagem de 65 V, por três horas e 46 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

47 meia. O gel foi verificado e a imagem digitalizada sob fonte de luz ultravioleta. O tamanho dos fragmentos amplificados foi determinado por comparação com o marcador de peso molecular Ladder de 100 pb (InvitrogenTM Brasil). ANáLISE ESTATíSTICA Os fragmentos de DNA amplificados foram identificados para presença (1) ou ausência (0) de bandas de igual tamanho e uma matriz binária foi construída. Com base nesta matriz binária, foi calculado o Coeficiente de Similaridade de Jaccard, entre cada par de indivíduos. Os coeficientes de similaridade foram utilizados para construir um dendograma, através do método de agrupamento UPGMA (Unweighted Pair Group Method Using Arithmetic Averages). Estas análises foram feitas usando o programa NTSYS-pc, versão 2.1 (ROHLF, 2001) e a análise de bootstrap ( permutações) foi feita utilizando o programa Bood versão 3.01 (COELHO, 2000). A porcentagem de locos polimórficos, a identidade genética de Nei e a distância genética de Nei (1978) foram calculadas com o programa TFPGA (Tools for Population Genetic Analyses) versão 1.3 (MILLER, 1997) assumindo que todos os lócus eram dominantes e estavam em equilíbrio de Hardy-Weinberg. Os valores da distância genética de Nei entre cada par de populações foram utilizados para construir um dendrograma, pelo método de UPGMA. O teste de bootstrapping foi feito com permutações. Para o cálculo da variância molecular (AMOVA) e do Φ ST foi utilizado o programa ARLEQUIN versão 3.11 (EXCOFFIER; SCHNEIDER, 2005). RESULTADOS E DISCUSSÃO Dos 11 primers testados, oito mostraram polimorfismo, e destes, cinco foram selecionados para a análise, por apresentarem um bom padrão de amplificação. Os cinco primers utilizados para a análise produziram várias bandas (fragmentos), das quais 136 foram analisadas por apresentarem boa resolução. Do total de bandas analisadas, 131 bandas (96,32%) foram polimórficas, com o tamanho variando de 120 a 2070 pares de bases (pb) (Tabela 2). Tabela 2 - Primers ISSR: sua sequência, tamanhos dos fragmentos, número total de bandas e número de bandas polimórficas. Primer Sequência (5-3 ) Y= (C,T) Fragmentos [pb] Total de bandas Bandas polimórficas UBC810 (GA)8T UBC811 (GA)8C UBC834 (AG)8YT UBC855 (AC)8CYT UBC857 (AC)8CYG Total Os coeficientes de similaridade genética entre os indivíduos analisados variaram de 0,37 a 0,73. O maior índice de similaridade (Sj=0,73) foi encontrado entre os indivíduos 61J e 73J pertencentes à mesma população (Crissiumal), porém provenientes de progênies diferentes. De uma maneira geral, o dendrograma gerado com os coeficientes de similaridade mostrou que os indivíduos agruparam-se independentemente da sua progênie ou população de origem, ou seja, não houve a formação de agrupamentos preferenciais entre indivíduos de uma mesma população ou progênie, encontrando-se indivíduos das cinco populações distribuídos ao longo do dendrograma. Esta situação somada aos baixos valores de bootstrap obtidos podem ser um indicativo da existência de uma alta variabilidade intrapopulacional, e que esta variabilidade estaria Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

48 distribuída entre os indivíduos das cinco populações estudadas. A análise da porcentagem de locos polimórficos mostrou altos níveis de diversidade genética dentro das populações, com uma porcentagem média de locos polimórficos de 82% para as cinco populações. A população de Catuípe (3) foi a que apresentou a mais baixa porcentagem média de locos polimórficos (77%). Para as progênies, 50% dos locos analisados, em média, foram polimórficos. As progênies de cada população tiveram uma porcentagem de locos polimórficos inferior à observada para a população como um todo, sugerindo que as progênies de uma população não compartilham todos os locos polimórficos, revelando assim uma pequena diferenciação genética entre as mesmas. A identidade genética entre os indivíduos de uma mesma população e entre populações de jaborandi foi mensurada pela Identidade de Nei (1978) (Tabela 3). Tabela 3 - Identidade de Nei (1978) intrapopulacional. Populações Catuípe (1) Augusto Pestana Catuípe (3) São Martinho Crissiumal I N 0,948 0,937 0,961 0,938 0,935 Limites 0,930-0,965 0,923-0,954 0,948-0,968 0,919-0,951 0,912 0,959 I N geral 0,944 Os coeficientes médios de identidade intrapopulacional obtidos para as cinco populações foram muito semelhantes e bastante altos, variando de I N =0,935 (Crissiumal) a I N =0,961 (Catuípe 3). O coeficiente de identidade intrapopulacional geral (médio) para a espécie foi I N =0,944. O coeficiente de identidade geral (médio) entre as cinco populações foi de I N =0,986 (dados não mostrados). As médias de identidade de cada população com todas as demais variaram muito pouco, de I N =0,976 (entre Catuípe-3 e São Martinho) a I N =0,994 (entre Catuípe-1 e Crissiumal). Estes valores indicam que as populações analisadas são geneticamente igualmente próximas umas das outras. A partir da matriz da distância genética de Nei (1978) entre as populações foi construído um dendrograma pelo método UPGMA (Figura 2). Com os valores obtidos de identidade genética e pela forma de agrupamento das populações foi possível observar que apesar da variabilidade genética detectada, as populações mostraram-se bastante semelhantes geneticamente e esta semelhança ocorreu de forma independente da proximidade geográfica. Figura 2 - Dendrograma obtido pelo método UPGMA, baseado na distância genética de Nei (1978) entre as cinco populações em estudo. Distâncias genéticas são indicadas acima do dendrograma e valores de bootstrap são indicados nos nós. Legenda: 1 Catuípe Mato dos Machado; 2 Augusto Pestana; 3 Catuípe Mato do Erig; 4 São Martinho; 5 Crissiumal. 48 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

49 Para verificar a estruturação e a distribuição da variabilidade genética foi realizada a análise da variância molecular (AMOVA), sendo obtidas as variâncias entre as populações e as progênies e as variâncias dentro das mesmas. Os altos valores de identidade genética obtidos entre as populações (IN geral =0,986) são corroborados pela análise de variância molecular, a qual mostrou que somente 2,82% (Φ ST =0,0282, p < 0,001), do total da variabilidade foi atribuída a diferenças entre as populações. O baixo valor de Φ ST obtido sugere não existir uma estruturação entre as populações, ou seja, que existiria fluxo gênico entre as mesmas. Alguns dados obtidos no presente trabalho sugerem que as progênies de cada população apresentem algumas diferenças genéticas entre elas. Como os indivíduos que compõem uma progênie são indivíduos-irmãos (as sementes foram coletadas da mesma planta-matriz) é esperado que mostrem maior identidade genética. Mesmo assim, foi possível observar a existência de uma grande identidade genética entre os indivíduos das diferentes progênies e também das diferentes populações estudadas, considerando os valores obtidos de identidade genética de Nei e pela forma como os indivíduos formaram os agrupamentos nos dendrogramas. Esta alta identidade observada possivelmente seja remanescente do período onde a paisagem não se apresentava tão fragmentada e sugere-se que esta fragmentação da área em estudo seja recente, considerando o ciclo de vida da espécie. Assim, mesmo que as populações não formassem um contínuo na natureza, elas estavam menos distanciadas, e provavelmente com um maior número de indivíduos, permitindo que mesmo um vetor de polinização sem uma alta capacidade de dispersão pudesse manter o fluxo gênico entre elas. Os dados de Coelho (2000) indicam que o processo de redução da cobertura florestal é anterior à década de 60. Portanto, a fragmentação já acontece há pelo menos 50 anos e no máximo há 100 anos (intensificação do processo de colonização da região). Desta forma, um possível isolamento das populações ocorreu entre 70 e 50 anos atrás. Considerando uma geração arbórea, para esta espécie perene, de cerca de 30 a 40 anos, haveria no máximo duas gerações de isolamento, o que pode ser considerado pouco tempo para que os processos de endogamia e a pequena capacidade de dispersão das sementes e do vetor de polinização sejam refletidos na distribuição da variabilidade genética da espécie, na região em estudo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando que a maior parte da variabilidade genética está contida dentro das populações e que existe uma pequena diferenciação entre as progênies de cada população, sugere-se para a conservação ex situ, a coleta de sementes de diferentes progênies em várias populações, mantendo de forma representativa a variabilidade da espécie em bancos de germoplasma. Para a conservação in situ devem ser aplicadas estratégias que envolvam a manutenção do fluxo gênico entre as populações. A manutenção de corredores de vegetação entre as populações de P. pennotifolius poderia ser uma estratégia eficiente para a manutenção da variabilidade genética entre as populações e para a preservação da espécie nos fragmentos remanescentes. AGRADECIMENTOS Auxílio: PROICT/ULBRA; PIBIC/CNPq. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

50 REFERÊNCIAS BARBOSA, A.A.A. Hortia brasiliana Vand. (Rutaceae): polinização por aves Passeiriformes no cerrado do sudeste brasileiro. Revista Brasileira de Botânica. v. 2, p , COELHO, A.S.G. BOOD: avaliação de dendrogramas baseados em estimativas de distâncias/ similaridades genéticas através do procedimento de bootstrap. Goiânia: UFG, COELHO, G.C. Recuperação de áreas degradadas no Noroeste do RS. caderno de Pesquisa, Santa Cruz do Sul, v. 12, p , DOYLE, J.J.; DOYLE, J.L. A rapid DNA isolation procedure for small quantities of fresh leaf tissue. Phytochem Bull, v. 9, p , EXCOFFIER, L.; LAVAL, G.; SCHNEIDER, S. Arlequin version 3.0: An integrated software package for population genetics data analysis. evolutionary Bioinformatics Online, v. 1, p , FLORA BRASILIENSIS REVISITADA. Obra - Família Rutácea. Disponível em < cria.org.br/taxoncard?id=fbr3449> Acesso em: 19 jun LEI, Y. et al. Determination of genetic variation in Rhodiola crenulata from the Hengduan Mountains Region, China using inter-simple sequence repeats. Genetic and Molecular Biology, v. 29, p , LOPES, S.B.; GONçALVES, L. elementos para a aplicação prática das árvores nativas do sul do Brasil na conservação da Biodiversidade. [Porto Alegre]: Fundação ZooBotânica, Disponível em: < jardimbotanico/downloads/paper_tabela_aplicacao_arvores_rs.pdf> Acesso em: 19 jun LORENZI, H.; MATTOS, F.J.A. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas. São Paulo: Instituto Plantarum, p MALTAGLIATI, F. et al. Identification of endangered Mediterranean cyprinodontiform fish by means o DNA inter-simple sequence repeats (ISSRs). Biochemical Systems of ecology, v. 34, p , MILLER, M.P. Tools for Population Genetic Analyses (TFPGA), version 1.3. A windows program for the analysis of allozyme and molecular population genetic data. [S.l.]: do Autor, CD-ROM. NEI, M. Estimation of average heterozygosity and genetic distance from a small number of individuals. Genetics, v. 89, p , PRIMACK, R.B.; RODRIGUES, E. Biologia da conservação. Londrina: Planta, p REITZ, R.; KLEIN, R.M.; REIS, A. Projeto madeira do Rio Grande do Sul. Itajaí: Sellowia, p RIZZA, M.D. et al. Genetic diversity and DNA content of three South American and three Eurasiatic Trifolium species. Genetic and Molecular Biology, v. 30, p , ROCHA, G.M.; ROCHA, M.E.N. Uso popular de plantas medicinais. Saúde & Ambiente em Revista, v. 1, p , ROHLF, F.J. NtSYSpc: Numerical Taxonomy and Multivariate Analusis System, version 2.1. New York: Exeter Software, Setauket, CD-ROM. 50 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

51 SOUZA, A.; MOURãO, K.S.; SOUZA, L.A. Morfologia e anatomia do fruto e da semente em desenvolvimento de Pilocarpus pennatifolius Lem. (Rutaceae). Revista Brasileira de Botânica, v. 28, p , YAO, H. et al. ISSR primer screening and preliminary evaluation of genetic diversity in wild populations of Glycyrrhiza uralensis. Biologia Plantarum, v. 52, p , ZIETKIEWCZ, E.; RAFALSKI, A.; LABUDA, D. Genome fingerprinting by simple sequence reats (SSR) - anchored polymerase chain reaction amplification. Genomics, v. 20, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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53 Um modelo murino para tratamento de lesão por isquemia e reperfusão de retalhos cutâneos com o uso de células-tronco adiposo-derivadas an d r é vi c e n T e Bigolin 1 an T o n i o Fr a n c i s c o ru a r o Fi l h o 2 Th i a g o d o s santos Pe r e i r a 2 lu c i a n a li M a Ma r T i n s co s Ta 3 Br u n o Be l l a g a M B a 4 Me l i s s a ca M a s s o l a 5 na n c e na r d i 6 RESUMO A aplicação de células-tronco em retalhos cutâneos trouxe novas perspectivas ao campo da microcirurgia reconstrutiva. Este estudo visou desenvolver um modelo experimental para avaliar a utilização de célulastronco derivadas de tecido adiposo (ADSCs) em lesão por isquemia-reperfusão de retalhos cutâneos. Dez camundongos foram operados e divididos em Grupo 1 (isquemia e reperfusão) e Grupo 2 (controle). Foram avaliados temperatura, coloração e microangiografia. ADSCs foram isoladas de camundongos C57BL/6. Observou-se queda da temperatura e perda da coloração no Grupo 1, com recuperação no período de rep- 1 Acadêmico do Curso de Medicina/ULBRA - Bolsista PROICT/ ULBRA 2 Acadêmico do Curso de Medicina/ULBRA 3 Acadêmico do Curso de Medicina/UFCSPA 4 Biólogo, mestrando em Genética e Biologia Molecular UFRGS 5 Professora do Curso de Medicina/ULBRA e do PPG Diagnóstico Genético e Molecular/ULBRA 6 Professora-Orientadora do Curso de Medicina/ULBRA e do PPG Diagnóstico Genético e Molecular/ULBRA (nance.nardi@ulbra.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

54 erfusão. ADSC com expansão e morfologia adequada. Concluiu-se que foi possível estabelecer o modelo murino proposto. palavras-chave: retalhos cutâneos, microcirurgia, célula tronco, lesão de reperfusão, isquemia. ABSTRACT The use of stem cells on skin grafts brought new perspectives in the reconstructive microsurgery area. This study aimed to develop an experimental model to evaluate the using of adipose derivate stem cells (ADSCs) in ischemic reperfusion injury on skin grafts. Ten mice were operated and divided in: Group 1 (ischemia and reperfusion) and Group 2 (control). Temperature, color and microangiography were evaluated. ADSCs cells were isolated from C57BL/6 mice. Was observed that temperature fall and loss of color on Group 1; with recovery on the reperfusion period. ADSC have correct expansion and morphology. In conclusion, It was possible to development the murine model desired. Keywords: tissue grafts, microsurgery, stem cell, reperfusion injury, ischemia. INTRODUÇÃO Considera-se que a regeneração de um tecido seja auto-limitada no que se refere à recuperação das características prévias à lesão. Assim o próprio tratamento cirúrgico reconstrutivo encontra-se em um paradigma já que pode ser fator causal ou de agravo a uma lesão (MCDOWELL, 1978; MCCARTHY, 1990). A reparação cirúrgica com garantia do restabelecimento estético e da capacidade funcional é, hoje, um objetivo mais próximo no campo da microcirurgia reconstrutiva. Quando se objetiva a confecção de retalhos cutâneos ou enxertos, a lesão isquêmica imposta pela própria técnica cirúrgica torna-se um limitante ao desfecho do tratamento. Há evidências indicando um envolvimento multifatorial na lesão dos retalhos. A reação oxidativa, a alteração do sistema do complemento e a intensificação da interação leucocitária causados pela reperfusão tecidual agravam a lesão ao tecido já isquêmico (ANDREWS et al., 2000; KHALIL; AZIZ; HALL, 2006). Com o desenvolvimento da manipulação das células-tronco e aprofundamento no estudo de suas capacidades criou-se uma nova possibilidade de terapia adjuvante ao tratamento cirúrgico. Células progenitoras endoteliais são estimuladas pela presença da lesão isquêmica. Após um curto período de tempo da injúria, estas células já se encontram no tecido acometido e sua concentração é maior quanto maior for a área de isquemia (PARK et al., 2004; KENNY et al., 1994; LI et al., 2000). As células-tronco teriam a capacidade de interferir nestes fatores e assim estimular a quebra no ciclo de lesões desencadeadas pela isquemia inicial, e entre as células-tronco adultas acredita-se que as célulastronco mesenquimais são as que apresentam maior potencial terapêutico (MEIRELLES; NARDI, 2009). O papel das células-tronco no aumento da viabilidade de retalhos cutâneos após períodos de lesão isquêmica está vinculado à melhoria do aporte sanguíneo. Contudo, o mecanismo pelo qual ocorre essa intensificação na formação de novos vasos ainda está por ser definido. Além da angiogênese, 54 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

55 sugere-se que a estimulação da secreção de fatores tróficos e de citocinas protetoras esteja associada à atenuação da injúria causada pela isquemiareperfusão (MORTAZAVI-HAGHIGHAT et al., 2002; UYSAL et al., 2009). Nesta situação, estudos buscam novas respostas com o uso de modelos experimentais de retalhos cutâneos com ou sem indução de lesão por isquemiareperfusão (SCHOLZ; EVANS, 2008; UYSAL et al., 2009; MOON et al., 2008; LU et al., 2008; ICHIOKA et al., 2004). Apesar de terem sido descritos resultados significativos com o tratamento com células-tronco nestes modelos, a avaliação da eficácia e a padronização dos modelos ainda não foram completadas. Sendo assim este estudo visa o estabelecimento e avaliação de um modelo murino de isquemia e reperfusão de retalhos cutâneos para estudo do potencial terapêutico de células-tronco. MATERIAL E MÉTODOS Este estudo foi desenvolvido junto ao Laboratório de Células-Tronco e Terapia Gênica da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) e realizado com o apoio do Laboratório de Imunogenética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Para avaliação do modelo de isquemia e reperfusão, foram desenvolvidos parâmetros de avaliação, como temperatura aferida por termômetro infravermelho (Infrared Thermometer Minipa MT- 350), coloração do retalho e microangiografia. Animais Modelos murinos das linhagens isogênicas BALB/c e C57BL/6 foram utilizados, sendo os primeiros empregados na realização do experimento e os segundos para isolamento das células-tronco. Neste estudo optou-se pela utilização de célulastronco adiposo derivadas (ADSCs). Procedimento Cirúrgico Um grupo de 10 camundongos adultos da linhagem BALB/c foi dividido igualitariamente nos grupos especificados a seguir: Grupo 1: Submetido a lesão de isquemia e reperfusão. Grupo 2: Controle, sem lesão isquêmica induzida. A técnica operatória descrita a seguir foi aplicada em ambos os grupos, distinguindo-se apenas quanto à indução de isquemia no Grupo 1. Os animais foram anestesiados com uso de uma mistura de 1mL de Xilasina associada a 1 ml de Ketamina e 8 ml de solução fisiológica a 0,9%. Uma dose de 0,1 ml/10g foi injetada por via intraperitoneal. Após estabelecimento de plano anestésico cirúrgico, foi realizada uma tricotomia abrangendo o lado direito do dorso do animal e a área do retalho, com 3 cm de comprimento e 1 cm de largura, foi demarcada conforme demonstra a Figura 1. Um retalho cutâneo de base cranial foi confeccionado com incisão por bisturi de lâmina 16, foi observada a integridade da pele e a separação completa do tecido subcutâneo por dissecção romba. Neste momento, apenas para o Grupo 1, foi realizada a ligadura da base do retalho através da amarração com fio de sutura (Figura 2). O leito do retalho foi fechado com pontos simples de Mononylon 4.0. Um período de avaliação de 10 minutos foi realizado e após este, para o Grupo 1, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

56 houve a liberação da ligadura da base do retalho. Durante mais 2 minutos, período de reperfusão, os animais permaneceram em avaliação. A seguir, uma laparotomia mediana foi realizada e por abordagem trans-diafragmática, o meio contrastado foi injetado no ventrículo esquerdo do animal. injeção intracardíaca de dois meios de contraste. O primeiro meio foi baritado (Sulfato de Bário 30%) e o segundo iodado (Diatrizoato de Meglumina 60%), sendo cada um destes utilizado em 2 animais de cada grupo. Após injeção do contraste o retalho foi ressecado, observando-se uma margem de 2 cm. As radiografias foram realizadas com a proximidade máxima entre a peça e o filme radiológico. A onda radiológica emitida foi formada por 36 kvp e 32 mas e a impressão realizada em filme ECRAM-mamográfico Mir-2000 Kodak Isolamento e Cultura das Células Figura 1 - Retalho cutâneo de base cranial. Camundongos da linhagem C57BL/6 foram utilizados para isolamento. Através de uma inguinotomia um patch de gordura foi obtido, sendo utilizada a técnica de isolamento de ADSCs com a enzima colagenase (MEIRELLES; NARDI, 2009). As células foram mantidas em cultura com meio HDMEM. Avaliação dos Resultados Figura 2 - Ligadura da base do retalho através da amarração com fio de sutura. Observa-se também a síntese do leito vascular. Procedimento Radiológico Com objetivo de confeccionar uma microangiografia dos capilares da derme, foi realizada a A temperatura do retalho foi aferida por um termômetro infravermelho nos terços distal e médio do retalho. Devido ao termômetro utilizado ter um campo de visão de 100 mm de diâmetro a 1000 mm de distância, observou-se uma distância termômetroretalho de 5 cm, o que confere a cobertura de uma área de 5 mm de diâmetro pelo raio infravermelho. A aferição da temperatura nos dois pontos acima citados foi realizada a cada 2 min e 30 seg até 10 minutos, onde no Grupo 1 foi liberada a isquemia e no Grupo 2 encerrado o acompanhamento. A última aferição foi realizada para o grupo experimental no 12º minuto de avaliação (Figura 3). 56 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

57 A radiografia foi submetida a avaliação por médico radiologista quanto à qualidade do exame envolvendo o uso dos diferentes meios contrastados e contagem dos vasos sanguíneos segundo proposto por Hoang et al. (2005). Quanto ao cultivo das células, observou-se sua taxa de expansão assim como análise da morfologia. RESULTADOS Não foram observadas complicações durante os procedimentos para confecção dos retalhos cutâneos. A abordagem do ventrículo esquerdo através do diafragma exigiu maior técnica e habilidade com o registro de vazamento de pequena quantidade de contraste para o mediastino em todos os casos. A média de duração dos procedimentos foi de 30,6 min, variando de 27 min a 35 min. Figura 3 - Aferição da temperatura com termômetro infravermelho no terço distal do retalho. Fotografias foram obtidas por câmera fotográfica digital no 10º minuto de avaliação. Estas imagens foram observadas quanto a sua coloração por técnicos não vinculados ao estudo e cegos quanto ao grupo e objetivos do estudo. A temperatura cutânea pré-operatória teve média de 29,5º C. Pode-se observar uma diminuição da temperatura na primeira aferição após a confecção do retalho com queda progressiva em direção a extremidade distal do mesmo. Nas medidas seqüenciais, observou-se queda de temperatura de forma mais intensa nos animais do Grupo 1, tanto no terço médio quanto no distal (Figura 4). Ao final do 10º min de avaliação, constatou-se uma média de temperatura de 1,3º C a menos para o Grupo 1 no terço distal e de menos 0,82º C no terço médio. No 12º min, quando nos animais do Grupo 1 foi avaliado o término do período de reperfusão, houve um aumento na temperatura do retalho de 0,95º C no terço distal e 1,22º C no terço médio. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

58 O exame radiológico foi submetido a apreciação e considerado de qualidade/resolução insuficiente para contagem dos vasos sanguíneos. Em algumas porções do retalho pode-se observar os vasos e realizar a contagem, contudo o grande número de artefatos advindos da adesão do tecido ao filme e da umidade dos retalhos impossibilitaram uma análise angiográfica precisa. Este resultado foi observado em todos animais submetidos à angiografia, não havendo diferença entre os contrastes utilizados. Figura 4 - Gráfico demonstrativo da alteração da temperatura nos terços médio e distal do retalho durante os diferentes períodos avaliados. As imagens obtidas ao 10º min de avaliação revelaram a perda mais acentuada da coloração original nos retalhos dos animais do Grupo 1, sendo observado tons mais enegrecidos e menos brilhantes nestes tecidos. Estes sinais são sugestivos de redução da perfusão tecidual (Figura 5). Figura 5 - Imagem fotográfica aos 10 min de acompanhamento. Observa-se sinais claros de maior alteração da coloração tecidual na imagem à esquerda, correspondente ao Grupo 1. A imagem à direita, com maior preservação de cores vivas, é referente a animal do Grupo 2. Foi possível realizar o isolamento de ADSCs de camundongos C57BL/6 através de técnica utilizando enzima colagenase. As células isoladas mostraram morfologia fibroblástica e taxa de expansão de aproximadamente 1,5 x 10 5 células in vitro. DISCUSSÃO A lesão por isquemia-reperfusão é considerada uma dificuldade no tratamento cirúrgico com retalhos cutâneos. No modelo utilizado neste estudo sendo a isquemia tecidual proporcional e progressiva em direção a parte distal à base do retalho (PARK et al., 2004). Assim pode-se observar uma diferença de temperatura entre o terço médio e o distal do retalho. Sugere-se que os maiores valores e variações de temperatura obtidos nos primeiros sejam devido a proximidade da base vascularizada. Optou-se por não utilizar a implantação de vaso axial no retalho. Este fato pode ser a justificativa da falha na realização da microangiografia, tendo em vista que a técnica originalmente descrita foi aplicada em retalhos cutâneos vascularizados pela implantação de vaso axial. (HOANG et al., 2005). Este incremento no suporte sanguíneo impede que 58 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

59 a seja observado a capacidade de reabilitação das células vasculares lesadas pelo dano de isquemiareperfusão. O congelamento da peça cirúrgica antes da realização do exame radiológico, conforme idealizado pelo artigo original, pode atenuar os artefatos observados no presente estudo. Quanto à avaliação da temperatura, optou-se pela utilização de termômetro infra-vermelho pela praticidade, baixo custo e possibilidade de avaliação rápida e repetida quando comparado à técnicas calorimétricas. Pode-se observar uma redução mais pronunciada na temperatura do retalho dos animais do Grupo 1. Após um período de 2 min e 30 seg de reperfusão tecidual observou-se aumento importante da temperatura em ambos segmentos avaliados. Uma questão surge quanto a esta variação de temperatura em um período reduzido de tempo para reperfusão. Moon et al. relataram que 6 períodos de reperfusão de 15 seg seguidos pelo mesmo tempo de interrupção no fluxo (total de 3 min de intervenção) foram suficientes para atenuar a lesão adicional de reperfusão. (MOON et al., 2008). A maioria dos estudos avaliados mantém um período prolongado de isquemia, variando de 4 a 12 horas, seguido por um período de reperfusão sem limite. (MOON et al., 2008; UYSAL et al., 2009; GIDEROGLU, 2009; KüNTSCHER; HART- MANN; GERMANN, 2005). Neste estudo a utilização de um fio de sutura para realizar a ligadura da base vascularizada do retalho foi capaz de reduzir a temperatura de forma importante. Observou-se redução da espessura do tecido subcutâneo próximo aos locais de contato com o fio. Diferentemente do clampeamento com pinça cirúrgica mosquito, realizado por Uysal et al (2009), o fio de sutura possui uma menor área na aplicação da pressão, o que pode levar a avulsão do retalho se força excessiva for aplicada. Os resultados importantes aqui relatados foram possíveis devido à base estreita do retalho que permitiu sua amarração. Retalhos de maiores larguras não são bons canditados a indução de lesão isquêmica por esta técnica. Acredita-se que ambos modelos, por realizarem uma isquemia não seletiva e levarem a maceração celular de toda base do retalho, possam dificultar a recuperação pós-operatória do mesmo em relação ao grupo controle. Outros modelos de isquemia não cutânea já foram relatados, como para indução de infarto agudo do miocárdio, e demonstram ser próximo ao ideal pela seletividade e consecutivamente rigor de na comparação. (SCHOLZ; EVANS, 2008; HWANGBO et al; 2010). É de extrema importância a síntese do leito do retalho com o objetivo de evitar a revascularização a partir do mesmo. Lu et al. (2008). realizaram a interposição do retalho com dreno de pen rouse. Esta conduta é de difícil controle da permanência do material no período de acompanhamento pósoperatório. Diferentemente do presente estudo, Ichioka et al (2004). realizaram retalhos cutâneos duplos com base cranial avascularizada. Os retalhos duplos evitariam a variação interanimal; porém, retalhos extensos no dorso dos animais podem ser mais estressantes além de acrescentarem dificuldade ao procedimento cirúrgico e assim diferença na confecção dos mesmos. Optou-se pela realização vascular cranial devido à existência de vaso sanguíneo de fácil preservação nesta localização e também para diminuir a probabilidade de auto-mutilação no pós-operatório. A análise cega da coloração dos retalhos no 10º min pós-operatório evidenciou sinais mais intensos de isquemia no Grupo 1. A utilização de imagens fotográficas já foi utilizada por outros artigos para avaliar clinicamente a área de viabilidade do retalho. Esta avaliação pode ser realizada com períodos mais prolongados de acompanhamento Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

60 onde a necrose tecidual é mais evidente. (UYSAL et al., 2009). O tratamento de retalhos com as ADSCs pode ser feito através da injeção das mesmas em soro fisiológico ou associadas a biomaterial (THONHOFF et al., 2008). Estas possibilidades de análise possuem significado clínico importante e reforçam a necessidade de um modelo padrão para sua comparação. O processo para obtenção das ADSCs deve respeitar rotinas e o estabelecimento de técnica padrão é importante deste o isolamento até o cultivo e utilização. Objetivou-se o cultivo de ADSCs de camundongos da linhagem C57BL/6 devido a possibilidade de utilização de linhagens transgênicas GFP para experimentos futuros. Através de imunofluorescência estas células podem ser identificadas e avaliadas quanto a sua atuação no sítio da lesão. Neste estudo as células demonstraram adequada taxa de expansão e morfologia usual. A capacidade de diferenciação deve ser avaliada em estudos subseqüentes. A limitação imposta pela isquemia ao tecido do retalho pode ser o diferencial na busca pelos resultados ideais em uma microcirurgia. Assim muitas técnicas são propostas para atenuar a lesão, seja pela indução previa de isquemia para obter maior resistência à hipoxia ou pela liberação intermitente do fluxo para amenizar a lesão de reperfusão. (MOON et al., 2008; KüNTSCHER, HARTMANN; GERMANN, 2005). A proposta de atuação das células-tronco através de múltiplas vias para reduzir a lesão por reperfusão e ampliar o aporte sanguíneo, abre uma nova era neste campo cirúrgico. (PARK et al., 2004). Através do proposto foi possível o desenvolvimento padronizado de um modelo murino de retalhos cutâneos para tratamento com células-tronco. Apesar da falha na angiografia os demais métodos sustentaram a confirmação da lindução de isquemia-reperfusão. REFERÊNCIAS ANDREWS, K. et al. Ischemia - reperfusion injury: A multicellular phenomenon. Plast Reconstr Surg., v. 106, p , GIDEROGLU, K. et al. Montelukast protects axial pattern rat skin flaps against ischemia/ reperfusion injury. J Surg Res., v. 157, n. 2, p , dec HOANG, N. T. et al. Proposed New Method For Angiographically Quantifying Neovascularization In Prefabricated Flaps Inc. Microsurgery, v. 25, p , ICHIOKA, S. et al. Bone marrow cell implantation improves flap viability after ischemiareperfusion injury. Ann Plast Surg., v. 52, p , KENNY, D. et al. Transforming growth factor beta 1 preserves endothelial function after multiple brief coronary artery occlusions and reperfusion. Am Heart J., v. 127, p. 1456, KHALIL, A. A.; AZIZ, F. A.; HALL, J. C.. Reperfusion injury. Plast Reconstr Surg., v. 117, p , LI, Q. F. et al. Accelerated flap prefabricationwith vascular endothelial growth factor. J. Reconstr. Microsurg., v. 16, p. 45, LU, F. et al. Improved viability of random pattern skin flaps through the use of adiposederived stem cells. Plast Reconstr Surg., v. 121, p , KUNTSCHER, M. V.; HARTMANN, B.; GER- MANN, G. Remote Ischemic Preconditioning Of Flaps: A Review. Inc. Microsurgery, v. 25, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

61 MCCARTHY, J. G. Introduction. In:. (Edit.). Plastic surgery. Philadelphia: W.B. Saunders; MCDOWELL, F. Plastic surgery in the twentieth century. Ann Plast Surg., v. 1, p , MEIRELLES, L. S.; NARDI, N. B. Methodology, biology and clinical applications of mesenchymal stem cells. Front Biosci., v. 1, p , jan MORTAZAVI-HAGHIGHAT, R. et al. Rapid and dynamic regulation of TGF-beta receptors on blood vessels and fibroblasts during ischemiareperfusion injury. Am J Physiol., v. 282, p. C1161 C1169, MOON, J. G. et al. Postconditioning Attenuates Ischemia-Reperfusion Injury In Rat Skin Flap. Inc. Microsurgery, v. 28, p , PARK, S. et al. Selective Recruitment of Endothelial Progenitor Cells to Ischemic Tissues with Increased Neovascularization. Plast. Reconstr. Surg., v. 113, p. 284, SCHOLZ T.; EVANS, G. R. D. Impact of Hypertonic and Hyperoncotic Saline Solutions on Ischemia-Reperfusion Injury in Free Flaps. Plast. Reconstr. Surg., v. 122, p. 85, HWANGBO, S. et al. Therapeutic Potential of Human Adipose Stem Cells in a Rat Myocardial Infarction Model. Yonsei Med J., v. 51, n. 1, p , THONHOFF, R. J. et al. Compatibility of human fetal neural stem cells with hydrogel biomaterials in vitro. Brain Res., v. 2, n. 1187, p , jan UYSAL, A. C. et al. The Effect of Adipose- Derived Stem Cells on Ischemia-Reperfusion Injury: Immunohistochemical and Ultrastructural Evaluation. Plast. Reconstr. Surg., v. 124, p. 804, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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63 Ciências da Saúde

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65 Analise química e avaliação da atividade acaricida das folhas de Piper amalago, P. mikanianum e P. xylosteoides em larvas de Rhipicephalus (Boophilus) microplus Ma r c e l a silva d o s santos 1 gi l s a n e v o n Po s e r 2 sé r g i o Bo r d i g n o n 2 ve r a lu c i a sardá ribeiro 3 al e x a n d r e d e Ba r r o s Fa l c ã o Fe r r a z 4 RESUMO O carrapato-de-boi, Rhipicephalus (Boophilus) microplus, é um problema que traz muitos prejuízos a pecuária. Em estudos prévios, foi avaliada a atividade acaricida dos óleos essenciais das folhas de P. amalago (Pa), P. mikanianum (Pm) e P. xylosteoides (Px). Devido ao baixo rendimento dos óleos essenciais, o objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito acaricida do extrato metanólico (EM) das folhas de Pa, Pm e Px em larvas de carrapato e analisar a sua constituição fitoquímica. Com base nos ensaios fitoquímicos detectou-se a presença de alcalóides e flavonóides nas três espécies, e através do teste de imersão larval observou-se que apenas P. mikanianum apresenta atividade acaricida. palavras-chaves: Piper, Rhipicephalus (Boophilus) microplus, teste de imersão larval. 1 Acadêmico do Curso de Biomedicina/ULBRA Bolsista PIBIC/CNPq 2 Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas UFRGS 3 Faculdade de Veterinária UFRGS 4 Professor-Orientador do Curso de Pós Graduação em Genética e Toxicologia Aplicada /ULBRA (alexandre.ferraz@ulbra.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

66 ABSTRACT Cattle tick, Rhipicephalus (Boophilus) microplus, is a major problem for livestock and brings a lot of damage. In previous studies the acaricidal activity of the essential oils P. amalago (Pa), P. mikanianum (Pm) e P. xylosteoides (Px) was evaluated. Due to the low yield of the essential oils, the aim of this study was to evaluate the acaricidal effect of methanolic extract (ME) from the leaves of Pa, Pm and Px in tick larvae and to analyze their phytochemical composition. Based on the phytochemical analysis we detected the presence of alkaloids and flavonoids in the three species, and through the larval immersion test, only P. mikanianum displayed acaricidal activity. Keywords: Piper, Rhipicephalus (Boophilus) microplus, larval immersion test. INTRODUÇÃO Rhipicephalus (Boophilus) microplus (Canestrini, 1887) é uma das espécies de carrapatos com maior distribuição mundial, causador de diversos problemas para pecuária nas regiões tropical e subtropical. Conhecido popularmente como carrapato-de-boi, este é responsável por inúmeros prejuízos, como a perda de sangue do animal por sua ação hematófaga, lesões causadas na pele do gado por sua fixação que pode favorecer o aparecimento de infecções secundárias, perda na qualidade do couro e, além disso, é vetor de várias doenças como a babesiose e a febre maculosa (SABATINI et al., 2001; DURCONEZ et al., 2005). Por outro lado, as perdas causadas pelo carrapato podem ser minimizadas com o uso de acaricidas. Todavia, o uso contínuo desses produtos tem permitido o desenvolvimento de cepas destes artrópodes resistentes à agentes acaricidas (KLAFKE et al., 2006). Muitos destes produtos, além de contaminar o ambiente possuem um alto custo. Assim, a pesquisa de novos produtos acaricidas é necessária para auxiliar no controle deste parasita. O gênero Piper (Piperaceae) possui aproximadamente 1000 espécies (SIMPSON; OGORZALY, 1995). Várias espécies pertencentes a este gênero são utilizadas como plantas ornamentais, temperos, alucinógenos e na medicina popular (PARMAR et al., 1997). Algumas espécies de Piper apresentam elevado valor comercial e notável potencial econômico, como Piper nigrum, conhecida popularmente como pimenta-preta mundialmente utilizada como tempero (SIMPSON; OGORZALY, 1995; SIDDIQUI et al., 2004). Alguns efeitos medicinais dos extratos de Piper, como antibacteriano e antipirético, são conhecidos e disseminados na medicina popular em várias partes do mundo. Os compostos que conferem estas e outras propriedades medicinais são importantes na defesa das plantas para repelir insetos, fungos oportunistas e nematóides (EVANS et al., 1984; PARMAR et al., 1997). Alguns extratos e óleos essenciais de plantas pertencentes a este gênero têm demonstrado eficácia no controle de insetos causadores de pestes (CHAURET et al., 1996, FAZOLIN et al., 2007). Dentre as plantas estudadas neste trabalho, Piper mikanianum é uma espécie nativa do Rio Grande do Sul utilizada popularmente para distúrbios estomacais, no tratamento de amenorréias, leucorréias e como abortivo (ALICE et al., 1995). Piper amalago, encontra-se distribuída desde o México até o Brasil sendo utilizada popularmente para aliviar dores no peito e como agente antiinflamatório (PARMAR, 1997). 66 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

67 Em estudos prévios com óleos voláteis da P. amalago, P. mikanianum e P. xylosteoides, as amostras de P. mikanianum e P. xylosteoides apresentaram um potente efeito acaricida no teste de imersão larval (FERRAZ et al., 2010). Devido ao baixo rendimento dos óleos essenciais, o objetivo deste trabalho é avaliar o efeito acaricida do extrato metanólico das folhas destas três espécies de Piper em larvas de carrapato, utilizando o teste de imersão larval descrito por Ribeiro e colaboradores (2007) e analisar a sua constituição fitoquímica. MATERIAL E MÉTODOS Material Vegetal As partes aéreas de P. amalago, P. mikanianum e P. xylosteoides foram coletadas em abril de 2008, em Morro Reuter, Picada Café e São Francisco de Paula, no estado do Rio Grande do Sul. O material foi identificado pelo Prof. Dr. Sérgio Bordignon. As espécies foram depositadas no herbário de Universidade Luterana do Brasil (HERULBRA) com os números 3123, 3125, e 3500, respectivamente. Análise fitoquímica As folhas de P. amalago, P. mikanianum e P. xylosteoides foram analisadas através do screening fitoquímico de acordo com a metodologia descrita por Harborne (1998) e Simões et al. (2007). Estes métodos consistem em reações colorimétricas para a caracterização dos metabólitos secundários presentes no material vegetal, tais como: alcalóides (Mayer, Bertrand e Dragendorff), antraquinonas (reação de Borntraeger), cardiotônicos (Salkowsky, Keller-Killiani, Baljet), cumarinas (fluorescência em papel alcalinizado), flavonóides (reação cianidina), taninos (teste da gelatina) e saponinas (teste da espuma). Os resultados foram confirmados através da literatura e por cromatografia em camada delgada em sílica gel, utilizando sistemas eluentes e reveladores indicados por Wagner e Bladt (1996). Preparação e análise cromatográfica do extrato metanólico Os extratos metanólicos foram obtidos por maceração das folhas secas (3 x 24h) e trituradas (1:10 m/v). As amostras foram filtradas e concentradas sob pressão em evaporador rotatório. Para análise cromatográfica os extratos foram aplicados em placas de sílica para cromatografia de camada delgada com sistemas eluentes pré-estabelecidos por Wagner e Bladt (1996). Preparação das amostras Para o teste de imersão larval, os extratos metanólicos foram dissolvidos e diluídos em etanol, nas concentrações de 1%, 0,5%, 0,25% e 0,0625%. Preparação dos carrapatos Fêmeas de R. (Boophilus) microplus em fase posterior ao ingurgitamento, medindo aproximadamente 4,5mm foram coletadas de animais infestados, foram limpas com água e secas em papel toalha. O peso médio dos carrapatos era de 0,30g. Essas fêmeas foram incubadas em temperatura 27-28ºC e 70-80% de umidade relativa até a ovoposição. A Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

68 partir destes ovos, foram obtidas as larvas para o teste de imersão larval. Teste de Imersão Larval Os experimentos foram realizados com aproximadamente 100 ovos (0,005g) acondicionados em envelopes de tecido TNT (1,0cm X 1,5cm). Os envelopes foram incubados em temperatura de 27-28ºC e 70-80% de umidade relativa por 14 dias, até a eclosão dos ovos. Após mais 14 dias de incubação, os envelopes contendo as larvas, foram submersos por 5 minutos em 10mL nas soluções teste. Etanol e água foram utilizados como controles negativos. Após 1h, para a evaporação do solvente, os envelopes foram incubados em temperatura de 27-28ºC e 70-80% de umidade relativa por 48h. Larvas (vivas e mortas) foram contadas para avaliar o percentual de mortalidade. Os testes foram realizados em triplicata. RESULTADOS E DISCUSSÃO Através da análise fitoquímica das folhas das três espécies de Piper detectou-se a presença de flavonóides e alcalóides. Uma vez que não há estudos fitoquímicos com estas espécies, torna-se necessário buscar a ocorrência destas classes de metabólitos secundários em outras plantas deste gênero. Segundo trabalho de Quílez e colaboradores (2010) com as folhas de Piper carpunya, foram identificados os flavonóides vitexina, isovitexina e isoembigenina. Dessa mesma forma, Dragull e colaboradores (2003) relatam a ocorrência dos alcalóides 3α,4α-epoxi-5β-pipermetistina e avaina nas folhas de Piper methysticum. A ausência de antraquinonas, saponinas, taninos, cumarinas determinada nos ensaios fitoquímicos também é embasada na ausência de relatos destas classes na literatura para o gênero Piper. A análise do extrato metanólico por cromatografia em camada delgada no sistema eluente hexano:tolueno (93:7) com posterior nebulização de anisaldeído sulfúrico como agente cromogênico indicou a presença de produtos majoritários. Após o cálculo do fator de retenção e consulta a literatura foi possível constatar nos extratos metanólicos de P. xylosteoides e P. mikanianum a presença de safrol e apiol, respectivamente. O extrato metanólico de P. amalago não apresentou atividade acaricida em nenhuma das concentrações testadas (Tabela 1). Este resultado corrobora com dados prévios que demonstraram uma ineficiência do óleo essencial desta planta frente às larvas R. (B.) microplus (FERRAZ et al., 2010). Através de cromatografia gasosa acoplada a espectrometria de massas (CG-EM), foi possível identificar os compostos presentes no óleo essencial de P. amalago. Os compostos encontrados em maior quantidade foi uma mistura de monoterpenos, limoneno e β-felandreno (20,52%) (FERRAZ et al., 2010). Cabe mencionar que para o limoneno, já foram descritas atividades biológicas, como inseticida (PRATES et al., 1998) e até mesmo acaricida (FERRARINI et al., 2008). Entretanto, acredita-se que por este produto estar em uma mistura e em baixa concentração no óleo, não foi possível produzir o efeito demonstrado no estudo anterior, no qual sua toxicidade frente às larvas de R. (B.) microplus foi encontrada nas concentrações de 10mg/mL até 2,5mg/mL de limoneno puro (FERRARINI et al., 2008). O extrato metanólico de P. xylosteoides também não demonstrou atividade (Tabela 1), diferenciando-se do resultado obtido no teste de imersão larval com o óleo essencial extraído de 68 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

69 suas folhas, onde apresentou atividade acaricida nas concentrações de 1% que matou 97% das larvas e na concentração de 0,5% matou 25% das larvas. Na análise do óleo por CG-EM, o composto majoritário encontrado foi o fenilpropanóide safrol que representou 47,80% da mistura (FERRAZ et al., 2010). O safrol é um composto que possui atividade inseticida relatada em literatura (HUANG et al., 1999) entretanto a analise cromatográfica indicou uma baixa concentração deste produto no extrato metanólico. Os resultados obtidos no teste de imersão larval com o extrato metanólico das folhas de P. mikanianum, demonstram eficácia nas concentrações de 1%, 0,5% e 0,25% (Tabela 1). Observa-se que nas concentrações mais altas, o extrato foi letal e na concentração de 0,25% matou 60% das larvas. No ensaio realizado com o óleo essencial, foi obtido o mesmo resultado nas concentrações mais altas, porém na concentração de 0,25%, o óleo matou 90% das larvas. Na análise por CG-EM do óleo da P. mikanianum, o componente majoritário encontrado foi o apiol, correspondendo a 64,90% da constituição do óleo volátil (FERRAZ et al., 2010). Estudos comprovam a atividade biológica do apiol, onde uma delas é a interferência no crescimento e na redução da fecundidade de moscas adultas da espécie Parasarcophaga dux (KHALAF, 2004). Tabela 1 - Atividade acaricida do extrato metanólico de Piper amalago, P mikanianum e P. xylosteoides em % de mortalidade. Concentração/ Amostra 1% 0,5% 0,25% 0,125% 0,0625% EMPa EMPm ±10 13±3,53 3±2,08 EMPx CONCLUSÃO Os resultados obtidos neste trabalho demonstram que o extrato metanólico de Piper mikanianum é um bom candidato para o desenvolvimento de novos agentes acaricidas e seu efeito parece estar relacionado à presença de apiol. AGRADECIMENTOS Este trabalho teve o apoio financeiro da Universidade Luterana do Brasil ULBRA e da Fundação de Amparo a pesquisa do Rio Grande do Sul (FAPERGS). REFERÊNCIAS ALICE, C. B. et al. Plantas medicinais de uso popular: atlas farmacognóstico. Canoas: Ed. ULBRA, CHAURET, D.C. et al. Insecticidal Neolignans from Piper decurrens. Journal of Natural Products, v. 59, p , DRAGULL, K.; YOSHIDA, W.Y.; TANG, C.S. Piperidine alkaloids from Piper methysticum. Phytochemistry, v. 63, p , DUCORNEZ, S. et al. Diagnosis of amitraz resistance in Boophilus microplus in New Caledonia with modified Larval Packet Test. Veterinary Parasitology, v. 130, p , EVANS, P.H.; BOWERS, W.S.; FUNK, E.J. Identification of fungicidal and nematocidal Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

70 components in the leaves of Piper betle (Piperaceae). Journal of Agricultural and Food chemistry, v. 32, p , FAZOLIN, M. et al. Insecticidal properties of essential oils of Piper hispidinervum C. DC.; Piper aduncum L. and Tanaecium nocturnum (Barb. Rodr.) Bur. & K. Shum against Tenebrio molitor L., ciência e Agrotecnologia, v. 31, p , FERRARINI, S. R. et al. Acaricidal activity of limonene, limonene oxide and β-amino alcohol derivatives on Rhipicephalus (Boophilus) microplus. Veterinary Parasitology, v. 157, p , FERRAZ, A. B. F. et al. Acaricidal activity and chemical composition of the essential oil from three Piper Species. in press Parasitology Research, v. 107, n. 1, p , abr HARBORNE, J.B. Phytochemical Methods. Oxford: Clarendon Press, HUANG, Y.; HUNG, H. O. S.; MANJU- NATHA, K. R. Bioactivities of safrole and isosafrole on Sitophilus zeamais (Coleoptera: Curculionidae) and Tribolium castaneum (Coleoptera:Tenebrionidae). Journal of economic entomology, v. 92, p , KHALAF, A. F. Toxicological efficacy of some indigenous dill compounds against the flesh fly, Parasarcophaga dux Thomson. Journal of the egyptian Society of Parasitology, v. 34, p , KLAFKE, G. M. et al. Larval immersion tests with ivermectin in populations of the cattle tick Rhipicephalus (Boophilus) microplus (Acari: Ixodidae) from State of Sao Paulo, Brazil. Veterinary Parasitology, v. 142, p , PARMAR, V. S. et al. Phytochemistry of the genus Piper. Phytochemistry, v. 46, p , PRATES, H. T. et al. Insecticidal activity of monoterpenes against Rhyzopertha dominica (F.) and Tribolium castaneum (Herbst). Journal of Stored Products Research, v. 34, p , QUÍLEZ, A. et al. Anti-secretory, anti-inflammatory and anti-helicobacter pylori activities of several fractions isolated from Piper carpunya Ruiz & Pav. Journal of ethnopharmacology, v. 128, p , RIBEIRO, V. L. S. et al. Acaricidal properties of extracts from the aerial parts of Hypericum polyanthemum on the cattle tick Boophilus microplus. Veterinary Parasitology, v. 147, p , SABATINI, G. A. et al. Tests to determine LC50 and discriminating doses for macrocyclic lactones against the cattle tick, Boophilus microplus. Veterinary Parasitology, v. 95, p , SIDDIQUI, B. S. et al. New Insecticidal Amides from Petroleum Ether Extract of Dried Piper nigrum L. Whole Fruits. chemical and Pharmaceutical Bulletin, v. 52, p , SIMÕES, C. M. O. et al. Introdução à análise fitoquímica. In:. Farmacognosia: da planta ao medicamento. 5. ed. Florianópolis; 70 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

71 Porto Alegre: Ed. da UFSC; Ed. da UFRG, p SIMPSON, B. B.; OGORZALY, M. O. (Eds.). economic Botany: plants in our world. 2. ed. New York: McGraw-Hill, WAGNER, H.; BLADT, S. Plant Drug analysis a thin layer chromatography atlas. 2. ed. Berlin: Springer, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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73 Estudo do perfil docente nos cursos de odontologia da região Sul lu c a s Pr e u s s l e r d o s santos 1 da n i e l e si g a l li n h a r e s 1 Ta l i Ta ca r n i e l 2 ca r lo s al B e r T o Fe l d e n s 3 va n i a re g i n a ca M a r g o Fo n Ta n e l l a 4 RESUMO O estudo objetivou traçar o perfil do professor que atua nos cursos de Odontologia nos Estados da Região Sul do Brasil. As instituições e seus professores foram identificados no Portal Sinaes e as variáveis relacionadas aos docentes foram coletadas da Plataforma Lattes. O perfil observado para o professor nos cursos de Odontologia da Região Sul é de cirurgiões-dentistas de ambos os sexos, com curso de especialização e mestrado, que atuam em três disciplinas inseridas em dois dos ciclos de formação do curso e sem atuação na pós-graduação, com nenhum a treze artigos publicados ao longo da carreira. palavras-chave: Educação Superior, Odontologia, docentes. ABSTRACT This study aimed to identify the profile of Dental School Teachers in the South Region of Brazil. The institutions and teachers were identified through Portal Sinaes. The variables related to the teachers were collected from 1 Acadêmico do Curso de Odontologia/ULBRA Canoas Bolsista PROICT/ULBRA 2 Acadêmica do Curso de Odontologia/ULBRA Canoas Bolsista PIBIC CNPq/ULBRA 3 Professor do Curso de Odontologia/ULBRA Canoas 4 Professora Orientadora do Curso de Odontologia/ULBRA Canoas (vaniafontanella@terra.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

74 the Plataforma Lattes. The observed profile for Dental School teachers in the South Region is a dentist of both sex, with specialization and master degree. They are inserted in three programs of two formation cycles but not in post-graduation programs, with none to 13 papers published along the career. Keywords: Higher Education, Dentistry, Professor. INTRODUÇÃO O professor do ensino superior, historicamente, teve como base a profissão paralela que exercia no mundo do trabalho. A idéia de que se este profissional soubesse fazer também saberia ensinar deu sustentação à lógica do recrutamento dos docentes (CUNHA, 2004). Desta forma, nos cursos pioneiros de Odontologia no Brasil os professores eram os profissionais bem sucedidos. Nos anos 1950 se começou a constatar a necessidade de qualificação, que culminou com a implementação dos cursos de Pós-Graduação e as exigências de titulação para a carreira universitária, obtidas em tais cursos e em concursos públicos (CARVALHO, 2001) Assim, a formação do professor de Odontologia no Brasil tem se baseado fundamentalmente nos Programas de Pós-Graduação, de modo geral tecnicistas, cuja racionalidade técnica é fundada na filosofia positivista, caracterizada pela fragmentação do conhecimento por especialidades (PÉRET; LIMA, 2003). Em consonância com o conceito de que o ensino superior caracteriza-se como processo de construção crítica do conhecimento para a transformação da sociedade, as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) preconizam que os cursos de Odontologia devem formar um cirurgião-dentista generalista, humanista, crítico e reflexivo, para atuar em todos os níveis de atenção em saúde, com base no rigor técnico e científico. A publicação das DCN introduziu nos cursos de Odontologia a necessidade de re-conceituar o ensino integrado, pois o modelo de clínicas por especialidades estanques não mais contribui para o novo perfil do profissional de odontologia. Neste novo paradigma de integralidade, a definição do papel do professor necessita também passar por uma profunda reflexão. Algumas temáticas são mais recorrentes nas preocupações dos docentes e, presumivelmente, são alvo de seus enfoques técnicos, políticos e pedagógicos, tais como possibilitar um sólido conhecimento básico técnico da área de atuação do cirurgião-dentista, reconhecer a integralidade do paciente, praticar a interdisciplinaridade e compreender a realidade social e epidemiológica do paciente. Mais raros são os questionamentos quanto à importância do processo de formação do professor generalista. Além disso, não existe um parâmetro definido por qualquer entidade oficial no tocante a como o preparo dos docentes pode contribuir para este fim e os editais dos referidos concursos continuam a exigir profissionais especialistas. Raldi et al. (2003) observaram que as atitudes do professor com os alunos, bem como o tipo de material didático adotado e o tempo despendido nas aulas teóricas podem tanto favorecer quanto prejudicar a aprendizagem nos cursos de Odontologia. A titulação do professor, critério mais valorizado pelas instituições, foi considerada importante por uma pequena parcela dos alunos. É unânime a valorização do papel do professor como determinante da qualidade no processo ensino-aprendizagem. O professor media o currículo 74 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

75 e seus destinatários. O papel dos professores e do sistema educativo não é influenciar as habilidades, conhecimentos, atitudes e motivações de seus alunos, mas sim, facilitar a construção, por parte dos alunos, de seus processos de formação. A formação do professor de Odontologia deve seguir a mesma linha das atuais DCN, pois estes são importantes agentes para alcançar a transformação do perfil profissional preconizado, ou seja, um cirurgiãodentista generalista, crítico, reflexivo e humanista. Ao defrontar-se com um novo cenário institucional extremamente competitivo e com padrões de docência definidos pelo mercado de trabalho/governo, o professor universitário tem, hoje, uma nova exigência. Embora não tenha sido estabelecida relação direta entre os resultados alcançados pelos alunos e a atuação docente e não possa ser atribuída ao docente toda a responsabilidade pela melhora do ensino, sabe-se que nenhuma transformação nesse sentido pode ser realizada sem a sua participação (TOLEDO, 2006). Desta forma, o presente estudo objetivou traçar o perfil do professor que atua nos cursos de Odontologia nos Estados da Região Sul do Brasil. MATERIAL E MÉTODOS As instituições que oferecem graduação em Odontologia na Região Sul do país foram identificadas no Portal Sinaes e então coletados dados referentes às seguintes variáveis: município, estado e categoria administrativa da instituição. Ainda por meio deste instrumento foi obtida a lista de professores de cada curso. Foram então acessados os currículos dos professores constantes na Base Lattes, dos quais foram extraídas as seguintes informações: sexo, titulação, tempo de formado, tempo de docência, área de formação, atuação em disciplinas dos diferentes ciclos do curso, orientações concluídas em programas de pós-graduação e número de artigos publicados. Os dados foram tabulados e são apresentados de forma descritiva, na forma de médias, medianas e valores mínimos e máximos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram encontrados registros de professores de Odontologia nas instituições da Região Sul, os quais atuam em 31 cursos de 28 universidades: cinco federais, quatro estaduais e dezenove privadas. Três instituições federais estão sediadas no Rio Grande do Sul, uma em Santa Catarina e outra no Paraná. O maior numero de professores está no Paraná (487 39%), seguido do Rio Grande do Sul (442 36%) e de Santa Catarina (25%), distribuídos em 14, 10 e 7 cursos, respectivamente (Figuras 1 e 2). O número de professores por curso variou de cinco (curso em implantação) a 85. Excluídos os quatro cursos novos, a média encontrada foi de 44 ± 17 docentes por curso, com mediana de 39. Figura 1 - Percentual de professores por estado. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

76 Figura 2 - Percentual de cursos por estado. Quanto ao sexo, a distribuição foi homogênea (55% masculino e 45% feminino Figura 3). Do total de professores, 86% têm formação em Odontologia (Figura 4) e os demais em outras áreas. Estes atuam em disciplinas do ciclo básico dos cursos. Uma parcela pequena de professores (2%) tem como titulação máxima a graduação, 66% são especialistas, 81% mestres e 45% doutores (Figura 5). Esta tendência se observa de forma homogênea entre os estados. Figura 5 - Titulação máxima dos docentes (em percentual). O tempo de formado variou de 1 a 52 anos (média 18 ± 9, mediana 17), e o tempo de docência variou de 1 a 49 anos (média 12 ± 9, mediana 9). Nos três estados se observa distribuição homogênea entre professores iniciantes e com maior experiência docente. Cada professor participa em média de 3 ± 2 disciplinas (mediana 2), sendo que a maioria dos docentes (65%) está inserida em disciplinas de dois dos ciclos de formação, caracterizados como básico, pré-clínico e clínico. Apenas 6% dos professores atuam nos três ciclos (Figura 6). Figura 3 - Percentual de docentes quanto ao sexo. Figura 6 - Atuação docente nos diferentes ciclos de formação do curso (em percentual). Figura 4 - Percentual de docentes por área de graduação. A experiência docente em cursos de pósgraduação foi aferida pelo número de orientações 76 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

77 concluídas. Encontrou-se que uma parcela considerável de docentes concluiu orientações em cursos lato sensu (39%) e stricto sensu (21%). A média de orientações concluídas por docente foi de 8 em ambos os níveis. O número de artigos publicados apresenta ampla variabilidade (0 a 196 publicações, com média de 11 ± 18 e mediana de 4). Um quarto dos professores publicou pelo menos 13 artigos ao longo da carreira e 21% deles não publicaram nenhum. CONCLUSÃO Conclui-se que perfil do professor nos cursos de Odontologia da Região Sul é de cirurgiõesdentistas de ambos os sexos, com curso de especialização e mestrado, que atuam em três disciplinas inseridas em dois dos ciclos de formação do curso e sem atuação na pós-graduação, com nenhum a treze artigos publicados ao longo da carreira. REFERÊNCIAS CARVALHO, A. C. P. ensino de Odontologia em tempos da LDB. Canoas, Ed. ULBRA, CUNHA, M. I. Diferentes olhares sobre as práticas pedagógicas no ensino superior: a docência e sua formação. educação, Porto Alegre, v. 54, n. 3, p , PÉRET, A. C. A.; LIMA, M. L. R. A pesquisa e a formação do professor de Odontologia nas políticas internacionais e nacionais de educação. Rev. ABeNO, v. 1, n. 1, p , RALDI, D. P. et al. O papel do professor no contexto educacional. Rev. ABeNO, v. 3, n. 1, p , TOLEDO, O. A. A docência nos Cursos de Odontologia. In: CARVALHO, A. C. P.; KRIGUER, L. educação odontológica. São Paulo: Artes Médicas, p Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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79 Estudo do polimorfismo TaqIB do gene CETP em indivíduos dislipidêmicos cristiana alv e s Ma r T i n s 1 ca r l a d avila d e as s u M P ç ã o 2 Fe r n a n d a go u l a r T la n n e s ch u l a 3 sa B r i n a es T e v e s d e MaT o s al M e i d a 4 Ma r i lu Fi e g e n B au M 5 Ma r i a lu c i a ro s s e T T i 6 cl á u d i a Ma r i a do r n e l l e s d a silva 7 RESUMO Dislipidemia é uma doença multifatorial causada pela interação entre fatores genéticos e ambientais. A proteína Transferidora de Ésteres de Colesterol (CETP) participa de uma importante etapa da regulação do metabolismo de lipídios, e o polimorfismo TaqIB do gene CETP tem sido associado a concentrações elevadas de HDL. O presente estudo teve como objetivo investigar a interação entre o polimorfismo TaqIB no gene CETP e as concentrações de lipídios em uma população de 119 pacientes dislipidêmicos do Sul do Brazil. O polimorfismo TaqIB foi determinado através da técnica de Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) e a enzima de restrição TaqI. Nenhuma relação entre os genótipos de CETP e parâmetros lipídicos foi observado. Esses achados demonstram que a contribuição genética da dislipidemia é extremamente complexa. palavras-chave: dislipidemia, polimorfismo, gene CETP, TaqIB, Brasil. 1 Acadêmico do Curso de Farmácia/ULBRA Bolsista PROICT/ ULBRA 2 Aluno de Pós-Graduação em Diagnóstico Genético e Molecular, Especialista em Diagnóstico Genético Molecular 3 Pesquisadora do Centro de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Estado 4 Professor do Curso de Biomedicina/FEEVALE 5 Professor do Curso de Farmácia/UFCSPA 6 Professor do Curso de Farmácia/ULBRA 7 Professor Orientador do Curso de Biologia/ULBRA (cmdornelles@gmail.com) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

80 ABSTRACT Dyslipidemia is a multifactorial disorder caused by an interaction between genetic and environmental factors. Cholesterol ester transfer protein (CETP) plays an important role in the regulation of lipid metabolism, and the TaqIB polymorphism of the CETP gene has been associated with elevated HDL concentrations. This study was aimed to investigate the interaction between TaqIB polymorphism in the CETP gene and plasma lipids in 119 dyslipidemic patients from Southern Brazilian population. TaqIB polymorphisms were determined using the Polymerase Chain Reaction (PCR) and the restriction enzyme Taq1. No relationship between CETP genotypes and lipids parameters was observed. The findings demonstrate that the genetic contribution to dyslipidemia is extremely complex. Keywords: Dyslipidemia, polymorphism, CETP gene, TaqIB, Brazil. INTRODUÇÃO As alterações metabólicas nos níveis séricos de lipídios circulantes do sangue são conhecidas como dislipidemias e estão relacionadas com a aterosclerose. Depósitos de lipídios desencadeiam processos bioquímicos que formam placas ateroscleróticas no interior dos vasos arteriais, podendo obstruir, parcial ou totalmente, um ou mais vasos (YAMADA et al., 2007). A variação dos níveis lipídicos é uma característica de etiologia multifatorial, determinada por uma ampla gama de fatores ambientais e genéticos (somatório de pequenos efeitos de vários genes). Variações em um grande número de genes envolvidos na síntese de proteínas estruturais e enzimas relacionadas ao metabolismo de lipídios podem responder por variações do perfil lipídico de cada indivíduo, associadas às dislipidemias (ORDOVAS, 2006). Assim sendo, qualquer gene que seja responsável pela produção de uma proteína envolvida na rota metabólica de lipídios pode ser um gene candidato para a investigação de determinantes genéticos dos níveis lipídicos. O somatório das variações genéticas com pequeno efeito em cada um destes genes pode levar à modificação do perfil lipídico de um indivíduo, predispondo à cardiopatia. Como estas variantes genéticas são bastante freqüentes na população em geral (entre 1,0% a 80,0%), seu impacto é muito maior na saúde pública, quando comparadas com mutações de grande efeito, mas que são muito mais raras. As variações genéticas, quando freqüentemente encontradas na população estudada, são chamadas de polimorfismos (ANDRADE; HUTZ, 2002). A ocorrência de doenças cardiovasculares (DCV) varia amplamente no mundo. De modo geral, a maior freqüência é encontrada em países ocidentais ou com estilo de vida ocidental. No Brasil, as DCV são a primeira causa de morte por doença não-transmissível, sendo que o Rio Grande do Sul apresenta o maior índice em relação aos demais estados do país (ATLAS SÓCIO-ECONÔMICO RGS, 2006). O gene CETP, codificador da Proteína Transferidora de Ésteres de colesterol, tem um papel central no metabolismo do HDL por participar do mecanismo de transporte reverso de colesterol. Dos vários polimorfismos estudados no gene CETP humano, o que está associado à criação de um sítio de restrição pela enzima TaqI, tem recebido atenção, sendo chamado de polimofismo TaqIB. Vários estudos têm reportado 80 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

81 que o polimorfismo TaqIB, alelo B1, está associado com níveis diminuídos de HDL e risco de DCV (KLERKX et al., 2004; BOEKHOLDT et al., 2005; SVIRIDOV & NESTEL, 2007). Ainda, tem sido demonstrado que indivíduos com o genótipo B2B2 apresentaram colesterol HDL mais elevado que os indivíduos com o genótipo B1B1. Indivíduos com o genótipo B1B1 apresentam, portanto, um risco maior de desenvolver DCV (BOEKHOLDT et al., 2005). Novos estudos sobre o polimorfismo TaqIB do gene da CETP com relação aos níveis lipídicos são justificados pela necessidade de conhecimento de suas interações nas diversas populações, inclusive no grupo proposto por este trabalho, já que existem poucos estudos com este polimorfismo no Brasil. No presente estudo foram comparados apenas os dados genotípicos do grupo de pacientes com níveis lipídicos. MATERIAIS E MÉTODOS População do Estudo Pacientes que buscaram atendimento no Ambulatório de Dislipidemia, sendo composta por 119 indivíduos dislipidêmicos. Todos os pacientes preencheram os critérios de elegibilidade e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido para participação do estudo. Dados clínicos, bioquímicos e antropométricos dos pacientes foram obtidos. Foram retirados 10 ml de sangue em condições estéreis para as análises moleculares e bioquímicas. Dosagens Bioquímicas Os níveis de colesterol total, HDL-colesterol, LDL, VLDL e triglicerídios foram dosados no plasma por métodos enzimáticos em indivíduos com 12 horas em jejum. Colesterol Total (CT) foi definido como normal (<200 mg/dl), moderado ( mg/dl) e alto ( 240 mg/dl). Para o colesterol LDL (LDL-C), as seguintes variações foram consideradas: normal (<130 mg/ dl), moderada ( mg/dl) e alta ( 160 mg/dl). Para o colesterol HDL (HDL-C), as seguintes variações foram consideradas: alta (>60 mg/ dl) e baixa (<40 mg/dl). Para os triglicerídeos (TG): normal (<150 mg/dl), moderado (150 to 200 mg/dl) e alto (>200 mg/dl). Indivíduos que apresentaram pelo menos uma desses níveis altos foram considerados dislipidêmicos. O colesterol LDL foi calculado de acordo com Friedewald (1972). Extração de DNA Os DNAs foram extraídos a partir de sangue total através da técnica descrita por Lahiri e Nurnberger (1991). Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) As condições de amplificação do gene CETP seguiram instruções segundo Carlquist et al. (2003). Detecção dos Fragmentos de DNA Amplificados Os fragmentos de DNA amplificados, com 535 pb, foram visualizados em luz ultravioleta após eletroforese em gel de agarose e o tamanho dos fragmentos avaliado com um marcador de peso molecular. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

82 Genotipagem por PCR-RFLP Os DNAs amplificados foram genotipados utilizando a enzima de restrição TaqI, segundo Carlquist et al. (2003). Análises Estatísticas Teste de qui-quadrado ou exato de Fisher foi utilizado para comparar as variáveis categóricas com a presença ou não do desfecho (polimorfismo TaqIB). Teste t-student ou não-paramétrico correspondente foi utilizado para comparar as variáveis contínuas com a presença ou não do desfecho, com intervalo de confiança de 95% e p < 0,05. As freqüências alélicas foram determinadas pela contagem direta dos alelos e o equilíbrio de Hardy-Weinberg foi verificado por meio do teste de qui-quadrado. RESULTADOS Dos 119 pacientes com dislipidemia, 54 eram homens e 65 mulheres. A média de idade foi de 61,8 (± 11.2) anos, sem diferenças estatísticas entre homens e mulheres. Nenhuma diferença foi observada entre homens e mulheres com relação aos níveis de CT, LDL-C, HDL-C e TG. A distribuição dos genótipos do polimorfismo TaqIB não mostrou significância estatística comparadas com aquelas esperadas sob o Equilíbrio de Hardy-Weinberg e nenhuma significância foi observada nas freqüências alélicas entre os sexos (p=0,794). As freqüências encontradas do alelo TaqIB B2 do gene CETP em homens e mulheres foram 43% e 45,2%, respectivamente. A Tabela 1 apresenta as médias ajustadas dos níveis de lipídios de acordo com o polimorfismo TaqIB. Nenhuma associação significante entre os genótipos e os níveis de lipídios foi observada. Tabela 1 - Associação dos genótipos do polimorfismo TaqIB com variáveis lipídicas. n TC n HDL-C N LDL-C n TG CETP TaqIB B1B ,6 ± 52,5 3 47,9 ± ,9 ± 46,6 30 5,2 ± 0,5 B1B ,1 ± 50, ,2 ± 10, ,7 ± 51,2 50 5,35 ± 0,6 B2B ,1 ± 43, ,7 ± 10, ,8 ± 38,7 16 5,41 ± 0,7 P 0,565 0,074 0,595 0,477 DISCUSSÃO No presente trabalho foi avaliado a influência do polimorfismo TaqIB presente no gene CETP em uma amostra de pacientes dislipidêmicos do Rio Grande do Sul. Os genótipos obtidos foram analisados quanto as suas possíveis influências sobre os níveis lipídicos. Trabalhos com o gene CETP tem mostrado associações importantes com níveis lipídicos, entretanto no presente estudo essas associações não foram encontradas (KLERKX et al., 2004; BOEKHOLDT et al., 2005; SVIRIDOV; NESTEL, 2007). Infere-se que esse resultado possa estar relacionado ao pequeno número amostral, sendo necessário, portanto, que futuros estudos sejam realizados com um número amostral maior, além da inclusão de um grupo controle. Finalmente, os dados apresentados sugerem que ainda existem vários obstáculos a serem superados 82 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

83 que incluem a real compreensão da dinâmica do genoma humano em relação às doenças de origem multifatorial. REFERÊNCIAS ANDRADE, F.; HUTZ, M. The Genetic Component of Serum Lipid Determination. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, p , BOEKHOLDT, S. M. et al. Cholesteryl ester transfer protein TaqIB variant, high-density lipoprotein cholesterol levels, cardiovascular risk, and efficacy of pravastatin treatment: individual patient meta-analysis of 13,677 subjects. Circulation, v. 111, p , CARLQUIST, J. F. et al. The cholesteryl ester transfer protein TaqIB gene polymorphis predicts clinical benefit of statin therapy in patients with significant coronary artery disease. American Heart, v. 146, p , FRIEDEWALD, N. T.; LEVY, R. I.; FREDRICK- SON, D. S. Estimation of the concentration of low-density lipoprotein cholesterol in plasma, without use of the preparative ultracentrifuge. Clinical Chemistry, v. 18, p , KLERKX, A. H. E. M. et al. Cholesterly ester transfer protein concentrations is associated with progression of atherosclerosis and response to pravastatin in men with coronary artery disease (REGRESS). European Journal of Clinical Investigation, v. 34, p , LAHIRI, D.; NURNBERGER, J. A. Rapid Non enzimatic method for the preparation of HMW DNA from blood for RFLP studies. Nucleic Acids Research, v. 19, p. 5444, ORDOVAS, J. M. Nutrigenetics, plasma lipids, and cardiovascular risk. Journal of American Diet Association, v. 106, p , RIO GRANDE DO SUL. Governo do Estado. Atlas Sócio-econômico do Rio Grande do Sul: indicadores sociais: mortalidade por causas. Disponível em: < Acesso em: 18. jun SVIRIDOV, D.; NESTEL, P. J. Genetics factors affecting HDL levels, structure, metabolism and function. Current Opinion in Lipid, v. 18, p , YAMADA, Y. et al. Prediction of genetic risk dyslipidemia. Genomics, v. 90, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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85 Detecção de DNA de Mycobacterium tuberculosis em amostras de sangue total utilizando o sistema FTa card ca r l a ro s s a n a d o s santos 1 su e l e n an g e l i 1 ca n d i c e Mi c h e lo n 2 ka r e n schmid 2 Ma r c i a susana nu n e s silva 2,3 Ma r i a lu c i a ro s a ro s s e T T i 2,4 RESUMO A tuberculose (TB) acomete principalmente o pulmão, sendo o escarro a amostra de escolha para o diagnóstico. Porém o mesmo é muitas vezes de difícil obtenção, além de ser muito infecto-contagioso e possuir necessidade de transporte e armazenamento adequados. Além disso, o diagnóstico é baseado na baciloscopia, do qual apresenta pouca sensibilidade e na cultura que é muito demorada. Sendo assim, o presente trabalho visou analisar a possibilidade de realizar o diagnóstico de TB através da Reação em Cadeia da Polimerase (PCR), com sangue total fixado em FTA card. Foram fixadas no cartão 20 amostras de sangue, sendo 10 de pacientes com TB (5 HIV positivos e 5 HIV negativos) e 10 de pacientes sem a TB. Dos pacientes com TB, apenas uma amostra não apresentou positividade e nas amostras analisadas de pacientes sem TB, todas foram negativas para o teste realizado. palavras-chave: Tuberculose, PCR, Mycobacterium tuberculosis, FTA card, DNA. 1 Biomédica formada pela ULBRA 2 Pesquisadora do CDCT/FEPPS 3 Professora do Curso de Farmácia/ULBRA 4 Professora-orientadora do Curso de Farmácia e Biomedicina/ULBRA e PPG Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA (mrossett@terra.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

86 ABSTRACT Tuberculosis (TB) affects mainly the lungs, and the sputum is the sample of choice for diagnosis. However, this sample is often difficult to obtain and contagious for transportation and storage. Besides, the diagnosis is based on microscopy, which presents low sensitivity, and the culture is time-consuming. The aim of this study was to perform the TB diagnosis, using PCR, with total blood fixed on FTA card. Twenty blood samples were used. Ten samples were from TB positive patients (5 positive and 5 negative for HIV) and 10 from TB negative patients. Among the patients with TB, only one sample showed no positivity and samples from patients without TB, all were negative for the test performed. Keywords:Tuberculosis, PCR, Mycobacterium tuberculosis, FTA card, DNA. INTRODUÇÃO A tuberculose (TB) é a doença crônica de maior morbidade e mortalidade e continua sendo um sério problema de saúde púbica, apesar da disponibilidade de tratamentos eficazes. Brasil e Peru juntos são responsáveis por 50% de todos os casos de TB nas Américas, sendo que no Brasil, a incidência da doença é de 44 casos por habitantes (WHO, 2008). Normalmente a TB é adquirida por inalação do bacilo, que se aloja no pulmão, podendo disseminar-se para outros órgãos. O bacilo é expelido pelo paciente com TB ativa (fonte de infecção). Devido a isso o contato com pessoas doentes em ambientes fechados pode provocar a disseminação da doença (ROSSETTI et al., 2006). A TB manifesta-se clinicamente como uma doença crônica ou subaguda, a qual afeta o pulmão em aproximadamente 85% dos casos, também podendo manifestar-se em qualquer outro órgão (TB extrapulmonar). Em pacientes infectados pelo HIV o número de casos de TB extrapulmonar pode chegar a 40%. O risco anual de pessoas co-infectadas com TB e HIV desenvolver TB pode exceder a 10% (CORBET et al., 2003). Os sintomas da TB consistem em febre, tosse seca e contínua, perda ponderal, sudorese noturna, cansaço excessivo. Nos casos de TB extrapulmonar, os sinais e sintomas dependerão do órgão afetado. As localizações mais freqüentes são pleuras, linfonodos, sistema nervoso central, rins e ossos (BATES, 1980). No Brasil, o principal agente causal da TB é o Mycobacterium tuberculosis, sendo raras as doenças causadas por outras micobactérias, ao contrário dos países desenvolvidos, onde complicações pulmonares são mais frequentes em decorrência de infecções com essas micobactérias (ROSSETTI et al., 2006). M. tuberculosis pertence à ordem Actinomycetales, família Mycobacteriacea e é um dos componentes do complexo M. tuberculosis, juntamente com o Mycobacterium bovis, Mycobacterium bovis BCG, Mycobacterium microti, Mycobacterium africanum, Mycobacterium canettii, Mycobacterium caprae e Mycobacterium pinnipedii que são identificados com base em características fisiológicas, bioquímicas e de crescimento (ARANAZ et al., 1999; CATALDI; ROMANO, 2007). Os bacilos são resistentes a agentes químicos, mas sensíveis a agentes físicos como radiação ultravioleta e calor. 86 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

87 As micobactérias são um grupo de bacilos que resistem à descoloração por álcool-ácido, por possuírem uma parede celular constituída por ácidos micólicos, que conferem resistência à descoloração. São microorganismos de crescimento lento, devido a uma constituição hidrofóbica da parede celular, o que dificulta a entrada de nutrientes nas células (OPLUSTIL et al., 2004). O diagnóstico da TB, ainda é realizado, na maioria das vezes pela baciloscopia, que consiste na pesquisa do bacilo em esfregaços corados pelo método de Ziehl Neelsen. Este método apesar de prático é pouco sensível e específico. A cultura do bacilo também é utilizada, mas apesar de mais sensível, demora até 2 meses para a obtenção de um crescimento. Além disso, são poucos os locais que a realizam, uma vez que o método é laborioso e requer cuidados especiais com a biossegurança (BRASIL, 2008). Devido ao seu poder infecto-contagioso, M. tuberculosis é considerado um microorganismo de classe de risco 3 (NB3) e requer nível de biossegurança 4 (NB4) para a sua manipulação (LEVY et al., 2004). Na década de 1990 vários métodos moleculares foram desenvolvidos para detecção direta e identificação do complexo M. tuberculosis em diversas amostras clínicas. Esses métodos têm a vantagem de diminuir o tempo na obtenção dos resultados, tornando-os mais precisos para o diagnóstico (OPLUSTIL et al., 2004). A amostra utilizada para o diagnóstico de TB pulmonar é geralmente o escarro, porém o mesmo apresenta um alto poder infecto-contagioso e não pode ser obtido de alguns pacientes. Nos casos de tuberculose extrapulmonar, o material clínico pesquisado é outro, e muitas vezes são obtidas de forma invasiva como no caso de meningite tuberculosa. Por esses motivos, pesquisas com a utilização de amostras com mais facilidade na sua obtenção, tais como o sangue e urina são importantes para o diagnóstico. Sendo assim, a detecção do DNA de M. tuberculosis em amostras de sangue periférico pode ser uma alternativa para o diagnóstico da TB (TACI et al., 2003, REBOLLO et al., 2006). Para manter a acurácia dos testes e a segurança técnica no diagnóstico, as amostras utilizadas necessitam de transporte, armazenamento e manuseio adequados e rigorosos. A utilização de cartões comerciais para a conservação e transporte de amostras de vários organismos vem sendo utilizadas com essa finalidade. (OWOR et al., 2007, TACK et al., 2007, GRIMES et al., 2008, TOR- TOLI et al., 2008, WOLFGRAMM et al., 2009). Os cartões FTA Classic Cards possuem em suas fibras componentes químicos capazes de eliminar o poder infecto-contagioso dos microorganismos por romperem as membranas celulares. O processo de extração de DNA da amostra fixada no cartão é realizado utilizando reagentes que purificam o DNA retido nas suas fibras (WHATMAN, 2002). Além disso, as amostras podem ser estocadas a temperatura ambiente. Devido aos problemas apresentados, como a inespecificidade e pouca sensibilidade do diagnóstico tradicional, o alto poder infecto-contagioso da amostra, bem como os cuidados excessivos requeridos no transporte, armazenamento e manipulação da mesma, o presente trabalho teve como objetivo verificar a possibilidade de obtenção de DNA de M. tuberculosis a partir de sangue total fixado em FTA cards através da técnica de PCR. MATERIAL E MÉTODOS Foram utilizadas no estudo 20 amostras de sangue total oriundas de um banco de amostras do Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

88 Centro de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde (CDCT/FEPPS). Destas, 10 de pacientes sem TB, do qual foi usado como grupo controle, e 10 de pacientes com diagnóstico de TB através da baciloscopia e/ou cultura de M. tuberculosis. Todos os pacientes considerados positivos pelo diagnóstico tradicional, também apresentaram resultado positivo pela técnica de PCR com DNA extraído de escarro. Destas amostras dos pacientes com TB, 5 estavam co-infectados com HIV e 5 apenas com TB. As amostras de pacientes sem TB mostraram resultado negativo nos testes realizados. As amostras depois de descongeladas em temperatura ambiente foram agitadas em vórtex e centrifugadas a rpm por 15 minutos com a finalidade de concentrar a amostra. Em seguida, o sobrenadante foi desprezado e o pellet ressuspendido com 30µL de TE 1x (10mMTris/1mM EDTA, ph 8,0). Após, o material foi dotado no cartão FTA Classic Card, bem como um controle negativo de extração (TE1x), um controle positivo de extração utilizando a diluição de número 3 da escala de Mac Farland de uma cultura da linhagem H37RV de M. tuberculosis e um DNA purificado de M. tuberculosis como controle de reação de PCR. Este cartão ficou secando dentro de uma capela por um período de 24h. Após a secagem dos cartões foi dispensado o uso da capela, pois a estrutura química do cartão propicia a quebra da parece celular dos microorganismos, eliminando o seu potencial infecto-contagioso. Foi então realizada a extração de DNA segundo instruções do fabricante do cartão, a fim de eliminar impurezas e DNases, ficando apenas com o DNA retido nas fibras do cartão (WHATMAN, 2002). Após a extração as amostras foram submetida à reação de PCR. Os primers utilizados foram INS-1 (5 -CGTGAGGGCATCGAGGTGGC) e INS-2 (5 -GCGTAGGCGTCGGTGACAAA), derivados da seqüência de inserção IS6110 (HERMANS et al. 1990) gerando um fragmento de 245 pb. A enzima utilizada na reação foi a Platinum Taq DNA polimerase. Foram adicionados à reação de PCR dois discos do cartão com 0,2 µm contendo as amostras e os respectivos controles. Foram utilizados quatro controles, um negativo de extração, um negativo de reação, um positivo de extração e um positivo de extração, a fim de controlar a existência de contaminação ou de inibição na técnica e a provável etapa em que ocorreram. As concentrações de reagentes e condições de amplificação foram os mesmos utilizados por Rossetti et al (1997). Os produtos obtidos após reação de amplificação foram submetidos à eletroforese em gel de agarose a 2%, corados com brometo de etídio e visualizados em luz ultravioleta. Foram consideradas positivas as amostras que apresentaram o fragmento de DNA de 245 pb, correspondente à obtida nos controles positivos de extração e de reação. Considerou-se resultado negativo a ausência de visualização do fragmento nas amostras. RESULTADOS E DISCUSSÃO Todos os procedimentos executados para avaliar a possibilidade de obter DNA a partir de amostras de sangue total de pacientes fixados em cartão foram realizados também com os controles. Os resultados obtidos após a PCR, permitiram visualizar fragmentos de DNA correspondentes a 245 pb, conforme esperado e observado em ambos os controles positivos utilizados (extração e reação). Os controles negativos (extração e reação) mostraram-se livres de DNA de M. tuberculosis, 88 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

89 uma vez que não apresentaram o fragmento de 245 pb. Dentre as reações de PCR realizadas com as amostras dos 10 pacientes sem TB, nenhuma apresentou resultado positivo, evidenciado pela não visualização do fragmento de 245 pb. Já no caso dos 10 pacientes com diagnóstico de TB foi possível a visualização do fragmento de 245 pb em todos os pacientes co-infectados por TB e HIV e, dentre os pacientes sem co-infecção, apenas um não apresentou tal fragmento. A detecção do DNA de M. tuberculosis fixado em cartões comerciais já havia sido descrita com sucesso anteriormente, porém a mesma havia sido realizada diretamente de DNAs obtidos de culturas (TORTOLLI et al., 2008) e não de amostras clínicas, como realizado no presente trabalho. Os resultados obtidos apesar de preliminares foram bastante satisfatórios, uma vez que somente as amostras de pacientes com TB foram positivas pela técnica proposta. Apenas uma amostra de paciente com TB não foi positiva. Resultados semelhantes foram relatados por Rodrigues e colaboradores (2002), onde os autores mostraram uma sensibilidade de 95% na amplificação de DNA extraído de sangue total de pacientes com HIV. No nosso estudo, todos os pacientes com diagnóstico de TB tinham também uma amostra de escarro positiva no diagnóstico por PCR e, apesar do número amostral ser pequeno para uma comparação, já era esperado que os resultados de PCR com amostras de sangue não possuíssem a mesma eficiência que os realizados com escarro. Vários autores relataram esse fato utilizando PCR com diferentes técnicas de extração e concluíram que, embora a detecção de DNA de M. tuberculosis em amostras de sangue total apresenta-se como uma alternativa à utilização do escarro, a sensibilidade é inferior (ROLFS et al., 1995, CONDOS et al., 1996, AHMED et al., 1998, TACI et al., 2003, REBOLLO et al., 2006). Isso pode acontecer por vários motivos entre eles a inibição da reação de PCR pela hemoglobina ou quantidade insuficiente de DNA presente no sangue para servir como alvo na reação de amplificação (SPERHACKE et al., 2004). Os resultados obtidos neste trabalho demonstraram serem bastante específicos, pelo fato de não terem ocorrido resultados falso positivos e todos os pacientes sem TB apresentarem resultados negativos. CONCLUSÃO Com base nos resultados obtidos nestes testes iniciais com o protocolo padronizado utilizando o sangue total de pacientes fixado no FTA Classic Card para a detecção por PCR de DNA de M. tuberculosis, é possível inferir que, apesar do número de amostras ser baixo, a técnica apresentou resultados satisfatórios quanto à extração de DNA e rapidez para a detecção do M. tuberculosis. Também, é provável que mesmo que a amplificação de DNA por PCR a partir de sangue não seja tão eficiente quanto à de outras amostras, ainda assim, pode ser importante como exame complementar em casos quando a amostra não é escarro, como no caso de TB extrapulmonar, Para uma análise quanto a acurácia na utilização de sangue como amostra para o diagnóstico de TB e a possível influência da imunodepressão na detecção da doença, será necessário que um número maior de amostras seja analisado e comparado com o diagnóstico tradicional. AGRADECIMENTOS Agradecemos ao CNPq, a ULBRA Canoas, ao CDCT/FEPPS, que forneceram toda a estrutura Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

90 e fomento necessários para o desenvolvimento deste trabalho e à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós- Graduação da ULBRA por possibilitar a divulgação de nosso trabalho. REFERÊNCIAS AHMED, N. et al. PCR- Based Rapid Detection of Mycobacterium tuberculosis in Blood from Immunocompetent Patients with Pulmonary Tuberculosis. Journal of clinical Microbiology., v. 36, p , ARANAZ, A. et al. Mycobacterium tuberculosis subsp. caprae subsp. nov.: a taxonomic study of a new member of the Mycobacterium tuberculosis complex isolated from goats in Spain. Int J Syst Bacteriol., v. 3, p , BRASIL. Manual Nacional de Vigilância Laboratorial da tuberculose e outras Microbactérias. Brasília: Ministério da Saúde, BATES, J. H. Transmission and pathogenesis of tuberculosis. clinical chest Medicine, v. 1, n. 2, p, , CATALDI, A.; ROMANO, I. Tuberculosis caused by Other Members of the M. tuberculosis Complex. In: Palomino JC; Leão SC, Ritacco V. tuberculosis 2007: From basic science to patient care [S.l.]: Amedeo Challenge, cap. 8, p Disponível em: < Acesso em: 15 jul CONDOS, R. et al. Peripheral blood based PCR Assay to Identify Patients with Active Pulmonary Tuberculosis. the Lancet., v. 347, p , CORBET, E. L. et al. The Growing Burden of Tuberculosis: Global Trends and Interactions with the HIV Epidemic. Archives of International Medicine, v. 163, p , GRIMES, K. A. et al. PCR Based Assay Using Occult Blood Detections Cards for Detection of Diarrheagenic Escherichia coli in Specimens from U.S. Travelers to Mexico with Acute Diarrhea. Journal of clinical Microbiology, p , HERMANS, P. W. et al. Specific detection of Mycobacterium tuberculosis complex strain by polymerase chain reaction. Journal of clinical Microbiology, v. 28, n. 6, p , LEVY, C. E. et al. Manual de Microbiologia clínica para o controle de Infecção em Serviços de Saúde. Módulo II. Salvador: Agência Nacional de Vigilância Sanitária, OPLUSTIL, C. P. et al. Procedimentos Básicos em Microbiologia clínica. São Paulo: Sarver, OWOR, B. E. et al. Successful Application of FTA Classic Card Technology and Use of Bacteriophage ɸ 29 DNA Polymerase for Large scale Field Sampling and Cloning of Complete Maize Streak Virus Genomes. Journal of Virological Methods, v. 140, p , REBOLLO, M. J. et al. Blood and Urine Samples as Useful Sourses for the Direct Detection of Tuberculosis by Polymerase Chain Reaction. Diagnostic Microbiology and Infectious Disease, v. 56, n. 2, p , out RODRIGUES, V. F. et al. Characterization of pnca mutations in pyrazinamide-resistant Mycobacterium tuberculosis in Brazil. Antimicrob 90 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

91 Agents chemother, v. 49, n. 1, p , 2005 RODRIGUES, V. F. et al. Erratum: Characterization of pnca mutations in pyrazinamideresistant Mycobacterium tuberculosis in Brazil. Antimicrob Agents chemother, v. 50, n. 11, p. 3970, nov ROLFS, A. et al. Amplification of Mycobacterium tuberculosis from Peripheral Blood. Journal of clinical Microbiology, v. 33, p , ROSSETTI, M. L. R. et al. Improvement of Mycobacterium tuberculosis Detection in Clinical Samples Using DNA Purified by Glass Matrix. Journal of Microbiology Methods, v. 28, p , ROSSETTI, M. L. R. et al. (Orgs.) Doenças Infecciosas: Diagnóstico Molecular. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, SPERHACKE, R.D. et al. Detection of Mycobacterium tuberculosis by a polymerase chain reaction colorimetric dot-blot assay..international Journal tuberculosis Lung Disease, v. 8, n. 3, p , TACI, N. et al. Detection of Mycobacterium tuberculosis DNA from Peripheral Blood in Patients with HIV seronegative and New Cases of Smear positive Pulmonary Tuberculosis by Polymerase Chain Reaction. Respiratory Medicine, v. 97, p , TACK, L. C. et al. Automated Forensic DNA Purification Optimized for FTA Cards Punches and Identifiler STR based PCR Analysis. clinics in Laboratory Medicine, v. 27, p , TORTOLI, E. et al. Use of Commercial Cards for Freeing DNA from Micobacterial Strains. New Microbiologica, v. 31, p , WHATMAN. FtA Protocol: Collect, Transport and Access Nucleic Acids All at Room Temperature: WB [S.l.]: Whatman, WOLFGRAMM, E. V. et al. Simplified Buccal DNA Extraction with FTA Elute Cards. Forensic Science International: Genetics, v. 3, p , WORLD HEALTH ORGANIZATION. Global Tuberculosis Control: surveillance, planning, financing. WHO Report Disponível em: Acesso em: 15 jul Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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93 Paracetamol induz radiossensibilidade na linhagem celular derivada de glioma humano U-87 Fe l i P e um P i e r r e co n T e r 1 lu c i a n a Br o s i n a d e le o n 2 TaT i a n e v o n We r n e Ba e s 2 Fá B i o da l Be l lo 3 da n i e l Pr e T T o schuneman 4 ar o l d o Br a g a Fi l h o 5 an d r é a re g n e r 6 ad r i a n a Br o n d a n i d a ro c h a 6 iv a n a grivicich 7 RESUMO Neste estudo avaliamos o potencial radiossensibilizante do paracetamol e a participação da enzima Glutationa Peroxidase (GPx) na linhagem celular de glioma humano U-87. Após radiação com 5 Gy, a linhagem U-87 apresentou redução na fração de sobrevivência, quando comparada ao controle. A combinação do paracetamol (0,5 mm) com a radiação ionizante (2 Gy) demonstrou redução no número de colônias formadas, quando comparado com a radiação isolada. Após exposição a 2 Gy de radiação, observamos um aumento de 40% na atividade da GPx na linhagem U87. Por outro lado, a exposição ao paracetamol (0,5 mm) não alterou os níveis basais desta 1 Acadêmico do Curso de Biomedicina/ULBRA Bolsista PROICT/ULBRA 2 Acadêmica do Curso de Medicina/ULBRA 3 Mestre em Diagnóstico Genético e Molecular (ULBRA); Professor da Feevale 4 Mestre em Diagnóstico Genético e Molecular (ULBRA); Médico do Hospital Mãe de Deus de Porto Alegre 5 Médico, Serviço de Radioterapia do Hospital São Lucas da PUCRS 6 Professora do Curso de Medicina/ULBRA, PPG em Diagnóstico Genético e Molecular/ULBRA, PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA 7 Professora Orientadora do Curso de Biomedicina/ULBRA, PPG em Diagnóstico Genético e Molecular/ULBRA, PPG em Genética e Toxicologia Aplicada/ULBRA (grivicich@terra.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

94 enzima. Nossos resultados indicam que o paracetamol aumenta a sensibilidade à radiação na linhagem celular U-87, mas a GPx não está ligada a este efeito. palavras-chave: glioma humano, paracetamol, radiação ionizante, radiossensibilidade. ABSTRACT In this study, we evaluated the potential of the radio sensitizing paracetamol and participation of the enzyme GPx in the results observed in the U-87 human glioma cell line. After a 5 Gy irradiation, the U-87 cell line showed a decrease in survival fraction when compared to control. The effect of the combination of paracetamol (0.5 mm) with irradiation (2 Gy) presented a reduction in the number of colonies formed when compared with radiation itself. We observed an increase of approximately 40% in the activity of GPx in the U-87 cell line after an exposure to a 2 Gy irradiation. However, exposure to paracetamol (0.5mM) did not change the basal levels of this enzyme. Our results indicate that paracetamol increases the sensitivity to radiation in the U-87 cell line but the GPx is not related to this effect. Keywords: human glioma, paracetamol, ionizing radiation, radiosensitivity. INTRODUÇÃO Os tumores do sistema nervoso central (SNC) correspondem a 4% do total das neoplasias malignas no Brasil (MINISTÉRIO DA SAÚDE. INSTITUTO NACIONAL DO CâNCER; INCA, 2010). Desses, os gliomas representam 60 a 70% dos casos (WEN; KESARI 2008). A sua incidência aumenta de acordo com a idade com um pico entre 65 e 75 anos, onde há o predomínio das espécies mais agressivas de gliomas, particularmente os astrocitomas malignos (NEWTON, 2008). Entre estes, o Glioblastoma Multiforme (GBM) representa 25 % de todas as neoplasias do SNC (BRANDES et al., 2008). A Organização Mundial da Saúde classifica os astrocitomas em quatro estágios, baseando-se em características patológicas. O GBM, por apresentar uma proliferação celular e microvascular incontroláveis, áreas de necrose tecidual e infiltração dos tecidos adjacentes, é classificado como grau IV (FULLER; SCHEITHAUER, 2007). A patogênese do GBM apresenta diversas mutações em genes supressores tumorais e em protooncogenes que ocasionam alterações no ciclo e na diferenciação celular, favorecendo a formação das células tumorais (MILLER; PERRY, 2007). Os sinais e sintomas dos pacientes com GBM incluem cefaléia, náusea ou vômitos, e alterações no nível de consciência (ADAMSON et al., 2009). A ressecção cirúrgica máxima, seguida pela radioterapia, é o tratamento padrão para estes pacientes (DEANGELIS, 2001). A quimioterapia adjuvante pode aumentar em um a três meses a sobrevida mediana, porém, a maioria dos pacientes com GBM sofre recidiva da doença após a terapia inicial (STEWART, 2002). A quimioterapia paliativa é comumente usada no tratamento desses pacientes, mas os únicos resul- 94 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

95 tados promissores foram observados com a associação da radioterapia com o quimioterápico temozolamida (STUPP et al., 2005). Assim, a radioterapia é o principal tratamento adjuvante no GBM, entretanto as respostas terapêuticas são freqüentemente acompanhadas por radiorresistência tumoral (PETERSEN et al., 2000; HUSSAINI et al., 2002). Está bem documentado que a radiorresistência é um dos fatores associados à redução da eficácia do tratamento em GBMs (ROCHA et al., 2004). Estudos evidenciaram que as espécies reativas de oxigênio (EROs) propiciam a ação da radiação ionizante e sua produção no meio intracelular auxilia a lesão e a morte celular em GBMs (LEE et al., 2002). As lesões oxidativas ocorrem pelo desequilíbrio entre a produção de radicais livres de oxigênio e os efeitos de enzimas antioxidantes, como a glutationa peroxidase (GPx). Estas enzimas também são conhecidas como fatores de radiorresistência e quimiorresistência (FREEMAN; CRAPO, 1982). A GPx é uma seleno-enzima, cuja ação é baseada na oxidação da glutationa (GSH), ao dissulfeto correspondente (GSSH) (SALVADOR; HENRIQUES, 2004). A Glutationa é responsável pela degradação do peróxido de hidrogênio em água, protegendo as células contra a formação do radical hidroxila (WOZNIAK et al., 2007). Em células tumorais, um fator importante no tratamento radioterápico é a ação diminuída desta enzima, permitindo que as EROs sensibilizem as células tumorais à radiação ionizante a promovam a morte celular (TANRI- VERDI et al., 2007). Entretanto, a participação da GPx na radiorresistência apresenta achados conflitantes que indicam que este efeito depende do tipo celular (MANSUR et al., 2001). O paracetamol é um medicamento amplamente utilizado como analgésico, antipirético e antiinflamatório (BERTOLINI et al., 2006). Este, tem como mecanismo de ação a inibição da síntese de prostaglandinas através da inibição da enzima ciclooxigenase (COX) (SMITH, DEWITT; GARAVITO, 2000). Foi demonstrado que o paracetamol reduz a proliferação em linhagens celulares de glioblastomas (JOKI et al., 2000; BERNARDI et al., 2006), porém o mecanismo envolvido não está elucidado. Um estudo sugere que o paracetamol poderia causar radiossensibilização através da inibição da síntese de prostanóides pela COX, reduzindo o crescimento tumoral e aumentando o número de células em apoptose (BERTOLINI et al., 2006). A radiossensibilidade celular há muito tempo tem sido foco de investigação, devido sua influência nos resultado da terapia. Estudos anteriores mostram que a intrínseca radiossensibilidade das células tumorais é um importante determinante para a resposta à radioterapia. Entre as estratégias de aumentar a sensibilidade do tumor à radioterapia está a associação com medicamentos. Considerando a limitada resposta aos tratamentos dos GBMs, faz-se necessária à investigação de novas estratégias terapêuticas. Neste sentido, este estudo tem por objetivos investigar o potencial radiossensibilizante do paracetamol e avaliar a participação da enzima glutationa peroxidase (GPx) na resposta ao tratamento com radiação ionizante, na presença e ausência do paracetamol na linhagem celular de glioblastoma humano U-87. MATERIAL E MÉTODOS Linhagem Celular e Manutenção das Culturas A linhagem celular de glioblastoma humano U-87 foi adquirida da American Type Culture Col- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

96 lection (Rockville, MD, EUA) e mantida em frascos de cultura de 25 cm 2 com meio de cultura DMEM contendo 2% de L-glutamina (p/v) e 15% de soro fetal bovino (v/v), a 37 ºC em atmosfera de 5% de CO 2 e umidade relativa de 95%. Avaliação da Toxicidade do Paracetamol Culturas em triplicatas foram expostas ao paracetamol diluído em etanol (concentração máxima 1%) com doses variando de 0-10 mm (CASPER et al., 2000). A dose de IC 50 (concentração que inibe 50% do crescimento celular) do paracetamol foi utilizada associada ao tratamento com radiação. As respostas celulares ao tratamento com o paracetamol foram avaliadas através de ensaio colorimétrico com sulforodamina B (SRB) (SKEHAN; STORENG; SCUDIERO, 1990). Após 24 h de tratamento, as células foram fixadas in situ com ácido tricloroacético (TCA; 50%). O TCA foi removido com água destilada, e após serem secas, as células foram coradas com solução de SRB (0,4%). A seguir, o excesso de SRB foi removido com acido acético (1%), e o SRB ligado às proteínas foi solubilizado com Trizma base (10 mm; ph 10.5). Cada experimento incluiu um controle contendo meio de cultura ou meio de cultura com paracetamol e sem células, e células que não recebem paracetamol para servir de controle do crescimento celular. As absorvâncias foram quantificadas em comprimento de onda de 540 nm, usando um leitor de microplacas Elisa (Multiskan EX, Labsystems, Finlândia). Avaliação do Efeito da Radiação A linhagem celular U-87 foi exposta a doses de 2, 5 e 10 Gy de radiação ionizante, isolada ou associada ao paracetamol. Tal procedimento foi realizado em acelerador linear Telecobalto Theratron Phoenix Philips SR 7510 (Eindhoven, Holanda), no Serviço de Radioterapia do Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Para avaliar o efeito tardio da radiação (PE- TERSEN et al., 2000), as células foram irradiadas na presença ou ausência do paracetamol. Após tratamento, 400 células/2ml foram inoculadas em placas de 6 well, em triplicata e incubadas por 14 dias. A seguir, as células foram fixadas com etanol 70% e coradas com violeta cristal (0,1%). Apenas as colônias contendo 50 ou mais células foram contadas sob um microscópio óptico. A fração de sobrevivência (FS) foi calculada como: FS = T/C x 100; onde: T = número de colônias após tratamento e C = número de colônias nos controles não tratados. Determinação da Atividade da Glutationa Peroxidase As células foram irradiadas na presença ou ausência do paracetamol, ou expostas ao paracetamol isolado, removidas dos frascos de cultura, lavadas com PBS, sonicadas em gelo e centrifugadas. O sobrenadante foi coletado e uma alíquota utilizada para dosar proteína pelo método de Bradford (BRADFORD, 1976). A atividade da GPx foi quantificada com base no consumo do NADPH oxidado (LAWRENCE; BURK, 1976). O pellet resultante foi incubado em solução de EDTA, NaN 3, glutationa, glutationa redutase, por 10 min. Após a adição de H 2 O 2, a oxidação do NADPH foi mensurada em espectrofotômetro em comprimento de onda de 340 nm por 3 min em intervalos de 20 seg. Uma unidade da GPx é definida como a quantidade de proteína necessária para oxidar 1 µmol 96 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

97 de NAPH por min. Os resultados foram expressos em mu de GPx por mg de proteína. Análise Estatística Os resultados foram apresentados como media ± desvio padrão de três experimentos individuais. A análise de variância seguida de pós-teste de Tukey foi realizada, e as diferenças foram consideradas significativas para valores de p < 0,05. O paracetamol foi avaliado quanto ao seu efeito antiproliferativo após 24 h de exposição à droga. Como demonstrado na Figura 1, o paracetamol apresentou uma citotoxicidade dependente da dose, sendo o valor de IC 50 (dose necessária para inibir 50% do crescimento celular) foi de 1,5 ± 0,2 mm. Estes achados estão de acordo com estudos anteriores que demonstraram inibição no crescimento celular nas linhagens celulares de glioblastomas humanos SNB-19 e U-138 com doses próximas a 1 mm de paracetamol após 24 h de tratamento (CASPER et al., 2000; BERNARDI et al., 2006). RESULTADOS E DISCUSSÃO Apesar do aprimoramento nas técnicas cirúrgicas e dos tratamentos empregando a quimioterapia e a radioterapia, o prognóstico dos pacientes com GBM ainda é ruim, pois estes tumores desenvolvem mecanismos de resistência (BUTOWSKI; SNEED; CHANG, 2006; REARDON; WEN, 2006). Ainda hoje, a radioterapia é o principal tratamento pósoperatório para os GBMs (BOGLER e WELLER, 2002). É amplamente aceito que a radiorresistência intrínseca de alguns tumores é um fator limitante da resposta ao tratamento radioterápico (SNEED et al., 1994). Sabe-se que as espécies reativas de oxigênio estão implicadas na carcinogênese, particularmente na indução de morte celular (ZHONG et al., 1999). Por esse motivo as células se defendem, produzindo enzimas, como a glutationa peroxidase, que degradam essas substâncias, (ROSEN et al., 1995). Diversos trabalhos têm buscado melhorar as respostas terapêuticas, atuando principalmente na sensibilização dos tratamentos já existentes. Neste estudo investigamos a capacidade do paracetamol em radiossensibilizar a linhagem celular de glioma humano U-87, bem como a participação da enzima glutationa peroxidase nas respostas obtidas. Figura 1 - Efeito do tratamento com paracetamol (1-10 mm) na linhagem celular derivada de glioma humano U-87. Os valores representam valores de média e desvio padrão obtidos de 3 experimentos independentes. Considerando que muitos dos danos celulares desencadeados pela radiação podem ser reparados, a determinação das conseqüências a longo prazo sobre o crescimento do tumor é fundamental (HILL et al., 2004). Com esta finalidade, o efeito tardio da radiação nos cultivos celulares foi avaliado pelo ensaio de formação de colônias 14 dias da irradiação. Para isto as células foram irradiadas com 2, 5 ou 10 Gy e posteriormente, inoculadas em placas de cultivo. As frações de sobrevivência foram calculadas e os resul- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

98 tados mostraram que 2 Gy de irradiação não alterou significativamente a formação de colônias na U-87. Porém, após radiação com 5 Gy, a linhagem celular U-87 apresentou uma diminuição de cerca de 35% na fração de sobrevivência, quando comparada ao controle. E a dose de 10 Gy reduziu a fração de sobrevivência em aproximadamente 92% (Figura 2). radiação, as células foram tratadas com uma dose sub-letal de paracetamol (0,5 mm) por 4 h e a seguir irradiadas com 2 Gy (dose que apresentou pouco efeito na linhagem U-87). Após os tratamentos as células foram avaliadas quanto a formação de colônias depois de 14 dias. Os resultados são apresentados na Figura3. *, ** * * Figura 2 - Fração de sobrevivência da linhagem celular derivada de glioma humano U-87 irradiada com 2, 5 ou 10 Gy. Os valores representam valores de média e desvio padrão obtidos de 3 experimentos independentes. Os dados são apresentados como fração de sobrevivência obtida a partir da razão do número de colônias irradiadas pelo número de colônias controle, expresso em percentual. *Valor considerado significativamente diferente do controle p < 0,05. De um modo geral, é possível dizer que a linhagem U-87 é sensível aos danos induzidos pela radiação, visto que ela demonstrou inibição de crescimento dependente da dose de radiação administrada (Figura 2). De fato, estudos anteriores (ZÖLZER; STREFFER, 2002; KANG et al., 2007) verificaram que a radiação induz uma redução no potencial clonogênico em diversas linhagens celulares de GBM, incluindo a U-87. Com o objetivo de determinar se o paracetamol poderia sensibilizar a linhagem U-87 ao efeito da Figura 3 - Fração de sobrevivência da linhagem celular derivada de glioma humano U87 tratada com com 2 Gy de radiação (rad), 0,5 mm de paracetamol (para) ou com 0,5 mm de paracetamol por 4 h e após irradiadas com 2 Gy (para+rad). Os valores representam valores de média e desvio padrão obtidos de 3 experimentos independentes. Os dados são apresentados como fração de sobrevivência obtido a partir da razão do número de colônias tratadas pelo número de colônias controle, expresso em percentual. *Valor considerado significativamente diferente das células não tratadas p < 0,01. **Valor considerado significativamente diferente das células tratadas com radiação sozinha p < 0,05. Nestas condições (0,5 mm), o paracetamol isolado não demonstrou efeito citotóxico. Isto resultou na ausência de diferença significativa no número de colônias formadas após o tratamento com paracetamol (90% ± 10,4) quando comparado com as células não tratadas (98% ± 11,1). Estes resultados estão de acordo com Casper et al., (2000) que também não observaram toxicidade do paracetamol na 98 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

99 formação de colônias. Mais recentemente, em um estudo na linhagem de glioblastoma humano U-87, com outro antiinflamatório não esteroidal, o celecoxib, também não apresentou redução na formação de colônias (KANG et al., 2007). Por outro lado, o efeito da combinação do paracetamol (0,5 mm) com a radiação (2 Gy) demonstrou uma redução de 20% (p<0,05) no número de colônias formadas, quando comparado com a radiação isolada (Figura 3), sugerindo um aumento de radiossensibilidade. Nossos resultados estão de acordo com Casper et al. (2000), que demonstrou que o paracetamol aumentou a radiossensibilidade da linhagem celular de glioblastoma humano SNB-19 em 40%. Em outro estudo, o antiinflamatório não esteroidal SC-236, aaumentou a radiossensibilidade da linhagem celular de glioblastoma humano U-251 (PETERSEN et al., 2000). Tem sido demonstrado que o paracetamol pode induzir fragmentação no DNA (SHENOY; GO- PALAKRISHNA, 1977). Além disso, a radiação ionizante causa lesões no DNA de forma direta ou indireta através da formação de radicais livres (LI et al., 2001). A remoção de parte das EROs pela GPx foi proposta como uma das formas de resistência à radiação em linhagens celulares humanas (MA- RKLUND et al., 1984). Neste sentido avaliamos se a GPx estava envolvida na radiossensilização da linhagem U-87. A linhagem celular U-87 apresentou atividade basal de GPx de 20 ± 3,3 mu/ mg proteína. Após exposição a 2 Gy de radiação, observamos um aumento de aproximadamente 40% na atividade da GPx. Por outro lado a exposição ao paracetamol (0,5 mm) não alterou os níveis basais desta enzima na linhagem estudada (Figura 4). Da mesma forma, a combinação do paracetamol com radiação não alterou a atividade da GPx quando comparado com o efeito da radiação isolada (Figura 4). Estes achados indicam que o paracetamol não interfere na atividade da GPx nas nossas condições de estudo. Figura 4 - Atividade da enzima glutationa peroxidase na linhagem celular derivada de glioma humano U87 tratada com 2 Gy de radiação (rad), 0,5 mm de paracetamol (para) ou com 0,5 mm de paracetamol por 4 h e após irradiadas com 2 Gy (para + rad), após 24 h. Os valores representam valores de média e desvio padrão obtidos de 3 experimentos independentes. Os dados são apresentados como mu da GPx/mg de proteína. *Valor considerado significativamente diferente das células não tratadas p < 0,05. CONCLUSÃO Em síntese nossos dados indicam que o paracetamol aumenta a radiossensibilidade à radiação na linhagem celular derivada de glioblastoma humano U-87. Porém, este efeito não parece estar associado com a atividade da enzima glutationa peroxidase. REFERÊNCIAS * ADAMSON, C. et al. Glioblastoma multiforme: a review of where we have been and where we are going. expert Opinion on Investigational Drugs, v. 18, p , * Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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103 Ciências Exatas e da Terra

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105 Análise computacional da interação da isoniazida com as formas selvagem (wt) e mutante (G68R) da n-acetiltransferase de Mycobacterium tuberculosis Ja n a í n a Me n e z e s Pe r e z 1 ri c a r d o Ma r T i n s ra M o s 2 Millene Bo r g e s co e l h o 3 Ma r i a lú c i a ro s s e T T i 4 he r M e s lu i s ne u B a u e r d e am o r i M 5 RESUMO A tuberculose (TB) é a principal causa de morte no mundo por um agente infeccioso. A forma mais comum de tratamento da tuberculose é com o fármaco isoniazida (INH). Estudos recentes têm sugerido que a acetilação da INH pela N-acetiltransferase de Mycobacterium tuberculosis (TBNAT) possa ser uma possível causa de inativação do fármaco resultando, assim, em cepas resistentes. Neste trabalho, métodos de modelagem por homologia, docking e de simulações por dinâmica molecular foram utilizados para avaliar o efeito da mutação G68R na interação da TBNAT com a INH. Os resultados obtidos sugerem que mutações pontuais na TBNAT podem originar resistência do bacilo TB ao fármaco. palavras-chave: Mycobacterium tuberculosis, isoniazida, arilamina N-acetiltransferase, modelagem por homologia, docking. 1 Acadêmica do Curso de Química Industrial/ULBRA 2 Professor do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia do Piauí; Doutorando pelo PPG em Genética e Toxicologia Aplicada (PPGGTA)/ULBRA 3 Doutoranda pelo PPG em Genética e Toxicologia Aplicada (PPGGTA)/ULBRA 4 Professora do Curso de Farmácia e do PPG em Genética e Toxicologia Aplicada (PPGGTA) ULBRA 5 Professor-orientador do Curso de Química e do PPG em Genética e Toxicologia Aplicada (PPGGTA)/ULBRA (hlnamorim@yahoo.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

106 ABSTRACT Tuberculosis (TB) is the leading cause of death in the world from a bacterial infectious disease. The most common form of treatment of TB is with the drug isoniazid (INH). Recent studies have suggested that acetylation of INH by N-acetyltransferase from Mycobacterium tuberculosis (TBNAT) may be a possible cause of inactivation of the drug, thus resulting in resistant strains. In this work, methods of homology modeling, docking and molecular dynamics simulations were used to evaluate the effect of G68R mutation on the interaction of TBNAT with INH. The results suggest that mutations in TBNAT can be one of the causes of drug resistance of tuberculosis bacilli. Keywords: Mycobacterium tuberculosis, isoniazid, arilamine N-acetyltransferase, homology modeling, docking. INTRODUÇÃO A tuberculose (TB) é uma das doenças infecciosas que mais mortes têm causado em todo mundo (SOINI; MUSSER, 2001; ROSSETTI et al., 2002; WADE; ZHANG, 2004), sendo responsável por mais de 9 milhões de novos casos/ano e cerca de 2 milhões de mortes/ano (WHO, 2007). A tuberculose apresenta incidência global, apresentando uma taxa de crescimento de 0,4% ao ano (MACEDO et al., 2009). O Brasil apresenta o mais elevado número de casos da América Latina, sendo o sexto país do mundo com maior incidência da doença (ROSSET- TI et al., 2002). A situação da tuberculose se tornou ainda mais preocupante com propagação do vírus HIV em todo mundo, já que ele é capaz de debilitar o sistema imunológico do hospedeiro, permitindo a reativação do bacilo TB do estado latente, tornando a pessoa mais suscetível à reinfecção (ZHANG, 2004; CORBETTE et al., 2003). O ressurgimento acelerado da tuberculose, juntamente com a pandemia do HIV, ameaça o controle da doença e destaca necessidade de desenvolver fármacos novos e mais eficazes (ZHANG, 2004). Desde sua introdução em 1952 (SANDY et al., 2004; ZHANG, 2004), a isoniazida (INH) se tornou uma dos pró-fármacos de linha de frente no tratamento da tuberculose (MDLULI et al., 1998; SANDY et al., 2004). Apesar da simplicidade em sua estrutura química, o modo de ação desse prófármaco é complexo. A INH necessita da ativação pela catalase-peroxidase, codificada pelo gene KatG, para formar um composto ativo que possui efeito letal em alvos intracelulares (MDLULI et al., 1998). Baseado em experimentos in vitro, foi proposto que a ativação da isoniazida gera um alto número de espécies reativas, capazes de oxidar e acetilar grupos de proteínas (SOMOSKOVI et al., 2001). A INH representou um marco importante na quimioterapia da TB, pois se caracteriza por ser um fármaco altamente ativo e barato (ZHANG, 2004). Resistência do bacilo TB à isoniazida Situações como o abandono ou tratamento inadequado são apontadas como as causas principais para o surgimento de linhagens de Mycobacterium tuberculosis resistentes a um ou mais fármacos (ROSSETTI et al., 2002; ZHANG, 2004). A resistência ao fármaco isoniaziada foi observada logo após sua introdução (ESPINAL, 2003). O 106 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

107 mecanismo pelo qual ocorre resistência à INH tem sido atribuído a mutações individuais em inúmeros genes, como: katg, que codifica para a enzima catalase-peroxidade (KatG), inha, que codifica para a enzima 2-trans-enoil-ACP (CoA) redutase (InhA), uma enzima envolvida na síntese dos ácidos micólicos (MACEDO et al., 2009), e kasa, gene que codifica para a β-cetoacil ACP sintase (ROSSETTI, et al., 2002; MACEDO et al., 2009). Vários estudos têm mostrado que as mutações no gene katg são os principais causadores da resistência (MDLULI, K.,1998). Algumas mutações em katg reduzem em 50% a atividade da enzima catalase-peroxidade, diminuindo a capacidade de ativação da INH. Outro gene muito freqüente na resistência é o inha. Estudos estimam que mutações no gene inha sejam responsáveis por aproximadamente 25% dos casos envolvendo resistência. Arilamina N-acetiltransferases (NATs) como possível origem de resistência Além dos mecanismos de resistência mencionados anteriormente, alguns autores têm levantado a hipótese que a enzima arilamina N-acetiltransferase de M. tuberculosis (TBNAT) possa estar envolvida na resistência ao fármaco INH (PAYTON et al., 2001; BROOKE et al., 2003). Arilaminas N-acetitransferases (NATs) são enzimas citosólicas (SUZUKI et al., 2007; SIM et al., 2008) que desempenham importante papel na destoxificação e ativação metabólica de xenobióticos (LIMA; DU- PRET, 2002). Estudos têm indicado que a NAT M. tuberculosis é capaz de acetilar a INH, representando uma via adicional do metabolismo do fármaco (UPTON et al., 2001). Neste caso, a acetilação da INH pela NAT de M. tuberculosis tornaria a droga terapeuticamente inativa (UPTON et al., 2001; SANDY et al., 2004). Estudos indicam que o derivado acetilado da isoniazida possui atividade 100 vezes menor in vivo e 500 vezes menor in vitro contra a bactéria TB (UPTON et al., 2001). Neste sentido, a compreensão dos mecanismos moleculares envolvidos no desdobramento da resistência serve de auxílio para o desenvolvimento de alternativas terapêuticas visando a redução de linhagens resistentes circulantes, trazendo grandes benefícios à saúde pública (ROSSETTI et al., 2002). Este trabalho teve como objetivo empregar métodos computacionais no estudo da interação do fármaco isoniazida (INH) com isoformas da enzima N-acetiltransferase de Mycobacterium tuberculosis (TBNAT). Correlacionar os dados obtidos com o mecanismo de resistência de certas cepas do bacilo TB ao fármaco INH. MATERIAL E MÉTODOS Modelagem por homologia Modelos estruturais da TBNAT H37Rv e da TBNAT G68R foram gerados por modelagem por homologia com o emprego do programa MODEL- LER 9v7. A primeira etapa consistiu em procurar proteínas homólogas para TBNAT do M. tuberculosis H37rv (sequência de aminoácidos com código de acesso YP_ na base NCBI) cujas estruturas experimentais encontram-se disponíveis no Protein Data Bank. Foram escolhidas duas estruturas molde, NAT de M. Marinum (MMNAT), código PDB 2VFB (2,0 Å de resolução, 76% de identidade de sequência), e NAT de M. Smegmatis (SMNAT), código PDB 1W6F (2,1 Å de resolução, 61% de identidade de sequência). A sequência da isoforma Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

108 mutante G68R foi obtida a partir da alteração da posição do aminoácido glicina (G) na posição 68 por uma argina (R) no arquivo FASTA da forma selvagem. Foram gerados 100 modelos independentes para cada TBNAT, sendo escolhido o modelo que apresentou valor mais negativo para a função de energia DOPE. Dinâmica molecular das enzimas livres Duas simulações por dinâmica molecular (DM) foram realizadas usando como ponto de partida as coordenadas atômicas dos melhores modelos obtidos por modelagem por homologia para: a) arilamina N-acetiltransferase selvagem; b) arilamina N-acetiltransferase mutante (G68R). As simulações de DM foram realizadas utilizando o campo de forças GROMOS96 53a6 (OOSTENBRINK et al., 2004) implementado no pacote de programas GROMACS, versão (LINDAHL, et al., 2001; VAN DER SPOEL et al., 2005). As estruturas geradas pelas simulações de DM foram analisadas por inspeção visual, através dos programas VMD (HUMPHREY et al., 1996) e DeepView (GUEX; PEITSCH, 1997), e com o programa de licença livre LIGPLOT (WALLACE et al., 1995). As trajetórias das simulações foram analisadas utilizando-se os módulos de análise do programa GROMACS. Docking molecular Para o docking da isoniazida foram escolhidas as conformações de energia mínima, de RMSD mínimo e de RMSD máximo da etapa de produção das simulações tbnatwt e tbnatg68r. Os cálculos de docking foram realizados com o programa Autodock 4.2 (MORRIS; LIM-WILBY, 2008), escolhendo-se o algoritmo genético lamarquiano (LGA) para a busca de geometrias otimizadas. Foram atribuídas cargas Gasteiger aos átomos dos ligantes e da enzima. Para os cálculos de docking, foi empregada uma resolução de 0,375 Å para a malha de afinidade (grid), que consistiu de 40 x 40 x 40 pontos. O centro da malha de afinidade foi definido a partir das coordenadas do átomo de enxofre da cisteína catalítica (Cys70). A INH foi tratada como flexível. No receptor, os resíduos Phe38 e Tyr69 foram tratados como flexíveis. Cada simulação de docking LGA consistiu de 100 corridas independentes, sendo escolhido o número de gerações em cada corrida. O número máximo de avaliações de energia foi fixado em O elitismo foi fixado em 1, a taxa de mutação em 0,02 e a taxa de crossover em 0,80. Ao final das simulações de docking, as configurações finais dos ligantes que diferiram em menos de 1Å em RMSD foram agrupadas e analisadas como um único resultado. Dinâmica molecular das enzimas complexadas As configurações mais adequadas da INH, obtidas nos procedimentos de docking, foram usadas para as simulações do complexos. O procedimento geral das simulações dos complexos foi mesmo empregado nas simulações das enzimas livres, exceto pelo tempo de simulação, que foi de 5ns. Preparação da isoniazida A geometria molecular da isoniazida foi pré-otimizada com o método de mecânica quântica semi-empírico AM1 (Austin Model 1) (DEWAR et al., 1985) implementado no programa ArgusLab. O modelo gerado foi 108 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

109 posteriormente submetido a cálculo tipo single-point pelo método HatreeFock, implementado no programa Gaussian (FRISCH et al., 2004), com conjunto de bases 6-31G**(d,p). Neste procedimento, cargas atômicas foram geradas através do método do potencial eletrostático molecular quântico, MEP (Molecular Electrostatic Potential) (CHUANG et al., 1998), esquema CHELPG (Charges from Electrostatic Grid Based) (BRENEMAN; WIBERG, 1990). A topologia da isoniazida foi gerada através do programa ProDRG (VAN AALTEN et al., 1996). Com exceção das cargas atômicas, que foram substituídas pelas cargas CHELPG, os demais parâmetros obtidos através do ProDRG foram mantidos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Modelagem por homologia As enzimas TBNAT selvagem e mutante foram obtidas através modelagem por homologia, pois suas estruturas 3D experimentais não estão disponíveis no banco de dados Protein Data Bank (PDB). De acordo com Fullam e colaboradores (2008), a baixa solubilidade da TBNAT expressada pela via recombinante impede que se façam estudos estruturais experimentais com esta enzima. Desta forma, a modelagem por homologia foi utilizada para gerar modelos 3D das isoformas selvagem e mutante (G68R) da TBNAT. Foram utilizadas duas enzimas como estruturas moldes, a arilamina N-acetiltransferase de M. smegmatis (SMNAT) e a arilamina N-acetiltransferase de M. marinum (MMNAT). Estas enzimas foram escolhidas como molde com base no alto grau de homologia com a TBNAT (SMNAT 61% e MMNAT 76%). Na Tabela 1 são comparados os valores dos parâmetros estereoquímicos de MMNAT e SMNAT, estruturas molde, com os valores obtidos para a TBNAT selvagem e mutante. Os resultados foram gerados pelos programas PROCHECK, VERIFY 3D e ERRAT implementados no servidor SAVES (Stuctural Analysis and Verification Server). Comparando os valores obtidos para as estruturas moldes com os valores obtidos para as estruturas modelos, pode-se considerar que as estruturas geradas apresentam boa qualidade estereoquímica. Contudo, a ausência de resolução para o segmento C-terminal nas estruturas molde resultou que a região correspondente nos modelos ficasse distorcida (dados não mostrados). Assim, uma etapa adicional de refinamento foi realizada por dinâmica molecular de 10ns. Tabela 1 - Parâmetros estereoquímicos das estruturas cristalográficas usadas como molde e das estruturas modelo geradas com o programa Modeller Estrutura Procheck Fator G Verify 3D Errat Fav. a Perm. b Gen. c Des. d Die. e Glob. f 3D-1D% Esc. g Qualidade Global MMNAT 85,6 12,2 1,3 0,9-0,3-0,1 99,27 >0,2 97,34 SMNAT 90,4 9,2 0,4 0-0,22-0,07 99,64 >0,2 96,89 Tbnat-wt 89,6 9,6 0,8 0-0,13-0,14 91,9 >0,2 80,45 Tbnat-g68r 89,6 9,1 0,8 0,4 0,01-0, >0,2 85,77 a percentual de resíduos em regiões mais favorecidas; b percentual de resíduos em regiões permitidas; c percentual de resíduos em regiões generosamente permitidas; d percentual de resíduos em regiões não permitidas; e fator G (ENGH; HUBER, 1991), log probabilidade relativo aos ângulos diedros; f fator G (ENGH; HUBER, 1991), log probabilidade relativo às propriedades estereoquímicas globais; g escore Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

110 Dinâmica molecular Com as estruturas geradas a partir da modelagem por homologia foram realizadas oito simulações de dinâmica molecular distintas, que estão apresentadas na Tabela 2. Duas das simulações foram executas por 10 ns com as enzimas TBNAT selvagem e mutante não complexadas como etapa de refinamento das estruturas obtidas por modelagem por homologia. Outras seis simulações foram realizadas na forma de complexos onde a INH foi docada nas conformações de energia mínima, RMSD mínimo e RMSD máximo obtidas na etapa de produção (5-10 ns) das simulações das enzimas livres. As simulações realizadas para refinamento (tbnatwt e tbnatg68r) foram analisadas com o objetivo de avaliar o comportamento dos modelos gerados por modelagem por homologia. Foram feitas análises do desvio médio quadrático (RMSD) das posições atômicas, raio de giro (Rg), superfície acessível ao solvente (SASA), flutuação do desvio médio quadrático (RMSF) e número total de ligações de hidrogênio intramoleculares (NTLH). Tabela 2 - Resumo das simulações realizadas Simulação Identificação TBNAT Ligante Período simulado 1 tbnatwt selvagem - 10ns 2 tbnatg68r mutante (G68R) - 10ns 3 tbnatwt-inh_emin selvagem INH 5ns 4 tbnatg68r-inh_emin mutante (G68R) INH 5ns 5 tbnatwt-inh_rmin selvagem INH 5ns 6 tbnatg68r-inh_rmin mutante (G68R) INH 5ns 7 tbnatwt-inh_rmax selvagem INH 5ns 8 tbnatg68r-inh_rmax mutante (G68R) INH 5ns Em função da limitação de espaço, apenas o gráfico da análise de RMSD (Figura 1) será discutido. O gráfico de RMSD mostra o desvio médio quadrático das posições dos átomos, ou seja, o quanto a estrutura da proteína muda em relação à estrutura inicial. Neste caso, podemos observar que há uma reorganização do sistema durante a simulação e uma tendência a estabilizar a partir dos 5ns de simulação. As trajetórias mostradas no gráfico podem ser divididas em três etapas, descritas a seguir: a) termalização, onde o sistema foi lentamente aquecido até a temperatura de 310 K por 25ps; b) ambientação, período onde o sistema sofreu um processo de relaxamento, até alcançar o equilíbrio termodinâmico, c) produção, onde o sistema se encontra estabilizado, a partir dos 5ns de simulação. Nesta última etapa, os valores dos parâmetros estruturais podem flutuar em torno de um valor médio. Figura 1 - Desvio Médio Quadrático (RMSD) da estrutura da TBNAT selvagem (inferior) e da TBNAT mutante (superior), ambas na forma livre. Cálculo realizado com módulo g_rms do programa GROMACS (VAN DER SPOEL et al., 2005). 110 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

111 A Tabela 3 mostra os valores médios dos parâmetros estruturais RMSD, determinado para os carbonos alfa (Calfa) e para todos os átomos da proteína (ALL), raio de giro (Rg), superfície acessível ao solvente (SASA), e número de ligações de hidrogênio intramoleculares (NTLH) da proteína, calculados para a etapa de produção das simulações de dinâmica molecular da TBNAT selvagem e mutante (5-10 ns). De uma forma geral, pode-se considerar que estes valores estão de acordo com o que se é esperado para simulações estáveis (de AMORIM et al., 2009). Pode-se observar que, com exceção do RMSD, a diferença nos valores dos demais parâmetros é muito próxima, no caso do raio de giro, ou se encontra dentro da variação do desvio médio, no caso da superfície acessível ao solvente e do número de ligações de hidrogênio intramoleculares. A manutenção dos valores de Rg, SASA e NTLH intramoleculares nas simulações tbnatwt e tbnatg68r, combinada com a diferença significativa encontrada para o RMSD, é indicativo de que a mutação G68R provoca alterações conformacionais sutis na TBNAT. Tabela 3 - Média dos parâmetros estruturais na etapa de produção (últimos 5ns) Estrutura Calfa RMSD ALL Rg SASA NTLHintra tbnat_wt 0,21±0,01 0,24±0,01 1,86±0,01 79,62±1,83 201,13±7,84 tbnat_g68r 0,30±0,02 0,34±0,02 1,84±0,01 78,42±1,75 206,00±7,14 RMSD: desvio médio quadrático; Rg: raio de giro; SASA: superfície acessível ao solvente; NTLH: número de ligações de hidrogênio intramoleculares. As estruturas tridimensionais obtidas no final do refinamento por DM são mostradas na Figura 2. Pode-se observar que as enzimas apresentam os domínios característicos de enzimas N-acetiltransferase. A geometria Cys70, His110 e Asp127 da tríade catalítica está pré-organizada para a atividade enzimática apenas na enzima selvagem, enquanto que na TBNAT mutante a conformação das cadeias laterais afasta-se um pouco do arranjo ideal. Figura 2 - Estrutura final dos modelos da TBNAT selvagem (A) e TBNAT mutante (B) após 10 ns de simulação de dinâmica molecular. Domínio I, N-terminal (ciano), domínio II (vermelho), interdomínio (cinza), domínio III, C-terminal (amarelo). Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

112 Simulações de DM dos complexos Da etapa de produção das simulações tbnatwt e tbanatg68r foram escolhidas algumas conformações representativas, para o docking da isoniazida: conformação de menor energia potencial, conformação de menor valor de RMSD e conformação de maior valor de RMSD. A Tabela 4 apresenta os valores dos parâmetros obtidos nas simulações de docking. A anáise do docking foi concentrada nos clusters de menor energia e de maior número de conformações. Em cada cluster foi escolhida a conformação de menor energia como estrutura inicial para as simulações dos complexos. Além da análise do cluster de menor energia, foi observada a orientação do grupo NH 2 da INH em relação ao grupo SH da cisteína catalítica para a definição da conformação utilizada nas simulações de DM. Tabela 4 - Parâmetros de docking para as conformações de energia mínima, RMSD mínimo e RMSD máximo obtidas pela simulação de dinâmica molecular Conformação Sistema Energia mínima G bind (kcal/mol) Número de conformações no cluster Energia da conformação usada a - G bind (kcal/mol) Número de conformações no cluster Emin tbnat_wt -11, ,82 90 tbnat_g68r -12, ,29 5 RMSDmin tbnat_wt -10, ,46 68 tbnat_g68r -11,32 7-9,95 61 RMSDmáx tbnat_wt -10, ,81 89 tbnat_g68r -12, ,26 5 a Usada nos casos em que o cluster com maior número de conformações representou condição de ligação mais razoável que o cluster de energia mínima A INH foi docada nas conformações de energia mínima, RMSD mínimo e RMSD máximo extraídas da etapa de produção das simulações tbnatwt e tbnatg68r. Foram efetuadas as análises com o objetivo de se avaliar o modo de interação e a afinidade da isoniazida com as duas isoformas. Como parâmetros de afinidade foram considerados as distâncias entre grupos de interesse, o número de ligações de hidrogênio, o número de contatos de van der Waals e a energia livre de interação ( G bind ), que foi obtida por dois métodos: a) na simulação de docking, através da função de escore implementada no programa AUTODOCK e b) a partir na simulação de DM através do método linear interaction energy (LIE) (AQVIST e MARE- LIUS, 2001). Os valores médios de alguns parâmetros analisados são mostrados na Tabela Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

113 Tabela 5 - Parâmetros de afinidade de interação INH-NAT nas simulações de DM Simulação NLH (3-5ns) Nvdw (LIGPLOT) G bind (docking)(kcal/mol) G bind (LIE)-DM (kcal/mol) tbnatwt-inh_emin 2,31±0, ,82-10,10 tbnatg68r-inh_emin 2,26±1, ,29-10,61 tbnatwt-inh_rmin 0,67±0, ,46-9,99 tbnatg68r-inh_rmin 3,38±0,74 1-9,95-11,31 tbnatwt-inh_rmax 1,89±0, ,81-10,36 tbnatg68r-inh_rmax 4,56±0, ,26-10,81 NLH: número médio de ligações de hidrogênio calculado para a etapa de produção da DM; Nvdw: número de contatos de van der Waals calculado pelo programa LIGPLOT (estrutura final em 5ns); LIE: energia livre de ligação calculada pelo método LIE (0-5ns) Ligações de hidrogênio constituem um parâmetro importante na interação fármaco-receptor (PATRICK, 2001). O complexo da TBNAT selvagem com maior número de ligações de hidrogênio na etapa de produção ocorreu na simulação tbnatwt-inh_emin (2.31±0.89) enquanto que para o sistema TBNAT-G68R ocorreu na simulação tbnatg68r-inh_rmax (4.56±0.86). Para o sistema selvagem, o maior número de contatos, observado na simulação tbnatwt-inh_emin (NLH: 2.31±0.89; NvdW: 4) não está relacionado com a energia de interação mais favorável, encontrada na simulação tbnatwt-inh_rmax ( kcal/mol). Por outro lado, a interação da isoniazida com Cys70 é mantida somente na simulação tbnatwta-inh_rmin (dados não mostrados). Tais resultados não são surpreendentes, considerando que a interação da INH com a TBNAT selvagem é de baixa afinidade, o que pode permitir vários modos fracos de ligação, não efetivos. No caso do sistema mutante, pode-se atribuir como modo mais provável de interação aquele indicado pela simulação tbnatg68r-inh_rmin, onde é encontrada a energia de interação mais favorável ( kcal/mol) e é observada a formação de ligação de hidrogênio com Cys70. De uma forma geral, pode-se considerar que a interação da isoniazida com a isoforma mutante G68R da TBNAT é de maior afinidade do que com a forma selvagem. Levando em conta a diferença entre os valores médios de interação para as três simulações de cada sistema, o maior número de ligações de hidrogênio e a energia de interação mais favorável, tanto pelo docking quando pelo método LIE, são encontrados para a isoforma mutante da TBNAT. Aspectos estruturais que podem explicar a menor afinidade da isoniazida com a forma selvagem da TBNAT podem estar relacionados com a desestruturação da primeira fita beta da região que forma a aba (lid) do domínio C-terminal. O gráfico de RMSF (não mostrado) da TBNAT selvagem livre mostra um pico de flexibilidade nesta região, que faz face ao sítio ativo. Neste sentido, autores têm apontado a região C-terminal como importante na regulação da atividade catalítica e especificidade de NATs procarióticas e eucarióticas (PAYTON; SIM, 1998). CONCLUSÃO A qualidade estereoquímica dos modelos estruturais obtidos para as isoformas selvagem e mutante G68R da arilamina N-acetiltransferase de Mycobacterium tuberculosis é comparável com a qualidade das estruturas molde experimentais, caracterizando que os modelos são confiáveis. Comparando as estruturas Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

114 selvagem e mutante, pode-se observar que o segmento relacionado com a primeira fita beta que compõe a aba da região C-terminal é menos extenso e mais flexível na TBNAT selvagem. Parâmetros de interação equivalentes não permitiram a definição do modo mais provável de interação da isoniazida com a isoforma selvagem da TBNAT. Os resultados podem ser atribuídos à baixa afinidade entre o par fármaco-enzima. É possível considerar que a interação da isoniaziada com a isoforma mutante G68R da TBNAT é de maior afinidade do que com a forma selvagem. Como consequência, não se pode descartar a possibilidade de que mutações pontuais na região codificante do gene nat de M. tuberculosis possam gerar isoformas capazes de inativar o fármaco isoniazida. Os resultados obtidos no presente estudo podem contribuir para o planejamento de terapias mais eficientes contra a tuberculose, por duas razões: a) considerando o possível papel da TBNAT na síntese dos ácidos micólicos, esta enzima se caracteriza com um novo alvo para a terapia anti- TB; b) por outro lado, o surgimento de cepas com mutações específicas no gene nat pode levar à inativação do fármaco através da acetilação da INH. REFERÊNCIAS AMORIM, H. L. N.; NETZ, P. A.; GUIMARãES, J. A. Thrombin allosteric modulation revisited: a molecular dynamics study. Journal of Molecular Modeling, v. 16, n. 4, p , abr AQVIST, J.; MARELIUS J. The linear interaction energy method for predicting ligand binding free energies. Comb Chem High Throughput Screen, v. 4, n. 8, p , BRENEMAN, C. M.; WIBERG, K. B. Determining atom-centered monopoles from molecular electrostatic potentials. The need for high sampling density in formamide conformational analysis. J. Comput. Chem., v. 11, p , BROOKE, E. W. et al. An Approach to Identifying Novel Substrates of Bacterial Arlamine N-Acetyltransferases. Biooganic and Medicinal Chamistry, v. 11, p , CHUANG, Y. Y.; CRAMER, C. J.; TRUHLAR, D. G. The interface of electronic structure and dynamics for reactions in solution. Int. J. Quantum Chem., v. 70, p , CORBETT, E. L. et al. The growing burder of tuberculosis: Global trends and interations with the HIV epidemic. Arch Intern Med, v.163, p , DEWAR, M. J. S. et al. AM1: A New General Purpose Quantum Mechanical Molecular Model. J. Am. Chem. Soc., v. 107, p , ESPINAL, M. A. The global situation of MDR- TB. Tuberculosis (edinb), v. 83, p , FRISCH, M. J. et al. Gaussian 03: Revision C.03. [S.l.]: Gaussian, Wallingford CT, FULLAM, E. et al. Divergence of Cofactor Recognition across Evolution: Coenzyme A Binding in a Prokaryotic Arylamine N-acetyltransferase. J. Mol. Biol., v. 375, p , GUEX, N.; PEITSCH, M. C. SWISS-MODEL and the Swiss-PdbViewer: An environment for comparative protein modeling. Electrophoresis, v. 18, p , HUMPHREY, W.; DALKE, A.; SCHULTEN, K. VMD: visual molecular dynamics. J Mol Graph, v. 14, n. 1, p , LIMA, F. R.; DUPRET, J. M. 3D Modelo f Hu- 114 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

115 man Arylamine N-Acetyltransferse 2: Structural Basis of the Slow Acetylator Phenotype of the R64Q Variant and Analysis of the Active-Site Loop. Biochemical and Biophysical Research Communications, v. 291, p , LINDAHL, E.; HESS, B.; VAN DER SPOEL, D. GROMACS 3.0: A package for molecular simulation and trajectory analysis. J. Mol. Mod., v. 7, p , MACEDO, R.; AMORIM, A.; PEREIRA, E. Tuberculose multirresistente: Detecção direta em amostras respiratórias com método de genética molecular MTBDRplus. Revista Portuguesa de pneumologia, v. 15, p , MDLULI, K. et al. Inhibition of a Mycobacterium tuberculosis ß-Ketoacyl ACP Synthase by Isoniazid. Science, v. 280, p , MORRIS, G. M.; LIM-WILBY, M. Molecular docking. In: KUKOL, A. Molecular Modeling of Proteins. Totowa: Humana Press, p OOSTENBRINK, C. et al. A biomolecular force field based on the free enthalpy of hydration and solvation: the GROMOS force-field parameter sets 53A5 and 53A6. J. Comput. Chem., v. 25, p , PATRICK, G. L. An Introduction to Medicinal Chemistry. 2. ed. Oxford Oxford University Press, PAYTON, M. et al. Evidence towards the role of arylamine N-acetyltransferase in Mycabacterium smegmatis and development of specific antiserum against the homologous enzyme of Mycobacterium tuberculosis. Microbiology, v. 147, p , PAYTON, M. A.; SIM, E. Genotyping human arylamine N-acetyltransferase type1 (NAT1): the identification of two novel allelic variants. Biochem. Pharmacol, v. 55, p , ROSSETTI, M. L. R. et al. Tuberculose resistente: revisão molecular. Ver. Saúde Pública, v. 36, p , SANDY, J. et al. Binding of the anti-tubercular drug isoniazid to the arylamine N-acetyltransferase protein from Mycobacterium tuberculosis. Protein science, v. 14, p , SIM, E. et al. Arylamine N-acetyltranferases: Structural and functional implications of polymorphisms. Toxicology, v. 254, p , SOINI, H.; MUSSER, J. M. Molecular diagnosis of mycobacteria. Clin chem, v. 47, p , SOMOSKOVI, A.; PARSONS, L. M.; SALFIN- GER, M. The molecular basis of resistence to isoniazid, rifampin, and pyrazinamide in Mycobacterium tuberculosis. Respir Res, v. 2, p , SUZUKI, H.; OHNISHI, Y.; HORINOUCHI, S. Arylamine N-Acetyltransferase Responsible for Acetylation of 2-Aminophenols in Streptomyces griseus. Journal of Bacteriology, v. 189, n. 5, p , UPTON, A. M. et al. Arylamine N-acetyltransferase of Mycobacterium tuberculosis is a polymorphic enzyme and a site of isoniazid metabolism. Molecular Microbiology, v. 42, n. 2, p , VAN AALTEN, D. M. F. et al. PRODRG, a program for generating molecular topologies and unique molecular descriptors from coordinates Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

116 of small molecules. J. Comp. Aid. Molec. Des., v. 10, p , VAN DER SPOEL, D. et al. GROMACS: Fast, Flexible, and Free. J Comput Chem., v. 26, p , WADE, M. M.; ZHANG, Y. Mechanisms of drug resistence in Mycobacterium tuberculosis. Frontiers in Bioscience, v. 9, p , WALLACE, A. C.; LASKOWSKI, R. A.; THORNTON, J. M. LIGPLOT: A program to generate schematic diagrams of protein-ligand interactions. Prot. Eng., v. 8, p , WORLD HEART ORGANIZATION. Global Report Disponível em: int/tb/publications/global_report/2009/en/ index.html Acesso em: 15 jul ZHANG, Y. The Magic bullets and tuberculosis drug targets. Annu Rev Pharmacol Toxicol, v. 45, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

117 Determinação da curva característica do solo de uma barreira capilar: uma alternativa para um sistema de cobertura de aterros sanitários al e x a n d r e Pe T r y ca r n e i r o 1 Ju l i a Fa n T i 1 ro d r i g o Mo r a e s da silveira 2 al B e r T We l z e l 3 Fl á v i a schenato 4 RESUMO Curva característica (CC) é a relação entre a quantidade de água presente dentro dos poros e a sucção do solo. A partir da CC pode-se definir a capacidade de um solo de armazenar água quando o mesmo é submetido a diferentes valores de sucção. A CC do trabalho em questão foi obtida a partir de corpos de prova com índice de vazios (e) equivalente as propriedades físicas do solo moldado em um protótipo barreira capilar (e=1.24) e teor de umidade de 37%, que equivale a um grau de saturação de 89%. Com os resultados obtidos é possível estabelecer a variação do teor de umidade do solo em função sucção e com isso estimar a quantidade de água que poderá infiltrar na barreira capilar em função do balanço hídrico. palavras-chave: curva característica, barreira capilar, aterro sanitário. 1 Acadêmico(a) do Curso de Engenharia Ambiental/ULBRA - Bolsista PROICT/ULBRA 2 Pesquisador PNPD-CAPES, ULBRA 3 Engenheiro Químico Aluno do PPG em Engenharia/ULBRA 4 Professor-orientador do Curso de Engenharia Ambiental/ ULBRA (fschenato@yahoo.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

118 ABSTRACT Characteristic curve (CC) is the ratio between the amount of water present inside of the soil s pores and soil s suction. Using the CC is possible to define the soil s capacity to store water when it is subjected to different values of suction. The CC of this paper was obtained using specimens with void ratio (e) equivalent to the physical properties of a wrapped soil in a prototype capillary barrier (e = 1.24) and with moisture content of 37%, which equates to a degree of saturation equal to 89%. Analyzing the results is possible to establish the variation of moisture content of soil versus suction and thereby estimate the amount of water that can seep into the capillary barrier in function of the water balance. Keywords: characteristic curve, capillary barrier. INTRODUÇÃO O presente trabalho apresenta resultados de ensaios geotécnicos realizados em um solo utilizado como camada capilar moldada subjacente a uma camada oxidativa, as quais compõem um protótipo desenvolvido no PPGEAM/ULBRA, para fins de estudo de um sistema de cobertura para aterros sanitários. O desenvolvimento do protótipo visa o controle simultâneo dos processos de retenção de água na camada capilar e os processos de oxidação do metano na camada oxidativa (HAUSER, 2009). Os ensaios geotécnicos realizados compreenderam aos ensaios de caracterização e ao ensaio de curva característica (CC). Os ensaios de caracterização geotécnica consistiram na determinação dos índices físicos, limites de Atterberg, análise granulométrica além da descrição e classificação dos solos. Os procedimentos utilizados na determinação das características do solo constituem práticas usuais em laboratórios de mecânica dos solos e encontram-se normatizados. A importância quanto à realização destes ensaios reside no fato de que as propriedades obtidas refletem a composição dos solos. Conforme já citado, foram realizados também ensaios de curva característica, que define a relação entre a quantidade de água presente dentro dos poros do solo e a sucção. A quantidade de água dos poros pode ser quantificada em termos do teor de umidade volumétrico (θ), teor de umidade gravimétrico (w) ou em termos do grau de saturação (S r ). A partir da CC pode-se definir a capacidade de um solo de armazenar água quando o mesmo é submetido a diferentes valores de sucção. É importante salientar que, em um sistema do tipo barreira capilar, é de fundamental importância a verificação da capacidade do solo reter a água e com isso estimar a quantidade de água que poderá ingressar na barreira capilar, em função do balanço hídrico. Os ensaios citados foram realizados no Laboratório de Solos da ULBRA. CURVA CARACTERíSTICA O objetivo principal da determinação da curva característica é a obtenção da relação entre a água presente nos poros do solo e sua sucção (GORS- COVICH, 2001). O volume de água presente no solo é quantificado em termos do teor de umidade volumétrico (θ), que é a relação entre o volume de água e o volume total da amostra; teor de umidade gravimétrico (w), que é a relação entre o peso da quantidade de água e o peso dos sólidos; ou em termos do grau de saturação (S r ). Existem dois tipos de sucção, uma é conhecida como sucção mátrica, 118 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

119 expressa pela diferença entre a pressão de ar e a pressão de água exercida no solo, e a outra é a sucção osmótica, expressa pelas diferentes concentrações de sais presentes no solo. A sucção total é dada pela soma da sucção mátrica com a sucção osmótica. Segundo Fredlund e Xing (1994), para sucções maiores que 1500 kpa a sucção mátrica e total podem ser consideradas equivalentes. A ocorrência de fluxo de água no solo só inicia após ultrapassado um certo valor de sucção, conhecido como valor de entrada de ar, e simbolizado por ψb. Esse valor varia de acordo com o tipo de solo e identifica o ponto em que o ar começa a entrar no maior poro do solo não saturado. Após esse ponto a curva característica apresenta uma zona de transição, onde o teor de umidade reduz-se sensivelmente com o aumento do valor de sucção. Essa zona termina no ponto de saturação residual que representa o teor de umidade a partir do qual se torna difícil remover água do solo por drenagem. A forma da curva característica é influenciada por diversos fatores, como: tipo de solo (representado pelo tamanho de grãos e composição mineralógica), estrutura e agregação, teor de umidade inicial, história de tensões, índice de vazios, método de compactação, história de umedecimento e secagem, entre outros (TINJUM et al, 1997; VANAPALLI et al, 1999; GERSCOVICH, 2001). NBR 7181 (1988). Os ensaios de caracterização foram realizados com a secagem prévia do solo. Os ensaios de granulometria foram realizados com e sem a utilização de agente defloculante (hexametafostato de sódio) para verificar a influência do agente na desagregação dos finos do solo e a presença de material fino agregado, característica de alguns solos argilosos. Para a obtenção da curva característica do solo foi empregado o método das panelas de pressão (RICHARDS, 1965). O sistema utilizado para a realização do ensaio é composto por panelas de pressão, placa cerâmica porosa interna e equipamentos de produção e controle de pressão, podendo ser usado para o ensaio, amostras indeformadas ou deformadas (Figuras 1 e 2). MATERIAL E MÉTODOS Para a realização dos ensaios foi amostrado aproximadamente 1 kg de solo (solo utilizado como camada capilar da barreira do protótipo montado no CEPPED/ULBRA) conforme as recomendações da ABNT NBR 9604 (1986). Os ensaios de caracterização seguiram as recomendações das seguintes normas brasileiras: ABNT NBR 6457 (1986), ABNT NBR 6508 (1984), ABNT NBR 6459 (1984), ABNT NBR 7180 (1988), ABNT Figura 1 - Equipamento para ensaios de Curva Característica Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

120 Figura 2 - Corpos de prova ensaiados A placa cerâmica porosa interna possui vazios muito pequenos que permitem, dentro de certos limites, o fluxo de água, porém não o de ar. O ensaio consiste na utilização das panelas de pressão para aplicação de diferentes valores de pressão, em corpos de prova de solo saturado, moldadas em anéis com 2 cm de altura e 4,5 cm de diâmetro, fazendo com que a água seja expulsa do solo até que se estabeleça um equilíbrio entre a pressão anterior e a pressão aplicada. Neste trabalho, para a realização dos ensaios, foram utilizados 6 corpos de prova. Após o equilíbrio das pressões são determinados os teores de umidade do solo de acordo com o potencial matricial aplicado [sucção (S)]. Nos ensaios realizados as amostras deformadas foram moldadas com teores de umidade (w) aproximados de 37% o qual equivale a um grau de saturação (S r ) de 89% e índice de vazios (e) equivalentes a 1,24 (índice de vazios de moldagem da camada capilar do protótipo). A umidade do solo foi equilibrada de acordo com as pressões aplicadas que variaram de 10 a 1000 kpa. O tempo necessário para estabilização do teor de umidade do solo equivaleu a 48 horas para cada pressão aplicada. Imediatamente após atingir o equilíbrio cada amostra foi pesada para posterior cálculo do teor de umidade. O peso seco dos corpos de prova foi definido após a aplicação da última pressão de ensaio. É importante salientar aqui que posteriormente serão realizados ensaios de CC seguindo o método do papel filtro o qual permite medir sucção matricial em amplos limites ( kpa) (MARINHO, 1995). RESULTADOS E DISCUSSÃO A Tabela 1 apresenta os resultados de caracterização geotécnica do solo estudado. As características de plasticidade indicam que o solo apresenta índice de plasticidade (IP) menor que 15, o que caracteriza o material como medianamente plástico (7<IP<15). Analisando os demais dados da Tabela 1, observa-se que o solo estudado apresenta uma diferença insignificante de granulometria, em função do uso do agente defloculante. O solo apresenta percentual de finos em torno de 40%. Entretanto, a quantidade de areia média se equivale a este valor. De acordo com a USCS [ASTM Standard Practice for Classification of Soils for Engineering Purposes (Unified Soil Classification System)] o solo ensaiado é classificado como silte de alta compressibilidade [sandy elastic silt (MH)]. 120 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

121 Tabela 1 - Resultados dos ensaios de caracterização ϒs LL (%) IP (%) Granulometria - Porcentagem passante (%) argila (%) silte (%) areia fina (%) areia média (%) areia grossa (%) pedregulho 29,3 36,9 14,4 22/(16*) 21/(23*) 8/(11*) 37/(45*) 12/(5*) 0/(0*) Resultados sem o uso de agente defloculante: (x*) A Figura 3 mostra a curva característica do solo estudado em termos do teor de umidade volumétrico versus sucção. A mesma expressa a variação da quantidade de água dentro dos poros do solo quando este é submetido a diferentes valores de sucção, em trajetória de secagem. * (a) Figura 3 Curva característica obtida (a) e (b). (b) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

122 A curva característica apresentada na Figura 3 (a e b) sugere que o solo estudado apresenta um comportamento típico de solo argiloso. O solo apresenta um valor de entrada de ar equivalente a 10 kpa conforme mostrado na Figura 3b. Aubertin et al. (1998) apresentaram faixas de variação do valor de entrada de ar (y b ) de acordo com o tipo de solo sendo que o solo ensaiado enquadra-se com silte (y b = kpa). A quantidade de água que o solo ensaiado é capaz de reter equivale a sua capacidade de campo. De acordo com Marinho e Stuermer (2000), a capacidade de campo é definida para sucções equivalente a 30 kpa. Assim sendo, de acordo com os resultados obtidos, a capacidade de campo do solo estudado equivale a aproximadamente 40%, conforme destacado na Figura 3a (asterisco e identificação dos autores). CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com os ensaios de Limites de Atterberg o solo pode ser classificado como mediamente plástico e corresponde a solos siltosos, conforme a norma americana ASTM Os ensaios de granulometria realizados conforme a ABNT, com e sem o uso do agente defloculante, mostra que o solo possui 40% de finos e 40% de areia média, sendo assim classificado como areno siltoso. A curva característica mostrou valor de entrada de ar de 10 kpa (valor característico de solo siltoso) e uma capacidade de campo de 30 kpa. Os ensaios até então realizados mostram que o solo não é o mais favorável para a camada capilar da barreira devido à baixa porcentagem de argila, entretanto, o mesmo deve ser ainda analisado quanto a sua condutividade hidráulica. AGRADECIMENTOS Os autores deste trabalho agradecem o financiamento da pesquisa à CAPES, ao CNPq e à Propesq/ULBRA. REFERÊNCIAS ASSOCIAçãO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9604: Abertura de Poço e Trincheira de Inspeção em Solo com Retirada de mostras Deformadas e Indeformadas. Rio de Janeiro, NBR 6457: Amostras de solo Preparação para ensaios de compactação e ensaios de caracterização. Rio de Janeiro, NBR 6508: Grãos de solos que passam na peneira de 4,8 mm Determinação da massa específica. Rio de Janeiro, NBR 6459: Solo Determinação do Limite de Liquidez. Rio de Janeiro, NBR 7180: Solo Determinação do Limite de Plasticidade. Rio de Janeiro, NBR 7181: Solo Análise Granulométrica. Rio de Janeiro, AUBERTIN, M.; RICARD, J. F.; CHAPUIS, R. P. A predictive model for the water retention curve: application to tailings from hard-rock mines. canadian Geotechnical Journal, v. 35, p Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

123 FREDLUND, D. G.; XING, A.; HUANG, S. Predicting the permeability function for unsaturated soils using soil-water characteristic. canadian Geotechnical Journal, v. 31 n. 3, p , GERSCOVICH, D. M. S. Equações Para Modelagem da Curva Característica Aplicada a Solos Brasileiros. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE SOLOS NãO SATURADOS, 4., 2001, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: ABMS, p HAUSER, V. L. evapotranspiration covers for landfills and waste sites. [S.l.]: CRC, MARINHO, F. A. M. A técnica do papel filtro para a medição de sucção. In: ENCONTRO SOBRE SOLOS NãO SATURADOS, 1995, Porto Alegre. Anais Porto Alegre, p MARINHO, F. A. M.; STUERMER, M. M. The influence of the compaction energy on the SWCC of a Residual Soil. Proceeding of sessions of geo-denver, Geotechnical special publication, n. 99, p , RICHARDS, L. A., Physical conditions of water in soil. In: BLACK, C. A. et al. (Eds.). Methods of soil analysis - Physical and mineralogical properties, including statistics of measurements and sampling. Madison: ASASSSA, p , TINJUM, J. M.; BENSON, C. H.; BLOTZ, L. R. Soil-water characteristic curves for compacted clays. Journal of Geotechnical and Geoenvironmental engineering, v. 123, n. 11, p , VANAPALLI, S. K.; FREDLUND, D. G.; PU- FAHL, D. E. The influence of soil structure and stress history on the soil-water characteristic of a compacfted till. Géotechnique, v. 49 n. 2, p , abr Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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125 Mineralogia da mina Andreazza, Vila Nova do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil da r c s o n vieira d e Fr e i Ta s 1 lu i s an d r e Ba P T i s Ta 1 Pa u lo cé s a r Pe r e i r a d a s ne v e s 2 RESUMO O presente estudo apresenta a diversidade mineralógica de uma mineradora de calcário (mina Andreazza), situada na região do Escudo Sul-rio-grandense, Vila Nova do Sul, RS, Brasil. Foram identificados em nível de espécie 15 minerais (calcita, fluorita, grafita, diopsídio, calcopirita, pirita, galena, esfalerita, titanita, allanita-ce, talco, prehnita, muscovita, quartzo e calcantita), além de outros cinco em nível de grupo (feldspato-k, apatita, olivina, clorita e argilo-minerais). A presença desta assembléia mineralógica demonstra a importância de trabalhos nesta temática, que devem ser estendidos para outros ambientes do Estado do Rio Grande do Sul. palavras-chave: mineralogia, Vila Nova do Sul, Escudo Sul-rio-grandense. ABSTRACT This paper presents the mineralogical diversity of a calcareous mining (Andreazza mine), located in the Sul-rio-grandense Shield, Vila Nova do Sul county, RS, Brazil. Fifteen minerals were identified at species level (calcite, fluorite, graphite, diopside, chalcopyrite, pyrite, galena, sphelerite, titanite, allanite-ce, talc, prehnite, muscovite, quartz, and chalcantite), and others five only at group level (K-feldspar, apatite, olivine, chlorite, and 1 Acadêmico do Curso de Química Industrial/ULBRA Bolsista PROICT/ULBRA 2 Professor-Orientador - Laboratório de Geologia e Mineralogia do Curso de Química Industrial/ULBRA (nevespc@yahoo.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

126 clay-minerals). The presence of this mineralogical assembly shows the importance of this kind of study in another places of Rio Grande do Sul state. Keywords: mineralogy, Vila Nova do Sul county, Sul-rio-grandense Shield. INTRODUÇÃO A mineralogia global das minerações ativas ou inativas, ocorrentes no Estado do Rio Grande do Sul, encontra-se em um nível muito incipiente de conhecimento. Poucos autores trataram do tema até o momento, como Ribeiro (1978), que descreveu os depósitos dos minerais de minério de cobre ao longo do Escudo Sul-rio-grandense, além de Branco e Gil (2002), que situam as principais jazidas de minerais de interesse gemológico ocorrentes ao longo de todo o Estado, ambos sem a preocupação de descrever e qualificar os demais minerais ocorrentes nos locais, tanto em nível de paragênese, quanto de produtos de alteração. Este trabalho é parte do projeto intitulado Diversidade mineralógica no estado do Rio Grande do Sul, desenvolvido pelo Laboratório de Geologia e Mineralogia da Universidade Luterana do Brasil, que tem como objetivo principal descrever a grande diversidade de minerais ocorrente nos diversos ambientes geológicos de nosso Estado. Os minerais aqui determinados pertencem às ocorrências da mina Andreazza, uma mineradora de calcário localizada no terreno Vila Nova, Escudo Sul-rio-grandense ( S; W), na toponímia do Cerro da Cadeia, cerca de 6 km a oeste da cidade de Vila Nova do Sul (Figura 1). Figura 1 Mapa de localização da mina Andreazza. A mina Andreazza geologicamente constitui-se numa seqüência carbonática composta por mármores predominantemente calcíticos do Complexo Cambaizinho, envolta tectonicamente por rochas gnáissicas de natureza tonalítica, mais jovens pertencentes ao Complexo Cambaí, estando situada na porção oeste do Complexo Dom Feliciano, no Escudo Sul-rio-grandense (SANTOS; MACIEL 126 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

127 ; MOSMANN,1989; SAALMANN; REMUS; HARTMANN,2005; 2006; PHILIPP; JUNGERS; BITENCOURT, 2008). MATERIAL E MÉTODOS Foram realizadas saídas em campo para coleta dos litotipos componentes da mina Andreazza. Em laboratório as amostras foram investigadas por métodos físicos e químicos de identificação mineralógica (NEVES; SCHENATO; BACHI, 2008). A seguir foram confeccionadas lâminas delgadas para análise em microscopia óptica em luz natural (LN), polarizada (LP), com auxílio de Deer, Howie e Zusmann (1981). Minerais de alteração foram determinados pela técnica de difratometria de raios X (DRX), em difratômetro Siemens 9500, com radiação CuKα, de comprimento de onda 1,5409 Å em intervalo de 2 a 80 2θ, com 0,02 2θ/s. As nomenclaturas, sistemas cristalinos e composições químicas dos minerais investigados seguiram Beck e Mandarino (2008), conforme preconizações da International Mineralogical Association (IMA). RESULTADOS E DISCUSSÃO Os litotipos identificados na mina Andreazza, da base para o topo, foram: mármore, gnaisse e xisto, além de bolsões esparsos de minerais metálicos e granitóides ricos em veios feldspáticos. Pelas técnicas mineralógicas utilizadas foi possível identificar 15 minerais em nível de espécie e outros cinco em nível de grupo. A Tabela 1 mostra os 15 minerais identificados em nível de espécie e as respectivas técnicas utilizadas. Tabela 1 Minerais identificados em nível de espécie na mina Andreazza. Mineral Sistema Cristalino Composição Química Técnica 1.Calcita Trigonal CaCO 3 Físicos/químicos 2.Fluorita Cúbico CaF 2 Físicos 3.Grafita Hexagonal/trigonal C Físicos 4.Diopsídio Monoclínico CaMgSi 2 O 6 Físicos/LP 5.Calcopirita Tetragonal CuFeS 2 Físicos 6.Pirita Cúbico FeS 2 Físicos 7.Galena Cúbico PbS Físicos/LP 8.Esfalerita Cúbico ZnS LP 9.Quartzo Hexagonal/trigonal SiO 2 Físicos 10.Titanita Monoclínico CaTiOSiO 4 LP 11.Allanita-Ce Monoclínico (Ca,CE,La) 2 (Al,Fe 2+,Fe 3+ ) 3 Si 3 O 12 (OH) LP 12.Talco Monoclínico/triclínico Mg 3 Si 4 O 10 (OH) 2 LP 13.Prehnita Ortorrômbico Ca 2 Al 2 Si 3 O 10 (OH) 2 LP 14.Muscovita Monoclínico KAl 2 AlSi 3 O 10 (OH) 2 LP 15.Calcantita Triclínico Cu 2+ SO 4.5H 2 O Difração raios X Foram identificadas, em campo e em laboratório (pelo uso de microscópio estereoscópico), as propriedades físicas dos seguintes minerais: calcita, fluorita, pirita, calcopirita, diopsídio, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

128 quartzo, muscovita, feldspato e grafita. Com o uso de microscopia óptica, no laboratório de Petrologia Metamórfica do Departamento de Mineralogia e Petrologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pelas técnicas de luz natural, luz polarizada e luz refletida, foram determinados os seguintes minerais nas litologias da Mina Andreazza: titanita, allanita-ce, talco, prehnita, apatita, galena, esfalerita, além de clorita e argilo-minerais. As investigações mineralógicas permitiram identificar em nível de espécie as substâncias: calcita (associada à fluorita e em cristais isolados, relacionada às rochas carbonáticas); fluorita (nas rochas carbonáticas, em belos cristais roxos nos planos de fratura das rochas); grafita (na forma de massas pulvurolentas, impregnando grafita xistos); diopsídio (na forma de diminutos cristais prismáticos, coloração verde-claro, nas rochas carbonáticas); calcopirita (na forma de cristais disseminados de coloração amarelo-latão, associados à fluorita, nas rochas carbonáticas); pirita (em grãos na forma de hexaedros combinados com octaedros, nas rochas carbonáticas; galena (ocorrência rara, em bolsões, associada à esfalerita determinada em microscopia óptica à luz transmitida e, também em campo, nos diques); esfalerita (ocorrência rara, em bolsões associada à galena determinada em microscopia óptica à luz refletida, além do brilho típico resinoso) e quartzo (comum nos gnaisses e nos filões feldspáticos). Além desses foram encontrados titanita, allanita-ce, talco, prenhita e muscovita em análises petrográficas. Um mineral de coloração azul (disseminado ao longo das fraturas) somente pode ser determinado pela técnica de difratometria de raios X, sendo classificado como calcantita (CuSO 4.2H 2 O). Sua ocorrência nas litologias da Mina é devido à oxidação da calcopirita CuFeS 2, mineral muito abundante no local, que se dá pela seguinte reação: CuFeS2 + 2H2O + 2O2 FeS + CuSO4.2H2O Em nível de grupo foram identificados feldspato-k, apatita, olivina, cloritas e argilo-minerais. CONCLUSÃO Os resultados demonstram ser a mina Andreazza um ambiente geológico bastante diversificado em relação a sua mineralogia. Isto se evidencia pelos minerais identificados em nível de espécie (calcita, fluorita, grafita, diopsídio, calcopirita, pirita, galena, esfalerita, titanita, allanita-ce, talco, prehnita, muscovita, quartzo e calcantita) e de grupo (feldspato-k, apatita, olivina, cloritas e argilo-minerais). O presente trabalho é inédito em termos de inventário mineralógico das minas do Rio Grande do Sul. Com isso, já se começa a ter um panorama da grande diversidade mineralógica do Estado, a partir do estudo sistemático de uma mineradora do Escudo Sul-rio-grandense. Com o prosseguimento dos estudos outras mineradoras serão contempladas. REFERÊNCIAS BECK, M.; MANDARINO, J. A. Fleischer s glossary of mineral species Tucson: The Mineralogical Record, p. BRANCO, P. M.; GIL, C. A. Mapa gemológico do estado do Rio Grande do Sul. 2. ed. Porto Alegre: CPRM, DEER, W. A.; HOWIE, R. A.; ZUSSMAN, J. 128 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

129 Minerais constituíntes das rochas uma introdução. Lisboa: Kaloute Gulbenkian, p. NEVES, P. C. P. das, SCHENATO, F.; BACHI, F. A. Introdução à mineralogia prática. 2. ed. Canoas: ULBRA, p. PHILIPP, R. P.; JUNGERS S. L.; BITENCOURT, M. F. Isótopos de Nd dos Complexos Neoproterozóicos Cambaí e Cambaizinho, Terreno, Vila Nova: implicações para a evolução do Cinturão Dom Feliciano no RS. In: CONGRESSO BRA- SILEIRO DE GEOLOGIA, 44, 2008, Curitiba. Anais... Curitiba: SBG, RIBEIRO, M. J. Mapa previsional do cobre no Escudo Sul-rio-grandense. Brasília: DNPM, SAALMANN, K.; REMUS, M. V. D.; HART- MANN, L. A. Geochemistry and crustal evolution of volcano-sedimentary sucessions and orthogneisses in the São Gabriel block, Southernmost Brazil Relicts of Neoproterozoic magmatic arcs. Gondwana Research, v. 8, n. 2, p , Tectonic evolution of the Neoproterozoic São Gabriel block, southern Brazil: constraints on Brasiliano orogenic evolution of the Rio de la Plata cratonic margin. Journal of South American Earth Sciences, v. 21, p , SANTOS, E. L. dos; MACIEL, L. A.; MOS- MANN, R. Mapa geológico do estado do Rio Grande do Sul 1: Brasília: DNPM, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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131 Ciências Humanas

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133 Aprendendo a ser criança nas canções Ro b e Rta d e Cá s s i a La R s e n 1 Ma R i a Lú C i a Ca s ta g n a Wo R t M a n n 2 RESUMO O estudo focalizou 10 canções que circularam em uma escola municipal de educação infantil de Porto Alegre, RS. Argumentamos que as canções atuam não só como entretenimento, mas como pedagogias culturais que possuem efeitos produtivos importantes nas identidades infantis (STEINBERG; KINCHELOE, 2001;, GIROUx, 1995, 2001). A música invadiu o mundo infantil, povoando recreios e salas de aula. Canta-se (e dança-se) para aprender a lavar as mãos, tomar banho, escovar os dentes, conhecer os animais, vegetais, o corpo humano, os alimentos, para aprender a contar etc. Mas entre as canções trazidas pelos alunos, algumas assustam as professoras pelo teor de suas letras e por carregarem na sexualidade das coreografias. palavras-chave: estudos culturais, pedagogias culturais, canções. ABSTRACT This work has studied 10 songs circulating in a municipal children s education school in Porto Alegre (RS). We have argued that songs have effects both as entertainment and cultural pedagogy which has useful effects on children s identities (STEINBERG; KINCHELOE, 2001; GIROUx, 1995, 2001). Music has come over children s world, in school recess time and classrooms. You can sing (and dance) to wash the hands, to have a shower, 1 Acadêmica do curso de Pedagogia/ULBRA. Bolsista PROICT/ ULBRA 2 Professora- Orientadora do Curso de Pedagogia e do PPG Educação/ULBRA (wortmann@terra.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

134 brush the teeth, know animals, vegetables, the human body, food, to learn to tell stories, etc. However some songs students bring to the classroom causes teachers to be alarmed of their content and sexuality in their dances. Keywords: Cultural studies, cultural pedagogies, songs. INTRODUÇÃO A música tem instigado os sujeitos a comemorar e a participar de atividades de recreação, lazer, artísticas, cívicas, ritualistas e religiosas, tendo presença intensa nas sociedades contemporâneas. Ela invadiu o mundo infantil de muitas formas! Assim, mesmo em uma incursão superficial às prateleiras de lojas de artigos infantis, encontraremos muitos objetos musicais - desde chocalhos, que entretêm as crianças desde a Antiguidade, até uma quantidade de livrinhos musicais, CD`s, DVD`s entre outros artefatos voltados a interessá-las, a partir da utilização de sons e ritmos. Pode-se dizer, inclusive, ter havido uma verdadeira invasão da música no universo infantil, processada através de diversas instâncias culturais, pois são cada vez mais numerosos os programas televisivos endereçados ao público infantil 1, nos quais as personagens que animam os pequenos cantam e dançam constantemente. Além disso, a música está igualmente presente em ofícios religiosos, nas peças de teatro infantil e também nas festas infantis, de um modo geral. Pode-se dizer, ainda, que se tem associado a música a gestações tranquilas 2 e ao lazer, ao bom 1 Referimo-nos, por exemplo, à programação do canal de televisão por assinatura Discovery Kids, pertencente à rede Discovery Networks International, cuja sede é em Miami, Florida, USA, voltada às crianças durante 24 horas. A maior parte dos personagens desses Programas canta e dança ora para falar sobre temáticas voltadas à preservação do planeta, ora para envolver as crianças em brincadeiras diversas. 2 Inúmeros CDs prometem serenidade às futuras mamães. Além disso, está à venda na web um produto denominado Bellysonic Speaker Pouch, uma espécie de bolsa com mini caixas de som que deve ser colocada ao redor da barriga da grávida. O som emitido tem como função acalmar tanto a futura mamãe como o seu bebê. O preço do produto anunciado é: USD$79,95. sono 3 e aos momentos de alimentação das crianças pequenas. Então, ora impregnada pelo folclore, ora pela erudição, ora, ainda, por ritmos da moda, a música interpela as crianças em programas televisivos, no rádio e em vídeos acessados pela internet. Aliás, é possível dizer que grande parte das muitas modificações relativas às formas de pensar e viver a infância são decorrentes das inúmeras transformações operadas nas sociedades, estando essas também associadas às possibilidades de acesso das crianças a um maior número de produções culturais que carregam informações e interpelações de diferentes ordens. Cabe ainda salientar que a educação na perspectiva dos Estudos Culturais, vertente que inspirou este estudo, tem sido vista como se processando para além dos muros da escola. Assim, uma variedade de locais sociais e produções da cultura, tais como o rádio, o cinema, a televisão, o teatro, os jornais, as revistas, os anúncios publicitários, além dos livros infantis, e até mesmo os brinquedos e shopping-centers passaram a ser vistos como exercendo efeitos educativos, mesmo que, como Steinberg (1997) e Steinberg e Kincheloe (2001) destacaram, esses não tenham como função primeira ensinar. E disso decorre, como também salientaram esses autores (Ibid), mas também Henry Giroux (2001), entre outros estudiosos 4 que se valem do campo dos Estudos Culturais para discutir produções culturais 3 É interessante referir CD que adaptou tradicionais marchinhas de carnaval a novos ritmos e sonoridades, passando a endereçar tais músicas aos bebês recém-nascidos. 4 Indicamos serem inúmeras as produções realizadas nesta direção pelos professores e alunos do Programa de mestrado em Educação da ULBRA. 134 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

135 contemporâneas, a importância de atentar-se para o que nelas se diz sobre a infância e como nelas se configura o que é ser criança. Seguindo tal recomendação focalizamos, neste texto, uma dessas produções as inúmeras e diferenciadas canções que circulam nas escolas de Educação Infantil -, considerando que essas representam mais do que simples formas de entretenimento. Assumimos atuarem essas como pedagogias culturais que exercem efeitos produtivos importantes sobre as identidades infantis, tal como também indicaram Steinberg e Kincheloe (2001), Giroux (1995, 2001) e Steinberg (1997). as entrevistas, pois a intenção mais ampla do estudo era discutir o quê e como tais canções ensinavam às crianças. Desenvolvemos, assim, uma análise cultural, caracterizada por Wortmann (2007) como um procedimento capaz de dar visibilidade a aspectos que dizem respeito ao cotidiano dos sujeitos, os quais possuem, tal como indicou Turner (1996, apud WORTMANN, 2007), inegável efeito e influência em suas vidas. Tais análises buscam, então, indicar representações produzidas a partir de significados que circulam na cultura, bem como examinar práticas culturais do ponto de vista de seu envolvimento com, e no interior de, relações de poder (NELSON; TREICHLER;GROSSBERG, 1995, p.11). CONFIGURANDO O ESTUDO DESENVOLVIDO Nosso primeiro propósito foi indicar a frequente utilização das canções na programação de uma escola municipal de educação infantil de Porto Alegre, RS, frequentada por crianças de 1 a 6 anos, com baixa renda familiar. Para tanto, realizamos entrevistas com professoras e funcionárias dessa escola, buscando identificar quais eram as canções nela mais tocadas, ou aquelas que espontaneamente eram cantadas pelas crianças. Valemo-nos, também, de observações feitas nos recreios e em algumas festas escolares (as comemorações dos aniversariantes do mês, por exemplo) para acrescentar mais informações ao nosso estudo. Como buscávamos também saber que temas figuravam em tais canções, selecionamos 10 dentre as canções executadas, sendo 5 escolhidas entre as que figuravam nas atividades escolares organizadas pelas professoras e as outras 5, a partir das trazidas pelas crianças para a escola. Procedemos, então, a análise discursiva de tais textos, bem como das anotações feitas durante AS ANáLISES Focalizaremos, inicialmente, as canções que integram a vida escolar a partir das proposições da escola. Constatou-se que tanto as professoras quanto as atendentes valiam-se de canções não apenas para animarem os recreios, mas utilizavamnas como um recurso constante para procederem às atividades curriculares diárias. Assim, as crianças iam cantando no trenzinho imaginário 5, que as conduzia até o refeitório, mas também cantavam para dar as boas-vindas aos colegas na rodinha 6. Além disso, a música animava brincadeiras procedidas nas salas-de-aula, quando, por exemplo, as crianças encenavam o conteúdo da letra cantada. É possível dizer, então, que as 5 Usualmente nas escolas infantis, as crianças dirigem-se ao refeitório, ou a outros locais da escola organizadas em uma fila que é conduzida pela professora. E a essa fila atribui-se a denominação trenzinho. 6 A rodinha é uma estratégia pedagógica também muito utilizada nas escolas de Educação Infantil. Ela ocorre, geralmente, no início da atividade escolar diária e nela são procedidas combinações que dizem respeito ao trabalho a ser desenvolvido naquele dia escolar. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

136 canções possuem um trânsito intenso na vida desta escola de Educação Infantil até porque, além das canções programadas, outras mais adentram o mundo infantil escolar, sendo essas trazidas pelas próprias crianças, que as aprendem em sua convivência com a família, com grupos de amigos, com grupos religiosos, ou mesmo a partir de populares programas de rádio ou de televisão. Entre as canções que figuraram nas programações da Escola estavam as cantadas por dois populares palhaços a dupla Patati e Patatá 7 - que, nos últimos 20 anos, têm interpelado as crianças com ritmos bailáveis e encenações reproduzidas em DVD s e CD`s, mas também no Youtube, sendo ainda a dupla convidada a participar de programas televisivos e festas infantis, tendo suas figuras reproduzidas como bonecos de diferentes tamanhos comercializados em lojas de brinquedos infantis e em encartes para colorir. Suas canções tratam de temas como a importância de lavar as mãos antes das refeições (As mãos, 2006), de alimentar-se bem (Hora da refeição, 2006) e sobre a necessidade de tomar banho (Chuveiro, chuveiro, 2006) 8. Elas também abordam temas ecológicos (A grama foi crescendo, 2006), identificam as letras do alfabeto (As Letras do Alfabeto, 2007), informam o número de dias de cada mês (Os meses do ano, 2007), estando muitas delas contidas nos 4 CD`s que integram a coleção sugestivamente denominada As 100 mais da pré-escola (2009). Transcrevemos, abaixo, aguns excertos de tais canções: Era um menino que não gostava Pra tomar banho sempre chorava 7 Suspeitamos que essa dupla de palhaços já foi protagonizada por outros sujeitos. 8 As canções referidas encontram-se no CD intitulado Os maiores sucessos de Patati Patatá, lançado em Brincava muito o dia inteiro E o no banheiro ele cantava (refrão) Chuveiro, chuveiro Não faz assim comigo Chuveiro, chuveiro Não molha o seu amigo (Chuveiro, chuveiro, Patati Patatá, 2006) Na hora do almoço, segunda refeição carne com batata arroz com feijão verduras e legumes não vão ficar de fora Que bom, a sobremesa vem agora (refrão) Come, come, come Pra mamãe ficar feliz Come, come, come Come tudo e pede bis Na hora do café no almoço ou no jantar primeiro as minhas mãos eu vou lavar (Hora da refeição. Patati Patatá, 2006) Destaca-se a variedade de ritmos dessas canções - marchas carnavalescas, passando por ritmos caribenhos, até pagodes, axés, entre outros ritmos dançantes. Registramos que algumas delas são composições da própria dupla, sendo também freqüentes as canções de domínio público por eles interpretadas (A barata, Coelhinho da Páscoa, entre outras). Outras canções que também figuram na programação dessa escola são as interpretadas pelo premiado grupo paulista Palavra Cantada 9, que 9 O grupo, organizado em 1994, é liderado pelos músicos San- 136 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

137 aborda temas poéticos ou de cunho social, além de caracterizarem-se suas canções pela sofisticação dos arranjos musicais. Cabe registrar que esse grupo possui uma significativa produção musical, tendo recebido inúmeros prêmios nacionais 10. Além disso, as letras de suas canções estimulam as crianças a utilizarem tambores, latas, chocalhos, bem como a emitirem sons com a boca, com as mãos, etc. Ou seja, pode-se dizer que há uma preocupação pedagógica bastante explícita nas canções e apresentações deste grupo! Aliás, registramos que a sua popularidade parece ser maior entre as crianças que frequentam teatro e entre aquelas que têm acesso freqüente a CD s e DVD s. Na canção A sopa por exemplo, enumera-se uma série de vegetais, brincando com a possibilidade desses estarem ou não na sopa das crianças, como se pode ver no excerto que reproduzimos abaixo: O que que tem na sopa do neném? O que que tem na sopa do neném? Será que tem farinha? Será que tem balinha!? Será que tem macarrão? Será que tem caminhão?! (refrão) É um, é dois, é três... (Sopa, Paulo Tatit e Sandra Peres, 1996) Já na canção criança não trabalha o que está em destaque é uma problemática social o trabalho dra Peres e Paulo Tatit e tem, inclusive, o seu CD, intitulado Pé com pé, patrocinado pela Petrobras, Ministério da Cultura, através da lei de Incentivo à cultura. O grupo também participa com freqüência da apresentação de espetáculos teatrais 10 A dupla já recebeu 4 prêmios Sharp. Entre os seus CDs destacam-se: (2008) Palavra Cantada Tocada (2008); Carnaval Palavra Cantada (2005); Pé com pé (2004); Palavra Cantada 10 anos (2003); Meu neném (2001); Canções do Brasil (1999); Noite Feliz -Histórias de Natal (1999); Mil pássaros-sete histórias de Ruth Rocha (data). infantil -, que vai sendo entremeada à enumeração de termos vinculados ao mundo infantil, como podemos ver no excerto que transcrevemos a seguir: Giz, merthiolate, band-aid, sabã Tênis, cadarço, almofada, colchão Quebra-cabeça, boneca, peteca, botão Pega-pega, papel, papelão (refrão) Criança não trabalha, criança dá trabalho Criança não trabalha, criança dá trabalho (Criança não trabalha, Arnaldo Antunes e Paulo Tatit, 1998) Mas, é possível dizer, que tanto nas canções do grupo Palavra Cantada, quanto nas da dupla Patati Patatá, brinca-se, com freqüência, com as letras das músicas pelo uso de jogos de palavras, pela troca de letras e pelo uso de outros recursos semelhantes a esses, como é possível ver nos exemplos abaixo: quem é esse menino, esse menino é meu vizinho onde ele mora, mora lá naquela casa onde está a casa, a casa tá na rua onde está a rua, tá dentro da cidade. onde está a cidade, tá do lado da floresta (refrão) onde está a floresta, a floresta é no Brasil onde está o brasil? (Ora Bolas, Paulo Tatit e Edith Derdyk,1996) (refrão) P-pa p-tá p-ti P-pa p-tá p-tá p-vem p-a p-qui p-vem p-can p-tar P-pa p-tá p-ti P-pa p-tá p-tá Nossa brincadeira Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

138 Vai agora começar (A Língua do P, Igor Haid para Patati Patatá, 2006) Trava línguas é uma brincadeira, Divertida e facíl de brincar, É só enrrolar a língua fazendo Ela dançar. (refrão)ooooooooooooooooooooooooooo Olha o sapo dentro do saco O saco com o sapo dentro O sapo batendo papo O papo soltando vento (Patati Patatá, 2006) Mas o que nos interessou ressaltar é que tais canções mobilizam as crianças a cantar, a dançar e a brincar, fazendo frequentes chamamentos à aquisição de hábitos sociais que devem passar a integrar a sua rotina diária ou seja, hábitos que se pretende sejam por elas aprendidos escovar os dentes, tomar banho todos os dias etc. Como as professoras destacaram nas entrevistas, elas utilizam bastante os CD s disponibilizados pela Escola, procurando outros, apenas, quando isso se faz necessário em função de algumas propostas mais pontuais. Mas elas também enfatizaram que privilegiam os CD s que estimulam as crianças a se movimentarem no ritmo da música, constituindose esse tipo de música, segundo elas, no repertório ideal a ser apresentado para os alunos: ou seja, parece-lhes que sua tarefa é lidar com um repertório que seja diferente do apresentado às crianças fora da escola. Nesse sentido, então, a escola forneceria alternativas à massificação do gosto musical perpetrada pela mídia, operando na aquisição de uma cultura musical e na exploração de ritmos variados ao valer-se, exclusivamente, do que é endereçado ao público infantil. Como argumentamos neste estudo, as crianças não apreendem apenas com as canções selecionadas por suas professoras para integrarem as atividades escolares, mas, também, com aquelas com as quais convivem em outros espaços sociais, sendo que essas também adentram a escola. Como as professoras registraram nas entrevistas, é comum presenciar-se as crianças dançando e cantando funk, rap ou rock, que integram trilhas sonoras de novelas, nos recreios, ou seja, vê-las reproduzindo o que escutam e veem na mídia, mas, também, em cultos religiosos e em outros locais sociais. Entre as canções que as crianças cantam e dançam espontaneamente na escola estão: Faz um milagre em mim, interpretada pelo funkeiro carioca Mc Marcinho; Você não vale nada, interpretada pelo grupo de forró sergipano Calcinha Preta, (2009); A gente bota pra quebrar do grupo Exaltasamba, 2009; Dança do Creu, composta e interpretada pelo DJ carioca Sérgio Costa, mais conhecido como Mc Creu; Late que eu to passando, interpretada pelo grupo de funk carioca Gaiola das Popozudas, 2007; e Tropa de elite, interpretada pelo grupo paulista de rock alternativo Tihuana, 2009, todas elas reproduzidas especialmente nas rádios AM e em certos programas televisivos de auditório, bastante populares. Apresentamos no excerto abaixo estrofe de um funk religioso bastante popular entre as crianças da escola pesquisada: 138 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

139 Como Zaqueu, eu quero subir O mais alto que eu puder Só pra te ver, olhar para ti E chamar sua atenção para mim Eu preciso de ti, Senhor Eu preciso de ti, ó pai Sou pequeno demais, me da a tua paz Largo tudo pra te seguir Entra na minha casa, entra na minha vida mexe com minha estrutura Sara todas as feridas Me ensina a ter santidade Quero amar somente á ti Por que o senhor é meu bem maior Faz um milagre em mim (Faz um milagre em mim, Mc Marcinho, 2009) Reproduzimos, também, estrofe de uma das canções que têm assustado as professoras pelo conteúdo da sua letra Agora O bicho vai pegar!!! Tô chegando de bicho, Tô chegando e é de bicho Pode parar com essa história de se fazer de difícil Que eu tô chegando, tô chegando e é de bicho Pode parar com essa marra, pode ir parando com isso (Tropa de elite, Banda Tihuana, 2009) Letras de músicas como essa, bem como as coreografias com as quais elas são apresentadas nos programas de televisão, abusam do duplo sentido e, ao serem dançadas, de gestos sensuais, com forte alusão a práticas sexuais. As professoras declararam-se surpresas e até assustadas com o acesso que as crianças têm a tais canções. CONSIDERAÇÕES FINAIS A música tem sido utilizada para interpelar intensa e cada vez mais prematuramente às crianças. Em função disso, argumentamos no estudo ser importante atentar para as canções que circulam nas escolas, pois essas intencionadamente, ou não, atuam na produção de modos das crianças postaremse e sensibilizarem-se frente ao mundo. Ou seja, consideramos atuarem as canções como peculiares formas de pedagogias culturais nas quais quem dá as aulas são os interpretes/cantores/autores, mesmo que isso se dê, muitas vezes, independentemente da intenção desses sujeitos buscarem deliberadamente ensinar até porque as organizações que atuam na produção dessas pedagogias culturais não são usualmente configuradas como educativas, mas como movidas por interesses de outras ordens - literários, religiosos, de entretenimento ou comerciais, como salientou Steinberg (1997), ao examinar outras produções culturais igualmente presentes no mundo contemporâneo. Como enfatizou Stuart Hall (1997), é no trânsito por diferentes instâncias sociais e culturais que ocorre o processo de naturalização das representações! Ou seja, é nesse processo que essas ganham estatuto de verdades, ao deixarem de ser questionadas e ao passarem a ser reiteradamente enunciadas e repetidas, enquanto a compreensão de que são criadas/produzidas em um discurso culturalmente impregnado também vai sendo apagada. E esses são alguns dos motivos que levam os educadores, que se valem do campo dos Estudos Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

140 Culturais, a atentarem tão frequentemente para os significados que circulam nas diferenciadas formas de produções culturais sejam essas diretamente, ou não, implicadas nas ações consideradas como eminentemente escolares. REFERÊNCIAS GIROUX, Henry Armand. Atos Impuros. A prática política dos estudos culturais. Porto Alegre: ARTMED, Memória e pedagogia no maravilhoso mundo da Disney. In: SILVA, Tomaz Tadeu. (Org.). Alienígenas na sala de aula. Petrópolis: Vozes, NELSON, Cary; TREICHLER, Paula A.; GROSSBERG, Lawrence. Estudos Culturais; uma introdução. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (Org. ). Alienígenas na sala de aula. Petrópolis; Vozes, HALL, Stuart, A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções de nosso tempo. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 22., n. 2, STEINBERG, Shirley R. Kindercultura: a construção da infância pelas grandes corporações. In: SILVA, Luiz Heron et al. Identidade social e a construção do conhecimento. Porto Alegre: PMPA/SMED, STEINBERG, Shirley R.; KINCHELOE, Joe L. Cultura Infantil: A Construção Corporativa da Infância. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, WORTMANN, Maria Lúcia Castagna. Análises culturais um modo de lidar com histórias que interessam á Educação. In: COSTA, Marisa Vorraber (Org.). 2..ed. Caminhos Investigativos II. Rio de Janeiro: Lamparina, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

141 Casais que decidem não ter filhos: motivos, sentimentos e impressões am a n d a do r n e l ri B a s 1 ca r l a Me i r a kr e u T z 2 RESUMO Ao longo das últimas décadas, tem crescido o número de casais que optam por não querer ter filhos. Este estudo objetivou verificar os motivos que levam os casais a tal decisão, bem como seus sentimentos e impressões frente à sociedade. Participaram desta pesquisa dois casais, tendo sido entrevistados individualmente. Os resultados apontam para uma decisão calcada em diversos fatores, baseados na vivência de cada um e em seu meio social. Além disso, os entrevistados não se imaginam pais, não se sentem com o perfil para ter um filho e priorizam a liberdade de vida a dois. palavras-chave: casal, família, sentimentos, não ter filhos, sem filhos. ABSTRACT Over the past, a large number of couples have decided not to have children s. This study has focused the understanding of this decision, feelings and social impressions. In this study, two couples were interviewed singly. Results obtained shows that the decision is related to many factors, some regarding life experience and social relations. Beyond that, the couples do not see themselves as parents or have the cutout to be a parent, they prioritize their lives as a couple. Keywords: couple, family, feelings, no child s, no kids. ¹ Acadêmica do curso de Psicologia/ULBRA Gravataí (amandaribas@gmail.com) ² Professora-Orientadora do Curso de Psicologia/ULBRA Gravataí Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

142 INTRODUÇÃO Quando o homem e a mulher se casam é comum surgirem questionamentos referentes à provável chegada de um bebê na família. Porém, com as mudanças no histórico familiar e na concepção de família, está se tornando mais freqüente ouvir-se falar de casais que decidem não ter filhos. Crepaldi et al. (2006) relatam que até a década de 50, o pai era considerado responsável pelo sustento da família enquanto as mães eram responsáveis pelas atividades domésticas, pelo cuidado das crianças e por suprir as necessidades emocionais de seus filhos. Amato (em Crepaldi et al., 2006) aponta que transformações econômicas e ideológicas, como a recessão dos anos 70 e 80 e o movimento feminista influenciaram a entrada das mulheres no mercado de trabalho, passando a dividir com o homem o papel de provedor da família. Com a inserção das mulheres no mercado profissional, a força de trabalho se tornou mais equilibrada, povoada por homens e mulheres, mas não houve um deslocamento comparável de homens para a esfera doméstica, e assim houve uma desvalorização da tarefa de criar filhos. Castells (1999) relata que, em decorrência desses processos, o casamento contemporâneo configura um estilo relacional muito diferente daquele existente no início do século passado. Conforme Ramos (em Montovani, 2007), muitas mulheres não chegam a tomar uma decisão consciente sobre o tema de ter ou não ter filhos, mas adiam a maternidade para se dedicar à carreira até que chega uma hora em que fica mais difícil engravidar e desistem. Ramos (em Montovani, 2007) afirma que cada vez mais as pessoas têm consciência do esforço que significa criar um filho, da dedicação e dos custos econômicos e emocionais envolvidos, assim, a dificuldade de educar crianças na atualidade é um dos motivos que levam muitas mulheres a questionarem a vontade de engravidar. Piccinini et al. (2004) complementam que ter um filho gera menos tempo para as intimidades do casal, os gastos são maiores, as tarefas diárias aumentam, a divisão dos afazeres é necessária, e com isto os conflitos conjugais tendem a crescer. Segundo os dados do IBGE, em 2004, há cerca de 8,18 milhões de casais sem filhos no Brasil, sendo que a região Sul é a recordista, com 18% de suas famílias assim constituídas. No Brasil, em 2006, já havia 15,6% de casais sem filhos, revelando um aumento nos últimos dez anos (IBGE, 2009). Dentro dos possíveis motivos que levam casais à decisão de não ter filhos, Kakuta e Ribeiro (2008) citam o fator econômico, custo de vida, dificuldades de emprego e renda, além da baixa qualidade dos serviços públicos de saúde e educação, que acabam também por desestimular a idéia. Estudos do IBGE apontam que casais sem filhos têm renda substancialmente maior que casais com filhos, provavelmente, porque podem trabalhar mais facilmente e investir mais em sua capacitação e formação profissional. Conforme o referencial teórico apresentado existe uma série de fatores que podem contribuir para que os casais decidam não ter filhos. Segundo Perlin e Diniz (2005), a complexidade das mudanças nos papéis e as funções sociais de homens e mulheres coloca pesquisadores das relações humanas diante da necessidade de ampliar o foco de análise das relações interpessoais para compreender os novos modelos de casamento que estão surgindo. Desta forma, este estudo teve por objetivo verificar os motivos que levam os casais à decisão de não ter filhos, investigando seus sentimentos e impressões. 142 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

143 MATERIAL E MÉTODOS Delineamento Para este estudo, foi utilizada a metodologia qualitativa de estudos de casos múltiplos (Yin, 2001). Apresentação dos resultados Abaixo serão apresentadas primeiramente sucintas impressões dos casais entrevistados e posteriormente serão vistas as categorias temáticas que surgiram das entrevistas. Serão utilizadas as letras M para identificar as mulheres e H para os homens. Participantes Participaram desta pesquisa dois casais, sendo um deles casado há 5 anos, e o outro há 20 anos, todos tinham escolaridade semelhante (superior completo e incompleto). Os participantes foram buscados por conveniência. Instrumentos Foi utilizada para esta pesquisa uma ficha de identificação juntamente com uma entrevista semi-estruturada a ser aplicada individualmente. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para a análise de dados. Procedimento de coleta e análise dos dados A pesquisadora convidou os casais para participarem da pesquisa. O Termo de consentimento livre e esclarecido foi lido em conjunto com os participantes e depois de terem concordado e assinado foi preenchida a ficha de identificação dos participantes e deu-se início à entrevista. As respostas dos participantes foram analisadas através da análise de conteúdo baseada em Bardin (1977). Impressão Geral Transmitida Casal 1: O casal 1 convive há 20 anos, com estabilidade financeira. O casal mostra ter a idéia de não ter filhos bastante clara, apesar de não ter ocorrido uma conversa formal para formular esta decisão, ela foi construída ao longo dos anos que o casal mora junto. E hoje, inclusive pela idade, eles não vêem possibilidade de retomar esta escolha. M1: 42 anos, é concursada e trabalha em um órgão público de sua cidade. A entrevistada veio de uma prole de quatro filhos, sendo filha mais nova de seus pais. Assim, tem três irmãos mais velhos, do sexo masculino, todos casados e com filhos. M1 descreve-se como uma pessoa bem resolvida (sic) e com bom relacionamento interpessoal, comunicase de forma clara. Na entrevista parece expor suas idéias livremente, fala de suas exigências e considera não ter... perfil para ser mãe, conceber um ser e correr o risco de fazê-lo ter problemas futuros (sic) decorrentes de sua postura. Mostra-se bastante convicta de sua decisão, com um marido que lhe apóia no tema. H1: 53 anos, é funcionário de um hospital de sua cidade. Sua comunicação é bastante objetiva, assim como sua decisão de não-paternidade. Parece ser uma pessoa franca, que revela não ter perfil para ser pai. Considera-se impotente para ter filhos e para garantir o futuro de uma criança, além disso, traz sua experiência enquanto filho como influência Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

144 na falta de interesse em ter filhos. Quanto a sua vida particular, mostra-se mais caseiro, com zelo por sua liberdade e autonomia, em curtir seus momentos e lazer sem empecilhos. casal 2: Estão casados há 5 anos, com grande estabilidade financeira, ocupando cargos de status nas instituições nas quais trabalham. O casal se mostra bem decidido quanto a não ter filhos. Relatam ter uma vida bastante ocupada, trabalhando em mais de um local e percebem que faltaria espaço para um filho nesta rotina. Além disso, as experiências vividas por familiares, inclusive de seus pais junto a seus irmãos foram descritos como tendo um papel importante na decisão. Não houve uma conversa formal entre o casal para esta escolha, mas ao longo do tempo sempre deixaram muito claro, um para o outro, a opção de não querer ter filhos. M2: 35 anos, tem curso superior completo e trabalha em 4 locais diferentes na região onde mora. Comunica-se bastante, com uma vasta gama de conteúdos frente às perguntas. É uma pessoa desenvolta, dinâmica e habituada a fazer várias tarefas no seu dia, estar em vários lugares. Parece ser uma pessoa que facilmente consegue liderar uma conversa ou relação, mostrando-se bastante decidida em seus posicionamentos e argumentos. Além de suas ocupações diárias, mostra que a decisão de não ter filhos está muito ligada a experiências de amigos e parentes que presenciou e temeria reproduzir. Também destaca não ter perfil para ser mãe, já que refere não ter afeto por crianças. H2: 33 anos, também tem nível superior completo e trabalha em seis locais diferentes. Tem um irmão de 31 anos que é solteiro, formado, porém não trabalha, o que o entrevistado informa ser um problema para seus pais. A comunicação de H2 é clara e objetiva. Fundamenta sua decisão de não ter filhos principalmente nas experiências que presenciou em sua família, refletindo sobre a responsabilidade e medos de ter um filho. Além disso, o participante prioriza suas horas de lazer com viagens e não vê este espaço de liberdade ser mantido com a presença de um filho. Impressões e idéias sobre si mesmo frente à maternidade/ paternidade, gravidez e desenvolvimento de filhos Nesta categoria, são expostas as reflexões dos dois casais no que diz respeito ao seu próprio perfil, modo de agir e pensar. São apresentados relatos sobre a relação disto com a decisão de não optar pela maternidade/paternidade. Alguns participantes relataram que entendem como natural esta decisão de não ter filhos. Eu acho que a decisão foi construída, porque a gente nunca cogitou ter filhos, foi assim, quando eu conheci ele, eu não pensava que eu ia ter filhos, não foi dito assim Ah, não vamos ter filhos, não, não existia o plano de né, não existia, não se ficava planejando isso, assim. (M1) Alguns participantes falaram sobre seu perfil, identificando características suas como não ter dom para a parentalidade ou a possibilidade de prejudicar um filho, trazendo também uma visão pejorativa das crianças, até mesmo agressiva. É muita responsabilidade, um pouco de egoísmo também porque, criar filhos não é simplesmente ta colocando no mundo aí, então, e eu não tenho este dom pra ser pai. Eu tenho um pavio muito curto, criança eu gosto muito com batatinha e no forno né (risos). (H1) 144 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

145 Idéias negativas relacionadas à gestação, amamentação e crianças também foram trazidas por uma das entrevistadas. Eu não consigo me imaginar amamentando, não consigo me imaginar grávida, eu acho horrível mulher grávida! [...] eu acho muito nojento amamentar [...] eu acho que as pessoas ficam meio retardadas quando tão grávidas, fica todo mundo ahhh babando aquela criança [...] não curto esse negócio, não toca o meu coração [...] eu não gosto muito de criança também [...] Eu gosto muito de animais, então se eu vejo um cachorro eu me sensibilizo muito mais do que se eu vejo uma criança. (M2) Outros apontam o medo frente ao futuro de um possível filho. É complicado, então passa realmente um monte de coisas na cabeça da gente, principalmente, aquela sensação de impotência, é isso, a sensação de impotência é muito grande. (H1) Outros participantes falam de suas ansiedades perante a responsabilidade de permanentemente ter um filho. Não tem como tu devolver. Não é produto. [...] é uma duplicata que tu nunca mais descarta, tu arrasta essa duplicata pro resto da tua vida. (H1) Alguns, ao refletir sobre seu perfil, falam da afeição com crianças, porém sem alterar a decisão de não ter filhos. E eu adoro crianças, tenho meus sobrinhos sabe, enfim, tô satisfeita. Tenho uma afiliada, tenho né, tô satisfeita, de outra forma. (M1) Já outra participante relata a não afeição com crianças. Eu nem gosto muito de ser chamada de tia, inclusive eu odeio ser madrinha de crianças dos outros, tem estes gêmeos, eu sou madrinha de um deles, mas eu acho isso aí uma imposição que me convidaram [...] pra mim é a mesma coisa que nada, infelizmente. As crianças também não têm afeto por mim. (M2) O papel da mulher na decisão do casal por não ter filhos também é relatada nas falas das mulheres entrevistadas. Eu acho que quando a mulher quer ter filho, não tem cristo que segure, o homem abre mão disso [...] eu acho que o homem é maleável nesse assunto, ele topa não ter se quer, e topa ter se ela quer. (M1) Os relatos acima demonstram diversidades de impressões e de idéias acerca de si mesmos, que contribuem para que os casais optem por não ter filhos. É visto que em suas falas, alguns falam do seu próprio nível de exigência até a responsabilidade para ter um filho. Estes casais salientam a sua própria falta de perfil e temem o comprometimento com possíveis filhos. Mansur (2003), em sua pesquisa com mulheres voluntariamente sem filhos, já falava da questão complexa e fundamental da identificação, a mulher é um ser dotado de capacidade de simbolizar, e o desejo de ser mãe é bastante complexo e difícil de isolar na intrincada rede de fatores psicológicos e sociais. Neste estudo voltado aos casais, também se pode entender desta forma, já que os casais não conseguem se imaginar pais. Alguns, em suas falas, inclusive apontam características próprias que acreditam prejudicar na criação de um filho, como impaciência, pouco afeto com crianças, egoísmo, sensação de impotência, perfeccionismo, pouca estrutura emocional. Os aspectos ilustrados nas falas, somados ao medo de conceber um filho, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

146 medo da responsabilidade fazem com que um filho seja visto como uma ameaça. É visto no H1 uma forma mais sarcástica e agressiva de falar do tema filhos. Isto vai ao encontro da forma irônica com que Maier (2008) aponta os motivos para não se ter filhos. A autora afirma que a rotina com crianças passa a ser de gritos à noite, pais irritados, estragos nos finais de semana, e que com crianças a tiracolo você só será visto como papai ou mamãe, você deixa de existir na primeira pessoa (p.32). Isto nos mostra uma forma mais agressiva de reação, pois a escolha voluntária por não ter filhos está ligada a sentimentos de frieza e rejeição às crianças, que parecem ser sentidos como seres inimigos. Stam (em Mansur, 2003) avalia que a decisão de ter filhos é uma escolha difícil e irreversível, pois não é possível fazer um teste prático com um filho para saber se vai dar certo. Isto corrobora o relato de alguns participantes, sobre seus medos de não saber como pode ser a realidade de ter um filho, temendo arriscar e ter problemas futuros. Outro ponto destacado nestes relatos foi à falta de desejo por parte da mulher do segundo casal, quanto à gestação e criação de um filho. Winnicott (1978), por sua vez, enumerou motivos para uma mãe detestar o próprio bebê: é um perigo para o seu corpo, uma interferência em sua vida privada, machuca-lhe os seios, impõe a sua lei, lhe deixa frustrada. Conforme Mansur (2003), quando uma mulher reconhece que não tem vocação para a maternidade e escolhe manter uma vida sem filhos, evita sujeitar-se a obrigações e demandas consideradas excessivas, garantindo a preservação da liberdade e autonomia que julga fundamental para seu bem-estar. Experiências vividas/ presenciadas que influenciam a escolha de não ter filhos Nesta categoria, exploram-se os relatos dos casais entrevistados acerca de situações reais que viram em suas famílias, ou mesmo que presenciaram e que os fizeram refletir sobre o tema e contribuir na decisão de viver sem ter filhos. Alguns participantes falaram de experiências mal-sucedidas com crianças e adolescentes de suas famílias. Pode estar vinculado a exemplos de família, das famílias nossas [...] às vezes uma pessoa que tu dá tudo e ela não corresponde, né. [...] tem pessoas que tu dá tudo, dá bom colégio, paga cursinho, escolhe o que tem de melhor, e o cara não quer nada com nada, vai indo por outro caminho, aquilo pra ti é um estresse. (H2) A experiência difícil de amigos também é relatada por uma participante. Minha melhor amiga na faculdade teve gêmeos, ela engravidou, aliás, ela engravidou assim sem ter planejado, a mãe dela morreu, a sogra dela é a mesma coisa que nada, mora em SP. E aí, eu vi o trabalho que ela passou, como dá trabalho ter dois bebezinhos, nasceram prematuros, e aí eu vi aquilo ali e não quero pra mim essa trabalheira toda. (M2) Outro participante, fala de sua própria infância e recorda situações passadas por seus pais que dificultaram a criação dos filhos. É, porque eu vi o sacrifício dos meus pais, em trazer alimento pra dentro de casa, porque meu pai teve desempregado muitos anos, pegou justamente aquela época da ditadura [...] isso aí rolou seis anos, ao ponto da gente ter que 146 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

147 almoçar um café com leite, e às vezes tinha pão, e outras vezes não. (H1) Um participante fala sobre o medo relacionado às doenças. A gente vê muita coisa, assim de doença, de criança que não nasce normal, que tá tudo bem e de repente aparece uma coisa. (M2) Outro fala sobre a perda de liberdade que algumas pessoas próximas tiveram. A gente tava num churrasco lá, o dia inteiro, bebendo, alugamos chopp e tal... e o cara que tinha filho não foi, tu vê, não pôde ir, porque tem filho e tal. (H2) A violência e dificuldades reais também são relatadas. Essa insegurança no Brasil eu tenho medo. Não quero que o meu filho, eventualmente se tivesse um filho, passe por isso, acho horrível [...] fui assaltada num salão de beleza, minha mãe já foi assaltada, minha irmã já foi sequestrada, então é só uma questão de tempo assim né, e eu tenho muito medo disso. (M2) No relato a seguir temos um exemplo de experiência de chantagem emocional dos pais e a não compreensão dos sentimentos maternos. Parece que a força da relação com um filho é assustadora para a participante. A minha mãe sempre fazia um pouco de terrorismo assim, meu pai também quando a gente ia viajar, ah não viaja minha filha, não viaja, é perigoso, é isso e aquilo. Eles botavam um pouco de culpa sabe, a minha mãe chegou a nos dizer que se a gente morresse ela se matava. Então, é uma coisa assim que eu acho muito forte, porque se tu tem um filho, que todo mundo diz que é a melhor coisa do mundo, e aí morre e tu se mata? Pó! Que droga então, melhor não ter, porque que eu vou correr o risco de me matar, nunca pensei em me matar, não sou nenhuma tendência depressiva, suicida, é mais fácil eu matar outra pessoa. (M2, 35) É possível verificar o impacto que as situações presenciadas e falas de amigos e familiares acerca do tema tiveram para a decisão de ter ou não ter filhos. Situações como as descritas, parecem ter marcado os entrevistados, que não quiseram ter vivências semelhantes. Mansur (2003) cita que toda mulher obtém da experiência com a própria mãe a noção do que é ser mãe. Quando opta por não ter filhos, corta um vínculo importante com a mãe, diferenciando-se dela e da família original. Isso vai ao encontro do que aparece neste estudo, pois é visto que os entrevistados também atribuem à decisão de não ter filhos às experiências que tiveram enquanto filhos. As dificuldades passadas pelos pais para criá-los e as possíveis frustrações que permeiam estes pais fazem com que os casais não desejem enfrentar uma situação de eles próprios serem pais e terem filhos. Mansur (2003) afirma que mulheres que decidem não ter filhos relatam que tê-los implicaria dispor de recursos afetivos que não foram desenvolvidos junto à família primária. Parecem temer que a maternidade as transforme na própria mãe, ou que um bebê pudesse ser tão invasivo e controlador como suas mães foram. Quando M2 menciona sobre o terrorismo que sua mãe lhe fazia, pode-se verificar o temor de reproduzir esta situação ao viver o papel de mãe. A complexidade de criar e educar um filho, já tendo sido filho e já tendo sido espectador dos próprios pais no papel parental causa a sensação de impotência frente a novas descobertas. Porém, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

148 Bonini-Vieira (em Mansur, 2003) avalia que considerar vivências familiares negativas como impedimento para ter filhos pode ser uma conclusão simplista. No entanto, pode-se constatar que os relatos a respeito dessas vivências mostram que elas têm forte peso na decisão de não ter filhos. As experiências presenciadas e os modelos possibilitam a reflexão acerca de situações ainda não vividas, caminhos que lhes trouxeram situações de angústia e desamparo, que agora poderão ser mais bem analisados antes de serem trilhados. Vantagens acerca da decisão de não ter filhos Nesta categoria são apresentadas reflexões dos entrevistados que dizem respeito às vantagens de não conceber um filho. Os dois casais falam sobre a autonomia e liberdade do casal e seu direito de ir e vir. Tanto homens quanto mulheres falaram da sua autonomia e da vantagem financeira. Vantagem econômica, emocional, disponibilidade, essas coisas assim, a gente tá disponível para as coisas que planeja e quer fazer. Ah, economicamente nem se fala assim, seria uma das maiores vantagens. (M1) Uma entrevistada fala da possível dedicação aos pais. Justamente por não ter filho, a gente consegue se dedicar aos pais [...] a minha sogra que faleceu há dois anos, a gente também dava atenção, saia com ela. Sim, porque tu não tem filhos, tu não tá envolvida, atolada em compromissos e dívidas com seus filhos, aí tu consegue dar um pouco de energia para os pais. (M1) É percebido nos relatos acima que os casais buscam priorizar seus próprios programas, planejando-os conforme suas próprias conveniências. Os participantes relatam sentir que podem ter mais liberdade e autonomia dessa forma. Por outro lado, pode-se pensar nos papéis que eles podem estar cumprindo de cuidar dos próprios pais, pois há uma inversão do ciclo de vida familiar que favorece os pais. Pode-se pensar que os casais sem filhos já tem, muitas vezes antes do casamento, um papel importante de cuidados para com os pais. No primeiro casal, os passeios e visitas freqüentes aos pais parecem ser exemplos disto. No segundo casal, ambos têm irmãos que já são adultos, porém, não trabalham. Portanto esse casal pode ter um papel de mais responsabilidade com a chegada da velhice de seus pais. É possível pensar que a liberdade que os casais relatam seja relativa, pois eles podem não estar livres e sim presos a seus pais e a papéis delegados por esses últimos. Quanto ao aspecto financeiro, os casais relatam uma vantagem econômica ao escolher não ter filhos. Nesse mesmo sentido, Almeida (2008) fala dos dinks, grupo que significa em inglês double income and no kids, ou seja, dupla renda e nenhuma criança. Esses casais dos Estados Unidos, por opção, privilegiam a carreira e o lazer, e com isso, são um fenômeno da classe média. Além disso, em países como EUA, Inglaterra e Canadá, já há organizações que oferecem apoio e informações para as pessoas sem filhos (No Kidding!, Childless by Voice, Childfree Association). Mansur (2003) salienta uma distinção feita na língua inglesa, o termo childfree é empregado atualmente com a intenção de desestigmatizar a opção por uma vida sem filhos, já que o termo childless, tradicionalmente utilizado, carrega em si a conotação de ausência ou falta involuntária, que é muito diferente da possibilidade de escolher um modo ou estilo de vida. Esta categoria 148 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

149 de vantagens para não ter filhos, por si só, não parece justificar os motivos que levam os casais a esta escolha, mas, em contrapartida, são estas vantagens que reforçam e solidificam esta decisão nos dois casais entrevistados. Desvantagens acerca da decisão de não ter filhos Nesta categoria foram exploradas as percepções dos entrevistados acerca das possíveis desvantagens de não ter um filho, de como isto é percebido e sentido por eles. Um entrevistado fala sobre o fim do sobrenome de sua família. Eu sou o último Santos da minha família, o nome da minha família morre comigo. [...] E na verdade pô, senti a necessidade de perpetuar essa, essa questão né, mas aí... olha... vai ficar comigo e era isso. (risos). (H1) Outro fala da possibilidade de ficar de fora de assuntos da roda de amigos. Daqui a pouco, os meus amigos, da minha faixa etária toda, já tão casados, alguns já começaram a ter filhos, daqui a pouco a maioria do grupo vai começar a ter filho. Talvez eu veja como uma desvantagem, talvez ficar um pouco de fora, vamos dizer, perder um pouco o vínculo pelo fato de não estar seguindo aquela rotina, seguindo a maioria. (H2) A possibilidade de trabalhar a paciência também é citada por uma entrevistada. Talvez exercitar a doação, a paciência no extremo que eu acho que a maternidade traz, então seria uma experiência de vida, é uma experiência de vida que deixo de ter. (M1) Também foi percebida a curiosidade dos sujeitos entrevistados em saber como poderia ser um filho oriundo dos seus casamentos. Eu tenho defeitos claro, mas também tenho qualidades que, de repente, juntando com as qualidade do L, a gente poderia ter um filho maravilhoso, assim como poderia ter uma praga né [...] Assim, por frações de segundo eu penso [...] se tivesse um filho, nasceria com os olhos dele, com o cabelo dele... (M2) Um participante fala de não poder presenciar o desenvolvimento de um filho. Não deixa de ser uma desvantagem, perder isso, pois deve ser uma experiência notável ver uma criança crescer, tu ensinar a criança, ver falar teu nome, caminhar e coisa. (H2) Uma entrevistada fala da preocupação em não ter um filho se precisar de cuidados. Se ficar doente, isso sim, não vai ter quem te cuide, isso é a única coisa que hoje em dia eu penso sabe. (M2) Por outro lado, outros participantes consideram pensar sobre esta desvantagem um desrespeito ao filho. Eu acho uma frase horrível, ah, quem é que vai te cuidar quando tu ficar velho, tu vai ficar velho e não vai ter ninguém pra te amparar, eu acho isso uma frase meio egoísta, porque na verdade então as pessoas tem filhos pensando em si, pensando em si no futuro. (H2) Os relatos acima demonstram as reflexões feitas pelos casais acerca das possíveis desvantagens em não ter um filho. É percebido que eles vêem desvantagens no que diz respeito à curiosidade de conceber Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

150 um filho, ou então de acompanhar o seu desenvolvimento. Nas falas acima, um entrevistado refletiu o fim do seu sobrenome, justamente pelo impacto do rompimento de algo que seria natural, como se fosse o fim da sua família. Um participante falou da desvantagem de ficar fora dos assuntos comuns do seu meio social, já que percebe a maioria de seus amigos casando e na seqüência, tendo filhos. Assim, o temor de não estar inserido em seu grupo de iguais faz com que reflita a falta de filhos. Além disso, foi levantado o fato do filho proporcionar o exercício da paciência e doação, já que a responsabilidade e a entrega nos cuidados com um filho podem refletir no crescimento destas características. Foi visto que os participantes defendem a idéia de que ter um filho pra usufruí-lo no futuro seria um ato egoísta, até porque não podem afirmar que o filho estaria disponível para esta proposta após a idade adulta, apenas uma das participantes revelou medo de um futuro possivelmente sem amparo. Morisssette e Spain (1991), em seus estudos sobre a não-parentalidade comentam que a decisão baseia-se nas condições sociais favoráveis ou desfavoráveis à parentalidade. Nesse sentido, utiliza-se da teoria de custos e benefícios para concluir que a não-parentalidade voluntária exprime uma escolha de vida que é simplesmente diferente, normal e aceitável. Assim, pode-se pensar que os casais conseguem refletir e discutir sobre pontos positivos ao pensar em ter um filho, mas sempre, ao ponderar, eles enxergam mais razões que os fazem desistir dessa idéia. Imposição social e familiar Nesta categoria, explora-se o impacto da decisão de não ter filhos frente à sociedade, de como os quatro entrevistados percebem a família, amigos e sociedade frente à decisão dos mesmos de não terem filhos. Alguns trazem a fala de alguns familiares ao perceber o não movimento para ter filhos. Meu sogro às vezes faz chantagens [...] A minha mãe às vezes me dá assim, artigos que ela pega [...] faz pequenas coisas assim, tenta sutilmente ver se mudo de idéia. O meu pai não, a minha mãe é a única que toca no assunto. (M2) Já outros relatam menor posicionamento da família quanto ao assunto. A minha mãe nunca perguntou se ia ser avó, na minha família nunca houve esse questionamento. (H1) Nas reflexões, alguns entrevistados percebem uma aceitação por parte de pessoas mais próximas e mesmo da sociedade. Acho que as pessoas estão se dando conta que hoje em dia botar filho no mundo não é bem assim [...] mas acho que tem, não digo preconceito, mas as pessoas ficam relativamente chocadas quando tu diz que não quer ter filhos [...] acho que a sociedade ainda vê com certo choque assim quando tu afirma, bate o martelo, quando tu veemente diz não quero ter. Eu até evito de dizer, digo: ah, sei lá, não estou programando..., pra não me incomodar, pra não ficar discutindo isso. (H2) Alguns falam da imposição social ligada à religião. Eu acho que tem muito um conceito de religião, acho que muitas famílias mais católicas assim, acho que tem mais, acho que é quase... tipo tu não ter filho é um pecado, grosseiramente, o casamento é feito pra procriar assim, né. Então, e como eu acho que a gente ainda tem esta 150 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

151 influência forte, contribui pro choque de não ter filho, aceitar. (H2) Os relatos acima demonstram que os casais sofrem com a opinião da sociedade acerca da sua decisão de não ter filhos, principalmente em relação a sua rede de apoio, como família e amigos. Nos relatos trazidos pelo primeiro casal quanto à decisão de não ter filhos, que já tem isto estabelecido há bastante tempo, não há questionamentos por parte de seus pais. Apenas o irmão de M1 inicialmente questionou a decisão, segundo a participante, mas com o tempo todos os familiares assimilaram a idéia. Já no segundo casal, que está casado há cinco anos, viu-se que os pais ainda tentam mostrar uma visão favorável da vida com filhos. Para fugir desta conversa, os mesmos falam que ainda estão pensando sobre o assunto ou adiando devido aos estudos. Porém, é visto que justamente por não enfrentarem os questionamentos sociais com maior rigidez, dão margem para a insistência familiar sobre a possibilidade de ter filhos. Maier (2008) afirma que, mesmo com a crescente tolerância às diversas formas de vida privada, ainda há reprovação social aos casais que optam por não ter filhos. Os que têm essa coragem são vistos pelas pessoas ao redor como desviantes da norma. Isso vai ao encontro do que os casais sentem, inclusive salientam a pressão religiosa, o fator de procriação, segmento da família. Entretanto, com os amigos, na medida em que os conhecem, é visto que a decisão passa a ser mais aceita ou menos questionada. CONSIDERAÇÕES FINAIS Mansur (2003) cita o desejo de se dedicar mais à relação conjugal, dúvidas sobre a capacidade de ser pai ou mãe, vontade de ter menor preocupação com questões financeiras e inquietações em relação à superpopulação e ao futuro do planeta como razões comuns para que muitos casais abdiquem da paternidade. Isto se confirma neste estudo, no qual podemos constatar que há uma diversidade de fatores para explicar a decisão de um casal de abdicar da paternidade/maternidade. Alguns dos fatores fortemente identificados por estes casais, para não ter filhos, estão ligados as suas vivências familiares, seus perfis e temperamento. A família e os modelos que estes casais tiveram durante suas vidas possibilitam reflexões e críticas acerca do tema, que, unidos às dúvidas quanto à capacidade de criar um filho, responsabilidades e perfil, os fazem optar por uma vida sem filhos. Além disso, há aspectos ligados às experiências que já presenciaram, aos anseios quanto às responsabilidades exigidas na criação de um filho, medo de repetir exemplos que não concordam, e até mesmo, para priorizar a liberdade e autonomia que uma vida sem filhos os proporciona. De qualquer maneira, a capacidade dos participantes de identificarem que não querem ou não se sentem em condições de serem pais, não sucumbindo às pressões sociais e tomarem a decisão de não ter filhos mostra-se um importante aspecto a ser ressaltado. Afinal, a difícil tarefa da parentalidade necessita, acima de tudo, desejo de ter filhos por parte dos pais para que se tenham pessoas (pais e filhos) mais saudáveis e felizes. A decisão de não ter filhos não é feita por um único motivo, assim, esta decisão é vista como multifatorial. Para maior aprofundamento acerca de suas histórias, visto que este é um estudo de caso, seria interessante a proposta de um segundo momento de entrevistas com estes casais com maior aprofundamento acerca de suas histórias de vida e relação com seus próprios pais para investigar mais acerca da influência na decisão. Outra possibilida- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

152 de, que pode ser sugerida para novos estudos na área, diz respeito ao número de participantes, pois, com um maior número também seria possível abordar novas temáticas, ou ainda melhor aprofundar as já apresentadas. REFERÊNCIAS ALMEIDA, C. Dobra o número de casais sem filhos. O Globo, 27 set Disponível em: < ibge_dobra_numero_de_casais_sem_filhos asp.> Acesso em: 15 jul BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, CASTELLS, M. O poder da Identidade 2. ed. In:. A era da informação: economia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e Terra,1999. v. 2. CREPALDI, M. A. et al. A participação do pai nos cuidados da criança, segundo a concepção de mães. Psicologia em estudo, v. 11, n. 3, p , INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Séries estatísticas e séries históricas Disponível em: < ibge.gov.br/series_estatisticas> Acesso em: 18 abr KAKUTA, S. M.; RIBEIRO, J. Grande número de casais sem filhos. Rio de Janeiro: SEBRAE/ RJ, Disponível em: < rj.sebrae.com.br/boletim/?p=566> Acesso em: 11 out MAIER, C. Sem filhos: 40 razões para você não ter. Rio de Janeiro: Intrínseca, MANSUR, L. H. B. Sem filhos: a mulher singular no plural. São Paulo: Casa do Psicólogo, MONTOVANI, F. Cada vez mais casais decidem não ter filhos. Folha, 11 out Disponível em: < br/folha/equilibrio/noticias/ult263u shtml.> Acesso em: 11 out MORRISSETTE, H.; SPAIN, A. Voluntary Childlessness: a Critical Review of the Literature. canadian Journal of counselling, v. 25, n.4, p , PERLIN, G.; DINIZ, G. Casais que trabalham e são felizes: mito ou realidade? Psicologia clínica, v. 17, n. 2, p , PICCININI, C. A. et al. O envolvimento paterno durante a gestação. Psicologia: Reflexão e crítica, v. 17, n. 3, p , WINNICOTT, D. Da pediatria à psicanálise. Rio de Janeiro: Imago,1978. YIN, R. K. estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

153 Construção e análise das propriedades psicométricas de um instrumento para avaliação de estratégias de enfrentamento (coping) de situações estressoras no contexto de trabalho MiriaM ra q u e l Wa c h h o l z strelhow 1 ch e i l a d e oliveira Bu e n o 2 sh e i l a go n ç a lv e s câ M a r a 3 Ma r y sa n d r a ca r l o T T o 4 RESUMO O presente estudo visou desenvolver um instrumento para avaliar as formas utilizadas pelos trabalhadores para lidar com situações estressoras no contexto de trabalho (estratégias de coping). O instrumento inicial, de 45 itens, foi construído com base na literatura e entrevistas semi-estruturadas e avaliado em termos de sua validade de conteúdo. A versão obtida foi aplicada em 232 trabalhadores da Região Metropolitana de Porto Alegre e os dados submetidos a análise fatorial. O instrumento final consistiu de 19 itens divididos em cinco fatores: religiosidade, apoio social, evitação comportamental, evitação cognitiva e repercussões somáticas, com índices aceitáveis de fidedignidade. Os fatores evitação cognitiva e repercussões somáticas devem ser reavaliados para uma versão final, bem como se faz necessária uma ampliação da amostra de trabalhadores em outros estados brasileiros. palavras-chave: estratégias de coping no trabalho, elaboração de instrumento, validação de construto. 1 Acadêmica do Curso de Psicologia/ULBRA Bolsista PROICT/ULBRA 2 Acadêmica do Curso de Psicologia/ULBRA Bolsista IC/ CNPQ 3 Professora do Curso de Psicologia e do PPG em Saúde Coletiva/ULBRA 4 Professora-Orientadora do Curso de Psicologia e do PPG em Saúde Coletiva /ULBRA (mscarlotto@gmail.com) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

154 ABSTRACT The present study aimed to develop an instrument to evaluate the ways used by workers to deal with stressful situations in the work context (coping strategies). The first instrument, with 45 items, was constructed using the literature and semi-structuralized interviews and evaluated in terms of its content validity. The obtained version was applied in 232 workers from the metropolitan region of Porto Alegre and the data submitted to factorial analysis. The final instrument consisted of 19 items divided into five factors: religiousness, social support, behavioral avoidance, cognitive avoidance and somatic repercussions, with acceptable reliability indexes. The cognitive avoidance and somatic repercussions factors must be reevaluated for a final version of the instrument as well as is necessary to expand the sample of workers in other Brazilian. Keywords: coping strategies at work, instrument construction, construct validation. INTRODUÇÃO O interesse pelo estudo do estresse no trabalho tem sido crescente na literatura científica, particularmente nos últimos anos. Uma razão para o aumento de pesquisas sobre este tema deve-se ao impacto negativo do estresse ocupacional na saúde e no bem-estar dos trabalhadores e, conseqüentemente, no funcionamento e na efetividade das organizações (JACQUES, 2003). Atualmente, em função do grande desenvolvimento tecnológico, mais que em períodos anteriores, o mundo do trabalho requer uma mudança de perfil dos seus trabalhadores em termos das novas formas de organização, gestão e controle de trabalho. Na intenção de ajustar-se a este perfil, os trabalhadores se deparam com novas exigências (multifuncionalidade e qualificação técnica) que acabam se tornando importantes geradoras de estresse (GASPARINE; BARRETO; ASSUNçãO, 2006). Todas as profissões e atividades laborais geram algum grau de estresse. Omar e Paris (2008), afirmam que o estresse laboral tem sido definido como as reações individuais às características do ambiente de trabalho percebidas como ameaçadoras pelo trabalhador, surgindo a partir de um desajuste entre as capacidades do individuo e as exigências de seu trabalho. Entre os principais estressores de trabalho estão a sobrecarga, os conflitos e a falta de apoio de superiores e colegas, a falta de recursos, a pressão do tempo e os baixos salários. A percepção da incapacidade para lidar com as demandas de trabalho conduz a uma diminuição da satisfação com o trabalho. As estratégias que o trabalhador utiliza para lidar com as dificuldades que encontra em seu contexto laboral podem constituir-se em um importante recurso para a manutenção de sua saúde e qualidade de vida. Segundo Murta e Trócolli (2004), a forma como a pessoa lida com as circunstâncias geradoras de estresse exerce grande influência sobre sua saúde, modulando a gravidade do estresse resultante. O modo como as pessoas enfrentam as múltiplas exigências da vida com o objetivo de resolvê-las e adaptar-se aos contextos nos quais estão inseridas é denominado coping. Para Hudek-Knezecic e Kardum (2000), coping representa uma das facetas do estresse e uma das principais ferramentas para o seu manejo. Ainda conforme os autores, consiste na capacidade que o individuo possui de pensar e agir frente a situações estressantes. 154 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

155 Coping Há diversos modelos teóricos, diferentes em suas especificidades, que abordam o tema de coping, mas todos têm como base o modelo cognitivo de estresse e coping de Lazarus e Folkman (1984), que é genérico e aplicável a diferentes contextos estressantes (FOLKMAN, 2009). Este considera que os sentimentos, pensamentos e ações das pessoas durante um evento estressante dependem da avaliação que elas fazem da situação e de suas capacidade para lidar com ela, ou seja, as estratégias de coping. Essas representam esforços cognitivos e comportamentais para lidar com situações estressantes e são classificadas como focadas no problema ou focadas nas emoções (COHEN; BEM-ZUR; ROSENFELD, 2008). Quando o indivíduo busca estratégias de coping focalizadas na emoção, os esforços estão sendo dirigidos a uma busca de alívio da situação aversiva. São, normalmente, práticas voltadas a uma descarga física dirigida a aspectos somáticos ou de sentimentos que visam obter a mudança do estado emocional. O coping focalizado no problema direciona-se não a mudar as conseqüências negativas da situação estressante, mas a encontrar a origem da situação na tentativa de solucioná-la. Ou seja, as estratégias são no sentido de alterar a relação geradora de estresse entre ambos (TAMAYO; TRÓCCOLI, 2002). Conforme os elementos descritos por Folkman e Lazarus (1980), o estressor em potencial será submetido a uma avaliação primária em termos de significado e repercussões. A seguir, apenas o evento estressante precisa ser considerado em termos de um prejuízo, uma ameaça ou um desafio. Contando com os recursos pessoais de coping (habilidades de coping aprendidas no e do ambiente) e os sócio-ecológicos de coping (condições e recursos do ambiente em interação com o indivíduo), o evento estressante será submetido a uma segunda avaliação, na qual a busca de estratégias e a relação custo-benefício são o foco. Neste ponto, são desenvolvidas as estratégias que podem ser focalizadas no problema ou na emoção. Uma vez estabelecidas as estratégias de coping a serem utilizadas, obter-se-á um determinado resultado que será submetido a uma reavaliação. Em termos de método, Folkman e Lazarus (1980) propõem a compreensão de coping em uma dimensão de aproximação vs. evitação, também conhecida como coping ativo vs. passivo. Esta dimensão diz respeito à ação que o indivíduo realiza para responder ao estressor, podendo ser aproximação/ativa ou evitação/regulação emocional. De acordo com Câmara, Sarriera e Remor (2002), o desdobramento das dimensões do modelo original dá origem a quatro categorias de coping: aproximação comportamental, que consiste na realização de uma ação concreta para afrontar a situação estressante ou suas conseqüências; aproximação cognitiva, que corresponde a uma análise lógica da situação, reavaliação positiva ou ensaio mental de ações alternativas e suas conseqüências; evitação comportamental, como uma busca de compensações alternativas, abertura às emoções e envolvimento em comportamentos impulsivos, redutores de tensão; e, evitação cognitiva, traduzida em pensamentos ou respostas que objetivam negar ou minimizar a gravidade da situação de crise ou suas conseqüências. Estudos de Cohen, Bem-Zur e Rosenfeld (2008) reforçam que um maior uso do coping com foco nas emoções está significativamente relacionado com maior estresse psicológico. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

156 Avaliação das estratégias de enfrentamento no contexto do trabalho As pesquisas na área de coping têm se mantido bastante produtivas nas últimas duas décadas (PINHEIRO; TRÓCCOLI; TAMAYO, 2003). Apesar disto, questões conceituais e metodológicas envolvidas no estudo do construto permanecem sob discussão. Dentre elas, ressaltam-se a falta de consenso sobre os tipos de estratégias de coping a serem avaliados (CARVER; SCHEIER; WEIN- TRAUB, 1989), a mensuração do construto, que tem sido realizada através de uma variedade de medidas, mas sem uma avaliação adequada quanto às propriedades psicométricas (LATACK, 1986) e o fato de as medidas de coping não considerarem os fatores contextuais na identificação das estratégias de enfrentamento a serem utilizadas (TAMAYO; TRÓCCOLI, 2002). No contexto ocupacional, alguns princípios sobre o processo do estresse já estão bem delimitados. Sabe-se, por exemplo, que ter alta auto-eficácia com respeito a manejar um estressor específico é benéfico para a pessoa, e também que as opções de coping não são apenas determinadas pelas possibilidades de controlar a situação, mas também por aspectos do ambiente como as demandas de competição (FOLKMAN, 2009). Assim, considerando as restrições impostas pelo ambiente ocupacional, a esquiva pode ser a mais adaptativa estratégia disponível em um contexto altamente estressante, com poucos recursos ambientais e restrição de expressão de uma ampla gama de estratégias adaptativas em outros contextos (DEWE; COX; FERGUSON, 1993). Assim, a mensuração de coping no ambiente ocupacional deve considerar os recursos e estratégias disponíveis, mas também permitir agilidade ao preenchimento (em função das diversas rotinas laborais) e satisfazer critérios psicométricos usuais (PINHEIRO; TRÓCOLI ; TAMAYO, 2003). Na avaliação de coping em geral existem alguns instrumentos já consagrados que contemplam o modelo básico de coping. Dentre estes, ressaltam-se a Ways of Coping WOC, versão atualizada da Ways of Coping Checklist (FOLKMAN et al. 1986), que é também amplamente utilizada como base para a construção de outras escalas; a Coping Strategy Indicator CSI (AMIRKHAN, 1990) e a COPE (CARVER; SCHEIER; WEIN- TRAUB, 1989). No contexto do trabalho, um dos primeiros estudos tentava acessar os inúmeros construtos presentes no complexo processo do estresse ocupacional, incluindo medidas de estressores, mediadores e conseqüências físicas e psicológicas. Os problemas principais apresentados no instrumento foram a falta de validação de construto, o baixo índice de confiabilidade em algumas sub-escalas e o tamanho reduzido da população normativa (LYNE et al., 2000). Swan, Moraes e Cooper (1993) realizaram a tradução dos itens do OSI (Occupational Stress Indicator) para a língua portuguesa, no entanto, considerando o número de itens do instrumento ou mesmo o número de fatores que compõem cada escala, a quantidade de sujeitos para a validação é insuficiente (PASQUALI, 1999). Diante da instabilidade do construto de coping, especialmente no contexto ocupacional, revela-se a importância de fundamentar um novo instrumento com as experiências de trabalhadores em lidar com estressores específicos em seu contexto de trabalho. Nesse sentido, o presente estudo seguiu os passos da elaboração de instrumentos de medida psicológica, considerando as limitações do entorno para a utilização de estratégias para lidar dom o estresse 156 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

157 no trabalho. Uma escala de avaliação de estratégias de coping entre trabalhadores brasileiros consiste em uma importante ferramenta que pode favorecer o diagnóstico de dificuldades enfrentadas assim como déficits no repertório de trabalhadores para lidar com seu cotidiano laboral, visando a promoção da saúde do trabalhador. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi desenvolvido em duas etapas subseqüentes, sendo a primeira qualitativa (construção da escala) e a segunda quantitativa (análise das propriedades psicométricas), correspondendo estas aos pólos teórico e empírico da elaboração de medidas psicológicas, respectivamente (PAS- QUALI, 1998). Etapa 1 Construção do instrumento de medida O desenvolvimento metodológico de ítens constituiu-se das seguintes etapas: a) revisão da literatura, com operacionalização de modelos teóricos sobre coping, sob a forma de cognições ou comportamentos factíveis (PASQUALI, 1998); e, b) 32 entrevistas semi-estruturadas com trabalhadores dos três setores econômicos (comércio, indústria e serviços) que relataram uma situação específica estressante no trabalho e a forma como lidaram, em um primeiro momento, com o evento. Participaram do estudo qualitativo 32 trabalhadores selecionados por acessibilidade, das mais diversas ocupações no mercado laboral, incluindo autônomos, profissionais com baixa escolaridade até profissionais de ensino superior atuando em sua área em empresas tanto públicas quanto privadas. A faixa etária dos participantes variou de 21 a 57 anos, o gênero foi eqüitativo, da mesma forma que o estado civil, entre casados e não casados. Utilizou-se como instrumento entrevista semiestruturada que contemplou seis questões norteadoras, de acordo com as áreas de interesse da pesquisa: 1) Situação estressora; 2) Reação à situação de estresse; 3) Fatores estressantes no trabalho; 4) Estratégias de coping; 5) Repercussões do estresse; e, 6) Repercussões das estratégias de coping. As entrevistas individuais, com duração média de meia-hora foram realizadas com os trabalhadores em locais convenientes para os entrevistados. Os dados colhidos foram gravados e, posteriormente transcritos na íntegra, de forma literal. O material colhido foi submetido à análise de conteúdo, de acordo com Bardin (2002), o que permitiu o estabelecimento de categorias bem delimitadas de acordo com o referencial teórico sobre o tema (LAZARUS; FOLKMAN, 1984; RIBEIRO; RO- DRIGUES, 2004). Geração de temas (dimensões) e itens sobre formas de lidar com eventos estressantes no trabalho. O instrumento foi desenvolvido de acordo com os princípios e técnicas da construção de testes desenvolvidos por psicólogos (EIGNOR, 2001). A análise de conteúdo das entrevistas identificou 108 respostas que foram agrupadas em 12 categorias de resposta (estratégias de coping de religiosidade, ilusão, atividades distratoras, evitação cognitiva, fuga dos problemas, apoio social, isolamento, reavaliação positiva, mudança de hábitos alimentares e consumo de álcool, acomodação, foco na tarefa pela tarefa e ironia). Tais categorias foram operacionalizadas em 45 itens na versão inicial da escala. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

158 Validade de conteúdo Para verificar a validade aparente (face validity, ANASTASI; URBINA, 1997), a compreensão e a relevância dos itens para as estratégias de coping utilizadas no contexto de trabalho, a versão inicial encaminhada a experts, psicólogos (n=6), em Psicologia Social do Trabalho, com um protocolo estandartizado de avaliação. Neste, os juízes: a) avaliaram o aspecto semântico dos itens (clareza dos conteúdos, expressões, regência verbal e compreensibilidade dos termos para adolescentes de diferentes classes sociais); b) analisaram os itens e os classificaram em três categorias (adequados - expressam opinião adequada sobre o tema, plausíveis - frase não totalmente adequada, mas que expresse algum aspecto do contruto, e ingênuos - nem adequado e nem plausível); c) categorizaram os itens em estratégias de coping (avaliação da adequação de cada item aos fatores apresentados); e, d) indicaram se o item deveria ser aceito tal como estava, revisado ou eliminado. As respostas dos experts foram avaliadas através de porcentagens para modificação e exclusão de itens. O critério estabelecido para a tomada de decisão acerca da manutenção, modificação ou rejeição de itens foi: a) para compreensibilidade um item foi revisado quando o acordo acerca da clareza dos itens foi menor que 80%, b) relevância para o construto - um item era retirado quando menos de 80% dos juízes considerou o item relevante para o tema, c) para modificação, o item foi reescrito quando mais de 20% dos experts recomendaram modificação, e d) quanto à correspondência itemdimensão, os itens foram mantidos quando houve acordo entre mais de 80% dos experts. Considerando tais quesitos, não houve itens a serem retirados, mas cinco itens foram revisados para uma melhor adequação à população-alvo do instrumento. As questões do instrumento eram respondidas através de escala tipo Likert de cinco pontos, sendo que quanto menores os escores, menor a freqüência de utilização da estratégia (Nada-Muito freqüentemente). Etapa 2 Avaliação das propriedades psicométricas do instrumento de medida elaborado A população para a qual foi construído o instrumento corresponde a qualquer trabalhador, uma vez que situações estressoras fazem parte do contexto do trabalho de maneira geral (OMAR; PARIS, 2008). Assim, foram selecionados por acessibilidade 232 trabalhadores que eram também estudantes de uma universidade privada da Região Metropolitana de Porto Alegre. Todos cumpriram o critério estabelecido de preenchimento de mais de 90% dos itens da escala. O tamanho amostral foi definido de acordo com os requisitos necessários à realização da análise fatorial exploratória - cinco sujeitos por item do instrumento (GARCÍA JIMÉNEZ; GIL FLORES; RODRÍGUEZ GÓMEZ, 2000). A aplicação do instrumento, mediante autorização expressa das coordenações de curso e dos participantes, por meio de assinatura ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TCLE, foi realizada em salas de aula, pelos pesquisadores, com tempo médio de 15 minutos. A análise psicométrica da escala correspondeu a uma análise descritiva acerca da distribuição das respostas dos sujeitos em cada item da escala para avaliação da normalidade das respostas nos itens e análise fatorial exploratória. Utilizou-se o método de Componentes Principais, com rotação ortogonal Varimax, que pressupõe independência entre os fatores, para a análise da validade de construto do instrumento (HAIR et al., 2009). 158 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

159 O projeto deste estudo, cumprindo com os critérios para a realização de pesquisas com seres humanos, foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição de afiliação dos autores. RESULTADOS Dentre os sujeitos que responderam ao instrumento construído, 66,4% eram do gênero feminino. As idades variaram de 18 a 55 anos, com média de 30 anos (DP=8,79). O tempo médio de trabalho na empresa atual foi de sete anos 84 meses (DP = 7,88) e o tempo médio na profissão ou cargo atual foi de cinco anos e meio (DP = 7,33). Antes de utilizar a análise fatorial, verificou-se a normalidade de cada um dos 45 itens da escala, através das freqüências de resposta dos sujeitos às opções de resposta para cada item (utilização de histogramas com curva normal). Não houve quaisquer problemas quanto à dispersão das respostas (efeito chão ou teto ) pois esta foi restrita, indicando homogeneidade em todos os ítens. A adequação da amostra para a análise fatorial foi mensurada de acordo com o teste de esfericidade de Bartlett (x 2 =8399,5; p=0,000), o qual indicou que a matriz de dados é adequada para proceder à análise fatorial (FIELD, 2009). Análise fatorial exploratória Pelo critério de comunalidades, de que a solução fatorial deve explicar, pelo menos, metade da variância de cada variável original, foram excluídos aqueles itens cujo valor apresentou-se menor que 0,50 (15 itens), após cinco interações. Em seguida, foram avaliados aqueles itens que apresentaram estrutura complexa, isto é, que saturaram em um ou mais fatores além de seu fator de pertença, com valor igual ou superior a Após três novas interações foram excluídos 11 itens. Todos os 19 itens restantes apresentaram carga fatorial superior a 0,30. Os cinco fatores encontrados a partir da distribuição de seus componentes e de seus autovalores (superiores a 1), explicaram 60% da variância e permitiram identificar uma distribuição fatorial bem delimitada tanto na análise quanto em termos de aderência à teoria. A análise semântica dos agrupamentos de itens (fatores), acrescida da teoria sobre Coping, contribuiu para uma análise acerca do significado de cada fator obtido. Nesse sentido, foi possível denominar o fator 1 de religiosidade, o fator 2 de apoio social, o fator 3 de evitação comportamental, o fator 4 de evitação cognitiva e o fator 5 de expressão emocional (Tabela 1). Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

160 Tabela 1 - Itens por fator, carga fatorial, médias e desvio-padrão dos itens e coeficientes alfa de Cronbach por fator (Canoas/RS, N = 232). Fator Item Carga Fatorial Média DP F1 Peço orientação a Deus 0,810 2,72 1,49 Religiosidade Busco proteção e consolo na fé 0,768 2,74 1,51 Rezo, oro 0,716 2,78 1,46 Espero que Deus resolva os problemas 0,707 1,88 1,13 Leio a bíblia ou evangelho 0,687 1,88 1,16 Vou à missa ou culto 0,668 2,14 1,28 Espero que um milagre aconteça 0,535 1,67 1,04 F2 Converso com pessoas de confiança 0,829 3,69 1,23 Apoio Social Converso com amigos 0,718 3,52 1,24 Compartilho o problema com uma pessoa de confiança 0,689 3,81 1,06 Converso com familiares 0,545 3,34 1,25 Busco orientação com pessoas mais experientes 0,465 3,45 1,32 F3 Compro algo para mim 0,764 2,56 1,19 Evitação comportamental Tento divertir-me indo ao cinema ou ouvindo música 0,707 3,11 1,25 F4 Engulo o sapo (aceito e não revido) 0,703 2,58 1,10 Evitação cognitiva Isolo-me em silêncio até a raiva desaparecer 0,582 2,71 1,29 Culpo os outros 0,621 1,69 0,93 F5 Uso tranqüilizantes 0,722 1,24 0,80 Expressão emocional Respondo a provocações 0,734 2,16 1, A fidedignidade, avaliada pelo método alfa de Cronbach, para cada fator foi: 0,84, 0,70, 0,63, 0,50 e 0,44, respectivamente. Os resultados indicam que os itens componentes de cada um dos três primeiros fatores apresentaram maior similaridade no estilo de resposta dos sujeitos dessa amostra, aumentando sua consistência interna e demonstrando que os primeiros fatores na análise fatorial, apresentam também maior poder explicativo em relação ao construto. Já os fatores quatro e cinco apresentaram baixa consistência interna (BISQUERRA; SARRIERA; MARTÍNEZ, 2004). DISCUSSÃO A etapa inicial, de desenvolvimento de itens, contou com o importante aporte das experiências de trabalhadores de diversas atividades no mercado de trabalho. Além disso, a entrevista com os trabalhadores contava com uma questão acerca do relato da última situação estressante vivida no trabalho, o que permite a recuperação do estado emocional naquele momento. Nesse sentido, as estratégias utilizadas (o que fez em uma primeira reação) foram relatadas especificamente para o evento (SEIDL; TRÓCCOLI; ZANNON, 2001). Não obstante, os estressores vividos por um grupo bastante heterogêneo de trabalhadores pôde ser classificado em categorias gerais, da mesma forma que suas estratégias para fazer frente a tais estressores. Foi possível identificar que o contexto de trabalho apresenta certas regularidades em termos de estressores, da mesma forma que os trabalhadores utilizam estratégias 160 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

161 similaridades para enfrentá-los (OMAR; PARIS, 2008). As avaliações dos juízes especialistas em Psicologia Social do Trabalho, com conhecimento sobre coping, indicaram adequada validade aparente. Assim, de acordo com os parâmetros teóricos, a escala poderia ter mantido seus 45 itens iniciais como representantes das estratégias de coping de trabalhadores. No entanto, a eliminação de itens seguiu parâmetros estatísticos bem definidos que mantiveram uma estrutura fatorial compatível com o modelo teórico utilizado. Com isso também obteve-se um instrumento enxuto que contemplou a extensão do construto no contexto do trabalho (VIEYTES, 2004). As saturações dos itens em um fator geral (comunalidade) foram todas superiores a 0,50 e o modelo obtido explicou mais de 50% da variância do construto. Cada item saturou em seu fator de origem, não havendo itens complexos que saturassem com carga fatorial igual ou superior a 0,30 em dois ou mais fatores. Tais procedimentos permitiram que o modelo fatorial contasse com fatores puros e bem delimitados estatisticamente (HAIR et al., 2009). A análise fatorial demonstrou que a escala de estratégias de coping no trabalho apresentou cinco fatores. Foram agrupados em cada fator os itens relativos à religiosidade (peço orientação a Deus, busco proteção e consolo na fé, rezo, oro, espero que Deus resolva os problemas, leio a bíblia ou evangelho, vou à missa ou culto, espero que um milagre aconteça), busca de apoio social (converso com pessoas de confiança, converso com amigos, compartilho o problema com uma pessoa de confiança, converso com familiares, busco orientação com pessoas mais experientes), evitação comportamental (compro algo para mim, tento divertir-me indo ao cinema ou ouvindo música), evitação cognitiva ( engulo o sapo - aceito e não revido, isolo-me em silêncio até a raiva desaparecer, culpo os outros) e expressão emocional (uso tranqüilizantes, respondo a provocações). A escala como um todo pode ser utilizada para fins de pesquisa. Os fatores encontrados parecem representar adequadamente o modelo de coping proposto por Folkman e Lazarus (1980), considerandose que os dois primeiros fatores correspondem a estratégias de aproximação foco no problema e os três últimos fatores a estratégias de evitação foco na emoção. Como os dois primeiros fatores são os responsáveis pela maior parte da variância explicada (34,57%), verifica-se que as estratégias aproximação ao problema são preponderantes no contexto do trabalho, indo ao encontro dos estudos realizados por Folkman e Lazarus (1980). A análise da consistência interna de cada fator revelou alfas de satisfatórios a moderados nos três primeiros fatores. Os dois últimos fatores, no entanto, apresentaram alfas baixos indicando que não poderiam funcionar como escalas independentes. Nesse sentido, considera-se importante revisar alguns itens do instrumento inicial ou de outras escalas de coping no contexto de trabalho a fim de incorporar novos itens a estes fatores, dado que a confiabilidade é afetada pelo número de itens da escala (DANCEY; REIDY, 2006). Tal procedimento implicaria em uma nova análise das propriedades psicométricas dos fatores de evitação cognitiva e expressão emocional. É importante considerar que, apesar de o número de sujeitos utilizados para os estudos de validação da escala cumprir os critérios para a realização da validade de construto (análise fatorial), de acordo com García- Jimenéz, Gil Flores e Rodríguez-Gómez (2000), sua representação não pode ser generalizada. Os sujeitos eram Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

162 também estudantes universitários constituindo uma amostra de conveniência com características regionais do sul do Brasil que não representavam a diversidade de classes sociais e culturas existentes no país. CONCLUSÃO A utilização do instrumento em contextos laborais específicos pode contribuir para a identificação de formas habituais de lidar com estressores do trabalho, identificando as estratégias dos trabalhadores nos diferentes setores econômicos. Possivelmente, as diferenças entre os gêneros também possam ser contempladas em estudos mais abrangentes com a utilização do instrumento desenvolvido. Uma revisão da escala, considerando os aspectos mencionados, poderá contribuir para uma utilização mais ampla e maior compreensão das dificuldades dos trabalhadores frente às restrições do contexto de trabalho. Dessa forma, intervenções psicossociais poderão contribuir para fortalecer os trabalhadores para fazerem frente aos estressores presentes no ambiente em que passam grande parte de sua vida. REFERÊNCIAS AMIRKHAN, J. H. A factor analytically derived measure of coping: The coping strategy indicator. Journal of Personality and Social Psychology, v. 59, p , ANASTASI, A.; URBINA, S. Psychological Testing. Englewood Cliffs: Prentice Hall, BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, BISQUERRA, R.; SARRIERA, J. C.; MARTÍ- NEZ, F. Introdução à estatística: enfoque informático com o pacote estatístico. [S.l.]:SPSS, CâMARA, S. G.; SARRIERA, J. C.; REMOR, E. A. Análise fatorial da escala de afrontamento para adolescentes (ACS) em uma amostra de jovens de Porto Alegre. Aletheia, v. 16, p , CARVER, C. S.; SCHEIER, M. F.; WEIN- TRAUB, J. K. Assessing coping strategies: A theoretically based approach. Journal of Personality and Social Psychology, v. 56, p , COHEN; BEN-ZUR; ROSENFELD. Sense of Coherence, Coping Strategies, and Test Anxiety as Predictors of Test Performance Among College Students. International Journal of Stress Management, v. 15, n. 3, p , DANCEY, C. P.; REIDY, J. Introdução à análise de fatores. In:. Estatística sem matemática para psicologia usando SPSS para Windows. Porto Alegre: Armed, p DEWE, P.; COX, T.; FERGUSON, E. Individual strategies for coping with stress at work: a review. Work & Stress, v. 7, n. 1, p. 5-15, EIGNOR, D. R. Standards for the development and use of tests: the standards for educational and psychological testing. European Journal of Psychologicl Assessment, v. 17, p , FIELD, A. Descobrindo a estatística utilizando o SPSS. Porto Alegre: Bookman/Artmed, FOLKMAN, S. Question, Answers, Issues, and Next Steps in Stress and Coping Research. European Psychologist, v. 14, n. 1, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

163 FOLKMAN, S. et al. Dynamics of a stressful encounter: Cognitive appraisal, coping, and encounter outcomes. Journal of Personality and Social Psychology, v. 50, p , FOLKMAN, S.; LAZARUS, R. S. An analysis of coping in a middle-aged community sample. Journal of Health and Social Behavior, v. 21, p , GARCÍA-JIMÉNEZ, E.; GIL-FLORES, J.; RODRÍGUEZ-GOMÉZ, G. Cuadernos de estadística análisis factorial. Madrid, La Muralla, GASPARINI, S. M; BARRETO, S. M; AS- SUNCAO, A. A. Prevalência de transtornos mentais comuns em professores da rede municipal de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 22, n. 12, HAIR, J. F. et al. Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Bookman/Artmed, HUDEK-KNEZECIAE, J.; KARDUM, I. The effects of dispositional and situational coping, perceived social support, and cognitive appraisal on immediate outcome. European Journal of Psychological Assessment, v. 16, p , JACQUES, M. G. C. Abordagens teórico-metodológicas em saúde/doença mental & trabalho. Psicologia e Sociedade, v. 15, p , LATACK, J. C. Coping with job stress: measures and future directions for scale development. Journal of Applied Psychology, v. 7, n. 3, p , LAZARUS, R. S.; FOLKMAN, S. Stress, appraisal and coping. New York: Springer, LYNE, K. D. et al. A psychometric evaluation of the occupational stress indicator. Journal of Occupational and Organizational Psychology, v. 73, p , MURTA, S. G.; TROCCOLI, B. T. Avaliação de Intervenção em Estresse Ocupacional. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 20, n. 1, p , OMAR, A; PARIS, L. Predictores de satisfacción laboral en médicos y enfermeros. Estudos de psicologia, Natal, v. 13, n. 3, p , PASQUALI, L. Princípios de elaboração de escalas psicológicas. Revista de Psiquiatria Clínica, v. 25, n. 5, Análise fatorial: um manual teóricoprático. Brasília: Ed. da UnB, PINHEIRO, F. A; TRÓCCOLI, B. T; TA- MAYO, M. R. Mensuração de coping no ambiente ocupacional. Psicologia: Teoria e pesquisa, v. 19, n. 2, p , RIBEIRO, J. L. P.; RODRIGUES, A. P. Questões acerca do coping: a propósito do estudo de adaptação do brief cope. Psicologia, Saúde & Doenças, v. 5, n. 1, p. 3-15, SEIDL, E. M. F. l.; TROCCOLI, B. T.; ZAN- NON, C. M. L. C. Análise Fatorial de Uma Medida de Estratégias de Enfrentamento. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 17, n. 3, set SWAN, J. A; MORAES, L. F. R; COOPER, C. L. Developing the occupational stress indicator (OSI) for use in Brazil: A report on the reliability and validity of the translated OSI. Stress Medicine, v. 9, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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165 Contribuições da utilização de calculadoras gráficas na estruturação de conceitos relacionados a coordenadas polares di e n i F e r ki a k sc a P i n 1 ro d r i g o dalla ve c c h i a 2 ca r M e n Te r e s a ka i B e r 3 RESUMO O presente estudo tem como foco investigar o potencial de utilização de calculadoras gráficas na construção de ideias e conceitos matemáticos específicos. Para tanto, toma-se como pergunta diretriz: como as tecnologias informáticas, em particular o uso da calculadora HP 50g, podem contribuir para o estudo de conceitos relacionados a coordenadas polares? A pesquisa foi conduzida com um viés qualitativo. O referencial teórico foi baseado nas ideias de virtual e virtualização. Como principais contribuições indicam-se a visualização e os elementos específicos inerentes à realidade criada pela calculadora como potencializadores no processo de conjecturação matemática. palavras-chave: tecnologias de informação e comunicação, calculadora HP 50g, coordenadas polares. ABSTRACT This present study aims to investigate the potential of use of graphing calculators in the making of ideas and specific mathematical concepts. To this end, a guiding question is taken: how can information technologies, par- 1 Acadêmica do Curso de Licenciatura em Matemática/ULBRA - Bolsista PROICT/ULBRA 2 Professor do Curso de Licenciatura em Matemática/UL- BRA 3 Professora-Orientadora do PPG em Ensino de Ciências e Matemática e do Curso de Licenciatura em Matemática/ ULBRA (kaiber@ulbra.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

166 ticularly the use of the calculator HP 50g, contribute to the study of concepts related to polar coordinates? The research was carried out through a qualitative approach. The theoretical reference was based on the ideas of virtual and virtualization. Among the main contributions, the visualization and the specific elements inherent in this reality created by the calculator can be pointed out as boosters in the process of mathematical conjecture. Keywords: information and communication technologies, calculator HP 50g, polar coordinates. INTRODUÇÃO A investigação apresentada neste artigo está inserida no projeto de pesquisa intitulado Possibilidades e desafios da utilização de Ambientes Virtuais de Aprendizagem nos Cursos de Licenciatura em Matemática. O estudo tem como objetivo investigar as potencialidades de utilização de recursos tecnológicos nas atividades acadêmicas, no curso de Licenciatura em Matemática, bem como avaliar o impacto da utilização dos mesmos na aprendizagem dos estudantes e no seu processo de formação como professores. Como principal fator que influenciou e incentivou a presente investigação destaca-se a mudança no comportamento social e cultural da sociedade, provocada pela evolução das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) e que pode gerar potencialidades distintas para o processo de ensino e aprendizagem da Matemática. Atualmente, a pesquisa em relação ao uso das TIC, em sala de aula, faz-se necessária para que a educação cumpra seu papel de preparar o indivíduo para a vida social e para o mercado de trabalho em um contexto onde a tecnologia se faz cada vez mais presente. Não se pode negar o impacto provocado pela tecnologia de informação e comunicação na configuração da sociedade atual. Por um lado, tem-se a inserção dessa tecnologia no dia-a-dia da sociedade, a exigir indivíduos com capacitação para bem usá-la; por outro lado, tem-se nessa mesma tecnologia um recurso que pode subsidiar o processo de aprendizagem da Matemática. É importante contemplar uma formação escolar nesses dois sentidos, ou seja, a Matemática como ferramenta para entender a tecnologia, e a tecnologia como ferramenta para entender a Matemática (BRASIL, 2006, p. 87). No contexto do desenvolvimento do projeto, no ano de 2009, o foco da investigação voltouse para o potencial de utilização de calculadoras gráficas na construção de ideias e conceitos de objetos matemáticos específicos, inserindo-se na parceria criada entre a Universidade Luterana do Brasil e a empresa HP Calculadoras. Nesse sentido, procurou-se compreender aspectos do trabalho realizado com a calculadora HP 50g na disciplina de Matemática Aplicada IV, que aborda temas como Coordenadas Polares, Cálculo Vetorial e Equações Paramétricas. Para tanto, toma-se como pergunta diretriz: como as tecnologias informáticas, em particular o uso da calculadora HP 50g, podem contribuir para o estudo de conceitos relacionados a coordenadas polares? A natureza da pergunta evidencia o cunho qualitativo da pesquisa. Os sujeitos investigados são os alunos do curso de Matemática Licenciatura da Universidade Luterana do Brasil, que cursaram a disciplina de Matemática Aplicada IV no segundo semestre do ano de Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

167 Acredita-se que a utilização de tecnologias modifica a forma como se constrói o conhecimento, tendo como premissa básica a quebra da linearidade posta por outros meios. Nesse sentido, justifica-se essa investigação, uma vez que novas perspectivas e novos potenciais para a Educação Matemática podem surgir. Calculadoras gráficas e virtualização Na busca por enfoques pedagógicos que relacionem as TIC com a Educação Matemática, destaca-se a utilização de calculadoras gráficas. Autores como Borba (1999), Borba e Penteado (2003) e Scucuglia (2006) defendem e investigam essa associação, evidenciando elementos que possam contribuir para o processo de ensino e aprendizagem da Matemática. Assim como esses autores, embasa-se a busca por respostas às indagações propostas em referenciais que estão diretamente relacionados às questões tecnológicas. Em especial, será tratada a questão do virtual e da virtualização, sob o ponto de vista filosófico, associando-o, posteriormente, com ambientes informáticos. O virtual para o propósito do presente artigo será entendido dentro da filosofia escolástica, como algo que existe em potência e não em ato. De forma mais precisa, o virtual é tido como [...] um complexo problemático, o nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um acontecimento, um objeto ou uma entidade qualquer (LÉVY, 1996, p. 16). A virtualização, por sua vez, pode ser entendida como uma elevação à potência da entidade considerada (Lévy, 1996, p. 17). Sobre a virtualização, o autor revela que consiste em um [...] deslocamento do centro de gravidade ontológico do objeto considerado: em vez de se definir principalmente por sua atualidade (uma solução ), a entidade passa a encontrar sua consistência essencial num campo problemático. Virtualizar uma entidade qualquer consiste em descobrir uma questão geral à qual ela se relaciona, em fazer mutar a entidade em direção a essa interrogação e em redefinir a atualidade de partida como resposta a uma questão particular (LÉVY, 1996, p ). Ao enfatizar esses elementos, pretende-se sair do contexto coloquial em que o virtual é posto, confundindo-o, muitas vezes, com o espaço criado pelas tecnologias. Apesar da relação entre eles ser íntima, é necessário uma distinção. Entende-se o virtual não como o espaço criado pelo software, ou especificamente, pela calculadora gráfica, mas sim o ambiente problemático criado em torno de uma entidade ou situação. Salienta-se dessa colocação e das citações acima o elemento problemático. Nele está a essência daquilo que se assume no presente artigo por virtual e virtualização, não se devendo confundir a simples presença de um software, de um computador, de uma calculadora, ou passagem de uma tecnologia à outra com a virtualização. É necessário criar um campo problemático, elevando a entidade ou situação analisada a esse campo. Fica claro, a partir dessas colocações, que o que se entende por virtualização não está necessariamente relacionado com a presença de tecnologias digitais. Entretanto, como já evidenciado, a relação entre estes elementos é estreita. Dentre os aspectos os quais associam o virtual ao espaço dado pelas tecnologias destaca-se, neste artigo, a mudança de perspectiva que a realidade virtual pode proporcionar, a qual se associa, diretamente, às percepções de tempo e espaço, como Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

168 observado na visão de Bicudo e Rosa (2010). Para estes autores a realidade do mundo cibernético [...] pode, então, ser compreendida como um modo de viver a vida na dimensão do humano, como ela é, mesmo que as relações presentificadas nessa dimensão da realidade se dêem em um espaço mundano que deve ser caracterizado em termos do espaço/tempo possibilitado pelas tecnologias (BICUDO; ROSA, 2010, p.5). Defende-se aqui que é na transformação da percepção de tempo e espaço que as tecnologias podem oferecer que está uma das principais potencialidades desses recursos como vetores de virtualização, isto é, como elementos os quais podem elevar a entidade a um estado problemático, possibilitando o surgimento de novas perspectivas. Com base nessas idéias, serão focados nesta investigação os momentos nos quais a entidade foi posta em um estado problemático e modificouse, permitindo conjecturações e a construção do conhecimento matemático, mostrando, assim, possíveis contribuições da calculadora HP 50g para o estudo de coordenadas polares. MATERIAL E MÉTODOS A metodologia utilizada para realizar a investigação assume caráter qualitativo. Na abordagem qualitativa, segundo Santos Filho e Gamboa (2000) o propósito fundamental é a compreensão, a explanação e a interpretação do fenômeno estudado. Tomando a interação das calculadoras gráficas e o usuário como foco principal da investigação, o conjunto de informações das falas, gestos, interações entre as pessoas, interações com a calculadora HP 50g, constituiu-se na principal fonte de dados, os quais foram registrados por meio de filmagens. Powell, Francisco e Maher (2004) afirmam existir pelo menos dois potenciais de registro ao utilizar o vídeo como uma fonte de pesquisa: a densidade e a permanência. Análises detalhadas de vídeos e de dados longitudinais, assim como os de curto prazo, tornam-se mais eficazes a partir de múltiplas sessões de visualização. O vídeo não apenas nos permite múltiplas visões. Mas também possibilita visões sob múltiplos pontos de vista (POWELL; FRANCISCO; MAHER, 2004, p.91). Além disso, as observações foram complementadas com um diário de campo e documentos. Entende-se por documentos qualquer tipo de informação que possa contribuir como fonte de informação (ALVES-MAZOTTI; GEWANDS- NAJDER, 1999) e, no caso específico do presente artigo, os documentos constituem-se na produção dos alunos. O processo de elaboração e articulação dos dados é dado por triangulação 1. A coleta de dados ocorreu, principalmente, por meio de filmagens de atividades, onde havia a interação aluno-calculadora e a utilização de algum recurso proveniente da calculadora HP 50g. Com base nas perspectivas abordadas, nas próximas seções, serão apontados trechos de episódios de investigação, os quais foram desenvolvidos com as atividades propostas e que evidenciaram elementos relacionados à questão norteadora. 1 O processo de elaboração e articulação de diferentes dados é conhecido na literatura como triangulação de dados (BORBA; ARAÚJO, 2006; GOLDENBERG, 2005; ALVES- MAZZOTTI, 1999). 168 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

169 RESULTADOS E DISCUSSÃO Serão apresentados, nesta seção, relatos dos experimentos, bem como as conjecturações obtidas nas aplicações com os alunos. Procura-se evidenciar como o uso da calculadora HP 50g contribuiu para o estudo de conceitos relacionados a coordenadas polares. Fazem parte desse contexto as atividades elaboradas, as conjecturas obtidas e a análise de elementos específicos os quais contribuíram para que determinada conjectura fosse formada. eixo y, mais precisamente no ponto. A família r=a.senθ consiste em circunferências com diâmetro a e seu centro está localizado no eixo x, mais precisamente no ponto. r=a.senθ Experimento das Circunferências Esta atividade consistiu na investigação de duas famílias de circunferências, dadas em coordenadas polares. Pediu-se que os alunos, com o apoio das calculadoras HP 50g, analisassem o comportamento e esboçassem os gráficos das famílias de equações r=a.senθ e r=a.cosθ, r=a.cos(nθ), onde θ é a variável independente e representa o ângulo, r é a variável dependente e representa o raio e n representa uma constante 2 a ser definida pelos alunos. Essa atividade oportunizou a geração de conjecturas a respeito da natureza geométrica das equações propostas, dadas pela variação do coeficiente a das mesmas. No desenvolvimento da atividade, foi possível observar a construção dos gráficos pelos sujeitos da pesquisa. De um modo geral, não houve dificuldades para construir os gráficos que evidenciaram a natureza geométrica das famílias propostas que podem ser observadas na Figura 1. Como principais resultados, destacam-se as seguintes conjecturas: A família r=a.senθ consiste em circunferências com diâmetro a e seu centro está localizado no 2 Na atividade proposta considerou-se apenas n positivo e inteiro. r=a.cosθ Figura 1 - Gráficos das famílias de equações plotados pelos alunos. Experimento das Rosáceas A segunda atividade analisada pode ser descrita como uma continuação da primeira, uma vez que as circunferências, em coordenadas polares, podem ser entendidas como um caso particular de rosáceas. Após as discussões geradas pelo experimento das circunferências, foi solicitado aos alunos que fizessem uma investigação envolvendo o conjunto de equações: r=a.sen(nθ) e r=a.cos(nθ), onde θ é a variável independente e representa o ângulo, r é a variável dependente e representa o raio e n representa uma constante 3 a ser definida pelos alunos. 3 Na atividade proposta considerou-se apenas n positivo e inteiro. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

170 O objetivo dessa atividade era a construção de conjecturas acerca da natureza geométrica das rosáceas. Como primeiro elemento a ser percebido pelos alunos, destaca-se a conhecida relação entre o número de pétalas de cada rosácea com o coeficiente n do argumento da função. Ao variar o valor de n nos coeficientes, foi possível construir uma série de gráficos (Figura 2) e criar a seguinte conjecturação: A quantidade de pétalas das rosáceas para nθ é n, se n for ímpar e 2n, se n for par. r=a.sen(2θ) r=a.sen(3θ) r=a.sen(4θ) r=a.sen(5θ) r=a.sen(2θ) r=a.sen(3θ) r=a.sen(4θ) r=a.sen(5θ) Figura 2 -Gráficos de rosáceas plotados pelos alunos na calculadora HP 50g. Para evidenciar a construção dessa conjectura, apresenta-se um excerto que descreve a fala de dois alunos, denotados de aluno L e aluno A. Nele, aparentemente, o aluno L já havia percebido a relação existente entre o coeficiente do argumento e o número de pétalas e conduzia a conversa de tal forma que propiciasse a descoberta dessa relação pelo seu colega. A: L, o n do argumento é o número de pétalas?! No 1 não, mas do 2 adiante... n igual a dois é quatro... L: E tem uma outra coisa interessante que acontece nos ímpares que tu não percebeu ainda... A: n=4 é oito... L: Então, nos pares é o quê? A: Nos pares é o dobro e nos ímpares é o próprio número, né... A continuação da conversa revela que o aluno L. percebeu outra relação que responde à pergunta: por que quando n é par dobra o número de pétalas e quando n é ímpar não? L: Tem uma outra coisa agora interessante que acontece nos ímpares. A: Vou adiante então Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

171 L: Não, pode fazer com o 3 e o 5...o 7... com esses mesmo que tu fez. Tu está vendo que ele acabou de desenhar já...e demorou pra aparecer o menuzinho embaixo. A: Ele está fazendo alguma operação. L: Ele está fazendo mais alguma operação, o que ele está fazendo? A: Será que ele não está passando de novo? Em cima do próprio traço? Está repetindo o gráfico? L: Está repetindo. A: Está repetindo... [...] quantas vezes? L: Eu fiquei intrigado com isso daí eu fui pro papelzinho...mas, ela está repetindo. Vê quanto tempo ela demorou pra desenhar uma vez. Quando ela começar a desenhar tu começa a contar mentalmente. Ela acabou de desenhar tu começa outra contagem. E daí tu vai descobrir quantas vezes. A: É uma vez só... L: Ela vai repetir uma vez só? A: É, uma vez! Eu fiz com cinco... de repente... L: Vê quantas vezes ele vai repetir com 3, quantas vezes ele vai repetir com 7... A: Ele repete sempre uma vez. L: É, ela passa sempre duas vezes pelo ponto. Considera-se implícito nesse diálogo a já citada pergunta: por que quando n é par dobra o número de pétalas e quando n é impar não? Na verdade, ao se fazer uma construção gráfica com a variação de angulação 4 0 θ 2p, sempre há uma duplicação 4 Cabe salientar que foi configurado em todas as calculadoras HP 50g utilizadas no experimento o intervalo de angulação 0 θ 2p no número de pétalas. Entretanto, nos casos em que n é ímpar, cada pétala é desenhada duas vezes no intervalo de 0 θ 2p, isto é, as 2n pétalas estão sobrepostas duas a duas, configurando uma imagem gráfica de apenas n pétalas. O que chama a atenção nesse excerto é a maneira como essa relação foi obtida. Claramente, vê-se que só foi possível graças ao tempo de depuração da calculadora. Quando o aluno L fala Tu está vendo que ele acabou de desenhar já...e demorou pra aparecer o menuzinho embaixo, está se referindo às características específicas da calculadora HP 50g, que só apresenta as barras de ferramentas menuzinho ao concluir o gráfico. Se não havia aparecido a barra de ferramentas no visor é porque a calculadora estava ainda processando algum dado, fato expressado na fala do aluno A: Ele está fazendo alguma operação. Entretanto, esse fato só garantiu a repetição e não a duplicidade. Novamente, considera-se que o tempo de depuração foi responsável pela conjecturação, mas nesse caso, a da duplicidade. A idéia de usar o tempo como fator de análise da quantidade de repetições parte do aluno L com a seguinte proposta: Vê quanto tempo ela demorou pra desenhar uma vez. Quando ela começar a desenhar tu começa a contar mentalmente. Ela acabou de desenhar tu começa outra contagem e é confirmada pelo aluno A que, após algumas tentativas, conclui: Ele repete sempre uma vez. Ao investigar as equações r=sen(nθ) e r=cos(nθ), com o uso de calculadoras, estabelecese uma mudança na percepção da problemática da situação, dada pela realidade que as tecnologias proporcionam. O tempo em particular o tempo de depuração foi um dos principais fatores que proporcionaram essa discussão. Como já evidenciado no referencial teórico, a questão do tempo/espaço são os dois principais elementos que constituem a realidade dada pelos meios di- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

172 gitais (BICUDO; ROSA, 2010). Evidentemente, a questão do tempo é muito mais abrangente do que o tempo de depuração, mas sua relevância se dá no momento em que esse condiciona fatores relativos ao espaço/tempo da realidade do mundo cibernético. Nesse contexto, toma-se o espaço condicionado pela presença da tecnologia como um vetor de virtualização, corroborando, assim, com as idéias de Lévy (1996, p. 18), o qual afirma que [...] a virtualização [...] consiste, sobretudo, em fazer das coordenadas espaço-temporais [...] um problema sempre pensado e não uma solução estável. Entretanto, cabe salientar que a virtualização em si, isto é, a elevação da entidade a um estado problemático não se deu pela execução de um problema informático ou pela demora do mesmo. Conforme Lévy (1996, p. 40), o [...] virtual só eclode com a entrada da subjetividade humana. Portanto, somente a partir da problemática instaurada e da constante reflexão e reinvenção dessa problemática por meio da subjetividade dada pelo humano é que pode ocorrer a virtualização. Não são apenas as características específicas inerentes a uma dada realidade que contribuem para o processo de construção do conhecimento. A mudança de percepção da realidade pode, também, contribuir para o firmamento de uma dada conjecturação. Isso pode ser percebido na fala do aluno L quando diz que: Eu fiquei intrigado com isso daí eu fui pro papelzinho, referindo-se ao momento em que usou lápis e papel para investigar a conjectura proposta. Ao mesmo tempo em que o meio digital proporciona ambientes propícios a determinadas investigações, ele possui limitações, por causa das características específicas do espaço e tempo que condiciona. Nesse sentido, a mudança da percepção da realidade ou de perspectiva pode proporcionar uma mudança da percepção da problemática envolvida, influenciando no processo de virtualização e dando uma caracterização dinâmica à situação envolvida. Ao se adotar o ponto de vista dado pelo virtual, o caráter dinâmico de uma entidade evidencia-se. Nesse sentido, Lévy revela que: Por um lado, a entidade carrega e produz suas virtualidades: um acontecimento, por exemplo, reorganiza uma problemática anterior e é suscetível de receber interpretações variadas. Por outro lado, o virtual constitui a entidade: as virtualidades inerentes a um ser, sua problemática, o nó de tensões, de coerções e de projetos que o animam, as questões que o movem, são uma parte essencial de sua determinação (LÉVY,1996, p. 16, grifos do autor). Destaca-se, nesse caso, que a mudança da percepção da realidade, ou o retorno à problemática inicial, que consistia no uso do lápis e papel, participou do processo de virtualização da entidade. Não se trata, apenas, de uma volta ou um retorno ao ponto inicial 5, mas sim de um avanço na problemática. Nesse sentido, Deleuze (1988, p. 338), ao falar de virtual revela: Indo de A para B e, depois, retornando de B para A, não encontramos um ponto de partida, [...]; a repetição é, antes, entre A e B, B e A; é o percurso ou a descrição progressiva do conjunto de um campo problemático. Esse processo investigativo envolvendo os alunos L e A não cessou com as descobertas colocadas no excerto analisado. No presente artigo optou-se por analisar apenas um excerto, apresentando as demais conjecturas de forma descritiva. 5 Antes de investigarem as situações propostas os alunos trabalharam a construção de gráficos usando lápis e papel. Nesse sentido que se está falando em retorno. 172 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

173 Assim, destaca-se a conjectura: Para as rosáceas, r=a.cos(nθ) o ápice de uma das pétalas sempre será no ponto (em coordenadas polares 6 ) (a,0) e para a família r=a.sen(nθ), no ponto. Essa afirmação originou-se de uma discussão que pairava sobre a distribuição das pétalas em relação ao eixo coordenado x. Entretanto, um comparativo visual entre o conjunto de equações cosseno e seno contribuiu para que fossem expostos argumentos relativos aos pontos que representavam o ápice das pétalas das rosáceas. A partir dessa conjecturação passou-se a explicitar em termos matemáticos, o fato percebido visualmente. No conjunto das conclusões matemáticas obtidas com essa atividade, ainda encontra-se a seguinte conjectura: A diferença em graus entre um ápice e outro de cada pétala de uma rosácea dá-se pela regra (nº pétalas)/360º. Também, optase apenas por citá-la, como forma de contribuir num contexto mais geral, mostrando-a como uma possibilidade pedagógica no contexto investigado, o que não deixa de estar em consonância com elementos envolvendo a questão que orienta este artigo. Como principal contribuição da investigação, indica-se a visualização como potencializador no processo de conjecturação acerca da relação existente entre as formas algébricas e geométricas dos objetos estudados. Com base na análise dos dados, constatouse que, além de estruturações e relações básicas entre o formato de equações do sistema polar e do sistema cartesiano, a visualização pode instigar discussões e conjecturações inesperadas, sendo tomada como ponto de partida para investigações envolvendo demonstrações matemáticas. Outro aspecto que se mostrou relevante ao olhar dos investigadores foi o fator tempo, em particular o tempo de depuração, proporcionado pelas características específicas da realidade proporcionada pela calculadora. Esse consistiu um elemento essencial no que diz respeito à sua influência nas discussões dos alunos. A investigação realizada tem gerado questões que estão sendo aprofundadas e difundidas em artigos, livros e apresentações em congressos específicos da área. Salienta-se que os argumentos evidenciados aqui não constituem uma resposta final à pergunta diretriz, mas sim elementos que contribuíram para uma melhor compreensão do papel da tecnologia na construção do conhecimento. CONCLUSÃO Procurou-se, com os argumentos apresentados, dar indícios de como a utilização da calculadora HP 50g pode contribuir para o estudo de conceitos relacionados a coordenadas polares. Com esse objetivo norteando a investigação, foram evidenciados, ao longo do artigo, elementos que dizem respeito à apresentação dos experimentos, às conjecturas obtidas e à análise de discussões que as envolvem. 6 Em coordenadas polares, a primeira coordenada do parênteses se refere ao raio e a segunda, ao ângulo. AGRADECIMENTOS Este trabalho teve o apoio da Universidade Luterana do Brasil por meio do PROICT/ULBRA e da HP Calculadoras na pessoa do Sr. Enrique Ortiz. REFERÊNCIAS ALVES-MAZZOTI, A. J. O Método nas Ciências Sociais. In: ALVES-MAZZOTI, A. J.; GE- WANDSZNAJDER, F. O Método nas ciências Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

174 Naturais e Sociais: Pesquisa Quantitativa e Qualitativa. 2. ed. São Paulo: Pioneira, BICUDO, M. A. V.; ROSA, M. Educação Matemática na Realidade do Ciberespaço Que Aspectos Ontológicos e Científicos se Apresentam. Revista Latinoamericana de Investigación em Matematica educativa, México, v. 13, n. 1, p. 1-30, BORBA, M. C. calculadoras Gráficas e educação Matemática. Rio de Janeiro: Art Bureau, BORBA, M. C.; PENTEADO, M. G. Informática e educação Matemática. 3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, BORBA, M. C.; ARAÚJO, J. L. Construindo pesquisas coletivamente em Educação Matemática. In: BORBA, M. C.; ARAÚJO, J. L.a (Org.). Pesquisa Qualitativa em educação Matemática. 2. ed. São Paulo: Autêntica, BRASIL, Ministério da Educação. Orientações curriculares para o ensino médio. ciências da natureza, matemática e suas tecnologias. Brasília: Secretaria de Educação Básica, DELEUZE, G. Diferença e Repetição. Rio de Janeiro: Graal, GOLDENBERG. M. A. Arte de Pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em ciências Sociais. 9. ed. Rio de Janeiro: Record, LÉVY, P. O que é o virtual. São Paulo: Editora 34, POWELL, A. B.; FRANCISCO, J. M.; MA- HER, C. A. Uma Abordagem à Análise de Dados de Vídeo para Investigar o Desenvolvimento de Idéias e Raciocínios Matemáticos de Estudantes. Bolema, Rio Claro, v. 17, n. 21, p , SANTOS FILHO, J. C. O.; GAMBOA, S. Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. São Paulo: Cortez, SCUCUGLIA, R. A Investigação do teorema Fundamental do cálculo com calculadoras Gráficas Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

175 Experiências de quase-morte e mudanças na vida li a n e Ma r i a Fa g u n d e s Pi n T o 1 Fe r n a n d a Ba r c e l lo s se r r a lta 2 RESUMO Esse estudo qualitativo e exploratório objetiva descrever as vivências características de Experiências de Quase- Morte (EQM) e as suas conseqüências em pessoas que passaram por este tipo de experiência. Para validar a experiência, os participantes responderam a Escala de EQM (GREYSON, 1983a) e a Escala de Experiência Dissociativa (EED) (CARLSON; PUTNAM, 1993). Após, foram realizadas entrevistas em profundidade, analisadas pelo método de análise de conteúdo proposto por Bardin (2009). As descrições obtidas são compatíveis com os relatos de EQM na literatura internacional. Como conseqüências da EQM sobressaíram os efeitos positivos sobre a vida dos sujeitos, como, por exemplo, o incremento da auto-estima e da autoconfiança. palavras-chave: Experiência de Quase-Morte (EQM), experiência dissociativa, mudanças na vida. ABSTRACT This qualitative and exploratory study aims to describe characteristics of Near-Death Experiences (NDE) and their consequences to life of people who have gone through this kind of experience. Participants responded to the NDE (GREYSON, 1983a) and to the Dissociative Experience Scale (DES) (CARLSON; PUTNAM, 1993) scales in order to confirm true NDE. Thereafter, depth interviews were conducted and analyzed by content 1 Acadêmica do Curso de Psicologia/ULBRA 2 Professora-Orientadora do Curso de Psicologia/ULBRA (psifer@terra.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

176 analysis method (BARDIN, 2009). Results are compatible with international literature reports of NDE. The study revealed positive life effects of NDE, for example, increased self-esteem and self-confidence. Keywords: Near-Death Experience (NDE), dissociative experience, changes in life. INTRODUÇÃO As Experiências de Quase-Morte (EQMs) consistem em um conjunto de experiências extraordinárias presentes de forma uniforme nos relatos daqueles que passaram pela morte clínica e conseguiram sobreviver (MOODY JUNIOR, 1975; MORSE, 1983; GREYSON; LONG, 2006; GREYSON, 2007a). Com etiologia controversa e desconhecida, as EQMs são explicadas por teorias biológicas (neurofisiológicas, neuro-anatômicas e neuroquímicas), teorias psicológicas e até mesmo por teorias espirituais e místicas. A constatação de que EQMs também ocorrem em pessoas que acreditaram estar diante da iminência da morte, mesmo que de fato não estejam (FRENCH, 2005), sustenta a hipótese psicológica de que a produção deste tipo de experiência dependa mais da ameaça percebida do que da ameaça real de morte (APPLEBY, 1989; OWENS; COOK; STEVENSON, 1990). Algumas teorias psicológicas compreendem o fenômeno das EQMs como um complexo fenômeno dissociativo (APPLEBY, 1989; FRENCH, 2005; GREYSON, 2000; 2007a), uma espécie de defesa frente à situação traumática da consciência de morte iminente. É importante ressaltar que, embora as EQMs tenham características similares a estados psicopatológicos, elas envolvem diferentes conseqüências e necessitam de uma abordagem terapêutica diferenciada (GREYSON, 2000; ATHAPPILLY; GREY- SON; STEVENSON, 2006). Em um interessante estudo realizado com uma amostra de pacientes que estiveram muito próximos da morte, Greyson (2000) encontrou que os pacientes que relataram EQMs (n=96) apresentaram significativamente mais sintomas dissociativos do que os referidos pelo grupo de comparação (n=38). Ademais, entre os que relataram EQMs, a profundidade da experiência foi correlacionada positivamente com os sintomas dissociativos, embora o nível de sintomas fosse substancialmente mais baixo do que os níveis dos pacientes com desordens dissociativas patológicas. A interpretação dos resultados mostra que o padrão dos sintomas dissociativos relatados pelos pacientes que experienciaram EQMs é consistente com uma resposta dissociativa não-patológica ao estresse. Embora experiências anômalas de consciência sejam comuns na população em geral, não se tem uma estimativa real da sua ocorrência (ALMEIDA; LOTUFO NETO, 2003). Há indicativos de que a prevalência de EQMs venha aumentando como resultado das modernas técnicas, equipamentos e do sucesso obtido nas ressuscitações (NOYES, 1980; VAN LOMMEL et al., 2001; SIMPSON, 2001; PARNIA; FENWICK, 2002). As EQMs ocorrem mesmo que o paciente não tenha mantido qualquer contato com informações acerca de suas características ou efeitos (LOPEZ et al., 2005; GREYSON, 2007a). Em pacientes sobreviventes de parada cardíaca, a prevalência das EQMs situa-se entre 12% e 18% (PARNIA; FENWICK, 2002; GREYSON; LONG, 2006). Ressalte-se, entretanto, que provavelmente esses índices sejam submensurados, visto que os pacientes têm medo da reação alheia frente ao fenômeno experienciado 176 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

177 (SIMPSON, 2001) e também porque este tipo de experiência é freqüentemente negligenciada pelos pesquisadores (PARNIA; FENWICK, 2002; AL- MEIDA; LOTUFO NETO, 2003). Moody Junior (1975) foi o primeiro a estudar as Experiências de Quase-Morte (EQMs). Em seu livro Life after life ( Vida depois da vida ), o autor agrupa quinze características que estavam presentes nos relatos dos pacientes que experienciaram uma EQM: 1. inefabilidade; 2. ouvir a notícia de sua morte pela equipe médica, familiares ou outros; 3. sentimento de paz e/ou sensações agradáveis; 4. ouvir sons (ruídos desagradáveis ou músicas agradáveis); 5. perceber/estar em um túnel de luz ou buraco escuro no espaço; 6. sensação de estar fora do corpo; 7. encontros com seres não-físicos ou figuras religiosas; 8. seres muito amorosos com uma luz brilhante sobrenatural; 9. revisão da vida; 10. fronteira demarcando a vida terrestre e a vida após a morte; 11. voltar; 12. contar a experiência a outros; 13. efeitos positivos na vida; 14. nova visão da morte; e 15. colaboração com a pesquisa. Estudos subseqüentes indicam que: a) de modo geral, pessoas que tiveram EQM são indistinguíveis das outras pessoas (GREYSON, 2003, 2007a); b), o fenômeno é independente da religião, do tempo, da idade, do gênero, da instrução ou do nível social (VAN LOMMEL et al., 2001); e c) o índice de ocorrência e a experiência nuclear relatada parecem ser independentes da cultura ou lugar (ATHAPPILLY; GREYSON; STEVENSON, 2006; GREYSON, 2007a). Embora em alguns casos as EQMs possam trazer conseqüências desagradáveis, na maioria das vezes produzem efeitos benéficos para aqueles que as experienciaram (GREYSON, 1983b; 1997; 2000; 2007a). Entre os efeitos positivos encontram-se o incremento da espiritualidade, do altruísmo, do autocuidado e da auto-estima (GREYSON, 1983b), e a diminuição da ideação suicida (GREYSON, 1993) e do sofrimento após o estresse pós-traumático da morte clínica (GREYSON, 2001; 2003). MATERIAIS E MÉTODOS Este estudo teve como objetivo descrever, em profundidade, as vivências e as conseqüências advindas da experiência de quase-morte (EQM). A investigação, qualitativa e exploratória, foi realizada com cinco pessoas que passaram pela experiência de quase-morte e que foram selecionadas por conveniência entre indivíduos indicados por profissionais da área da saúde (médicos e enfermeiros) que haviam identificado uma suposta EQM no decorrer de uma situação clínica anterior em que houve risco de morte. Os dados foram coletados mediante entrevistas semi-estruturadas, antecedidas pela aplicação auto-respondida de duas escalas, utilizadas neste estudo com o propósito de validar a experiência de quase-morte. A Escala de Experiência de Quase-Morte (The Near-Death Experience Scale NDE/EQM), elaborada por Greyson (1983a), foi traduzida e adaptada para o Português do Brasil por Serralta et al. (2010). Esta escala possibilita diferenciar as respostas daqueles que estiveram próximos da morte e vivenciaram uma EQM daqueles que tiveram um encontro com a morte sem a experiência de quase-morte (GREYSON, 2000). O instrumento consiste em um questionário que contém dezesseis itens auto-respondidos pelo entrevistado. Os itens são de múltipla escolha, sendo que a pontuação das repostas varia entre 0, 1 ou 2 de acordo com a intensidade da resposta mais próxima da vivência Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

178 durante a experiência de quase morte. Um escore igual ou maior que 7 no total da escala cuja pontuação máxima é de 32 pontos define uma EQM (GREYSON, 1983a; 2000). Quanto maior a pontuação, mais profunda a EQM (GREYSON, 2000). A Escala de Experiências Dissociativas (Dissociative Experiences Scale DES/EED), elaborada por Bernstein e Putnam (1986) e atualizada por Carlson e Putnam (1993), foi traduzida e adaptada para o Português do Brasil por Fiszman et al. (2004). Ela possibilita averiguar a presença e a freqüência de diferentes tipos de experiências dissociativas. Determina desde um grau comum e não patológico até a caracterização de experiências patológicas nas quais, por exemplo, o indivíduo não se lembra de importantes eventos do passado ou sente que seu corpo não lhe pertence. Esta escala é constituída de vinte oito itens que variam entre 0 (não acontece nunca) a 10 (acontece sempre). Ainda que essa escala não seja utilizada como instrumento diagnóstico, o escore de 30 é considerado o ponto de corte acima do qual se pode identificar os pacientes com transtornos dissociativos (FISZMAN et al., 2004; BERNSTEIN; PUTNAM, 1986). A EED possui ainda um subconjunto de oito itens, chamado de DES-T (EED-T), que são uma medida sensível de dissociação patológica. Toda a contagem no DES-T (EED-T) indica um exemplo patológico da dissociação (GREYSON, 2000). Os itens que integram a DES-T (EED-T) são: 3, 5, 7, 8, 12, 13, 22 e 27 (WALLER; PUTNAM; CARLSON, 1996). Os participantes foram contatados inicialmente por telefone. A coleta de dados foi realizada nas residências dos sujeitos. Todos receberam as explicações pertinentes aos objetivos do estudo e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Após o preenchimento auto-administrado das escalas, todas as entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas ipsis verbis para estudo. A entrevista continha quatro questões exploratórias: 1. Como foi a sua experiência frente ao risco de vida?; 2. Houve mudanças na sua vida após ter passado por essa experiência? Se houve, quais?; 3. Você já havia passado por experiência semelhante anteriormente?; e 4. Você tem alguma informação que julgue importante acrescentar? Para analisar as entrevistas foi utilizado o método de análise de conteúdo proposto por Bardin (2009). O método de análise do conteúdo tem como objetivo fazer uma descrição sistemática, qualitativa e quantitativa do conteúdo manifesto, buscando encontrar as suas significações latentes. Para a divisão do texto, foram utilizadas as regras definidas pelo método que determina que as categorias (temáticas, neste caso) sejam homogêneas, exaustivas, exclusivas, objetivas, adequadas e pertinentes (BARDIN, 2009; CAREGNATO; MUTTI, 2006). As etapas de análise dos dados foram três: 1) pré-análise, na qual a leitura flutuante permite que o pesquisador utilize a sua intuição para operacionalizar e sistematizar as idéias iniciais para conduzir o plano de análise; 2) seleção das unidades de análise, na qual foram feitas a codificação e a numeração das unidades de registro. Ainda nessa etapa, os dados foram agrupados em unidades de contexto que são unidades de compreensão que possuem uma dimensão mais ampla e abrangente que as unidades de registro, sendo reduzidos a categorias estabelecidas a partir dos elementos temáticos comuns encontrados. O método de categorização foi misto, utilizando-se o critério de categorias apriorísticas (CAMPOS, 2004), por possuir de antemão como categorias predefinidas as características agrupadas por Moody Junior (1975), e dados não compatíveis com as 178 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

179 categorias apriorísticas formaram categorias a posteriori; e 3) tratamento dos resultados obtidos, inferência e interpretação, etapa final na qual se faz a transformação dos dados brutos em dados significativamente válidos por meio da interpretação e da reflexão sobre os conteúdos encontrados. RESULTADOS caracterização dos participantes: os cinco sujeitos entrevistados, representados por três mulheres e dois homens (A, B, C, D e E), apresentam características clínicas e sociodemográficas muito distintas entre si. Os dados estão sumarizados na Figura 1. Motivo da Internação a B C D E Linfoepitelioma de rinofaringe quimioterapia radioterapia Aneurisma Enfisema pulmonar Pneumonia dupla aguda Cirurgia nasal sangramento excessivo trans e pós-operatório Patologia clínica sim sim sim sim não Intervenção cirúrgica sim sim não não sim Coma não sim sim sim sedação Idade da ocorrência de EQM Idade atual Gênero F F M F M Estado Civil casada solteira casado casada casado Grau de Instrução Profissão ensino médio completo técnica em enfermagem ensino superior incompleto professora ensino fundamental incompleto agricultor ensino fundamental incompleto secretária aposentada pós-graduação médico Renda de 2 a 4 SM de 2 a 4 SM até 1 SM até 1 SM acima 10 SM Religião católica católica evangélica católica e universalista universalista Praticante da religião não sim não sim não Histórico de tratamento psicológico ou psiquiátrico sim(depressão e síndrome de pânico) Fonte: elaborado segundo os dados da pesquisa. Figura 1 - Identificação dos participantes. sim(depressão) não não não A pontuação total dos participantes na escla EQM variou entre 8 e 18 pontos, acima do ponto de corte da escala que indica a presença de uma EQM. A pontuação total na Escala EED variou entre 25,7 e 3,9, indicando que todos os participantes encontram-se na faixa normal de fenômenos dissociativos. Além disso, nenhum dos sujeitos da pesquisa pontuou nos itens DES-T (EED-T). Assim, demonstra-se que as EQMs relatadas foram legítimas, sem interferência que qualquer experiên- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

180 cia dissociativa patológica que indicasse a probabilidade de algum transtorno psicopatológico. Descrição das eqms categorias a priori: para a análise das entrevistas, foram consideradas treze das quinze categorias referentes às características de EQMs elencadas por Moody Junior (1975): 1. inefabilidade; 2. ouvir a notícia de sua morte pela equipe médica, familiares ou outros; 3. sentimento de paz e/ou sensações agradáveis; 4. ouvir sons (ruídos desagradáveis ou músicas agradáveis); 5. perceber/ estar em um túnel de luz ou buraco escuro no espaço; 6. sensação de estar fora do corpo; 7. encontros com seres não-físicos ou figuras religiosas; 8. seres muito amorosos com uma luz brilhante sobrenatural; 9. revisão da vida; 10. fronteira demarcando a vida terrestre e a vida após a morte; 11. voltar; 12. contar a experiência a outros; 13. efeitos positivos na vida; 14. nova visão da morte; e 15. colaboração com a pesquisa. As duas características não analisadas foram: contar a experiência a outros e colaborar com a pesquisa. Esses dois itens foram excluídos da análise de dados por serem redundantes nesse estudo. Das treze pré-categorias somente nove categorias foram encontradas nos relatos dos participantes. A Figura 2 apresenta as características descritas por Moody Junior (1975) encontradas e não encontradas, indicando o número de participantes que as descreveram. Sujeitos Características a priori a B C D E Total 1. inefabilidade 1 não notícia da morte não não não não não 0 3. sentimento de paz/sensação agradável ouvir sons não não não não não 0 5. perceber/estar túnel não não não não não 0 6. sensação de estar fora do corpo encontro com seres não físicos ou figuras religiosas não não não seres amorosos de luz não 2 1 não não 3 9. revisão da vida não não não não não fronteira não voltar contar a outros 13. efeitos positivos na vida nova visão morte 10 não 1 4 não colaborar com pesquisa Total 183 Fonte: elaborado segundo os dados da pesquisa. Figura 2 - Quadro comparativo EQM Depoimentos e características elencadas por Moody Junior (1975). A categoria inefabilidade refere-se à dificuldade das pessoas que experimentam EQMs em descrever em palavras a natureza dessa vivência:...pra dizer com palavras, às vezes, a gente não é bem fiel nas colocações. É difícil explicar em palavras... (Sr E); É um mundo bem diferente, né? Como é que se diz? Difícil explicá! (Sr. C); Ahhh!! Não dá pra explicar com palavras, né?! (Sra. A). 180 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

181 Com relação à categoria ouvir a notícia de sua morte pela equipe médica, familiares ou outros não houve nenhum relato dos participantes, dado esperado, visto que nenhum havia apresentado morte clínica. Nenhum sujeito descreveu ipsis litteris o sentimento de paz que foi observado somente no subtexto das entrevistas. Não obstante, os participantes referiram diversas sensações agradáveis e relacionadas ao bem-estar. Eu só sentia a leveza... como... como se eu fosse... só, só, só, só espírito mesmo...! (Sra. A); Podia me oferecer um automóvel novo pra eu voltar que eu não queria... De tão bom que tava lá!!! (Sr. C). Nenhum dos entrevistados relatou ouvir sons durante a EQM. Não houve qualquer relato dos entrevistados sobre perceber/estar em um túnel de luz ou buraco escuro no espaço ao experienciarem a EQM. A sensação de estar fora do corpo refere-se à impressão dos entrevistados de terem saído do corpo e verem-se afastados dele ou movendo-se no espaço: Eu via, como se estivesse em um ambiente acima. Vendo ele conversar com meu marido e me vendo. (Sra. A); E aí eu tava viajando... Muito bonito!... Mas tava lindo... Viajando, viajando... (Sr. C). Foram relatados pelos entrevistados encontros com seres não-físicos ou figuras religiosas que trouxeram uma sensação de acolhimento: Alguém que eu não vi, não sei quem é, mas que senti, né?... mexeu em mim... (Sr. E); São Jorge não estava lá debaixo do poste como uma imagem, uma estátua, um santo, um quadro. Ele era uma realidade muito diferente... (Sra. D). Os sujeitos também perceberam, durante a experiência de EQM, seres muito amorosos com uma luz brilhante sobrenatural:... do outro lado tinha duas pessoas paradas cheirando flor, com uma luz... parecia um nevoeiro fraco... (Sr. C).; Era uma pessoa vestida de branco. Todo de branco... Não sei se era médico ou enfermeiro... Era médico, eu acho... Espiritual... Todo de branco. Não sei se era homem, ou era mulher. Muito amoroso... (Sra. B). Nenhum dos sujeitos relatou ter feito qualquer revisão da vida ou visto qualquer cena do passado durante a EQM, também não houve escore positivo na Escala EQM (GREYSON,1983a; SERRALTA et al., 2010) nesse item. Alguns entrevistados notaram claramente uma fronteira demarcando a vida terrestre e a vida após a morte: Tinha assim, um lugar bonito... Uma ponte branca... Assim, meia redonda... eu tava atravessando a ponte. (Sr. C); Porque era o meu limite. Eu estive no limite. Na barreira da fronteira. (Sra. D). A categoria voltar refere-se à sensação de voltar ao corpo após a experiência de separar-se:... eu voltei subitamente pro meu corpo. (Sr. E); Eu senti um peso no corpo. Senti o corpo super pesado quando eu voltei. (Sra. B). A análise das entrevistas evidenciou que aos sujeitos foi oportunizado uma decisão consciente de voltar: Eu lembro que eu pude fazer a escolha. Que eu poderia ter ido. Mas que eu não quis. (Sra. A);...a minha escolha foi retornar. (Sra. D). Todos os sujeitos mencionaram efeitos positivos na vida após o evento da EQM. Essa categoria foi a que possuiu maior número de referências: Levantar de manhã e... Bahhh!!! Que jóia!!! Opâ mais um dia. Sabe? É muito importante!!! (Sr. C). Todos os entrevistados mencionaram melhora da autoconfiança, da auto-estima e diminuição do medo da morte. Seus relatos contam suas experiências com Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

182 relação ao aumento da confiança em um propósito de vida: A partir daquele momento eu... minha vida tomaria um novo rumo. (Sra. D); ao aumento da confiança da apreciação da vida: Hoje a vida pra mim tem um valor imenso. (Sra. B); no incremento da autoconfiança: Eu acho engraçado... Porque sei que agora eu consigo muitas coisas! (Sr. C); no incremento da auto-estima: Porque eu voltei sabendo que alguém tinha cuidado de mim... E senti as conseqüências benéficas na minha recuperação. Aprendi que se alguém cuida de mim assim e eu volto, devo ser alguém legal... (Sr. E.), e na diminuição do medo da morte:...eu, tu saber que não é só isso... morreu e acabou... te conforta. (Sra. A); Eu não tenho medo se amanhã alguém me contar que eu vou viajar... (Sr. C). Todos os entrevistados mencionaram que houve mudanças positivas substanciais na vida após a experiência de EQM: Depois eu comecei a aceitar como as coisas vêm... é natural... Elas vêm e vão... e eu acho que assim que as coisas funcionam... (Sra. A); Passei a viver a vida de uma outra maneira. (Sra. D). Todos os sujeitos relataram transformações em seus valores pessoais. Os entrevistados relataram o desenvolvimento do autocuidado: Parei de trabalhar como louca. (Sra. B); Parei de fumar. (Sr. C). Três sujeitos mencionaram o sentimento de altruísmo. O ato de ajudar aos outros é caracterizado nas seguintes falas: Por que eu queria cuidar de pessoas que, assim como eu, precisavam de alguém... (Sra. A);...podemos fazer alguma coisa por alguém... Nem que seja os pobres cachorrinhos de rua. (Sra. B). A compaixão é retratada nos relatos: Tu passa a admirar muito as pessoas. A respeitar... a respeitar as opções delas, as escolhas dela... (Sra. D); Hoje eu cultivo mais admiração, muito grande pelo ser humano que se doa (Sra. A). Dois sujeitos da pesquisa referiram dar menos importância às conquistas pessoais e ao sucesso: Temos a tendência... de nós viver, de uma vida influenciada da matéria... Preocupados com comida, valores, dinheiro... E o resto? (Sra. D.). A maioria dos entrevistados relatou desenvolver uma nova visão da morte após a experiência de EQM:...poder realmente morrer e não terminar. Porque até então... Assim ó... a morte para mim era o fim. (Sra. A).; Existe o conhecimento de que deixaremos de existir. Que temos uma vida após esse final... Ela existe como todas as coisas. Só não sabemos explicar. (Sra. D). Descrição das eqms categorias a posteriori: através da análise das entrevistas foram encontradas quatro categorias a posteriori : 1. saber do risco de vida; 2. telepatia; 3. busca de compreensão; e 4. memória nítida. A Figura 3 sumariza a distribuição das unidades de registro nessas as categorias. Sujeitos Características a posteriori a B C D E Total 1. saber do risco de vida não telepatia não não não busca de compreensão 4 não não não memória nítida não não 3 não 6 9 Total 40 Fonte: elaborado segundo os dados da pesquisa. Figura 3 - Categorias a posteriori Os entrevistados relataram saber do risco de vida presente na situação clínica experienciada:...tinha perfeitamente o conhecimento do meu estado físico, dos riscos que corria, das coisas que 182 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

183 poderiam acontecer. (Sr. E); Porque eu ouvia as pessoas falando. Os médicos falando com a minha irmã de que eu tinha 99,9% de chance de eu morrer. (Sra. B). Os sujeitos da pesquisa explicaram que a comunicação durante as EQMs não se dava através da palavra proferida e sim por telepatia: Eu recebi assim... como sendo essa informação dentro da minha mente... assim como se alguém tivesse colocado dentro da minha cabeça. (Sr. E); Ahhh!... A mensagem, a palavra em si ela ecoa dentro do nosso cérebro. (Sra. D). Após vivenciarem a Experiência de Quase- Morte, os entrevistados sentiram a necessidade de buscar compreender o fenômeno: Depois eu fui pesquisar. Né?! (Sr. E); Fui buscar mais informação. (Sra. D). Tanto que eu busquei, tentei é... frequentar várias casas espíritas... Só que nenhuma delas, até hoje, era o que eu estava buscando. (Sra. A); Procurei o que poderia ter sido... alguma coisa que tivesse sentido... pudesse contribuir realmente espiritualmente, fisicamente pra mudar o quadro. (Sr. E). Os entrevistados afirmaram ter uma memória nítida sobre os acontecimentos envolvidos nas EQMs: Isso faz mais de vinte anos que aconteceu e eu tenho a sensação nítida como se tivesse acontecido ontem, semana passada. Assim... algo bem vivo, bem marcado na minha... minha memória, ficou impregnado em mim. (Sr. E). DISCUSSÃO No mesmo sentido dos achados de Moody Junior (1975), nenhum dos entrevistados, ao relatar suas experiências, cumpriu todas as características por ele elencadas, haja vista que os relatos traziam fatos em comum entre si, mas estavam marcados pela subjetividade. Não obstante, a semelhança entre as características descritas na literatura internacional e os relatos encontrados no presente estudo é notável. Com exceção de um participante, os demais relataram desconhecer o fenômeno da EQM na ocasião em que o experienciaram, o que parece corroborar os achados de Lopez et al. (2005) e Greyson (2007a) de que as EQMs ocorrem na ausência de conhecimento teórico anterior sobre elas e a hipótese da universalidade do fenômeno (VAN LOMMEL et al., 2001; ATHAPPILLY; GREYSON; STEVENSON, 2006; GREYSON, 2007a). São dignos de nota os esforços efetuados pelos participantes a fim de compreender, posteriormente, a experiência, fato anteriormente observado por Greyson (2007a), que é indicativo da natureza perturbadora e transformadora da EQM. A experiência foi descrita como muito marcante para todos os sujeitos dessa pesquisa. Eles compartilharam suas experiências em riqueza de detalhes e afirmaram que a recordação daqueles momentos permanece muito vívida na memória. Esta preservação da memória, com toda a intensidade da vivência original, foi encontrada em outros estudos (GREYSON, 2007b). A riqueza dos detalhes e o minucioso relato dos acontecimentos ocorridos no ambiente em que o sujeito estava ao mesmo tempo em que se sentia pairar sobre o próprio corpo (Sra. A) está em consonância com os estudos de Parnia e Fenwick (2002) e Greyson (2000, 2007a). A categoria saber do risco de vida é também compatível com a teoria psicológica de que a EQM pode ser uma medida protetiva da mente frente à ansiedade avassaladora decorrente da consciência de risco (real ou imaginário) de morte (APPLEBY, 1989; FRENCH, 2005; GREYSON, 2000; 2007a). Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

184 Notou-se uma incrível habilidade dos entrevistados para proceder mudanças profundas e positivas em suas vidas, assim como vivenciar efeitos benéficos após experienciarem uma EQM. Pareceria, portanto, que a EQM possui um efeito protetor, constatado em diferentes pesquisas sobre o fenômeno (GREYSON, 1983b; 1997; 2000; 2003; 2007a; GREYSON; LONG, 2006). É interessante notar que, no presente estudo, os entrevistados relataram significativas transformações em seus valores pessoais sem, no entanto, relatarem o fenômeno da revisão da vida, que é considerado por Greyson (1983b) como um dos catalisadores para a esta mudança. Embora eventualmente as EQMs possam produzir conseqüências negativas (GREYSON, 1983b; 1997; 2007a), no presente estudo isso não foi encontrado. Ao contrário, todos os participantes alegaram um incremento no bem-estar subjetivo, com repercussões na auto-estima, no autocuidado e no relacionamento com os demais. Assim como já referido por Kelly (2001), a vivência da EQM promoveu nos entrevistados um aumento da espiritualidade e da crença na vida após a morte. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esse estudo, embora exploratório e com diversas limitações metodológicas, possui o mérito de ser o primeiro a descrever relatos de EQM no Brasil. Os resultados indicam que a ocorrência de EQM não está associada a dissociações patológicas e ocorre em situações de normalidade psíquica nas quais o sujeito tem a consciência de estar próximo à morte. De modo geral, os relatos obtidos são consistentes com as características típicas desse fenômeno já descritas em outros estudos realizados em diferentes países e culturas. Os entrevistados alegaram ter mudanças positivas substanciais em sua vida após a experiência de EQM, com incremento da auto-estima e autoconfiança, implementando uma nova visão da morte, além de outros efeitos positivos no viver idiossincrático e subjetivo. Pode-se dizer que houve um aumento na qualidade de vida, em especial no sentimento de bem-estar pessoal. Os resultados dessa investigação, ainda que estejam em consonância com a literatura acerca desse tema, precisam ser interpretados com cautela em face das limitações da pesquisa. É necessário considerar que o estudo foi conduzido com uma amostra de conveniência e com um número reduzido de participantes, o que diminui o poder de generalização dos dados. Uma vez que não há estudos brasileiros sobre EQM torna-se necessária a replicação em novos casos. Sugere-se, nesse sentido, a inclusão de pessoas que tenham experimentado a morte clínica. Em segundo lugar, a presente pesquisa privilegiou os aspectos psicológicos da EQM. Há a necessidade de estudos que examinem a associação da EQMs abrangendo outros fatores. A Psicologia, a Fisiologia e as Neurociências ainda não forneceram uma teoria satisfatória para explicar as relações mente/cérebro nem tampouco o funcionamento da consciência. Não existe nenhuma definição hábil a ponto de convergir as opiniões contrapostas dos pesquisadores. Compor teorias de forma integrada e abrangente, unindo a Neurobiologia, a Psicodinâmica e a Fenomenologia, pode ser um caminho viável para uma explicação mais adequada desse fenômeno ainda tão pouco explorado por pesquisadores e estudiosos do comportamento humano. 184 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

185 REFERÊNCIAS ALMEIDA, A. M.; LOTUFO NETO, F. Diretrizes metodológicas para investigar estados alterados de consciência e experiências anômalas. Revista de Psiquiatria clínica, São Paulo, v. 30, n. 1, p , APPLEBY, L. Near-death experience analogous to other stress induced physiological phenomena. British Medical Journal, Londres, n. 298, p , ATHAPPILLY, G. K.; GREYSON, B.; STEVEN- SON, I. Do prevailing societal models influence reports of near-death experiences? Comparison of accounts reported before and after the Journal of Nervous and Mental Disease, Nova Iorque, n. 194, p , BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, BERNSTEIN, E.; PUTNAM, F. Development, reliability and validity of a dissociation scale. the Journal of Nervous and Mental Disease, Nova Iorque, n. 174, p , CAMPOS, C. J. G. Método de análise de conteúdo: ferramenta para a análise de dados qualitativos no campo da saúde. Revista Brasileira de enfermagem, Brasília, v. 57, n. 5, p , CAREGNATO, R. C. A.; MUTTI, R. Pesquisa qualitativa: análise de discurso versus análise de conteúdo. texto & contexto enfermagem, Florianópolis, v. 15, n. 4, p , CARLSON, E. B.; PUTNAM, F. W. An update on the dissociative experiences scale. Dissociation, Eugene, v. 6, n. 1, p , FISZMAN, A. et al. A adaptação transcultural para o português do instrumento dissociative experiences scale para rastrear e quantificar os fenômenos dissociativos. Revista Brasileira de Psiquiatria, São Paulo, v. 26, n. 3, p , FRENCH, C. C. Near-death experiences in cardiac arrest survivors. Progress in Brain Research, Nova Iorque, n. 150, p , GREYSON, B. The near-death experience scale. Construction, reliability and validity. the Journal of Nervous and Mental Disease, Nova Iorque, v. 171, n. 6, p , 1983a.. Near-death experiences and personal values. American Journal of Psychiatry, Nova Iorque, v. 140, n. 5, p , 1983b.. Near-death experiences and antisuicidal attitudes. Omega, Charlottesville, n. 26, p , The near-death experience as a focus of clinical attention. the Journal of Nervous and Mental Disease, Nova Iorque, v. 185, n. 5, p , Dissociation in people who have neardeath experiences: out of their bodies or out of their minds? the Lancet, n. 355, p , Posttraumatic stress symptoms following near-death experiences. American Journal of Orthopsychiatry, v. 71, n. 3, p , Near-death experiences in a psychiatric outpatient clinic population. Psychiatric Services, v. 54, n. 12, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

186 . Experiências de quase-morte: implicações clínicas. Revista de Psiquiatria clínica, São Paulo, v. 34, n. 1, p , 2007a.. Consistency of near-death experience accounts over two decades: are reports embellished over time? Resuscitation, New York, v. 73, n. 3, p , 2007b. GREYSON, B.; LONG, J. P. Does the arousal system contribute to near death experience? Neurology, v. 67, n. 12, p , KELLY, E. W. Near-death experiences with reports of meeting deceased people. Death Studies, v. 25, n. 3, p , LOPEZ, U. et al. Near-death experience in a boy undergoing uneventful elective surgery under general anesthesia. Pediatric Anesthesia, n. 16, p , MOODY JUNIOR, R. A. Vida depois da vida. São Paulo: Nórdica, MORSE, M. A near-death-experience in a 7-year-old child. American Journal of Diseases of children, v. 137, n. 10, p , NOYES, R. Attitude change following neardeath experience. Psychiatry, n. 43, p , OWENS, J. E.; COOK, E. W.; STEVENSON, I. Features of near-death experience in relation to whether or not patients were near death. the Lancet, New York, v. 336, n , p , PARNIA, S.; FENWICK, P. Near death experiences in cardiac arrest: visions of a dying brain or visions of a new science of consciousness. Resuscitation, v. 52, n. 1, p. 5-11, SERRALTA, F. B. et al. Equivalência Semântica da Versão em Português da Escala de Experiência de Quase-Morte. Psico-USF, No Prelo. SIMPSON, S. M. Near-death experience: a concept analysis as applied to nursing. Journal of Advanced Nursing, v. 36, n. 4, p , VAN LOMMEL, P. et al. Near death experience in survivors of cardiac arrest: A prospective study in the Netherlands. the Lancet, New York, n. 358, p , WALLER, N.; PUTNAM, F.; CARLSON, E. Types of dissociation and dissociative types: a taxonomic analysis of dissociative experiences. Psychological Methods, n. 1, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

187 Percepções de alunos sobre educação a distância mediada por ambientes virtuais de aprendizagem ro d r i g o al c i o n e Ma i a 1 ka r l a sa r a i va 2 RESUMO Este estudo busca mostrar as percepções de estudantes de graduação da Universidade Luterana do Brasil sobre a educação a distância. Suas narrativas foram articuladas com excertos de artigos acadêmicos analisados por Saraiva (2010) num trabalho de pesquisa anterior. Para coletar as percepções dos alunos, foram realizadas entrevistas. Em sua grande maioria, as percepções dos estudantes coincidiram no que diz respeito ao melhor gerenciamento de tempo que o EaD proporciona, indo ao encontro daquilo que consta na maioria dos artigos acadêmicos. Da mesma forma, os alunos foram quase unânimes quando afirmaram sentir falta da presença física de professores e colegas, enunciado que analisado à luz das recomendações dos artigos acadêmicos parece sinaliza a necessidade de aprofundar os processos de interação. palavras-chave: educação a distância, ensino superior, internet, alunos. ABSTRACT This study aimed to demonstrate the impressions of undergraduate students from Universidade Luterana do Brasil about the distance learning and how this way of education has contributed in their upbringing. At the same time, these opinions were combined with academic articles previously used by Saraiva (2010) in a research about this same theme, but much broader. To get the impressions showed, were made interviews with students. These 1 Acadêmico do Curso de Licenciatura Plena em Letras Língua e Literatura Inglesa/ULBRA Bolsista PROICT/ULBRA 2 Professora-Orientadora do PPG de Educação/ULBRA (karlasaraiva@via-rs.net) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

188 interviews were transcribed and organized for analysis and comparison. The vast majority of student`s opinions were the same according to better management of time that distance learning provides. Likewise, student were almost unanimous when said feel the miss of physical presence of teachers and classmates. These findings indicate that both, student and the technology of distance learning still are in a process of adaptation. Distance learning, in constant technologic evolution, enhances its way of dealing with the student. And the student, day after day, fits with this new reality and better enjoy its benefits. Keywords: distance learning, college education, internet, students. INTRODUÇÃO A Educação a Distância (EaD) tem despontado no país como um meio de buscar a formação, em especial no Ensino Superior, atingindo diversos públicos em diferentes áreas. Conforme publicado em 12 de abril de 2010, no jornal O Estado de São Paulo (2010), dados do Ministério da Educação mostram que um em cada cinco novos alunos de graduação no País ingressam em um curso a distância. Ou seja: cerca de 20% dos universitários já estudam via EaD. Saraiva (2010) apresenta outros dados do MEC que indicam que, entre os anos de 2003 e 2006, o número de cursos de graduação em EaD cresceu 571% e o de matrículas 315%. Apesar da grande procura, nota-se a percepção dos estudantes acerca dessa modalidade de ensino ainda é pouco investigada. O presente artigo constitui uma contribuição teórica para compreender a percepção de alunos sobre a EaD. Mais especificamente, este artigo analisa narrativas de um grupo de alunos da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) que, através de entrevistas, expuseram suas impressões acerca da EaD desenvolvida com suporte de recursos disponíveis na internet. Essas percepções estão sendo tomadas como parte de um trabalho de pesquisa mais amplo, já iniciado por Saraiva (2010), com a análise de 239 artigos acadêmicos. A pesquisa com os alunos, foco deste trabalho, foi realizada para mostrar continuidades e descontinuidades entre esses dois campos discursivos. De acordo com outro artigo de Saraiva (2009), que discute a metodologia adotada na pesquisa anterior com a qual se está estabelecendo comparações, teria sido possível tomar inúmeros campos discursivos como material de análise para aquela pesquisa, dentre os quais foram cogitados artigos em periódicos e entrevistas com professores e alunos. A pesquisadora optou, na ocasião, por trabalhar com artigos acadêmicos, abrindo mão de utilizar entrevistas. Mesmo reconhecendo a importância de escutar professores e alunos, os enunciados encontrados nos artigos, nas entrevistas de professores e nas entrevistas de alunos gerariam um volume de material de pesquisa que não permitiria uma análise aprofundada do material. Assim, a pesquisa atual visa dar continuidade a essa pesquisa anterior. A seção seguinte apresenta a metodologia utilizada na pesquisa a partir de uma fundamentação teórica acerca da linguagem e de seu papel instituinte da realidade, que justifica nossa preocupação com as narrativas dos alunos e dos especialistas. A seguir, são apresentados e analisados excertos das entrevistas, articulados com resultados de pesquisa anterior de Saraiva (2010). Encerramos o artigo com algumas considerações finais. 188 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

189 DOS CAMINhOS DA PESQUISA Não buscamos uma verdade nem nos artigos nem nas falas dos alunos, mas sim novas leituras sobre os fatos que nos apontem diferentes possibilidades. Conforme Foucault (2002, p.56), o discurso faz mais do que descrever verdades e realidades exteriores. Gostaria de mostrar que o discurso não é uma estreita superfície de contato, ou de confronto, entre uma realidade e uma língua, o intrincamento entre um léxico e uma experiência; gostaria de mostrar, por meio de exemplos precisos, que analisando os próprios discursos, vemos se desfazerem os laços aparentemente tão fortes entre as palavras e as coisas, e destacar-se um conjunto de regras, próprias da prática discursiva. Certamente os discursos são feitos de signos; mas o que fazem é mais que utilizar esses signos para designar coisas. É esse mais que os torna irredutíveis à língua e ao ato da fala. É esse. mais. que é preciso fazer aparecer e que é preciso descrever. De acordo com Condé (1998), Wittgeinstein ao estabelecer uma crítica à leitura tractatiana, que via a linguagem como um espelho do mundo, mostrou que não é partindo do mundo que construímos a linguagem, mas contrariamente, a linguagem que constrói o mundo. Desse modo, assumimos aqui uma concepção de linguagem que não a toma como uma simples representação do mundo, mas como aquilo que o institui, que constitui a realidade, que cria aquilo que chamamos verdade. Na perspectiva que adotamos, a verdade existe não como algo transcendente, único e imutável, mas como algo fabricado socialmente pela linguagem, sendo múltipla, contingente, móvel. E é para analisar a produção de verdades acerca da EaD que essa pesquisa vem sendo desenvolvida. Para obtenção dos dados da pesquisa, foram realizadas entrevistas com estudantes de cursos de graduação presencial, que cursavam disciplinas na modalidade a distância, e também com alunos de cursos de graduação a distância. Os alunos entrevistados apresentaram-se de modo voluntário, atendendo a convite dos pesquisadores, divulgado por seus professores. Foram realizadas oito entrevistas, sendo consideradas suficientes, tendo em vista que nas últimas já não se percebia muitas diferenças em relações às anteriores. Tendo em vista que esta é uma pesquisa de caráter qualitativo, a quantidade de entrevistas será determinada por um entendimento subjetivo, referente à obtenção de um volume adequado de informações para realização das análises, não sendo um número determinado por questões estatísticas. Essas entrevistas foram gravadas e transcritas. A partir disso, foram extraídos excertos, organizados em uma planilha para posterior análise. A identificação dos alunos será feita de modo a preservar seu anonimato, sendo os nomes substituídos pelas denominações aluno 1, aluno 2,... AS PERCEPÇÕES DOS ALUNOS A partir dos excertos das entrevistas, foram desenvolvidas as análises que apresentamos nesta seção. Conforme já referido, essas análises supõem, entre outros elementos, a comparação com a pesquisa anterior de Saraiva (2010), onde a autora apresenta um estudo sobre a Educação a Distância mediada pela internet a partir da análise de 239 arti- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

190 gos acadêmicos publicados em periódicos nacionais especializados em tecnologia educacional, problematizando algumas verdades produzidas acerca da temática do EaD e analisando o entrelaçamento da emergência desse tema com alguns aspectos característicos da sociedade contemporânea. Nas entrevistas realizadas nesta pesquisa, uma das maiores vantagens apontadas pelos alunos que cursaram disciplinas ou mesmo todo o curso superior em EaD é a possibilidade de um melhor gerenciamento de tempo, visto que o ensino ofertado se adapta ao tempo do aluno, ao invés de o aluno se adaptar ao tempo do ensino, como ocorre na metodologia de ensino presencial. O benefício é que tu faz teu próprio horário, não precisa marcar um horário ou vir pra aula, ter aquele compromisso de se deslocar, de ter um horário dentro de sala de aula. Então tu acessa aos finais de semana, domingo, enfim, no tempo disponível. Isso é um grande benefício. (Aluno 1). O que eu vejo de bom é a questão do tempo, tu gerencia o teu tempo, quando tu consegues, tu acessa a internet, acessa as aulas, faz as atividades e ponto, não tem horários e dias marcados, além da economia de transporte, lanche, enfim. (Aluno 4). Esse entendimento dos alunos sobre uma vantajosa possibilidade de ajustar o tempo às suas necessidades é coincidente com aquilo que Saraiva (2010) encontrou nos artigos acadêmicos: Os conceitos existentes sobre a educação à distância indicam especialmente que esta pressupõe a autonomia do aluno, que irá organizar-se de acordo com suas possibilidades de tempo, espaço e ritmo de aprendizagem, contando, para isso, com diversos recursos didáticos (PEREIRA; MOTA; PAULA apud SARAIVA, 2010, p.96). Contudo, de acordo com Saraiva (2010, p.89), essa liberdade de escolha tem como contrapartida a necessidade de um engajamento que produz outros efeitos sobre os sujeitos: Os saberes que são produzidos com esse comprometimento permanente vão além dos conteúdos do curso. Professores e alunos aprendem a regular seu tempo de trabalho e a imporem para si rotinas que incluem o acesso sistemático aos ambientes informatizados nos quais se estabelece a comunicação. Essa possibilidade de um uso individualizado do tempo leva a uma valorização da EaD na sociedade atual, uma vez que, segundo Bauman (2001), existe uma ênfase contemporânea na individualização e na importância de cada um atender seus interesses. Além de permitir uma individualização do tempo, a EaD funciona como uma possibilidade de estar em diversos lugares ao mesmo tempo, atuando em diversos cenários simultaneamente. Pode-se acessar a hora que puder, não tem o tempo de deslocamento até a universidade, se economiza com gasolina, estacionamento, agiliza o andamento do curso, porque podese fazer mais disciplinas, pois as presenciais precisa fechar os horários. Não tem trabalhos em grupo, então não precisa disponibilizar tempo pra se encontrar, etc. (Aluno 2) Em consonância com essa percepção dos alunos, os artigos acadêmicos também compreendem a EaD como uma estratégia para vencer as restrições espaço-temporais no campo educacional. Atualmente, temos o potencial para um ensino menos limitado pelas restrições 190 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

191 de tempo e distância de uma sala de aula (COSTA; FAGUNDES; NEVADO apud SARAIVA, 2010, p.92). Seu principal objetivo é atender a necessidades de pessoas que não podem freqüentar cursos regulares por residirem em locais distantes e terem limitações de horário (MEDEIROS et al. apud SARAIVA, 2010, p.68). No entanto, de acordo com Saraiva (2010, p.42), essa liberdade de escolha e essa mobilidade implicam numa intensificação do comprometimento de cada um com sua formação: Na EaD, professores e alunos ganharam a liberdade de escolher quando e onde desejam trabalhar, mas perderam a liberdade de estarem fora do alcance da escola. Em qualquer local e em qualquer hora é possível aprender e é possível ensinar. Esse é o novo jogo de visibilidades que se impõe na educação via Internet. Entre as insatisfações apresentadas pelos alunos, a mais citada foi a falta de convivência e estabelecimento de laços com professores e colegas. Tal situação foi apontada como um provável elemento dificultador no processo de aprendizagem, visto que a troca de experiências em tempo real de alguma forma potencializa o entendimento do conteúdo estudado. Além disso, a ausência física do professor é vista de forma negativa, pois as dúvidas não podem ser sanadas no momento em que aparecem. Eu acho que o contato, o estar dentro da universidade, não tem nada que substitua esse convívio com os colegas. O contato físico mesmo com as pessoas, o olhar, o próprio questionar e até mesmo aquela questão da desenvoltura tu exercita mesmo na frente de outras pessoas. (Aluno 3) [É uma desvantagem] tu não interagir com a professora diretamente. Sei onde ela está, mas eu não conheço ela pessoalmente. E interagir é importante até pela atividade que eu faço, a faculdade que eu faço, porque eu vou trabalhar com pessoas. (Aluno 2) Alguns autores que investigaram as situações observadas no desenvolvimento de cursos a distância corroboram essa visão dos alunos: na vivência on-line, os alunos ficaram mais isolados e individualizados e a maioria sentiu falta do contato físico (MORAES apud SARAIVA, 2010, p.211). Contudo, diversos outros artigos apresentam um entendimento contrário a essa posição, pois lhes parece que as interações on-line seriam capazes de suprir a distância física: O resultado é que enquanto vemos muitos cursos tradicionais sustentando-se única e exclusivamente na proximidade natural de suas aulas presenciais, a EVI [Educação Virtual Interativa] não pára de evoluir e de criar condições para a efetiva redução de distâncias (TORI apud SARAIVA, 2010, p.78) A partir disso, podemos pensar que talvez seja necessário aprofundar a interatividade nos cursos a distância. Além disso, talvez possamos também apontar que o modelo de ensino hoje adotado na maior parte das vezes faz com que o aluno necessite da presença constante do mestre como centro da informação para conduzir o processo de construção do conhecimento. Nesse aspecto, para que o EaD aumente sua aceitação será necessária uma transformação nos comportamentos, o que talvez já esteja acontecendo nas novas gerações, cada vez mais integradas na cibercultura.outra desvantagem apresentada pelos alunos diz respeito à dificuldade da comunicação via web com o professor/tutor, pois as interações assíncronas via fórum ou Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

192 não permitem uma resposta imediata, uma troca imediata com o professor. Eu acho que, especificamente, na plataforma, só a ferramenta do fórum é um pouco ruim. Em algum momento tu poderias ter mais interação, uma aula ao vivo, ou alguma coisa assim que tu pudesses acessar pela Internet. Realmente fazer o curso a distância, mas podendo ter mais interação com o professor basicamente. Porque daqui a pouco tu estás lendo um texto, manda um , demora... Essa é a principal desvantagem. Especificamente, eu acho que o professor tinha que se tornar mais presente. (Aluno 4) De acordo com Saraiva (2010, p.38): Parece-me que a EaD não é apenas um instrumento para o governamento dos alunos, mas do próprio professor que, segundo Os Referenciais de Qualidade para Cursos a Distância, deve manter um processo contínuo de auto-avaliação e deve monitorar permanentemente a produção dos alunos, respondendo perguntas e enviando comentários com a maior rapidez possível. O relógio da sala de aula foi substituído por uma temporalidade contínua, sem delimitações dos períodos de trabalho. Ou seja, a EaD mediada por ambientes de aprendizagem on-line ao permitir uma maior liberdade na escolha dos alunos, não apenas os coloca no compromisso de construir sua agenda e manter um contato continuado, como também pode engajar os professores e tutores em um processo contínuo, que tende a expandir-se, recobrindo crescentes parcelas de tempo. CONSIDERAÇÕES FINAIS As diversas percepções de alunos apresentadas nesse artigo, bem como os excertos dos artigos acadêmicos também apresentados, refletem rentes representações que constituem verdades sobre a EaD. Como se pode observar, existem várias coincidências entre os elementos discursivos presentes nas entrevistas e nos artigos, apontando convergências. Em alguns casos, foram observadas algumas divergências, mostrando entendimentos diversos sobre um dado ponto. Levando em conta que a Educação a distância aliada ao uso da tecnologia ainda é uma ferramenta relativamente nova, os alunos de hoje ainda estão experimentando uma nova forma de aprendizado. Parece-nos que, com o passar do tempo, haverá transformações tanto na metodologia da EaD (seja pela entrada de novas tecnologias, seja por transformações no entendimento didático-pedagógico), quanto na própria postura dos alunos, levando em conta as rápidas transformações por que passa o mundo atual e os sujeitos que nele vivem. REFERÊNCIAS BAUMAN, Zygmunr. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, CONDE, Mauro Lucio Leitão. Wittgeinstein: linguagem e mundo. São Paulo: Annablume, FOUCAULT, Michel. Arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, O ESTADO DE SãO PAULO. Ensino a distância atrai 1 em cada 5 estudantes. Disponível em: < 192 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

193 vidae,ensino-a-distancia-atrai-1-em-cada-5- estudantes,537186,0.htm>. Acesso em: 18 abr SARAIVA, Karla. Diário de uma pesquisa off-road. In: FERREIRA, Taís; SAMPAIO, Shaula. Escritos metodológicos possibilidades na pesquisa contemporânea em educação. Maceió: UFAL, p SARAIVA, Karla. Educação a distância outros tempos, outros espaços. Ponta Grossa: UEPG, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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195 Projeto Pró-Memória: novos olhares sobre a história do esporte de Carazinho-RS di a c s o n vieira ribeiro 1 PaTricia ca r l e s s o Ma r c e l i n o siqueira 2 RESUMO A presente pesquisa faz parte do projeto pró-memória de Carazinho, o qual compreende em um projeto de pesquisa institucional, ainda em desenvolvimento, o qual está dividido em vários eixos, sendo o curso de Educação Física da ULBRA Carazinho responsável pela pesquisa do eixo esporte, o qual tem como objetivo contextualizar e reconstruir a história do desporto, dos desportistas e das entidades esportivas de Carazinho, identificando as modalidades coletivas e individuais que foram ou estão sendo praticadas no município desde sua emancipação até sua contemporaneidade. Também tem como meta identificar as entidades e seus respectivos locais que se iniciaram à prática desportiva no município, no passado e na atualidade, bem como identificar os principais desportistas de Carazinho, nas respectivas modalidades, coletivas e/ ou individuais. Com base nas primeiras informações que foram coletadas até o presente momento, percebe-se que o esporte no decorrer da história de Carazinho se destaca com muita ênfase, não somente no que se refere ao futebol de campo, mas também em outras modalidades esportivas como o basquete, bolão feminino e natação. palavras-chave: Projeto Pró-memória, Carazinho e esporte. ABSTRACT This research project is part of the pro-memory Carazinho, which includes a project of institutional research, still in development, which is divided into several axles, and the Physical Education course ULBRA Carazinho 1 Acadêmico do Curso de Educação Física/ULBRA Carazinho- Bolsista PROICT/ULBRA 2 Professora-Orientadora do curso de Educação Física /ULBRA Carazinho (patrícia.siqueira@ulbra.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

196 responsible for the research axis sport, which aims to contextualize and reconstruct the history of sport, the athletes and sports entities of Carazinho, identifying the collective and individual arrangements that have been or are being practiced in the city since their emancipation until his contemporaneity. It also aims to identify the entities and their respective locations that started the sport in the county in the past and at present, as well as identify key Carazinho athletes in their respective modalities, collective and / or the alone. Later, there will be sorting, grouping, and new organizations and new groups for similarities and complementarities. Keeping the guiding lights for the historical evolution of the facts with his dialogues due to the involved areas, education, sport and health. Based on preliminary information that has been collected so far, one realizes that the sport throughout the history of Carazinho stands out very forcefully, not only in relation to the football field but also in other sports such as basketball, swimming and women. Keywords: Project Pro-memory. Carazinho, sports. INTRODUÇÃO O presente artigo tem como objetivo apresentar a proposta do eixo esporte do projeto pró-memória de Carazinho, o qual compreende em um projeto de pesquisa institucional, ainda em desenvolvimento, dividido em vários eixos. O curso de Educação Física da ULBRA Carazinho é o responsável pela pesquisa do eixo esporte, o qual tem como objetivo contextualizar e reconstruir a história do desporto, dos desportistas e das entidades esportivas de Carazinho, identificando as modalidades coletivas e individuais que foram ou estão sendo praticadas no município, também tem como meta identificar as entidades e seus respectivos locais que se iniciaram a prática desportiva no município, no passado e na atualidade, bem como identificar os principais desportistas de Carazinho, nas respectivas modalidades, coletivas e/ou individuais. Reconhecido como um dos fenômenos sociais mais importantes, tendo influenciado profundamente a vida cotidiana do homem do século XX, o esporte impõe-se sistematicamente àqueles que o praticam, que o organizam, que de alguma forma, por ofício, dele dependem; aos seus aficcionados, e até mesmo àqueles que, sem vinculação afetiva com ele, são impregnados invariavelmente pelos noticiários da imprensa em crescentes espaços diários de mídia que citam, por outro lado, o esporte, anteriormente percebido apenas pelo rendimento, tem passado por uma revisão conceitual, aumentando sua própria abrangência, ao reajustar-se às necessidades de movimento causadas pelo desenvolvimento industrial e, fundamentalmente às exigências da utilização do tempo livre pelo homem moderno que nesta perspectiva, incorporou a prática do esporte popular (TUBINO, 1997, p.09). O projeto pró-memória esportes ainda, em desenvolvimento, iniciará suas buscas desde 1930 até o presente ano de 2009, tendo como materiais de pesquisa fontes como: jornais, atas, relatórios, ícones fotográficos das instituições de ensino superior, escolas, museu municipal e prefeitura municipal de Carazinho. As etapas de pesquisa histórica e pesquisa bibliográfica serão inicialmente norteadas pelos descritores científicos propostos para a construção teórica, após será feito o procedimento de busca criteriosa das publicações sobre o tema de caráter relevante para a análise. Em posse deste material iniciar-se-á a redação científica, organizada pelas 196 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

197 fichas de leitura contendo além das citações, as próprias reflexões dos autores sobre o assunto em questão. Após a seleção, organização, redação será elaborada o agrupamento dos conteúdos por familiaridade numa sequência que dará a sustentação teórica para a compreensão das próximas etapas da historia oral e construção da coletânea propriamente dita. Os artigos de caráter científico serão obtidos através da busca on-line, assim como em períodos que tratem da temática, prioritariamente dos últimos cinco anos. A técnica de análise será a proposta de conteúdo de Bardin (2004) em que haverá a organização do material, sua devida exploração, reconhecimento do material que tenha emergido das diversas fontes de busca. Posteriormente, haverá a ordenação, agrupamento, e novas organizações e novos agrupamentos por semelhanças e complementaridades. Mantendo o eixo norteador da evolução histórica os fatos com suas devidas interlocuções com as áreas envolvidas: educação, desporto e saúde. CONTEXTUALIZANDO O ESPORTE E EDUCAÇÃO FISíCA NO BRASIL Este esporte popular, sem vinculação institucional esportiva e exercício principalmente na perspectiva do direito do homem à prática esportiva, tornou o fenômeno do esporte ainda mais presente à realidade social. Pois é justamente este esporte, identificado mundialmente como relevante nas diversas sociedades, que, no Brasil, embora reconhecido legalmente pelo Estado há menos de 50 anos, encontra-se situado na área da educação (TUBINO, 1997, p.10). As valorizações econômicas, sociais e políticas do esporte seguiram o rumo de outras áreas da atividade humana. Deveríamos ser mais sensíveis á importância do movimento e do alcance educativo da formação esportiva dos jovens. Formação significa ação de desenvolver as capacidades próprias do ser humano: inteligência, sentido, consciência social, patriotismo, espírito crítico, etc. É nesse sentido que o esporte para crianças e jovens deve ser orientado, de forma a fazer convergir os objetivos das práticas esportivas com os objetivos que presidem a educação, ou seja, ser enquadrada nas finalidades e nas metas do sistema educativo (BARBANTI, 2005, p.10). O esporte e Educação Física no Brasil sofreu uma série de transformações, norteando a manifestação de diversos paradigmas, nos quais se evidenciaram, de acordo com Bregolato (2007) a partir da década de 80, evidenciando-se com os professores escritores como Vitor Marinho de Oliveira, João Paulo Subirá Medina, João Batista Freire, Valter Bracht, Lino Castellani Filho, Carmem Soares, dentre tantos outros. Esses autores, segundo Bregolato (2007), questionam as concepções pedagógicas com as idéias positivistas tais como: 1 - que o movimento corporal base do estudo da Educação Física não se encerre em si como num ato mecânico e desvinculado da vida do aluno, mas que os significados atribuídos aos exercícios que ele realiza estejam atrelados a sua vida em sociedade; 2 - Educação Física deslumbrando a totalidade humana, considerando-se também os aspectos culturais e biopsicosociais dos educando; 3 - que a educação escolar desperta o espírito crítico do aluno para que este possa interferir em sua realidade propondo a democratização do ensino; 4 - que Educação Física desenvolva Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

198 autonomia do aluno e para isso se faz do saber; 5- que Educação Física trabalha os conteúdos historicamente colocados: os jogos, as danças, as lutas, os esportes a história saber as interferências políticas-sociais-religiosas-filosóficas que levaram a humanidade construir o conhecimento corporal e o conhecimento escolar no decorrer dos tempos, efetuando-se na práxis, que a integração da teoria com a prática, do movimento corporal com a reflexão, da ação consciente as quais promovem grandes transformações nas sociedades. Para Castellani Filho (2001), já na década de 30 com o intuito de compreender em que medida as mudanças ocorridas no reoordenamento econômico-social sugerirão através dos estimulo à Educação Física, a concretização de uma identidade moral e cívica Brasileira analisar o envolvimento da Educação Física com os princípios segurança Nacional, tanto no alusivo à temática da Eugênia da raças, quanto àquela inerente a constituição dos, na época, Estados Unidos do Brasil. Referente à necessidade do adestramento físico, no primeiro momento necessário à defesa da pátria da ordem política e econômica constituída, como também à eminência de configuração de um conflito bélico a nível mundial, e, em outro instante visando assegurar aos processos de industrialização implantado no país, mão-de-obra fisicamente adestrada e capacitada cabendo e ela cuidar da recuperação manutenção da força do trabalho do trabalhador brasileiro. (CASTELLANI FILHO, 2001). Estudos de Romero (2005), enfatizam que a temática do corpo vem sendo discutida para apontar elementos para compreensão das atividades corporais que vem sendo desenvolvidas na práxis da Educação Física sob o olhar do gênero como categoria histórica, analista e relacional. Para Santin (2001), a maneira mais frequente e mais banal de tratar o esporte consiste em considerá-lo um mero instrumento posto a serviço de idéias, de interesses, de ideologias ou de qualquer ordem de valores que não sejam ele próprio neste caso o esporte propriamente não tem valor em si mesmo. Seu valor é extrínseco, o que o transforma na ferramenta que produz um determinado fim. Em geral, todas as pessoas que não praticam esporte, mas se interessam pelas atividades esportivas, são aquelas que mais cultivam essa idéia de funcionalidade instrumental do esporte. Há também um numero razoável de praticantes de esportes que buscam o esporte com objetivos não tanto esportivos (SANTIN, 2001). Segundo Soares (2007), a objetivação do corpo é parte de um processo que o coloca no campo no centro de nossas expectativas, constituindo-se em alvo dos anseios da existência, numa difícil distinção entre desejos que se transformam em necessidades, sobretudo a partir dos investimentos midiáticos. A satisfação desses desejos vai constituindo-se como algo imprescindível para a continuidade da vida, para um ideal sempre inatingível da felicidade. Desejos que se tornam tão essenciais que se impõem à vida, restringindo as possibilidades humanas, ampliando a ausência de liberdade. (SOARES, 2007). CARAZINhO: SUA história E SUA GENTE Os registros populacionais de Carazinho, que era o quarto distrito, ou seja, da grande região 198 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

199 que se tornaria antes de sua emancipação eram imprecisos. Os primeiros registros mostram que eram habitantes, sendo que, a população urbana era de 900 pessoas e rural eram 8646 pessoas (BOCOURNY, 2006). Em 1917, aconteceu à primeira tentativa de transformar o então Distrito de Passo Fundo em um futuro município, somente em 1930 fortaleceramse os desejos para que realmente a emancipação se consolidasse no dia 24 de janeiro de 1931 o intervalo federal no Estado General Flores da Cunha baixou o decreto número 1707 emancipando o município de Carazinho (BOCOURNY, 2006). O nome Carazinho tem sua origem segundo Bocourny (2006) um tanto conturbado, devido a grande circulação de versões as quais originaram seu nome: o mais provável é a derivação do nome ao povoado, pela denominação do Arroio Carazinho, que tem a denominação anterior á primeira aglomeração de casas. Entretanto, para Bocourny (2006, p.25), outra versão muito corrente nas duas primeiras décadas do século XX é que Carazinho seria uma corruptela de Jacuizinho, surgida de erros de escrituras, e era voz corrente que os dois primeiros escrivões do povoado eram analfabetos. Também era muito questionado o fato de que Cará não provinha, nem do tubérculo alimentar, nem do peixe Acará e sim, de uma taquarinha que os índios chamavam de Carafá e que abundava ás margens dos arroios que de mais tarde formariam a bacia do nosso município. Sem dúvida alguma, a versão mais pitoresca conhecida é a de uma placa de madeira com a inscrição CARAZINHO, para indicar que uma passagem em um curso hídrico próximo à primeira povoação, e que outrora seria mais caudaloso, era favorável à travessia das tropas de mulas que aqui cruzavam (BOCOURNY, 2006). Bocourny (2006, p.26), enfatiza que Carazinho teve variações ortográficas desde a sua emancipação, pois, no Decreto numero 4.709, de 24/10/1931, foi batizado como CARASINHO. Em 1942, por reforma na língua portuguesa, de acordo com novas regras, a denominação foi alterada para CA- RÀZINHO e motivada por outras regras da língua pátria, perdeu o acento á atual denominação de CARAZINHO. Os registros populacionais de Carazinho, que era o quarto distrito, ou seja, da grande região que se tornaria antes de sua emancipação eram imprecisos. Os primeiros registros mostram que eram habitantes, sendo que, a população urbana era de 900 pessoas e rural eram 8646 pessoas (BOCOURNY, 2006). Segundo dados do IBGE (2007), indicam que atualmente, Carazinho possui cerca de habitantes. O município se destaca por possuir o maior entroncamento rodoviário do sul do Brasil e ainda tem a maior cancha reta da América Latina. Sua economia está baseada na agricultura, mas conta também com algumas empresas de grande porte como a Parmalat (laticínios) e Semeato (implementos agrícolas), Rotoplastyc (Rotomoldagem),TW Transportes, SODER Tecno, GIHAL e Implementos Agrícolas MAX. O comércio local é destaque entre os municípios da Região. No âmbito educacional conta com 46 escolas de ensino fundamental e médio além de duas universidades: Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). Universidade de Passo Fundo (UPF). Também Carazinho conta com uma escola de aviação sediada no Aeroclube de Carazinho, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

200 onde são ministrados cursos de piloto privado, piloto comercial, piloto de planador, paraquedismo e aeromodelismo. (IBGE, 2007). O Esporte Carazinhense de 1930 a 1950 Muitas coisas evoluíram desde a emancipação da cidade de Carazinho, no esporte não foi diferente, pois nas décadas de 1930 a 1950, muitos foram os fatos marcantes ocorridos, entre eles destacamos a área desportista e social. Através da análise e leitura do Jornal Noticioso que faz parte do acervo da biblioteca Martinho Lutero da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) - campus Carazinho, obtivemos os primeiros fatos transcorridos na história do esporte em Carazinho. O Noticioso foi um dos primeiros meios de comunicação da cidade, sendo lançado em 22 de agosto de 1942, pelo então Sr. Nestor Moojen, diretor chefe, que mostrava fato local e do mundo, em destaque nesta década a política onde havia muitos conflitos, e se não bastasse havia uma guerra em ascensão. De posse deste material que foi doado pela Sra. Vera Lúcia Dall Valle a esta entidade educacional, percebe-se que o esporte na região tinha uma grande aceitação pela comunidade, sendo que o futebol teve seu destaque muito em suas equipes locais. O primeiro clube de Carazinho foi o Esporte Clube América, fundado em 1924, mais tarde fundi-se com o time Veterano Futebol Clube. Dois clubes se destacaram em nível local, ambos fundados em 1933: além do Veterano, o Grêmio Atlético Gloria. Os dois clubes, por muito tempo disputaram competições e, âmbito regional e estadual. A união dos dois clubes deu origem em 1970 ao clube Atlético também conhecido como Galo serrano (MU- SEU OLÍVIO OTTO, 2010). Em um dos momentos da pesquisa tivemos a oportunidade de conversar com o Sr. Sérgio Silva, um jornalista apaixonado pelo esporte, o qual lançou o livro Memória de Sérgio Silva, em sua obra ele aborda o esporte sob o olhar do jornalista esportivo. Também em diversos momentos pudemos conhecer e descobrir fatos sobre aquela época, nas visitas ao Museu Olívio Otto onde percebemos e sentimos a história de toda a cidade, através de imagens ali expostas, isso foi uma grande viagem ao tempo, sempre auxiliados pelo historiador Lucas Cabral Ribeiro, responsável pelo núcleo de história e cultura, que com grande alegria nos possibilitou ter o acesso ao acervo do museu, através de documentos, livros e ícones fotográficos. Uma contribuição muito valiosa nos foi dada pelo escritor Carazinhense Lio Bocourny, o qual enfatiza também em sua obra Carazinho: Nossa Terra Nossa Gente (2006), o qual aborda os principais fatos e personalidades relacionados ao desenvolvimento de Carazinho. Futebol em Carazinho: Revendo a história O esporte clube América foi o primeiro clube de futebol de Carazinho, com data de A Figura 1 foi registrada no campo da Vila Santo Antonio, com as seguintes referências, (mais ou menos na zona da casa do Sady de Quadros, Gutmann, Nestor de Quadros, Sulina etc. Naquela zona. Entrada do campo, onde está o prédio de Oscarzinho Kraemer, morava ali na época 200 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

201 Pedrinho Pereira. Desta sociedade que nasceu o Veterano F. C. Em 22 de outubro de (SIL- VA, 2007). A data oficial de fundação é 25 de outubro de A escalação do América vem nesta ordem: ponta direita, Hermínio Bassani,meia direita, Amadeu, centro, Dr. Léo Pinto, meia esquerda, Camilo Scherer, ponta esquerda, Stangler esta a linha. Os demais atletas : Veríssimo, Dorinieli, Pires (alfes), Armando Borges, Magala (backs), Paulino Biachi (goleiro), (SILVA, 2007). Fonte: Acervo Olívio Otto Figura 1 - Time do América 1º equipe de futebol de Carazinho 1925 Grêmio Aquático: Ênfase no Esporte De acordo com Bocourny, (2006), o Grêmio Atlético Carazinhense foi fundado em 2 de fevereiro de 1948, pelas seguintes pessoas: Arno Edmund Arend, Arno Franzen, Belmiro Correa, Francisco Fabel, Frederico Oscar Dietschi, Felipe Gerling (Mocotó), Irmão Estevão, Lauro Borges e Lauro Franzen. E neste mesmo ano inaugurou-se sua piscina olímpica. O remador Lauro Franzen juntamente com seus irmãos resolveram fundar a colméia aquática. O Grêmio Aquático Carazinhense continua ainda a ser um ponto de reunião da sociedade. Em 1948 eram praticados os esportes aquáticos, mas também o tênis, bolão e atletismo. A entidade na época era dirigida pelo Major Darci Vignoli. Basquete e Vôlei: força no esporte Embora sejam esportes bem distintos, o vôlei e o basquete sempre estiveram interligados em Carazinho, pois tanto os atletas que se dedicavam aos esportes de mão, via de regra destacavam-se em ambos, e por outro lado, os clubes na maioria surgidos na década de 50. A história nos conta que pouca importância era dada ao voleibol, cuja tendência inicial seria mais para uma modalidade feminina, porém já nos anos quarenta, principalmente nos colégios, foi difundido, tanto entre moças e rapazes (Figura 2). Armando Barleze escreveu no Jornal da Serra em 20 de setembro: No basquete e vôlei, esportes que permitem desenvolver-se técnica e fisicamente uma grande parte de nossos jovens conterrâneos, temos a União, a frente do qual se encontra Jairo Brum, coadjuvado por um grupo de abnegados desportistas. O União já fez realizar uma competição ainda inédita na região, reunindo representantes de Passo Fundo, Cruz Alta e Ibirubá, que, por dois dias consecutivos, realizaram embates sensacionais e que despertam o interesse do público para essas espécies de esporte. Continua ainda o união na vanguarda das realizações no setor de basquete e vôlei, fazendo-se recentemente representar na Semana da Pátria, trazendo maior brilho às comemorações que assinalaram mais um aniversário de nossa Independência. Sendo criada a Liga Carazinhense de Vôlei e Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

202 Basquete em junho de 1956 (BOCOURNY, 2006, p.267). Bolão: mulheres em ação! O bolão sempre foi um esporte tradicional em Carazinho, não só na cidade como também nos distritos, tanto é que a única obra escrita sobre esse interessante esporte, no Estado, é autoria carazinhense de Helaine Maria Kreling. O clube Caixeiral destacou-se em promover a modalidade (Figura 4) (BOCOUNRY, 2006, p. 266). Fonte: Acervo Olívio Otto Figura 2 - Basquete no pátio do colégio La Salle, Bocha: um esporte popular Um esporte muito popular que até hoje vem conquistando dia-a-dia mais simpatizantes, inclusive o público feminino, embora seja bem antigo, trazido pelos italianos como boccia, já tinha canchas em vilas e no interior desde os anos 20 (Figura 3). Popularizou-se em Carazinho através do Aquático desde 1950 (BOCORURNY, 2006, p. 266). Fonte: Acervo Olívio Otto. Figura 4 - Grupo feminino de bolão Clube Caixeiral Aeroclube de Carazinho Fundado em plena efervescência da Segunda Guerra mundial, em 5 de agosto de 1940, durante uma campanha nacional para incrementar a formação de pilotos brasileiros, nosso Aeroclube é hoje uma das mais tradicionais instituições da cidade. A pista foi inaugurada em 9 de julho de Em 1943, o primeiro hangar, de madeira, foi totalmente destruído, causando na época sérios problemas. Fonte: Acervo Olívio Otto Figura 3 - Inauguração da cancha de bocha do clube Caixeiral com a presença do Padre João Ghenno Neto e Alnir Rojas. Após ser oficializado, o Aeroclube abriu inscrição para a escola de aviadores, inclusive com a adesão de senhoritas da sociedade, que foram: Elba Branda Saldanha, Irmã Hammes, Jenny Branda, Marina Farias Vargas e Zuleika Notari. Em 23 de 202 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

203 janeiro de 1940, pela primeira vez, um avião aterrissou em local da atual Vila Santo Antônio, tendo o campo sido preparado pela prefeitura. O primeiro Avião a ser adquirido pelo Aeroclube foi Henrique Dias, batizado, em 1946, pelo então ministro da Aeronáutica, Salgado Filho, e pelo presidente dos Diários Associados, Assis Chateaubriand (BO- COURNY, 2006). Jockey Club a Maior Cancha Reta do País Segundo Silva (2007) o Jockey Club Carazinhense foi inaugurado no dia 16 de abril de 1950, como Sociedade Hípica Carazinhense e em 1º de abril de 1973, passou a denominar-se Jockey Club Carazinhense, tendo se destacado como A MAIOR CANCHA RETA DO BRASIL. Constitui-se num dos principais pontos turísticos do município e região, movimentando os meios turfísticos de vários Estados do país. Ao Longo de sua história, inúmeros colaboradores e ilustres presidentes contribuíram para elevar o Jockey Club, numa privilegiada condição, no cenário do turfe nacional e internacional. CONSIDERAÇÕES FINAIS Embora esta pesquisa esteja em andamento, percebemos quão são fortes os laços que ligam o esportes com as atividades cultuais e sociais, e de acordo com essas primeiros contatos com os documentos e ícones da época de 1930 a 1950, percebe-se a tendência à diversidade esportiva, porém podemos perceber a dimensão e a beleza no que se refere a interligação dos esportes. O esporte aproxima e apaixona as pessoas. Há muito ainda para descobrirmos sobre o esporte em Carazinho, no entanto de acordo com os dados já coletados percebe-se o grande interesse de nossa gente pelo esporte e pelas atividades físicas. Estamos descobrindo o seu significado resgatando nossas raízes! REFERÊNCIAS BARDIN, Laurence. Analise de conteúdo. Lisboa: Ed. 70, BARBANTI, Valdir J. Formação de esportistas. Barueri: Manole, BOCOURNY, Lio. carazinho: Nossa terra, nossa gente. Carazinho: Contato, BREGOLATO, Roseli Aparecida. cultura corporal do esporte. São Paulo: Ícone, (Coleção Educação Física escolar: no princípio totalidade e na concepção histórico-críticasocial; 3). CASTELLANI Filho, Lino. A educação Física no Brasil a história que não se conta. 6. ed. Campinas: Papirus, (Coleção corpo e motricidade). INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Senso Demográfico Disponível em: <http: // Acesso em: 16 set MUSEU OLÍVIO OTTO. Acervo Fotográfico. Carazinho, ROMERO, Elanine. Do corpo Docilizado na Aufklarung ao corpo generificado no século XXI. In: DANTAS, Estelio. Pensando o Corpo e o Movimento. Rio de Janeiro: Shape, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

204 SANTIN, Silvino. educação Física da Alegria: do lúdico à opressão do rendimento. 3. ed. Porto Alegre: EST, SILVA, Sérgio. Fatos e grandes feitos esportivos de carazinho: Memória Sérgio Silva. Carazinho, SOARES, Carmem (Org.). Pesquisa sobre o corpo ciências Humanas e educação. Campinas: FAPESP, TUBINO, Manoel Gomes. O esporte no Brasil: do período colonial aos nossos dias. São Paulo: IBRASA, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

205 Síndrome de Burnout em profissionais da saúde de Unidades Básicas de Saúde lu a n n a Ta B o r d a 1 íta l a chinazzo 2 Ma r y sa n d r a ca r lo T T o 3 RESUMO O objetivo do estudo foi identificar a prevalência da Síndrome de Burnout e associação entre variáveis sociodemográficas, laborais e psicossociais em uma amostra de 37 profissionais da área da saúde. A prevalência encontrada foi de 27% com alto nível de Baixa Realização Profissional, 10,8% de Exaustão Emocional e nenhum caso de Despersonalização. Com relação às variáveis sociodemográficas somente ter filhos associou-se a Exaustão Emocional. Variáveis laborais não apresentaram relação com Burnout e das psicossociais, somente a satisfação associou-se a Exaustão Emocional e a Despersonalização. Os resultados apontam a necessidade de ações preventivas com relação ao Burnout. palavras-chave: estresse ocupacional, Síndrome de Burnout, profissionais da área da saúde. ABSTRACT The present study has as objective to identify the prevalence of Burnout s Syndrome and the association among social demographic, work and psychosocial variables in a sample of 37 health professionals. The prevalence found was of 27% with high Low Professional Achievement, 10.8% with high Emotional Exhaustion and no 1 Acadêmica do Curso de Psicologia/ULBRA, Bolsista PRO- ICT/ULBRA 2 Acadêmica do curso de Psicologia da ULBRA, Bolsista PIBIC/ CNPq 3 Professora-Orientadora do Curso de Psicologia e do PPG em Saúde Coletiva - ULBRA. Bolsista produtividade do CNPq (mscarlotto@pesquisador.cnpq.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

206 cases of high Depersonalization. As for the sociodemographic variables, only having children was associated with Emotional Exhaustion. Labor variables showed no relation with Burnout and psychosocial characteristics, only satisfaction was associated with emotional exhaustion and depersonalization. The results point out to the necessity of interventions in a sense of prevention for the Burnout Syndrome. Keywords: occupational stress, Burnout Syndrome, health professionals. INTRODUÇÃO A Síndrome de Burnout (SB) vem sendo pesquisada desde a década de 70, tendo sido identificados resultados importantes que levaram a OMS (2000) a considerá-la um risco para a saúde física e mental do trabalhador. Estudos têm apontado e confirmado a SB como uma relevante questão de saúde pública (CEBRIÀ-ANDREU, 2005; GIL-MONTE, 2005; PALMER et al., 2005). Burnout é uma resposta emocional a situações de estresse crônico em função de relações interpessoais constantes, afetivas e intensas em situações de trabalho. Trata-se de um fenômeno psicossocial constituído de três dimensões: Exaustão Emocional (EE), Despersonalização (DE) e Baixa Realização Profissional (BRP) (MASLACH; JACKSON, 1981). Maslach e Schaufeli (1993) pontuam que todas as várias definições da SB, embora com algumas questões divergentes, ressaltam no mínimo cinco elementos comuns: (a) predominância de sintomas relacionados à exaustão mental e emocional, fadiga e depressão; (b) ênfase nos sintomas comportamentais e mentais e não nos sintomas físicos; (c) estes são relacionados ao trabalho; (d) manifestação em pessoas que não sofriam de distúrbios psicopatológicos antes do surgimento da síndrome; (e) diminuição da efetividade e do desempenho no trabalho ocorre por causa de atitudes e comportamentos negativos. Embora a SB já seja reconhecida como doença na Classificação Internacional das Doenças nº 10 (CID-10), com o código Z-73.0 e contemplada no Decreto nº 3048 de 06 de maio de 1999 do Ministério da Previdência e Assistência Social do Brasil (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001), que apresenta, na Lista B do Regulamento da Previdência, a Nova Lista de Doenças Profissionais e Relacionadas ao Trabalho, sua dimensão e caracterização específica ainda são pouco conhecidas (CARLOTTO; Câ- MARA, 2008). Burnout é um tema que tem adquirido crescente relevância e preocupação por parte de profissionais, gestores institucionais, entidades sindicais e governamentais devido à presença de inúmeros estressores aos quais estão expostos os trabalhadores do campo da saúde e que afetam diretamente o seu bem estar. Dentre vários, os mais referidos são as longas jornadas de trabalho, o número insuficiente de pessoal, a falta de reconhecimento profissional, a alta exposição a riscos químicos e físicos, assim como o contato constante com o sofrimento, a dor e muitas vezes a morte. O desempenho destes profissionais envolve uma série de atividades que necessitam de um controle mental e emocional muito maior que em outras profissões (BENEVIDES- PEREIRA, 2002; MASLACH; JACKSON, 1981). No cotidiano de seu trabalho, têm que manejar com pacientes em estado grave, compartilhando com o paciente e seus familiares a angústia, a dor e o medo de padecerem (ARANDA-BELTRÁN et. al., 2004; CORNELIUS; CARLOTTO, 2007; PAREDES; 206 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

207 PEREIRA; MONTIEL, 2008). Esta é considerada uma das principais causas da SB, pois estas relações, não raras vezes, estão acompanhadas de sentimentos de tensão, ansiedade e até mesmo de hostilidade encoberta (RODRIGUEZ-MARÍN, 1995). Burnout é um dos caminhos para que o profissional da área da saúde chegue a outras patologias mais incapacitantes como a depressão, resultado com sérios prejuízos para o paciente, para o profissional e para instituição de saúde. Equipes com Burnout podem ser menos produtivas e tendem a apresentar menor qualidade no atendimento ao cliente (SCHMITZ; NEUMANN; OPPERMANN, 2000). Os efeitos do Burnout envolvem toda a organização do serviço prestado, uma vez que tendem a disseminação irregular entre os membros de uma equipe, de uma equipe para outra e destas para os pacientes. Nestes, o contato com profissionais com Burnout é frustrante e ineficaz (PURICELLI et al., 2008). Segundo Leiter, Harvie e Frizzell (1999), o profissional é parte vital do sistema de saúde para garantir a oferta de atenção com qualidade. Estudo realizado por Grau et al. (2009) com profissionais da saúde, realizado na Espanha, identificou uma maior prevalência em mulheres, com menor número de filhos, trabalhadores jovens, profissionais médicos, realização de horas extras, apresentavam faltas devido a doenças e que não percebiam seu trabalho como importante e que apresentavam menor satisfação com a remuneração e desenvolvimento profissional. Villalobos et al. (2004) identificou associação entre Burnout e satisfação no trabalho em pesquisa realizada com profissionais de atenção primária. A relação encontrada foi com as variáveis sobrecarga de trabalho, conflito de papel e relacionamento com pacientes. Em outra investigação realizada por Caballero et al. (2001) com 354 médicos, enfermeiros e auxiliares clínicos de atenção primária de Madri relevou que 43,9% apresentavam ou haviam apresentado algum tipo de alteração física o psíquica relacionada diretamente com o desenvolvimento de sua profissão e em 38,3% associava-se diretamente ao desgaste com o excesso de demanda suportado habitualmente em suas consultas. Ao longo dos estudos sobre a SB tem se verificado um aumento da ênfase entre o desequilíbrio entre demandas e recursos de trabalho, e no conflito entre os valores pessoais e organizacionais assim como os valores declarados oficialmente pela da organização e os valores colocados em ação (SCHAUFELI; LEITER; MASLACH, 2009). Assim, considerando que a SB é um fenômeno psicossocial relacionado diretamente à situação laboral e que a atividade produtiva é um elemento constitutivo da saúde mental individual e coletiva, este estudo pretende, através de um delineamento observacional de corte transversal, identificar a prevalência e a relação entre a SB e variáveis laborais e psicossociais em profissionais da área da saúde que atuam em duas Unidades Básicas de Saúde (UBS) da rede municipal de uma cidade da região metropolitana de Porto Alegre. O presente estudo é parte de um maior, intitulado Síndrome de Burnout em profissionais da saúde, realizado com apoio financeiro do CNPq. MATERIAL E MÉTODOS Amostra Constituiu-se de 37 trabalhadores da saúde pertencentes a duas Unidades Básicas de Saúde (UBS). Usou-se como critério de inclusão o fato de não ter se afastado por licença-saúde nos últi- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

208 mos seis meses. A maioria dos participantes são mulheres (83,3%), solteiros, separados e viúvos (55,6%), com companheiro fixo (68,6%), com filhos (64,9%), possuem remuneração maior que três salários mínimos (61,1%). Quanto à formação dos participantes, identificam-se enfermeiros (27,0%), técnicos de enfermagem (24,3%), médicos (21,6%), dentistas (8,1%) e outras formações (18,9%). Também, a maioria não possui outra atividade a não ser no posto em que trabalham (77,8%). Possuem uma média de idade de 37 anos (DP=±11,01), tem em média 10 anos e 4 meses (DP=±10) de experiência profissional e 5 anos e 9 meses (DP=±6) de exercício profissional no posto de saúde. Possuem uma carga horária média de 36,61 horas (DP=±10,33) e atendem em média de 61 pacientes (DP=±59,34). Instrumentos Questionário para levantamento de variáveis sociodemográficas, laborais e psicossociais elaborado especificamente para este estudo. MBI - Maslach Burnout Inventory (1986) para avaliar a SB. O MBI avalia como o trabalhador experiencia seu trabalho, de acordo com as três dimensões estabelecidas no estudo realizado pelas autoras: Exaustão Emocional (9 itens), Realização Profissional (8 itens) e Despersonalização (5 itens) em profissões que possuem relação de ajuda. Procedimentos Primeiramente foi realizado um contato com a Secretaria da Saúde no qual foi apresentado o objetivo do estudo a fim de obter a autorização e o apoio para a aplicação dos instrumentos. Após, foi contatada a chefia da UBS para explanação dos objetivos e estruturação da logística de coleta de dados. Foram realizados os procedimentos éticos conforme resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), no que diz respeito à pesquisa com seres humanos (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1997). Foi esclarecido aos profissionais e chefia dos postos tratar-se de uma pesquisa sem quaisquer efeitos avaliativos individuais e/ou institucional e que as respostas e os dados referentes aos resultados serão anônimos e confidenciais. Para garantir estes aspectos éticos foi fornecido aos participantes um Termo de Consentimento Informado para eles assinarem sua conformidade na participação da pesquisa. A pesquisa possui aprovação do Comitê de Ética de afiliação das autoras. O banco de dados foi digitado e, posteriormente, analisado no pacote estatístico SPSS, versão Primeiramente foram realizadas análises descritivas de caráter exploratório a fim de avaliar, no banco de dados, a distribuição dos itens, casos omissos e identificação de extremos. Posteriormente, foram calculadas freqüências para variáveis categóricas e médias para variáveis contínuas. Para comparação de médias foi utilizada o teste t de student. Os resultados da análise bivariada serão considerados estatisticamente significativos quando o valor de p for igual ou menor que 0, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

209 RESULTADOS Quanto aos índices de Burnout, verificou-se que a Realização Profissional foi a dimensão que atingiu maior índice médio, seguida pela dimensão Exaustão Emocional, sendo que a de menor índice foi Despersonalização (Tabela 1). Tabela 1 Amplitude, média, desvio-padrão das dimensões de Burnout Burnout Min Max M DP Exaustão Emocional 1,00 5,00 2,57 1,04 Despersonalização 1,00 3,60 1,95 0,76 Realização Profissional 2,63 4,88 3,83 0,56 Os resultados indicam que 27% possuem níveis elevados de Baixa Realização Profissional e 10,8% apresentam elevada Exaustão Emocional, de acordo com o ponto corte da escala tipo Likert (Tabela 2). Tabela 2 Número e porcentagem de participantes com altos e baixos níveis de Burnout Dimensões Níveis altos ( 4) Níveis baixo (<4) Exaustão Emocional 4 (10,8%) 37 (89,2%) Despersonalização (100%) Baixa Realização Profissional 14 (27%) 23 (73%) Quanto às variáveis quantitativas, a dimensão Exaustão Emocional se correlacionou negativamente com as variáveis de satisfação com o trabalho, com o salário, com a salubridade do local, com a chefia e com a participação nas decisões institucionais. Já a dimensão Despersonalização se correlacionou negativamente com as variáveis de satisfação com o trabalho, com a salubridade do local e com a chefia. A dimensão Realização Profissional não se associou com nenhuma variável quantitativa (Tabela 3). Tabela 3 - Matriz de correlação entre dimensões de Burnout e variáveis quantitativas. Variáveis EE DE RP Idade -0,115-0,178-0,223 Remuneração 0,156 0,129 0,145 Tempo de profissão -0,031-0,133-0,141 Tempo na UBS 0,189 0,169-0,097 Carga horária semanal -0,160 0,092 0,189 Número de pacientes/dia 0,037 0,106 0,021 Satisfação com o trabalho -0,351* -0,165-0,107 Satisfação com o salário -0,524** -0,496** 0,080 Satisfação com ambiente físico do local -0,536** -0,417* 0,124 Satisfação com promoções -0,308-0,195 0,126 Satisfação com chefia -0,351* -0,334* 0,118 Satisfação com a participação -0,364* -0,292-0,147 *Correlação significativa ao nível de 5% **Correlação significativa ao nível de 1% EE=Exaustão Emocional; DE=Despersonalização; RP=Realização Profissional Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

210 As variáveis qualitativas sociodemográficas e laborais apresentou associação somente entre ter filhos e a dimensão Exaustão Emocional (Tabela 4). Tabela 4 Relação entre as dimensões de Burnout e variáveis qualitativas Variáveis EE DE RP Sexo M DP p M DP p M DP p Feminino 3,06 0,85 0,659 3,11 0,49 0,240 3,83 0,54 0,235 Masculino 2,98 0,62 3,06 0,78 3,52 0,80 Companheiro Sim 3,06 0,72 0,879 3,28 0,63 0,537 3,43 0,68 0,332 Não 3,04 0,85 3,18 0,46 3,22 0,51 Filhos Sim 3,27 0,78 0,009* 3,41 0,54 0,711 3,52 0,61 0,173 Não 2,92 0,86 3,18 0,62 3,32 0,45 Trabalha em outra instituição Sim 3,62 0,45 0,109 2,91 0,46 0,111 3,35 0,45 0,164 Não 3,07 0,85 3,38 0,58 2,95 0,65 Tipo de vínculo Estatutário 3,01 0,86 0,953 3,14 0,59 0,425 3,17 0,60 0,227 Contrato 3,08 0,43 3,30 0,53 3,40 0,63 Nota: *Diferença significativa ao nível de 5% EE=Exaustão Emocional; DE=Despersonalização; RP=Realização Profissional DISCUSSÃO Em relação à prevalência de Burnout, verificouse que a dimensão de Baixa Realização Profissional foi a que atingiu maior percentual de nível alto (27%), seguida pela dimensão Exaustão Emocional, com 10,8%, e a dimensão de Despersonalização, não evidenciou nenhum caso. Geralmente, a síndrome inicia com prevalência dos sintomas característicos da Exaustão Emocional ou da Baixa Realização Profissional (TELLES; PIMENTA, 2009), no caso do estudo é a falta de realização o que predomina. Sendo a Exaustão Emocional a segunda em termos de prevalência, esta não vem sendo implicada com o sentimento de não realização. Já com relação à Despersonalização pode-se supor que o conflito entre as perguntas e a desejabilidade da imagem social dos profissionais da saúde tenha interferido nos resultados (TAMAYO, 1997). Conforme o índice de Exaustão Emocional apresentado pelos resultados, pode-se pensar que 10,8% da amostra está se sentindo emocionalmente esgotada para lidar com as demandas profissionais. Esse fenômeno pode ser compreendido pelo contato diário e integral com outras pessoas (TELLES; PIMENTA, 2009), principalmente, porque essas relações estão marcadas por acontecimentos de supra importância aos pacientes e que, geralmente, são negativos e geradores de angústias e ansiedades, como, por exemplo, o adoecimento. Assim, a exigência do profissional da saúde é muito grande, pois além das demandas do trabalho em si, há as demandas do âmbito das relações interpessoais, uma vez que o profissional acaba por se envolver em relações permeadas por fortes sentimentos, como frustração, medo e tensão. Apesar de a Exaustão Emocional ser a dimensão mais elevada na amostra, essa ainda não é suficiente 210 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

211 para interferir na dimensão interpessoal, a da Despersonalização. Mesmo os profissionais estarem se sentindo esgotados com as demandas profissionais, estes ainda mantêm relacionamentos emocionais com os pacientes, e não os evitam. Todavia, é preciso atenção para isso, pois a elevada Exaustão Emocional desencadeia a Despersonalização, visto que ao se sentir sobrecarregado e oprimido pelas demandas emocionais exigidas pelas outras pessoas, o profissional pode não dispor de energia física e emocional para investir em suas relações com os pacientes. Isto é, o profissional assume uma posição de defesa em relação ao esgotamento emocional e se distancia caracterizando a dimensão Despersonalização (BONTEMPO, 1999). Com relação às variáveis sociodemográficas, somente os profissionais com filhos apresentaram índices significativamente maiores de Exaustão Emocional. Os trabalhadores podem sentir-se mais sobrecarregados, pois tem que conciliar as atividades do trabalho e as atividades junto aos filhos. Um percentual elevado dos profissionais da amostra tem filhos menores de 18 anos (41,2%), que demandam uma maior atenção e responsabilidade. Santos, Alves e Rodrigues (2009) encontraram resultado semelhante em sua pesquisa com enfermeiros, em que os profissionais que tinham filhos apresentaram maior percentual nas três dimensões de Burnout em relação aos sem filhos. A relação entre a SB e a satisfação no trabalho tem sido demonstrada de forma consistente na literatura, sejam estas variáveis estimadas de forma global ou mediante suas diferentes dimensões (GIL- MONTE; PEIRÓ, 1997). Segundo os autores, as dimensões de Burnout e satisfação no trabalho são negativamente relacionadas com os sentimentos de exaustão emocional e despersonalização e positivamente relacionada com a dimensão de realização pessoal no trabalho. Os resultados obtidos confirmam o referido, com exceção da dimensão de Realização profissional que não apresentou associação com nenhuma das dimensões da satisfação. A satisfação com o ambiente e as condições de trabalho é considerada peça fundamental para o crescimento e desenvolvimento da prática profissional do trabalhador da saúde (LILLEHAUG; LAJOJE, 1998). No estudo, verifica-se que quanto maior a satisfação com o trabalho, com o salário, com o ambiente físico do local, com a chefia e com a participação na instituição, menor a Exaustão Emocional. Resultado semelhante com relação ao trabalho por Patrician, Shang e Lake (2010), com o ambiente físico por Rosa e Carlotto (2005) e com a chefia por Silva e Carlotto (2008). Conforme Malmann et al. (2009), os escores de Burnout são reduzidos nas situações em que há suporte gerencial adequado. Assim, o profissional ao estar satisfeito com o trabalho que realiza, tendo condições de desenvolvê-lo e uma chefia que o apóia, faz com que as demandas inerentes a sua profissão atenuem a carga emocional. Este resultado implica também em um menor distanciamento com relação a sua clientela. Curiel-García, Rodríguez-Morán e Guerrero-Romero (2006) reforçam a importância das variáveis contextuais na explicação da SB em profissionais da saúde. As organizações de atendimento à saúde possuem uma estrutura organizacional complexa quanto aos profissionais, papéis, estrutura, divisão de trabalho, metas, hierarquia e normas que a regulam. Há uma prática profissional voltada, quase que exclusivamente para a eficácia do atendimento ao paciente (ROSA; CARLOTTO, 2006). O grau de satisfação que os profissionais têm em relação ao seu trabalho é um importante elemento de produtividade e qualidade dos serviços de saúde (BARQUERO; HERRER; MUNOZ, 2009). Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

212 Burnout é avaliado, não por sua presença ou ausência, por ser uma variável dicotômica (MAS- LACH; JACKSON, 1981, 1986). A SB se caracteriza por ser uma variável contínua, a qual oscila entre níveis baixo, moderado e alto (GIL-MONTE; PEIRÓ, 1997; MASLACH; JACKSON, 1986). Na maior parte dos estudos, altos escores em Exaustão Emocional e Despersonalização e baixos escores em Realização Profissional indicam alto nível de Burnout (MASLACH; JACKSON, 1981). Assim, não se verifica a caracterização de Burnout na amostra, devido principalmente da ausência de casos na dimensão de despersonalização. É importante salientar, no entanto, que a dimensão Exaustão Emocional é a primeira a surgir de acordo com o Modelo processual de Maslach e na sua fase subsequente costuma conduzir o profissional a atitudes defensivas sendo uma delas a ocorrência da dimensão Despersonalização. Assim, o profissional esgotado tende a se afastar dos pacientes, desqualificando o seu serviço. Com isso, é importante pensar-se os resultados obtidos em uma perspectiva preventiva tendo em vista a possibilidade quanto ao agravamento das dimensões de Burnout tendo em vista que sua ocorrência repercute negativamente na qualidade de vida do profissional assim como na qualidade dos serviços prestados. De acordo com Crawford et al. (2010), baixos níveis podem refletir uma fase inicial que já deve ser alvo de intervenções. Algumas limitações devem ser consideradas na análise dos resultados e conclusões realizadas. A primeira limitação é que o estudo tem delineamento transversal, o que impede conclusões em termos de causalidade. É importante considerar o efeito do trabalhador sadio, questão peculiar em estudos transversais em epidemiologia ocupacional que, muitas vezes, exclui o possível doente (Mc MICHAEL, 1976). Essa é uma situação que pode subestimar o tamanho dos riscos identificados, porque os mais afetados não conseguem manter-se no emprego, afastando-se por licenças para tratamento de saúde. A segunda é que a literatura sobre a SB em trabalhadores neste contexto ainda é incipiente (CARLOTTO; CâMARA, 2008), dificultando a comparação com outros estudos nacionais. Neste sentido, torna-se importante a realização de novos estudos com outros delineamentos e variáveis. A terceira é a possibilidade ocorrência do erro tipo II (falso negativo), de não revelar diferenças e associações entre determinadas variáveis devido ao pequeno tamanho da amostra. O estudo aponta para um quadro de variáveis que podem prevenir ou ocasionar Burnout no grupo de trabalhadores investigado, principalmente relacionados às variáveis psicossociais. Esse resultado aponta para ações importantes em termos de prevenção da SB, através de novas metodologias de análise considerando as variabilidades humanas, do meio e o saber dos trabalhadores (NASCIMENTO; VIEIRA; CUNHA, 2010). REFERÊNCIAS ARANDA-BELTRÁN, C. et al. Factores psicosociales laborales y Síndrome de Burnout en médicos del primer nivel de atención Disponível em: < abril2004/art4.html.> Acesso em: 12 dez BARQUERO, G. I.; GALVEZ, H. M.; RO- DRIGUEZ, M. A. Calidad de vida profesional y Burnout en técnicos de drogodependencias: análisis comparativo con otros grupos profesionales. Medicina y seguridad del trabajo, v. 55, n. 217, p , Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

213 BENEVIDES-PEREIRA, A. M. T. Burnout: o processo de adoecer pelo trabalho. In:. Burnout: quando o trabalho ameaça o bem estar do trabalhador. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002, p BONTEMPO, X. F. Nivel de síndrome de agotamiento en médicos, enfermeras y paramédicos. Revista Mexicana de Puericultura y Pediatría, v. 6, n. 2, p , CABALLERO, F. M. A. M. et al. Prevalencia y factores asociados al burnout en un área de salud. Atención Primaria, v. 27, n. 5, p , CARLOTTO, M. S.; CâMARA, S. G. Análise da produção científica sobre Síndrome de Burnout no Brasil. Psico-PUcRS, v. 39, n. 2, p , CEBRIÀ-ANDREU, J. El síndrome de desgaste profesional como problema de salud pública. Gaceta Sanitária, v. 19, n. 6, p , CORNELIUS, A.; CARLOTTO, M. S. Síndrome de Burnout em profissionais de urgência. Psicologia em Foco, v. 1, n. 1, p , CRAWFORD, M. J. et al. Job satisfaction and burnout among staff working in communitybased personality disorder services. the International Journal of Social Psychiatry, v. 56, n. 2, p , CURIEL-GARCÍA, J. A.; RODRÍGUEZ- MORÁN, M.; GUERRERO-ROMERO, F. Síndrome de agotamiento profesional en personal de atención a la salud. Revista Médica del Instituto Mexicano del Seguro Social, v. 44, n. 3, p , GIL-MONTE, P. R. el síndrome de quemarse por el trabajo (Burnout). Una enfermidad laboral en la sociedad del bienestar. Madrid: Pirâmide, GIL-MONTE, P. R.; PEIRÓ, J. M. Desgaste psíquico em el trabajo: el Síndrome de Quemarse. Madrid: Síntesis, GRAU, A. et al. Influencia de factores personales, profesionales y transnacionales en el síndrome de Burnout en personal sanitario hispanoamericano y español Rev esp Salud Pública, v. 83, n. 2, p , LILLEHAUG, S. I.; LAJOJE, S. Health care workers and their needs: the forgotten shadow of AIM research. Medinfo, v. 9, p , LEITER, M. P.; HARVIE, P.; FRIZZELL, C. The correspondence of patient satisfaction and nurse Burnout. Social Science & Medicine, v. 47, n. 10, p , MALLMANN, C. S. et al. Fatores associados à síndrome de Burnout em funcionários públicos municipais. Psicologia: teoria e Prática, v. 11, n. 2, p , MASLACH, C.; SCHAUFELI, W. B. Historical and conceptual development of burnout. In: SCHAUFELI, W. B.; MASLACH, C.; MAREK, T. Professional Burnout: recent developments in theory and research. New York: Taylor & Francis, p MASLACH, C.; JACKSON, S. E. The measurement of experienced Burnout. Journal of Occupational Behavior, v. 2, p , Maslach Burnout Inventory. 2. ed. Palo Alto: Consulting Psychologist Press, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

214 MC MICHAEL, A. J. Standardized mortality ratios and the healthy worker effect: scratching beneath the surface. Journal Occupational Medical, v. 18, p , MINISTÉRIO DA SAÚDE. Resolução CNS 196/196. Conselho Nacional de Saúde. Diretrizes e normas para pesquisa envolvendo seres humanos. Brasília: Ministério da Saúde, MINISTÉRIO DA SAÚDE. OPAS/OMS: Doenças relacionadas ao trabalho: manual de procedimentos para os serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde, NASCIMENTO, E. L. A.; VIEIRA, S. B.; CUNHA, T. B. da. Riscos ocupacionais: das metodologias tradicionais à análise das situações de trabalho. Fractal: Revista de Psicologia, v. 22, n. 1, p , ORGANIZAçãO MUNDIAL DA SAÚDE. the world health report Disponível em: <http// Acesso em: 16 dez PALMER, Y. et al. Factores de riesgo organizacionales asociados al síndrome de Burnout en médicos anestesiólogos. Salud Mental, v. 28, n. 1, p , PAREDES, M. B. A.; PEREIRA, D. I. M.; MONTIEL, R. P. Síndrome de Burnout en médicos y personal de enfermería del Hospital Escuela Oscar Danilo Rosales Argüello, León. Universitas, v. 2, n. 2, p , PATRICIAN, P. A.; SHANG, J.; LAKE, E. T. Organizational determinants of work outcomes and quality care ratings among Army Medical Department registered nurses. Research in Nursing Health, v. 33, n. 2, p , PURICELLI, O. et al. Burnout Syndrome in the health professions: analysis of aetiological factors. Rivista di Psicologia clinica, n. 3, p , RODRIGUEZ-MARÍN, J. Psicologia Social de la Salud. Madrid: Sínteses, ROSA, C. da; CARLOTTO, M. S. Síndrome de Burnout e satisfação no trabalho em profissionais de uma instituição hospitalar. Revista da SBPH, v. 8, n. 2, p. 1-15, SANTOS, F. E. dos; ALVES, J. A.; RODRI- GUES, A. B. Síndrome de Burnout em enfermeiros atuantes em uma Unidade de Terapia Intensiva. einstein, v. 7, n. 1, p , SCHAUFELI, B. W.; LEITER, M. P.; MASLACH, C. Burnout: 35 years of research and practice. career Development International, v. 14, n. 3, p , SCHMITZ, N.; NEUMANN, W.; OPPER- MANN, R. Stress, Burnout and locus of control in German nurses. International Journal of Nursing Studies, v. 37, p , SILVA, T. D. da; CARLOTTO, M. S. Síndrome de Burnout em trabalhadores da enfermagem de um hospital geral. Revista da SBPH, v. 11, n. 1, p , TAMAYO, R. M. Relação entre a síndrome de Burnout e os valores organizacionais no pessoal de enfermagem de dois hospitais públicos Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Faculdade de Psicologia, Universidade de Brasília, Brasília, TELLES, A. H.; PIMENTA, A. M. C. Síndrome 214 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

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217 Ciências Sociais Aplicadas

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219 O preço da bola: processo de formação de crianças e adolescentes das categorias de base do Sport Club Internacional zi l k a va r g a s 1 ho n o r d e al M e i d a ne T o 2 RESUMO Esta pesquisa investiga o processo de formação de jovens atletas das categorias de base do Sport Club Internacional, visa reconstituir a construção do habitus dessas crianças e adolescentes, analisando os riscos a que são expostos e a forma como reagem à pressão que caracteriza o contexto do futebol, bem como os saberes instaurados neste processo. Busca também identificar as expectativas de pais/responsáveis quanto ao futuro das crianças e, ainda, mapear o perfil sócio-econômico dos atletas. Neste estudo de casos realizou-se entrevistas com uma amostra representativa de atletas e pais de atletas com idade entre 10 e 11 anos. A amostra atual compreende 42 atletas, nascidos em 1997 e em 1998, e 41 pais o que compreende 70% deste recorte da população. palavras-chave: formação, infância, futebol, adultização. ABSTRACT The current paper investigates the formation process of young athletes from Sport Club Internacional base soccer team and aims at reconstructing the habitus construction of such children and teenagers by analyzing the risks to which they are exposed as well as how they react to the pressure which characterizes the soccer context 1 Acadêmica do Curso de Serviço Social. Bolsista PROICT/ ULBRA 2 Professor-Orientador do Curso de Serviço Social (dirciepoliticas@ulbra.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

220 and the knowledge involved in the process. It also attempts to identify the expectations of parents/guardians related to the future of such children and, yet, to map the socio-economic profile of the athletes. The study was based on interviews with a representative sample of athletes and athletes parents aged between 10 and 11 years old. The current sample comprises 42 athletes, born in 1997 and 1998 and 41 parents, representing 70% of the population sample. Keywords: formation, childhood, soccer, adultization. INTRODUÇÃO O ingresso da criança no universo do futebol traz a possibilidade de materialização de um sonho infantil e de ascensão social de sua família. Porém, poucos se tornam profissionais e as demandas desse subcampo do campo esportivo 1 que é o futebol exigem de todos a antecipação de etapas no seu desenvolvimento. Na comparação com anos anteriores vê-se que hoje modificou-se o processo de formação de jovens atletas das categorias de base do Internacional, que alterou-se em seus propósitos e sua estruturação. As novas disputas e interesses que distinguem hoje o campo esportivo pressionam cada vez mais a infância 2 destas crianças e adolescentes adultizando-as 3 precocemente. Na 1 O campo esportivo..pode ser construído a partir de um conjunto de indicadores, como, de um lado, a distribuição dos praticantes segundo sua posição no espaço social, a distribuição das diferentes federações, segundo o número de adeptos, sua riqueza, as características sociais dos dirigentes...e de outro lado, o tipo de relação com corpo que ele favorece ou exige.. (BOURDIEU, 1990, p.208). 2 A infância é análoga ao aprendizado da linguagem. Tem uma base biológica, mas não pode se concretizar a menos que um ambiente social a ative e a alimente...se as necessidades da cultura não a exigem então a infância continua muda (POSTMAN, 1999, p. 158). 3 Quanto ao conceito de adultização: Hoje o trabalho infantil pode ser traduzido por adultização, a adultização de crianças não é uma novidade na história humana, ela sempre existiu. A questão central é que ela não atinge mais somente a criança pobre, tem uma amplitude muito maior, é uma epidemia que assola todas as camadas sociais (ALMEIDA NETO, 2006, p.118). relação entre ser criança (idade biológica) e ter infância (tempo do brinquedo), a criança tem infância quando brinca, e se adultiza quando tem muita responsabilidade, controle, rigidez. Quando se depara então, com um conjunto de obrigações e responsabilidades prematuras, no intuito de preparar-se para ingressar no mercado de trabalho. No caso específico dos esportes de alto desempenho, um exemplo disso é a pressão por resultados. Essa pressão, embora seja amenizada nas categorias de base, até mesmo por seu caráter até certo ponto amador e de fabricação de atletas para a categoria profissional, existe, e é inerente a esse processo de formação 4. Pressão para manter-se pertencente ao clube e ao time, tendo em vista a alta competição que caracteriza essa realidade. Porém, concomitantemente a isso, este processo instaura também um conjunto de competências 5 e tende a ser gradativamente aprimorado, frente à enorme estrutura e investimento dos grandes clubes de futebol profissional na formação de novos atletas, como é o caso do 4 Formação é a ação pela qual algo se forma, é produzido; é a ação de formar, de organizar, de instruir, de educar e seu resultado. E formado é aquele que recebeu uma certa forma; que foi habituado conforme tal forma ou tal feitio (MIALARET apud DESAULNIERS, 1997, p.191). 5 A competência envolve todas as dimensões do individuo com ênfase na capacidade crítica e de autonomia, espírito de iniciativa, de responsabilidade, flexibilidade, além da visão empreendedora (DESAULNIERS, 1998). 220 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

221 Sport Club Internacional, cujo trabalho realizado nas categorias de base é referência nacional e internacional. A instauração de um conjunto de competências e a conquista de uma maior autonomia são neste contexto potencializadas, visto que o tensionamento entre o habitus 6 dos jovens atletas e as estruturas objetivas do campo esportivo demandam uma nova prática formativa, que otimize a aquisição de saberes que possibilitem uma visão diferenciada do mundo que o cerca e do papel que desempenha nas relações que neste se estabelecem, em outras palavras demandam, por exemplo, a aquisição de um maior volume de capital intelectual. Os objetivos da pesquisa foram: analisar o processo de formação de jovens atletas das categorias de base do Sport Club Internacional; reconstituir a construção do habitus dessas crianças e adolescentes; mapear o perfil sócio-econômico dos responsáveis; analisar quais competências são instauradas através deste processo de formação; verificar a percepção dos pais ou responsáveis dos atletas quanto ao universo e importância da escola em sua formação; analisar os riscos a que são expostos e a forma como reagem à pressão constante que caracteriza o jogo de futebol e seu contexto. Apresentam-se a seguir alguns dados tabulados e quantificados a partir das respostas de crianças e pais. 6 Quanto ao conceito de habitus: Os sujeitos são, de fato, agentes que atuam e que sabem, dotados de um senso prático, de um sistema adquirido de preferências, de princípios de visão e de divisão (o que comumente chamamos de gosto), de estruturas cognitivas duradouras (que são essencialmente produto da incorporação de estruturas objetivas e de esquemas de ação que orientam a percepção da situação e a resposta adequada). O habitus é essa espécie de senso prático do que se deve fazer em dada situação... (BOURDIEU, 1997, p. 42). MATERIAL E MÉTODOS Trata-se de um estudo de casos. Nesta primeira fase da pesquisa foram aplicados questionários junto às crianças e adolescentes atletas do Sport Club Internacional, e seus familiares. Para isso foram utilizadas as próprias dependências do clube, através de uma parceria com a equipe de Assistentes Sociais 7 que disponibilizaram os cadastros dos atletas e cederam suas salas para a realização das entrevistas. As entrevistas foram previamente agendas e autorizadas através do preenchimento de termos de consentimentos por parte dos pais, foram todas gravadas e transcritas. Os dados quantitativos que aqui apresentamos referem-se a uma amostra de 42 crianças (categorias 97 e 98) e 41 pais/responsáveis pelos respectivos atletas. A pesquisa responde ao seguinte problema de pesquisa: Como vem se constituindo o processo de formação de crianças nascidas entre 1998 e 1997, das categorias de base do Sport Club Internacional em Porto Alegre nos anos de 2008 e 2009? RESULTADOS Na Tabela 1, podemos perceber que o processo de formação de atletas começa desde tenra idade: Tabela 1- Tempo em que está no inter RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Até 6 meses De 7 a 10 meses ano ano e 6 meses anos anos anos TOTAL Assistentes Sociais Bernardette Mole Richard e Patrícia Bom Vasconcellos. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

222 Embora haja uma constante rotatividade de atletas, sobretudo de uma temporada para outra, não há ampliação de espaço, ou seja, há sempre o limite de em torno de 30 a 35 vagas para atletas por categoria (determinada pelo ano de nascimento). Há em torno de 46% de atletas que estão no clube há mais de 4 (quatro) anos. Esse dado é relevante se analisarmos os possíveis efeitos de dispensas de atletas na transição das categorias, frente ao investimento tanto dos pais quanto das crianças de tempo e dinheiro na busca pela realização de seu sonho maior, o de tornar-se jogador profissional: Nas Tabelas 2 e 3 percebe-se como o futebol é prioridade na vida dessas crianças e de boa parte dos pais, o que faz com que busquem adaptar os horários da escola em função dos dias e horários dos treinamentos: Tabela 2- Já trocou de colégio? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Sim Não TOTAL Tabela 3 - Período em que frequenta a escola RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Manhã Tarde TOTAL Vê-se que muitas crianças acabam transferindose de escola por virem de outras cidades, ou por buscarem adaptar o local da escola à proximidade do clube onde treinam. Nas Tabelas 4 e 5 é possível visualizar as novas exigências demandadas ao futuro jogador profissional, muito além do que apenas saber jogar futebol. Neste sentido, quando questionados sobre a importância da escola para sua futura carreira, as crianças apontam a relação entre o aprendizado formal e aquilo que precisarão para vencerem como jogadores: Tabela 4 - O que aprende na escola é importante para a carreira de jogador de futebol? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Sim Não TOTAL Tabela 5 - Como a escola auxilia na carreira de jogador de futebol? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Para saber conceder entrevistas Para saber lidar com o dinheiro/números Para aprender outras línguas Para ser educado e disciplinado Para ser esperto/ inteligente Ensina a se relacionar A ser humilde A ter raciocínio rápido, dentro de campo Poder ter outra profissão se não for jogador Para conhecer outras culturas do país e exterior É uma exigência do clube A não pensar só em dinheiro Saber sobre o corpo TOTAL Foi possível observar todo o zelo do clube com relação à formação formal das crianças. O departamento de Serviço Social efetivamente valoriza e fiscaliza a presença das crianças na escola, o que é condição para que participem dos times e disputem os torneios. Para participarem das categorias 222 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

223 de base, os atletas precisam estar matriculados na escola. Essa preocupação com o acesso à escola tem relação com todo o movimento hoje observado de maior cuidado com a infância, associado aos avanços legais e a preocupação do clube com sua imagem e sua política de responsabilidade social. Quanto à exigência da freqüência à escola, é importante levar em conta que aqueles atletas que têm um bom desempenho escolar, possivelmente não identifiquem essa necessidade de freqüência e desempenho na escola, relacionado à sua permanência no clube, daí os 36% que não apontaram essa preocupação do clube (Tabela 6). Porém, essas iniciativas por parte do clube não excluem a pressão excessiva à infância que caracteriza essa prática esportiva, e de resto, todo o esporte de competição voltado ao alto desempenho. Tabela 6 - O inter exige frequência e bom desempenho na escola? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Sim Não Mais ou menos TOTAL Quando questionados se desejariam tornar-se jogadores profissionais, as respostas são praticamente unânimes: todos sonham em tornarem-se jogadores. Nesse sentido esse tipo de trabalho diferencia-se de outras modalidades de trabalho infantil 8, em que a criança, embora saiba da necessidade de contribuir para o orçamento familiar, não tem prazer e desejo de seguir na atividade. A Tabela 7 demonstra claramente a idéia de formação para trabalho que está relacionada a esta atividade. 8 É toda e qualquer atividade útil, executada por crianças com menos de 16 anos, com certa regularidade (média de 15 horas por semana), com salário ou remuneração e ainda que envolva situações de risco tanto no cotidiano do trabalho como também para uma formação escolar regular (ALMEIDA NETO, 2003, p.16). Tabela 7 - Desejas te tornar jogador profissional? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Sim Não sei ainda Não TOTAL No que diz respeito à pressão que caracteriza esta atividade, as crianças mostram-se resignadas, considerando-a natural e inerente ao processo de formação do jogador de futebol profissional (Tabela 8): Tabela 8 - Reação da criança à pressão RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Normal / Fico tranquilo Fica nervoso Procura melhorar cada vez mais Normal mas às vezes chateia Não tem pressão Fica estressado / Briga em casa Procura esquecer TOTAL Foi possível constatar que o desejo de sucesso na futura carreira está intimamente ligado ao desejo da família. É comum observar a frustração dos pais por não terem conseguido vencer quando adolescentes no futebol, e a forma como transferem essa responsabilidade aos seus filhos. A pressão, portanto se dá, sobretudo pela família. Porém, essa oportunidade que efetivamente requer investimento e dedicação prematura, representa também uma chance de ascensão social, daí todo o investimento feito e os sacrifícios a que todos se sujeitam. Apenas um atleta trouxe o fato de que sua família não apoiava sua idéia e seu sonho de ser jogador de futebol (Tabela 9): Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

224 Tabela 9 - Quem mais te incentiva a ser jogador de futebol? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Pai Pai e mãe Pai, mãe e irmãos Mãe Toda família Avós e dindo Pai e irmãos Pai e avô Mãe e avós Ninguém TOTAL Vê-se pelos dados que os pais são os maiores incentivadores das crianças, o que, evidentemente, não exclui o desejo das mesmas, embora influencie nas suas escolhas e nos seus sonhos. Os dados apresentados nas Tabelas 10 e 11 referem-se a respostas dadas pelos responsáveis pelas crianças, corroboram este desejo e explicam o porquê deste investimento que em muitos casos requer a reorganização de toda a estrutura familiar. Tabela 10 - Expectativa quanto ao futuro do menino no futebol profissional? RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA% Que seja um bom profissional Que se realize seu sonho Melhores possíveis Que seja uma grande pessoa/ cidadão Que vença como jogador Não tenho grandes expectativas Que seja um grande jogador (atleta) RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA% Hoje é uma diversão Priorizamos o estudo Que não decepcione e vá longe na carreira Que seja feliz Ele está aqui porque ele gosta Estar sempre do lado dele, incentivar O futuro dele vem de berço o guri é bom de bola Que não se decepcione no futuro Que tenha boas lembranças desse momento Depende da oportunidade que tiver Não sabe, não respondeu TOTAL * Alguns pais deram mais que uma resposta Constata-se que essas crianças já sentem o peso da responsabilidade de ter que ajudar sua família, principalmente em retribuição ao apoio e ao investimento, tanto financeiro, quanto do tempo gasto. Tabela 11 - Acha importante as crianças ajudarem os pais financeiramente? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Sim Não TOTAL Via de regra a família aposta e acredita no futuro profissional dos jovens atletas, sentimento este que certamente se reflete na criança e tende a deixar marcas caso haja uma frustração desta expectativa no futuro (Tabela 12). 224 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

225 Tabela 12- Acredita que ele vence como jogador? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Sim Depende Não 0 0 TOTAL A Tabela 13 a seguir ilustra a idéia de que há todo um investimento voltado ao sucesso das crianças no esporte. Há uma migração das famílias para apoiar a futura carreira de seus filhos como atletas e, por vezes, toda a organização familiar se dá em função deste empreendimento: Tabela 13- Local de moradia RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Porto Alegre (RS) Viamão (RS) São Leopoldo (RS) Taquara (RS) Gravataí (RS) Alvorada (RS) Santa Cruz (RS) Veranópolis (RS) Passo Fundo (RS) Encantado (RS) Vale Real (RS) Santo Antônio da Patrulha (RS) Camboriú (SC) Maravilha (SC) TOTAL Os dados reforçam a idéia da pressão a que nos referimos e que efetivamente tensiona a infância destas crianças, trazendo um excesso de responsabilidade e um peso que criança alguma tem condições de suportar. A importância que as crianças atribuem a essa atividade como forma de retribuição ao esforço da família é corroborada pelos dados (Tabela 14). Tabela 14- Por que é importante as crianças ajudarem os pais financeiramente? RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Retribuir o esforço/ ajuda que receberam quando criança Porque os pais têm dificuldades / para não trabalharem sozinhos Somente após os anos Depende, se a família for correta Para que eles aproveitem a vida Não respondeu TOTAL * Alguns pais deram mais que uma resposta. Chama a atenção o fato de que na visão dos pais essa pressão a que são submetidas as crianças não significa nenhum tipo de prejuízo ao seu processo de formação, ao contrário. É comum que muitos considerem positiva essa tensão e essa responsabilidade, tendo em vista que, na visão destes pais, prepara-os para o mundo competitivo em que vivem e que enfrentarão quando adultos. Quando questionados sobre esse fato as respostas foram as seguintes (Tabela 15). Tabela 15- A pressão por resultados e a responsabilidade são benéficas ao seu filho? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS % Sim Às vezes Não Não tem pressão, não sabe TOTAL Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

226 Associado a isso, a pressão pelos resultados e pelo bom desempenho a cada treino e a cada jogo, que é inerente a esportes de competição, está bem presente nesta realidade. Há uma tensão constante por parte dos atletas, o que é agravada pela enorme rotatividade e constante apresentação de novos concorrentes, hoje vindos de todo o Brasil e também do exterior. Constata-se um certo temor entre as crianças e os responsáveis, quer seja por parte dos jogadores titulares, neste caso de perderem a posição entre os 11 jogadores do time, quer seja dos reservas, de perderem o espaço no grupo que é composto por em torno de 30 a 35 atletas. Sobre a relação entre esta atividade e a formação escolar regular das crianças, todos os pais/responsáveis falaram da importância do estudo na vida dos filhos (Tabela 16). Tabela 16- A escola tem papel importante na formação de teu filho? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS % Sim Não 0 0 TOTAL Porém, embora seja consenso entre os responsáveis a importância da escola, quando questionados sobre os possíveis prejuízos que esta atividade representa para a formação escolar, mais de 60% das respostas apontam para esse prejuízo (Tabela 17). Tabela 17- O futebol atrapalha de alguma forma a vida escolar do seu filho? RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS % Sim Às vezes Não TOTAL * Alguns pais deram mais que uma resposta Para entendermos melhor esses dados devemos levar em conta que para essa faixa etária há o compromisso dos treinamentos em pelo menos três dias por semana, realizados no turno inverso ao da escola e ocupando toda a tarde, das 14 as 17h30min. E, há ainda os dias de jogos, muitos deles realizados aos finais de semana. Porém, mesmo que tenham consciência dos riscos à formação escolar, quando questionados sobre as alternativas que vislumbram fora da carreira profissional de jogador de futebol, o estudo é reforçado como uma alternativa e uma necessidade em caso de fracasso na carreira que, como estamos demonstrando, começa desde cedo. Tabela 18- Alternativas que vislumbras fora do futebol RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS % Estudo / faculdade em primeiro lugar Não respondeu / o filho nunca deu outra alternativa Seguir no esporte (atleta, jornalista esportivo) Que seja um bom cidadão Que ele escolha Médico Com o estudo buscar outra profissão Que tenha sabedoria para fazer as melhores escolhas Trabalhar na loja (empresa familiar) Bombeiro como o pai Veterinário Engenheiro Civil Cantor Escritor TOTAL * Alguns pais deram mais que uma resposta 226 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

227 Chama a atenção também na Tabela 18 que 16,3% das respostas não levam em conta outra possibilidade para os filhos que não o sucesso na carreira profissional, o que se considerarmos o grau de competitividade e as inúmeras possibilidades de insucesso inerentes a esta atividade, não passa de uma ilusão. Como alternativa a um possível insucesso na futura carreira, percebe-se que a grande maioria das crianças concentra seus projetos futuros relacionados ao campo esportivo (Tabela 19). Tabela 19- Se não fores jogador profissional tu te imaginas fazendo o quê? RESPOSTAS Nº RESPOSTAS FREQUÊNCIA % Não sei Médico / Enfermeiro Praticar outro esporte Professor de educação física/treinador Motoqueiro/ Piloto de MotoCross Advogado/trabalhar em escritório Comentarista de futebol Palhaço de circo Empresário Engenheiro Arqueólogo Cantor Cuidador de crianças Desenhista Administrador de Empresas Marceneiro Substituir meu pai na Agricultura TOTAL *Alguns atletas deram mais que uma resposta Para além da questão econômica que está também na origem de todo o investimento feito, de uma maneira geral a procura por esta profissão não é mais restrita aos segmentos populares, o que aumenta o número de concorrentes e amplia o universo de crianças envolvidas nesta atividade e que alimentam este sonho distante, como apontam os dados abaixo relativos à renda familiar das crianças (Tabela 20). Tabela 20 - Renda mensal RESPOSTAS Nº RESPOSTAS % Entre R$ 500,00 e R$ ,00 Entre R$ 1.200,00 e R$ 1.500,00 Entre R$ 2.000,00 e R$ 3.000,00 Entre R$ 4.000,00 e R$ 5.000,00 Entre R$ 6.000,00 e R$ 8.000,00 Entre R$ ,00 e R$ ,00 Em torno de R$ ,00 TOTAL Ao analisar o novo perfil de jogador exigido pelo mercado do futebol, hoje globalizado, é possível em alguma medida considerar a formação escolar como um elemento importante para o sucesso do atleta profissional. E, neste sentido pode-se amenizar o desinteresse pela escola que, via de regra encontramos em crianças e em pais de crianças que sonham em tornarem-se jogadores profissionais (Tabela 21). Tabela 21 - Como a formação escolar pode ajuda na carreira de jogador de futebol? RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS % Aprender a falar para dar entrevista No caso de ir para outro país, adquirir cultura Vida social / Conviver em grupo, com as diferenças Para administrar o dinheiro, bens Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

228 RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS % Ser educado / Ter orientação, conhecimento Incentivar e entender o mundo do futebol Para fazer amizades, desenvolver o carisma/ imagem Ter respeito / respeitar adversários / hierarquia Ter disciplina 04 4 Facilita a expressão e a comunicação Ler o contrato / tratar 03 3 com advogado/ não ser enganado Não ajuda na carreira / 03 3 Não opinou Valores Humanos / 03 3 desenvolver como pessoa Aprender línguas estrangeiras 02 2 Porque tem que ter 01 1 Amplia a visão e facilita 02 2 a adaptação às diferenças A escola que ele está 01 1 prioriza o esporte A diretora do colégio 01 1 é esposa de um conselheiro TOTAL *Alguns pais deram mais que uma resposta Se é verdade que esta atividade traz inúmeros riscos à formação da criança e, sobretudo, ao que concebemos neste estudo como infância, é preciso levar em conta também que, como todo o processo formativo, a experiência nas categorias de base do futebol instaura também um conjunto de saberes, de competências (Tabela 22). Tabela 22- O que ele mais aprende neste convívio? RESPOSTAS* Nº RESPOSTAS % A ser responsável A respeitar a hierarquia A trabalhar em equipe A lidar com a pressão Afasta das drogas e da marginalidade A conviver com as dificuldades A organizar-se melhor/ ser disciplinado A conviver com as diferenças e com os diferentes A buscar seus sonhos e lutar pelo que deseja A ser: educado/respeitoso/cidadão 03 1 A aceitar a derrota/ter autocrítica A ser flexível A não ficar ocioso Ele amadureceu 03 1 Amizade / carisma 03 1 Experiência Superação Não dar atenção à comentários TOTAL *Alguns pais deram mais que uma resposta CONSIDERAÇÕES FINAIS No que diz respeito à construção da infância através desta experiência vivenciada pelas crianças no universo que envolve o futebol profissional, e como de resto todo e qualquer esporte voltado ao alto desempenho, é preciso levar em conta que a infância se constrói sempre na recorrência de experiências particulares das crianças. A questão central é 228 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

229 a quantidade de tempo em que este ser é criança, que tem tempo livre e que não sofre pressão excessiva, o tempo do brinquedo, do lúdico, na comparação com o tempo da responsabilidade e da disciplina. Ou seja, as relações que estes agentes estabelecem nas disputas que distinguem este subcampo do campo esportivo que são as categorias de base dos clubes de futebol, constroem a infância dessas crianças e deixam marcas para a vida adulta. Não apenas no futebol, mas de uma maneira geral, a infância das nossas crianças neste início de milênio vem sendo tensionada, colocada em tensão, em cheque. As crianças vêm sendo obrigadas a, cada vez mais cedo, depararem-se com questões para as quais ainda não tem estrutura cognitiva e, sobretudo, emocional para resolver. No campo esportivo há a cada dia novas demandas ao processo de formação das crianças. Hoje, se requer um conjunto de novas competências com vistas a uma formação integral do atleta, como flexibilidade, autonomia, capacidade de trabalhar em grupo, postura pró-ativa, controle emocional, entre outras. Competências e habilidades que não se instauram apenas com treinamentos técnicos, mas que estão relacionadas com o desenvolvimento pessoal da criança e que, certamente, refletem-se no seu desempenho como atleta, como jogador de futebol. Não obstante as exigências demandadas aos atletas de alto rendimento é possível aprimorar essa escola de formação que são as categorias de base de futebol, através da realização de pesquisas e de projetos de intervenção junto a esses agentes, com vistas a humanizar ainda mais esse espaço. Essa humanização passa por iniciativas voltadas à conscientização das famílias sobre as dificuldades a serem enfrentadas até a profissionalização e, sobretudo, dos riscos à formação das crianças inerentes a esse percurso. O que passa também pela conscientização das características e dos limites que distinguem a infância da idade adulta. Conscientização das inúmeras dificuldades e riscos a serem enfrentados até a profissionalização, do preço a ser pago pelo sonho de tornar-se jogador profissional, de vestir a camiseta de um grande clube, de realizar o sonho de tornar-se rico e famoso. Este é o preço da bola e a questão central é se vale ou não a pena pagar este preço, frente às inúmeras incertezas e riscos inerentes a esta realidade. REFERÊNCIAS ALMEIDA NETO, Honor de. trabalho Infantil na terceira Revolução Industrial. Porto Alegre: EDIPUCRS, p.. trabalho Infantil em Rede. Canoas: Editora da ULBRA, p. (Série Teses e Dissertações). BOURDIEU, Pierre. coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, p.. Razões práticas: sobre a teoria da ação. São Paulo: Papirus, DESAULNIERS, Julieta Beatriz Ramos. Formação e pesquisa: condições e resultados. Veritas, Porto Alegre, v. 42, n. 2, p , jun DESAULNIERS, Julieta Beatriz Ramos (Org.). Formação trabalho competência. Porto Alegre: EDIPUCRS, POSTMAN, Neil. O desaparecimento da Infância. Rio de Janeiro: Graphia, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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231 Percepções urbanas em cidades periféricas: o caso de Guajuviras em Canoas, RS, Brasil sa M y so u z a 1 lu T i a n e Bo M Be r c h 2 kat i a M. P. Po z z e r 3 he l o í s a g. l. li n d a u 4 cl á u d i a l. z. Pi r e s 5 an a r. F. si M ã o 6 RESUMO O Observatório Franco-Brasileiro de Cidades da Periferia é composto pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) e Université de Paris 8 - Saint Denis (França), tendo como parceiros as prefeituras das cidades de Canoas e Nanterre (França). O projeto visa estudar o espaço urbano da Região Metropolitana de Porto Alegre nos aspectos políticos, socioeconômicos, culturais e ambientais. palavras-chave: cidade, observatório, periferia, juventude, violência. ABSTRACT The Centre Franco-Brazilian cities of the periphery is composed of the Lutheran University of Brazil (ULBRA) and Université de Paris 8 - Saint Denis (France), having as partners the prefectures and cities in Canoas Nanterre (France). The project aims to study the urban space in the metropolitan region of Porto Alegre in the political, socioeconomic, cultural and environmental. Keywords: city, centre, periphery, younger, violence. 1 Acadêmica do Curso de Geografia/ULBRA. Bolsista PROICT/ ULBRA 2 Acadêmica do Curso de História/ULBRA. Bolsista de Extensão/FULBRA 3 Professora do Curso de História/ULBRA 4 Professora do Curso de Geografia/ULBRA 5 Professora-Orientadora do Curso de Ciências Políticas/ ULBRA (anasimao@terra.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

232 INTRODUÇÃO O Observatório Franco-Brasileiro de Cidades da Periferia é um projeto que integra a pesquisa e a extensão na busca da compreensão das diferentes realidades enfrentadas pelos habitantes que ocupam áreas sócioespaciais periféricas. Esta investigação teve início em maio de 2008, a partir da assinatura do Protocolo de Cooperação firmado entre a Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) e a Université de Paris 8 - Saint Denis (França). O projeto conta, ainda, com a parceria da Prefeitura da cidade de Canoas, da Prefeitura da cidade de Nanterre (França), do Fórum de Autoridades Locais de Periferia (FALP), da Rede de Cidades e da Central Única das Favelas CUFA (Brasil). O projeto do Observatório Franco-Brasileiro das Cidades Periféricas visa estudar o espaço urbano da Região Metropolitana de Porto Alegre nos aspectos políticos, socioeconômicos, culturais e ambientais, aprofundando temas relacionados à identidade, territorialidade, segurança, mobilidade, cidadania, política, capital social, entre outras questões correlatas que dialogam diretamente com a cultura da periferia. A partir da análise de dados da realidade da cidade de Canoas levantadas no Atlas Urbano de Canoas: Território e Paisagens na Entrada do Século XXI (prelo) foi estabelecido que a pesquisa iniciaria no bairro Guajuviras, pois o mesmo se originou em 1987, a partir de um processo de invasão da área pela população sem moradia. O Conjunto Habitacional Guajuviras é um bairro da cidade de Canoas, no Rio Grande do Sul, localizado na parte nordeste da cidade, sendo um dos mais populosos, com cerca de 40 mil habitantes, conforme estimativas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A cidade de Canoas possui 364 mil habitantes. O bairro Guajuviras nasceu da ocupação, em 17 de abril de 1987, do Conjunto Habitacional Ildo Meneguetti, na época, o maior aglomerado de habitações populares do Rio Grande do Sul. Neste período, o Brasil vivia uma situação de crise econômica, com uma inflação vertiginosa, que arruinava o salário dos trabalhadores. Ocupações das Habitações Populares no Rio Grande do Sul em 1987 Porto Alegre 6 Alvorada 5 Gravataí 2 Canoas 1 Cachoeirinha 1 Segundo Luiz Carlos Zacher, um dos participantes da ocupação O preço muito alto dos aluguéis, a política de salários do governo Sarney, o fracasso do Plano Cruzado e a imigração massiva da população do campo para a cidade, foram elementos que contribuíram para que a situação chegasse à esse ponto. Após seis meses de ocupação e de negociações com a Companhia de Habitação do Estado (COHAB), os ocupantes aprovaram, em assembléia geral, a proposta do governo e os imóveis invadidos foram regularizados. A Figura 1 apresenta a localização do município de Canoas na Região Metropolitana de Porto Alegre e a Figura 2 representa o município de Canoas e seus bairros. 232 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

233 Figura 1 Localização do Município de Canoas na Região Metropolitana de Porto Alegre. Fonte: Atlas Urbano de Canoas: Territórios e Paisagens na Entrada do Século XXI. (no prelo) Figura 2 Divisão administrativa dos bairros de Canoas. O bairro Guajuviras localiza-se no setor leste do município. Fonte: Atlas Urbano de Canoas: Territórios e Paisagens na Entrada do Século XXI. (no prelo) As questões supracitadas impõem-se na atualidade de nossas cidades, não apenas por sua importância no âmbito do estudo acadêmico, mas, sobretudo, pelo papel fundamental na formulação de políticas públicas, uma vez que hoje, cada vez mais, os governos e os movimentos sociais compartilham enorme responsabilidade na busca conjunta de ações capazes de resultar em benefícios potenciais, especialmente para aqueles que mais sofrem com processos de exclusão, pelo simples fato de serem da periferia. Assim, espera-se que tais estudos possam colaborar efetivamente para a melhoria da qualidade de vida das distintas comunidades que habitam a região metropolitana de Porto Alegre. O Observatório Franco-Brasileiro de Cidades da Periferia propõe-se como um espaço de reflexão, de formação e de pesquisa, visando o diálogo, o conhecimento e o sentimento de pertencimento de moradores das periferias, ainda pouco estudado no Brasil. O Observatório é uma instância de reflexão crítica que contribui para a pesquisa e enquetes sobre a realidade social; estudo das relações entre as periferias e as metrópoles e para a formação cidadã dos seus habitantes. Entende-se que o Observatório Franco-Brasileiro de Cidades da Periferia proporciona um espaço amplo de pesquisa e de extensão universitária integradas, envolvendo o diálogo entre a Universidade, os gestores públicos da cidade e as comunidades organizadas. Pretende-se realizar uma reflexão sobre questões como: O que é ser periférico? O que é uma periferia? Qual a relação de uma periferia com uma metrópole? Qual a relação entre uma periferia e uma cidade qualquer do mundo? Como são as relações no espaço público em uma periferia? A partir destes questionamentos, pretende-se Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

234 relacionar e comparar a realidade de diferentes periferias e ouvir os moradores locais; conhecer seus saberes e as formas como reconhecem suas identidades, buscando soluções para problemáticas associadas aos diversos sistemas socioambientais e culturais. Os resultados da pesquisa serão analisados e comparados com os trabalhos realizados sobre as periferias francesas, especialmente aquelas situadas na região metropolitana de Paris, produzidas pelos pesquisadores da Universidade Paris 8. MATERIAL E MÉTODOS Para atingir a orientação metodológica deste projeto, que integra pesquisa e extensão, além dos objetivos que o compreendem, a metodologia teve duas etapas de construção: etapa 1 Durante o primeiro semestre de 2009, a pesquisa foi construída a partir de um grupo de estudo que pretendia desenvolver uma proposta dialógica de investigação. Numa perspectiva metodológica, três pesquisadores (representantes da universidade, da gestão pública e da comunidade local) desenvolveriam um conjunto de questões acerca das identidades locais e dos possíveis conflitos territoriais. Este grupo realizaria, em conjunto, os trabalhos de campo, constituindo categorias explicativas de diferentes agentes que configuram o espaço geográfico das periferias urbanas. Deste trabalho resultou um primeiro roteiro de entrevistas a ser aplicado em um bairro do município de Canoas. Esta etapa passou por ajustes, resultando numa nova proposta de pesquisa, conforme segue. etapa 2 A partir do segundo semestre de 2009, o grupo de professores e estudantes pesquisadores iniciaram um processo de reconhecimento territorial do bairro Guajuviras. Esta etapa constituiu na elaboração de um segundo e definitivo roteiro de entrevista a ser aplicado em Escolas do bairro mencionado. Foi escolhida como escola piloto para este estudo, o Colégio Estadual Jussara Maria Polidoro. Neste momento, foram realizadas 25 entrevistas com jovens entre 15 e 25 anos. Abaixo segue a apresentação do roteiro na íntegra: 1) Fale sobre você. 2) Como você veio morar aqui? 3) O que você pensa do lugar onde você mora? 4) O que você gosta do lugar onde você mora? Por quê? 5) O que você não gosta do lugar onde você mora? Por quê? 6) Em sua opinião, qual o maior problema que existe neste bairro? Como ele poderia ser resolvido? 7) Existe alguma associação neste bairro? O que ela faz? O que você pensa desta associação? 8) Em sua opinião, qual é o papel da prefeitura? Ela está cumprindo este papel? 9) Em sua opinião, qual é o papel do governo do Estado? Ele está cumprindo este papel? 10) Em que você confia? 11) O que significa o Estado para você? 12) Para você o que é justiça? 13) O que é comunidade? 14) Você se sente fazendo parte de uma comunidade? 15) Se existe algo para mudar, o que você mudaria? 234 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

235 16) O que você quer dizer ainda? 17) O que você pensa desta entrevista? Em todas as etapas, os seguintes procedimentos metodológicos, também fizeram parte: Levantamento bibliográfico e de dados quantitativos e qualitativos: As referências bibliográficas têm como objetivo específico detalhar e levantar questões sobre as informações obtidas através dos dados levantados. trabalhos de campo: Os trabalhos de campo visam analisar diferentes paisagens, assim como realizar entrevistas; Análise e Interpretação dos dados: A partir da coleta de dados, foi construído um relatório que servirá de base, num momento seguinte, para refletir, junto com a comunidade e gestores da administração pública, quais medidas poderão ser tomadas com o objetivo de acionar mecanismos legais de fortalecimento de identidades, de justiça socioambiental e de valorização do patrimônio cultural. RESULTADOS PARCIAIS A partir da análise dos resultados das entrevistas, observou-se que grande parte dos entrevistados reclamam da ausência do Estado no cumprimento de direitos fundamentais como saúde educação e, principalmente, a garantia de segurança no bairro onde moram, neste caso o Bairro Guajuviras. Conforme um dos relatos, é dito acerca da violência: acho que não tem fórmula (sic), a polícia faz a parte dela, vai no bairro, nas vilas, prende, mas a demanda é muito grande para eles, falta policial. Outra observação realizada pelos entrevistados refere-se à educação: o papel é melhora (sic) o ensino das escolas, o ensino da população, dar estrutura de vida pros moradores. Não vi esses governantes fazerem nada, deviam colocar a mão na consciência. Considerando muitos problemas mencionados, os jovens entrevistados possuem um forte sentimento de pertença com o bairro Guajuviras, pois de forma majoritária responderam que gostam de morar neste bairro, que se sentem fazendo parte desta comunidade e que acreditam na sua melhoria. Um exemplo disto está na seguinte fala: Eu gosto de mora (sic) aqui, claro que tem o problema da violência, mas isso não tem só aqui, né? Tem em tudinho quanto é lugar, só que aqui as coisas aparecem mais. Penso que é um lugar que se tivesse (sic) mais investimento da prefeitura, ia se (sic) muito melhor, o Guajuviras é quase uma cidade, ai vocês imaginam, tem muitos problemas, mas pode crescer como qualquer outra cidade ou bairro. A preocupação com a violência é unânime, demonstrando que as limitações no direito à liberdade de ir e vir são agravantes do bairro. A confiança está depositada na família, sendo esta a maior referência dos princípios éticos. A noção de organização da comunidade é vaga, observando-se o não saber atuar comunitariamente. Apesar dos entrevistados vivenciarem a falta de investimentos na escola, reconhecem nela, um espaço de inclusão social. Além das entrevistas, também foram realizados intercâmbios através de encontros e seminários, entre as Universidades participantes do projeto, e está sendo organizada a construção do site do Observatório. Um exemplo disso aconteceu no curso de extensão O Lugar no Mundo e o Mundo no Lugar, realizado na Ulbra, em 2008, e também a Publicação do Livro do Professor Alain Bertho, Os Outros Somos Nós, na 54ª Feira do Livro de Porto Alegre, em Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

236 Com a análise das entrevistas que vem sendo realizadas, já foram identificados os temas centrais para a população do bairro Guajuviras: violência; ausência do Estado na saúde, educação e segurança pública; falta de confiança nas instituições políticas; predominância das relações familiares sobre as sociais e políticas. CONSIDERAÇÕES FINAIS O espaço é um polarizador de desenvolvimento e objeto do processo de planejamento que deve ser compreendido em dois níveis: no mundo e no lugar. Este é o desafio epistemológico enfrentado na atualidade e por pesquisadores acadêmicos, planejadores territoriais e gestores públicos. A totalidade almejada pelo planejamento não deve ser entendida como mera soma dos setores abordados metodologicamente. Uma metrópole com um sistema de transporte, de vias públicas, de áreas de lazer, de educação e de saúde bem planejados não se constitui, necessariamente, num excelente lugar. Se fosse assim, as regiões metropolitanas seriam grandes paraísos. Na metrópole encontramos o que Milton Santos (1999) chama de tempos curtos (cotidiano), tempos ocultos, tempos acelerados e tempos herdados ; que impõem ritmos e ações que singularizam os lugares que compõem cada região metropolitana. Nesta perspectiva, as informações obtidas pelos relatos de entrevistas levantadas nesse projeto de pesquisa e extensão visam contribuir para repensar o espaço metropolitano. REFERÊNCIAS BERTHO, Alain. Os outros somos nós. Canoas: Ed. ULBRA, Técnica, espaço, tempo: razão e emoção. São Paulo: Hicitec, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

237 Resident Evil e redes sociais: atualizações, virtualizações e audiovisualidades Ta í s se i B T 1 nísia Ma r T i n s d o ro s á r i o 2 RESUMO Este artigo aborda as significações que se constituem nos processos de circulação de produtos midiáticos em interação com redes sociais, considerando as conexões entre o imaginário social, os contextos da evolução científica, o imaginário tecnológico e as tecnologias do imaginário. O objeto de estudo é o produto midiático Resident Evil em suas versões para jogos on-line, filmes, vídeos, blogs, comunidades da web. A análise dessa diversidade permitiu vislumbrar nas redes sociais um meio de legitimação de significações compartilhadas pelos sujeitos que as constituem. Mas elas são, igualmente, espaços de reterritorialização das virtualidades e das significações produzidas acerca de determinado produto midiático. palavras-chave: audiovisualidades, corporalidades, imaginário, redes sociais. ABSTRACT This article discusses the meanings that are constituted in the process of movement of media products in interaction with social networks, considering the connections between the social imaginary, the contexts of scientific evolution, the technological imaginary and the technologies of the imagination. The object of study is the Resident Evil media product in its versions for online gaming, movie, videos, blogs, web communities. The analysis of this 1 Acadêmica do Curso de Comunicação Social - Habilitação Jornalismo/UNISINOS. Bolsista PIBIC/CNPq 2 Professora-Orientadora do PPG em Comunicação/UNISINOS (Nínisia@corporalidades.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

238 diversity allowed to glimpse in the social networking a source of meanings legitimation shared by the individuals that constitute them. But they are, also, places of repossession of the virtues and meanings produced about a particular mediatic product. Keywords: audiovisual, imaginary, social networks. INTRODUÇÃO O imaginário social, de uma maneira bastante sintética, é uma espécie de repositório de imagens com sentidos partilhados por determinada sociedade. Esse conjunto de significações nunca é estanque, ao contrário, mantém-se em movimento de acordo com o contexto de cada época. As tradições populares, a literatura e as artes foram algumas das ferramentas de que o homem dispôs para representar e alimentar seu imaginário ao longo dos tempos. Contudo, os avanços tecnológicos que resultaram, também, no aperfeiçoamento das técnicas de comunicação, permitiram uma eficiência maior na representação desse imaginário, pelo menos no que diz respeito ao audiovisual. Unindo som, imagens em movimento e efeitos especiais, o audiovisual (cinema, televisão, vídeos, jogos digitais) revela-se capaz de simular uma realidade muito semelhante à realidade cotidiana, que, ao mesmo tempo em que atualiza 1, também virtualiza outras significações. O objetivo deste estudo é abordar as significações que se constituem da interseção de produtos midiáticos, tecnologias do imaginário, redes sociais e imaginário tecnológico, no contexto da efervescência dos estudos genéticos. Dentre os produtos audiovisuais que apresentam a temática da engenharia genética, escolhemos trabalhar com o jogo digital Resident Evil, objeto de adaptações para o cinema e de discussões online, entre outros desdobramentos. 1 Os conceitos de atualização e virtualização, para este artigo, são os conceitos de Bérgson (ou Lévy). Para trilhar o caminho dessas inter-relações, será necessário abordar, num primeiro momento, como se dá a construção do imaginário e como a nossa imaginação se relaciona com a historicidade em que estamos inseridos. No que tange ao estudo de Resident Evil, será analisada a participação dos estudos genéticos na construção do imaginário social e tecnológico representados por meio de corpos eletrônicos materializados pelas tecnologias do imaginário, que seriam, neste caso, os jogos digitais, o cinema e os vídeos postados na internet. Tais tecnologias são entendidas como instrumentos de expressão do modo de significação social do mundo no contexto dos avanços científicos e tecnológicos da contemporaneidade. Também serão estudadas as apropriações midiáticas geradas nessas interseções, as quais podem ser observadas na atuação de fãs que recriam personagens na vida real - ou cotidiana imitando suas vestimentas e trejeitos em encontros de simpatizantes, bem como em pequenos vídeos postados na internet. Para que o leitor menos inteirado da temática do jogo possa, mesmo assim, compreender os desdobramentos de Resident Evil sob a perspectiva aqui trabalhada, este artigo tratará também de oferecer um panorama sobre a forma como a mutação genética é representada nos construtos audiovisuais e sociais relacionados ao objeto deste estudo. O alinhamento teórico escolhido para nortear esta análise vem, principalmente, de Pierre Lévy, que versa sobre o atual e o virtual, sendo que as 238 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

239 atualizações e virtualizações serão tomadas aqui sob a perspectiva das audiovisualidades, conceito cunhado pelo Grupo de Pesquisa Audiovisualidades (GPAv) 2. Na análise dos efeitos das novas tecnologias na construção do imaginário contemporâneo, partimos da representação desse imaginário no audiovisual, por meio de corpos eletrônicos mutantes. Neste artigo, considera-se corpo mutante as representações de corpos que sofreram alteração genética visível ou não. Mutante, portanto, é um indivíduo que tem alguma de suas características modificadas como resultado de uma mutação genética que ocorre em nível do DNA, por uma alteração num gene ou num cromosssoma. Tal alteração resulta de uma nova criação física ou mental que gera características que acabam por manifestar-se ou não de forma aparente. Não estão incluídos no estudo, portanto, os corpos que sofreram mutações físicas em função de razões outras, que não a genética, tampouco corpos que desenvolvem anomalias. Por serem representados audiovisualmente, tais corpos mutantes são, também, corpos eletrônicos, ou seja, representações eletrônicas do humano, podendo ser produzidos analógica, digital ou figurativamente e assumir as mais diversas formas como objetos de textos audiovisuais na televisão, 2 O Grupo de Pesquisa Audiovisualides é formado por pesquisadores de quatro universidades brasileiras (Unisinos, UFRGS, UFSC e UFMG), os quais se propõem a estudar o audiovisual a partir de três dimensões. Segundo o diretório de pesquisa, a primeira dimensão encontra e analisa audiovisuais em contextos não reconhecidamente audiovisuais. A segunda percebe o audiovisual como campo contemporâneo de convergência de formatos, suportes e tecnologias, resguardadas as especificidades do cinema, da televisão, do vídeo e das mídias digitais. A terceira reconhece suas linguagens, configurações, usos e apropriações. A partir dessa compreensão, o diretório volta-se para pesquisas teórico-metodológicas e para experimentações audiovisuais que contemplem as dimensões nas quais as audiovisualidades se atualizam como devires de cultura. no cinema, no vídeo e em produtos da internet (ROSÁRIO, 2008). O corpo eletrônico, portanto, configura uma corporalidade própria vinculada à técnica, à tecnologia e as gramáticas audiovisuais. Ele carrega uma multiplicidade de sentidos midiáticos, culturais, econômicos, estéticos, entre tantos outros capazes de comunicar e representar o social. Criar, interpretar ou traduzir textos de corpos eletrônicos torna-se possível em função de que o seu processo de significação estruturar-se sobre um conjunto de códigos partilhados códigos midiáticos. Alguns deles mais arbitrários, outros produzidos, adaptados e convencionados por grupos sociais que os manejam conforme suas necessidades e sua visão de mundo. Não se pode desconsiderar, nessa linha de raciocínio, a competência de ordenar sentidos que (en)formatem o audiovisual pela repetição e legitimação de determinadas técnicas, formatos e narrativas. A análise desses textos, aos quais Felinto (2005, p. 90) chama de produtos concretos do imaginário da cibercultura 3, é necessária para identificar os aspectos desse imaginário, uma vez que ele é posto em ação através de atos de ficcionalização. Os produtos audiovisuais incluem-se no hall das tecnologias do imaginário, que, segundo Felinto (2005, p. 92), seriam as tecnologias de comunicação e informação capazes de excitar os sentidos (especialmente a visão) e fomentar a atividade do imaginário. Isto é, ao mesmo tempo em que as tecnologias possibilitam que o imaginário seja atualizado, elas também induzem a construção do imaginário tecnológico. Logo, a representação dos corpos mutantes no audiovisual não apenas mate- 3 É difícil formular uma definição para cibercultura. Em linhas gerais, ela pode ser compreendida como a forma sociocultural que emerge da relação entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias que surgiram com a convergência das telecomunicações com a informática na década de 70 (LEMOS, 2003). Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

240 rializa o que já está presente no imaginário acerca desses seres, como também constrói significações a partir do que representa. No ciberespaço, o processo de ressignificação dos corpos mutantes pode ser verificado por meio da formação de redes sociais online. Lemos (2003) aponta que o maior uso da internet hoje é para a busca efetiva de conexão social ( , listas, blogs, fóruns, webcams ). Trata-se de uma nova forma de religiosidade social trazida à tona pelas tecnologias digitais. Assim, ver o outro e ser visto, trocar mensagens e entrar em fóruns de discussão é, de alguma forma, buscar o sentimento de re-ligação (LEMOS, 2003). O autor salienta que a relação mediada pela tecnologia não necessariamente substitui as formas tradicionais de interação social (face a face, espaço público físico), o que pode ser verificado nos desdobramentos de Resident Evil em redes sociais que transcendem o ciberespaço e alcançam a vida cotidiana, por meio de movimentos como Cosplay 4 e Zombie Walk 5, os quais serão examinados ainda neste artigo. MATERIAL E MÉTODOS Resident Evil é um jogo eletrônico de survival horror criado pela empresa japonesa Capcom, em Em meio à efervecência dos estudos gené- 4 Termo derivado das palavras inglesas: costume (traje, fantasia) e play (brincar, jogar), indica o movimento de jovens que se vestem como seus personagens de ficção favoritos, imitando seu jeito, suas poses, seu modo de falar e de se portar. O movimento começou na década de 1970, no Japão, e hoje tem adeptos no mundo todo, contando, inclusive, com encontros locais, nacionais e internacionais de cosplayers. 5 O movimento Zombie Walk teve início nos Estados Unidos, em 2001, reunindo fãs de filmes de horror, que se fantasiaram de zumbis para realizar passeatas. Atualmente, os zombie walkers estão em cidades do mundo inteiro, apresentando grande capacidade de mobilização a partir de redes sociais online. ticos, o jogo apostou nesse viés para embasar sua história e atrair jogadores. Os mutantes de Resident Evil resultam do vazamento de uma substância criada em laboratório por uma indústria farmacêutica, a Umbrella Corporation. O jogador é conduzido ao porão da mansão onde a empresa executa experiências secretas que acabaram expondo seres humanos, animais e insetos a um agente biológico altamente contagioso e mutagênico, conhecido como T-Vírus. Ao serem infectados, os seres primeiramente parecem mortos, mas na verdade sofrem uma mutação gradativa em seu DNA, até se transformarem em zumbis. O desafio do jogador é escapar dos mortos-vivos mutantes. O sucesso do primeiro game levou a empresa a continuar investindo na série. Já foram lançados 17 jogos, tanto para videogame como para computador, com possibilidades de enfrentamento entre jogadores on e offline, entre outros desdobramentos, tais como: sete livros, cinco séries de gibis, três filmes, um curta em 3D (lançado exclusivamente no Japão), um longa de animação, milhares de pequenos vídeos em sites de compartilhamento (uma rápida busca no Youtube pelo nome do jogo aponta quase 300 mil resultados), centenas de comunidades em sites de relacionamento (pesquisa no Orkut pelo nome do jogo resulta em 211 comunidades), entre outros tantos sites, blogs e perfis em microblogs. O tema da engenharia genética se manteve em pauta e até ganhou novas referências, como no quarto jogo da cronologia principal da série, Resident Evil: Code Veronica. Neste, um cientista cria seus filhos em laboratório, utilizando o gene da inteligência de sua mãe, em busca de seres humanos com capacidade intelectual superior. Isso introduz uma outra perspectiva para a acepção do corpo mutante no jogo. Agora, ele já não é mais o resultado monstruoso de uma experiência que deu errado, mas sim um ser acima da média, este 240 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

241 mais facilmente compreendido como mutante no imaginário produzido/representado hegemonicamente pelos produtos audiovisuais. O método usado para desenvolver essa pesquisa sobre corpos mutantes está integrado ao de uma pesquisa maior intitulada Corporalidades audiovisuais: técnicas, discursos e devires de cultura 6. Nessa via, incorpora também os seus referenciais teóricos e os seus procedimentos metodológicos. Um dos conceitos que se destaca é o de semiose, pela via peirceana (1990), uma vez que, ao considerar a produção do interpretante e, consequentemente, a necessidade de um sujeito afetado pelo signo, permite uma aproximação do processo de comunicação. Ao prever a constituição de uma cadeia de significação um signo que leva a outro signo a semiose também está antecipando a impossibilidade do emissor ter controle sobre essa série de eventos interpretantes. Isso se revela de forma substancial nas tantas interconexões que compõe o complexo produto midiático de Resident Evil. O que se acredita ser plausível não é delinear suas especificidades de sentidos, mas as tendências dos discursos, as redes de significação que se constituem, as suas potencialidades e, em parte, seus diversos modos de significar. Por sua vez, Lotman (1978) trata dos processos de construção de sentidos que permeiam a narrativa fílmica e dos elementos que configuram uma linguagem própria do meio. Apesar de centrar sua abordagem no cinema, o autor faz afirmações que podem ser aplicadas ao audiovisual como um todo, uma vez que, para ele, as imagens projetadas na tela são signos, carregam significados e informação, constituindo uma linguagem ao reproduzir 6 A referida pesquisa é coordenada pela prof. Dra. Nísia Martins do Rosário e se propõe a estudar as corporalidades audiovisuais no âmbito da técnica, do discurso e da cultura de quatro tipos de corpos artificiais: robôs, mutantes, avatares e ciborgues. objetos do mundo real, elas, entretanto, reproduzem também elementos subjetivos do mundo, estabelecendo significados suplementares. É nessa perspectiva que a linguagem audiovisual entra em inter-relação com sua função social e, desta forma, as trocas construídas entre os contextos sociais, o imaginário coletivo e tecnológico vão formar uma rede semiótica discursiva. Outros conceitos relevantes nessa pesquisa são atual e virtual. A palavra virtual vem do latim medieval virtualis e significa força, potência. Na filosofia, é virtual o que existe em potência e não em ato. A árvore está virtualmente presente na semente. Nesses termos, o virtual não se opõe ao real, mas ao atual. A dialética do real, por sua vez, seria o possível. O possível já está constituído, tal como o real, ao passo que o virtual é um nó de tendências, que serão em algum momento concretizadas por meio de atualizações. A atualização é uma solução que não estava contida previamente no enunciado. Ocorre uma produção de qualidades novas, uma transformação das idéias, um verdadeiro devir que alimenta de volta o virtual (LÉVY, 1996, p.17). O atual oferece uma solução para um problema, mas ainda carrega consigo o virtual, o que desencadeia um processo de virtualização, movimento inverso da atualização. De uma solução dada, passa-se para outro problema. Nessa via, podemos afirmar que se estabelece uma rede de semioses dos discursos acerca do corpo mutante audiovisual a partir das várias midiatizações de Resident Evil. Tal rede se organiza numa tecitura de significações discursivas não apenas a partir do audiovisual em si, mas também nas conexões entre os blogs, os jogos, os usuários, os contextos, a cultura, o cotidiano, entre outros. Esse viés encaminha, também, para o desvendamento Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

242 dos percursos da significação, considerando sempre os deslizamentos, as linhas de fuga, as desterritorializações e reterritorializações presentes na circulação dos discursos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Não apenas a racionalidade, mas também a imaginação diferencia o ser humano dos outros seres. Primeiramente, aliás, a imaginação. O ser humano, antes de pensar logicamente, imagina. Para o ser humano, o mundo nunca é apresentado, sempre representado. É a partir dos sentidos imaginados que se constrói o que chamamos de imaginário, como explica Ruiz (2004, p. 48): A pessoa, por diversos motivos, seleciona do fluir caótico de sensações que invadem os sentidos, determinadas imagens e as institui com um sentido específico. Da amálgama de sensações sem sentido que fluem perante ela, algumas são captadas e transformadas em imagens. Essas imagens são imediatamente significadas. Desse modo, o caos fugidio das impressões sensoriais se organiza como um cosmo de sentidos imaginados. Todo pensamento implica numa construção de sentido. O homem transforma elementos insignificantes em objetos carregados de significados. Tais significações são determinadas pelo contexto social de cada época. É, portanto, de se esperar que na contemporaneidade os avanços científicos e tecnológicos estimulem a construção de um novo imaginário. Nesse ponto, parece necessário desmistificar o senso comum de que imaginação é o modo de existir das coisas fantasiosas, oníricas, lúdicas, pueris. Essa concepção ganhou força na modernidade, quando a racionalidade era tida como sinônimo do que é verdadeiro e bom e a imaginação aparecia como estéril, relegada ao divertimento. Mais adiante, percebeu-se que a imaginação é necessária até mesmo para a racionalidade: A imaginação e o imaginário constituem dimensões antropológicas e sociais que interagem com a racionalidade de forma necessária. (...) Não há racionalidade, nem ciência ou tecnologia fora da imaginação, assim como não existe imaginação fora da dimensão racional. Ambas se correlacionam, interagem e criam a partir da dimensão simbólica inerente ao ser humano. (RUIZ, 2004, p. 32) É o imaginário que possibilita presentificar passados, atualizando conceitos antigos de acordo com novos contextos sociais, ao mesmo tempo em que permite projetar futuros, imaginando o porvir. O potencial criador do imaginário se concretiza em modos de produção, formas de organização social, escalas de valores, obras de arte e criações tecnológicas segundo determinações históricas. A historicidade contemporânea é a dos avanços científicos e tecnológicos, dentre os quais fazemos aqui um recorte voltado às pesquisas genéticas. Os seres fantásticos da ficção de outrora tinham suas características explicadas por aspectos místicos, mágicos e sobrenaturais, ao passo que as descobertas de agora inspiram justificativas alinhadas ao progresso da ciência e da tecnologia. No entanto, parece ainda ser a incerteza e a sensação de vulnerabilidade diante de tamanhas transformações o que inspira as fantasias do nosso tempo. Talvez o maior medo do homem seja este: ser substituído por tudo aquilo que ele próprio 242 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

243 criou. Ataque de clones, império de máquinas (MüLLER; MARKENDORF, 2006). A mutação genética, desde os estudos desenvolvidos por Darwin, é o ponto fundante da evolução das espécies, baseada na sobrevivência dos mais aptos, com a diferença de que o avanço da ciência e da tecnologia possibilita que o homem manipule seu DNA e seja soberano perante sua constituição física. Com ou sem interferência em laboratório, entretanto, ocorrem mutações cotidianamente ao nosso redor, ainda que não sejam perceptíveis à primeira vista. Segundo a revista Mundo Estranho, um estudo americano publicado em dezembro de 2007 estima que a taxa de mutação na humanidade aumentou em cem vezes nos últimos cinco mil a 10 mil anos, provocando mudanças em cerca de 7% da nossa genética (2008, p. 24). Não é nosso propósito imergir numa discussão filosófico-antropológica acerca do que define a humanidade. Antes, consideramos o corpo como o primeiro suporte dos textos culturais e dos processos comunicativos (BAITELLO, 2005, p. 7). Em outras palavras, o corpo é o primeiro meio de comunicação do homem, seu primeiro instrumento de vinculação com o mundo e com o outro. É a partir de seu corpo que o homem constrói identidades e se confronta com alteridades, sendo também objeto de segregação social, pois identificação e alteridade são projeções estabelecidas com base na cultura (TUCHERMANN, 1999, p. 105). Não é apenas na identidade que se demarca a fronteira entre o que é idêntico (mesmo) e o que é diferente (outro). Uma vez que o corpo também é o limite que separa o indivíduo do mundo, a delimitação da alteridade passa obrigatoriamente pelas demarcações do grupo social pelo qual se deseja ser acolhido e reconhecido. É necessário encaixar-se na rede de signos que uma sociedade estabelece para si como aceitável. A corporalidade dos mutantes e a consequente dificuldade de interação social que a fisiologia lhes impõe levanta a discussão proposta por Tuchermann: Até que grau de deformação (ou estranheza) permanecemos humanos? (1999, p. 101). O problema da alteridade é recorrente entre os corpos eletrônicos mutantes, tanto aqueles com capacidades sobre-humanas como os que apresentam características monstruosas. Eles são retratados como seres conflituados com sua condição: sofrem com o sentimento de não pertença, de exclusão social. Em Code Veronica a insatisfação do irmão gêmeo por ter sido criado em laboratório causou-lhe um problema psicológico, que pode também ter sido motivado por sua sensação de inferioridade em relação à inteligência da irmã. Por outro lado, a irmã gêmea quer se aproveitar de sua superinteligência para dominar a humanidade. Tal enfrentamento, aliás, é comumente retratado nos produtos audiovisuais. Em geral, o mutante é visto como um ser que precisa ser destruído, porque representa um risco para a continuidade da espécie humana. Nesse aspecto se revela a importância das tecnologias do imaginário na representação/construção de significações acerca não só dos mutantes, como também da humanidade no contexto dos estudos genéticos. O que significa, afinal, ser humano? Acaso não seríamos todos mutantes? Os desdobramentos de Resident Evil para outras formas de expressão e sua presença no contexto das relações sociais, ao mesmo tempo representando e construindo significados, motivam sua leitura sob a perspectiva das atualizações e virtualizações. Sob essa ótica, poderíamos considerar o imaginário social como uma grande teia de virtuais, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

244 dentre os quais o audiovisual seleciona determinados vetores e os atualiza em seus construtos. Faz-se importante destacar que, mesmo que os virtuais se atualizem, eles não se atualizam por completo, deixando sempre um devir, uma potência de atualização que se mantém virtual. No caminho inverso, os produtos audiovisuais devolvem ao virtual novas imagens significadas, as quais são incorporadas ao imaginário social e ao próprio audiovisual. Os corpos mutantes de Resident Evil, antes ainda de configurarem o imaginário sobre o efeito das mutações genéticas no homem, são além de uma atualização do virtual mutante que está em potência nas pesquisas científicas uma atualização da representação do zumbi no imaginário social e, com certeza, uma atualização das técnicas audiovisuais. Segundo a crença popular, zumbi (palavra do idioma africano Quimbundo, que significa fantasma) é um ser humano dado como morto que foi posteriormente desenterrado e reanimado por meios desconhecidos, mágicos. Em Resident Evil a magia perde campo para a tecnologia, ndoe a volta dos mortos se dá por meio da engenharia genética criando zumbis mutantes. Cabe ainda destacar, nesse mesmo processo, os movimentos Zombie Walk e Cosplay, por uma perspectiva oferecida pelas audiovisualidades. Esse conceito se aproxima das atualizações e virtualizações se considerarmos que há uma dimensão virtual que nada tem a ver com o digital do audiovisual (modo de ser) capaz de fornecer elementos para as diversas atualizações audiovisuais com as quais temos contato (modo de agir): Não se trata mais apenas de uma difusão ou de um transporte de mensagens, mas de uma interação no seio de uma situação que cada um contribui para modificar ou estabilizar, de uma negociação sobre significações, de um processo de reconhecimento mútuo dos indivíduos e dos grupos via atividade de comunicação. O ponto capital aqui é a objetivação parcial do mundo virtual de significações entregue à partilha e à reinterpretação dos participantes nos dispositivos de comunicação todos-todos. Essa objetivação dinâmica de um contexto coletivo é um operador de inteligência coletiva, uma espécie de ligação viva que funciona como uma memória, ou consciência comum. Uma subjetivação viva remete a uma objetivação dinâmica. O objeto comum suscita dialeticamente um sujeito coletivo. (LÉVY, 1996, p.114) Na via dessa pesquisa, o ciberespaço é, portanto, um ambiente de atualizações de um virtual mutante e de um virtual audiovisual, assim como é um ambiente de legitimação das significações negociadas entre os sujeitos que constituem determinada rede social. No caso em estudo, o compartilhamento de sentidos produzidos em torno de um produto audiovisual (Resident Evil) leva ao entrelaçamento de sujeitos por meio de ferramentas de comunicação online, como sites de relacionamento, de compartilhamento de arquivos e, principalmente, sites e blogs. Esses últimos se apresentam como o instrumento mais apropriado para constituir-se como ponto de encontro entre os sujeitos e de partilha de significações. Tanto o movimento Cosplay como o Zombie Walk apresentam grande capacidade de mobilização a partir do ciberespaço 7. Esses espaços, além de servirem como repositório de fotos e vídeos registrados pelos usuários, oferecem também orientações para os que desejam ingressar na rede, por meio de tutoriais do tipo como se transformar 7 A referência a esses movimentos é recorrente em sites, blogs e comunidades virtuais dedicados a simpatizantes do jogo Resident Evil, por essa razão eles foram incluídos neste estudo. 244 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

245 em zumbi. Nesse processo há, portanto, traços explícitos de convergência de formatos, suportes e tecnologias. Esse tipo de informação será revertida, num estágio seguinte, na reterritorialização das redes sociais. No ciberespaço, não é a geografia que determina a formação de uma comunidade, mas a afinidade de interesses. Apesar de não presente, essa comunidade está repleta de paixões e de projetos, de conflitos e de amizades. Ela vive sem lugar de referência estável: em toda parte onde se encontrem seus membros móveis... ou em parte alguma. (LÉVY, 1996, p. 20). Os membros dessas redes sociais se tornam não-presentes, se desterritorializam. Mas em algum momento se inserem em suportes físicos, se atualizam e se reterritorializam, por meio de passeatas de zumbis pelas cidades, ou em encontros de fãs que sobem ao palco para fazerem a performance de seu personagem favorito. Paralelamente à reterritorialização dos sujeitos das redes sociais, tais fenômenos constituem uma extensão das audiovisualidades fora do contexto reconhecidamente audiovisual. Nas redes sociais offline, identifica-se rastros do audiovisual. Quando um fã imita a vestimenta de certo personagem de algum produto audiovisual com o qual se identifica, aquele personagem é atualizado no contexto social, num tempo-espaço não digital, mas físico. Convém ressaltar que a presença das audiovisualidades no dia a dia é, na maioria das vezes, muito mais sutil. Gestos, falas e comportamentos que povoam nossos meios de convivência, não raro, são igualmente inspirados no audiovisual. Logo, o transbordamento das audiovisualidades para fora das telas não é particularidade de uma legião de fãs de determinados produtos. De rastros, esses movimentos, quando registrados pelos sujeitos das redes sociais em suas câmeras digitais e postos de volta no ciberespaço sob uma nova forma de apresentação, passam a compor outro construto audiovisual, que desencadeará um novo processo de significação e apreensão de sentido. Esse movimento configura a virtualização que retorna do atual para o virtual. De uma solução dada, passa-se a um novo problema. CONSIDERAÇÕES FINAIS As redes sociais on e offline podem ser consideradas meios de legitimação de significações compartilhadas pelos sujeitos que as constituem. Mas elas são, igualmente, espaços de reterritorialização das virtualidades e das significações produzidas acerca de determinado produto midiático nesse caso, Resident Evil. No seio da formação de comunidades simpáticas a determinado produto audiovisual, está a produção conjunta de sentido sobre ele. Em bate-papos via internet, seja em fóruns de discussão, por meio de comentários em blogs, artigos em sites, os usuários colocam em comum o que pensam a respeito do que viram, manifestam suas impressões. Assim, dão vazão ao imaginário, que por sua vez será também partilhado por determinado grupo social on e/ou offline. Esses percursos diversos que vão se formando na construção de sentidos de Resident Evil alavancados pelo imaginário social, o imaginário tecnológico, as pesquisas científicas e o próprio audiovisual acabam configurando novas problematizações e a própria desterritorialização e reterritorialização dos significados dos jogos, do filme, dos sites, dos blogs, dos eventos e assim por diante. No caso dos corpos mutantes de Resident Evil, percebe-se que a significação predominante carrega consigo a ideia de enfrentamento, de ameaça, de destruição. Os mutantes são frutos de um fracasso da Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

246 ciência, que, no ambiente simulado pelo jogo, precisa ser revertido não somente por meio do combate aos seres originados a partir da experiência equivocada, mas também pela destruição do conglomerado farmacêutico que comandava os estudos genéticos. O fato de os estudos serem feitos secretamente também reforça o imaginário pessimista e desconfiado de boa parte dos indivíduos em relação aos avanços científicos: ao mesmo tempo em que se aposta no desenvolvimento tecnológico como fonte de uma melhor qualidade de vida para a humanidade, há um temor de que a ciência crie monstros ao invés de heróis. O risco de falha acaba criando uma aura proibitiva em torno do tema. Essa falha da ciência, por sua vez, reflete o medo presente no imaginário coletivo acerca das criações científicas que se voltam contra o próprio homem. A tecnologia e a máquina que destroem o humano configuram um temor anterior a história de Frankstein. Por um lado, cosplayers e zombie walkers se vestem como zumbis para se divertirem, desenvolvendo uma forma lúdica de lidar com o que o imaginário lhes apresenta. O mesmo acontece com os usuários dos jogos que são capazes de enfrentar zumbis e outros perigos, assumindo o papel de heróis temporariamente e os espectadores de filmes e usuários de sites e blogs espelham e atualizam seu imaginário acerca dos mutantes. Por outro lado, essa diversão pode ocultar dúvidas latentes sobre a capacidade do homem de atualizar a si mesmo sem que isso represente a sua própria extinção. Como diz Tuchermann: Que humanos somos nós? A que nova raça pertencemos? O que é hoje a nossa corporeidade? Modificam-se o ambiente, a questão e os afectos: agora não se trata apenas do que podemos ser ou fazer, mas também, e principalmente, se podemos controlar aquilo que faremos e o resultado do que fizermos. (1999, p. 17) Dessa forma, acredita-se que as atualizações on e offline de Resident Evil assim como de outros jogos trazem, em potência, as virtualizações (das territorializações, desterritorializações e reterritorializações) provocadas nesse intrincado processo. As fronteiras entre ciência, ficção e realidade estão cada vez mais estreitas e o destino provável da interação entre imaginação e genética é a criação não apenas de um novo imaginário, como também de uma nova humanidade. O que não se pode garantir é que isso representará progresso. Da mesma maneira que se deve admitir a possibilidade de que o homem, tal qual o conhecemos hoje, não necessariamente triunfará. REFERÊNCIAS BAITELLO, Norval Junior. A era da iconofagia: ensaios de comunicação e cultura. São Paulo: Hacker, FELINTO, Erick. A religião das máquinas: ensaios sobre o imaginário da cibercultura. Porto Alegre: Sulina, LEMOS, André. Cibercultura: alguns pontos para compreender a nossa época. In: LEMOS, André; CUNHA, Paulo (Orgs.). Olhares sobre a Cibercultura. Porto Alegre: Sulina, p LÉVY, Pierre. O que é o virtual? São Paulo: Editora 34, LOTMAN, Yuri. Estética e Semiótica do Cinema. Lisboa: Estampa, MüLLER, Fernanda; MARKENDORF, Marcio. Apontamentos para um imaginário contemporâneo Disponível em: < html> Acesso em: 2 jul Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

247 PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, ROSÁRIO, Nísia Martins. Imagens midiáticas em corpos eletrônicos. InTexto, v. 1, p. 6, RUIZ, Bartolomé Castor. Os paradoxos do imaginário: ensaios de filosofia. São Leopoldo: Editora Unisinos, TUCHERMAN, Ieda. Breve história do corpo e de seus monstros. Lisboa: Vega, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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251 Aplicação de nanocatalisadores sintetizados em laboratório para remoção de fenol via fotocatálise Lu C a s by s t R o n s k i ab R e u 1 LiLiana am a R a L Fé R i s 2 RESUMO Efluentes industriais contendo fenol, poluente extremamente tóxico à vida aquática, mesmo que em concentrações muito baixas pode geral impacto ambiental significativo. É essencial o estudo de alternativas técnicas que viabilizem a remoção deste contaminante para que sejam atendidos os padrões da legislação ambiental referentes a efluentes industriais tratados a serem descartados em corpos receptores. Neste contexto, o presente estudo objetiva avaliar a eficiência de aplicação de três diferentes nanocatalisadores no tratamento de águas contendo fenol via fotocatálise. A principal vantagem desse processo é que, devido aos radicais hidroxilas serem altamente oxidantes, os mesmos reagem com grande variedade de compostos orgânicos e promovem a sua mineralização para compostos não-tóxicos, como gás carbônico e água. Esta é a terceira etapa de um grande projeto em desenvolvimento, a qual consiste na síntese e aplicação de novos catalisadores utilizando nanomateriais. Maiores índices de remoção foram encontrados utilizando-se o catalisador chamado Ti-Lap. Os catalisadores chamados Ti-Lap-NT e Ti- Lap -Na apresentam índices de remoção entre 25 e 35%. palavras-chave: efluentes, fotocatálise, remoção de fenol. ABSTRACT Phenolic compounds are common pollutants in many industrial wastewaters including those coming from pesticides, dyes, pharmaceuticals and petrochemical industries. Most of these compounds are known by their high toxicity level and their 1 Acadêmico do Curso de Engenharia Ambiental/ULBRA- Bolsista PROICT/ULBRA 2 Professora-Orientadora do Curso de Engenharia Ambiental/ULBRA e do PPG em Engenharia/ULBRA (liliana.feris@terra.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

252 persistence, and thus their recovery or elimination is required prior to the discharge or the reuse of the waste flow. Concerning wastewater treatment techniques, heterogeneous photocatalysis is a promising alternative method for the removal of organic pollutants in water. The degradation of this kind of pollutant in water, using irradiated dispersions of nanomaterials, is a growing area of both fundamental and applied research. It can be stated that current technologies concerning photocatalyzed oxidative degradation processes can be considered as practical alternatives to existing wastewater treatments. In the present study, tree photocatalysts have been prepared using different synthesis. The photodestruction of phenol compounds in synthetic wastewater was studied applying the prepared samples (Ti-Lap, TiO2-Lap-Na and TiO2-Lap-NT). Results showed best performance was achieved by the catalyst synthesized called Ti-Lap. Keywords: wastewater, phenol removal, photocatalysis. INTRODUÇÃO O controle e a prevenção da poluição adquire importância crescente à medida que os cuidados com a questão ambiental tornam-se mais presentes na sociedade. O ideal seria que a poluição pudesse ser evitada na fonte. Entretanto, muitas vezes a fonte não pode ser alcançada e ações para o tratamento, a reciclagem e o reaproveitamento devem ser consideradas (WOODSIDE ; KOCUREK, 1997). Ainda, dificilmente é possível obter grau zero de poluição em atividades industriais e por esta razão existem níveis de descarte de elementos poluentes estabelecidos para proteger o meio ambiente. A legislação varia conforme a região e o país e a tendência é que se torne cada vez mais restritiva. Todo este contexto serve de força motriz para sejam estudadas novas técnicas de controle da poluição. O controle de poluentes orgânicos na água é uma importante medida de proteção ambiental. Além dos muitos processos propostos e/ou que estão sendo desenvolvidos para a destruição dos contaminantes orgânicos, a biodegradação tem recebido bastante atenção. Porém, muitos desses contaminantes, especialmente aqueles que são tóxicos ou recalcitrantes, não são passíveis de degradação microbiológica (MUNEER et al., 2005). De forma geral, os compostos orgânicos aromáticos representam os principais poluentes industriais. O fenol e seus derivados ocupam uma posição proeminente na lista dos principais poluentes da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) e, além da suspeita de serem carcinogênicos, são tóxicos ou letais a peixes em concentrações de 5 a 25 mg/l e inibidores de biodegradação (SERPA, 2000). Assim, efluentes contendo fenol e outros compostos tóxicos requerem tratamento especial antes de serem dispostos em corpos de água (ECC apud TZIOTZIOS et al., 2005). Entre as diversas técnicas existentes para tratamento de águas contaminadas, a fotocatálise surge como alternativa técnica e economicamente viável para a remoção de contaminantes orgânicos. A aplicação de processos oxidativos avançados (POA) apresenta muitas vantagens, como a utilização de unidades compactas, alta velocidade de tratamento, não geração de outros resíduos provenientes do processo e alta eficiência. As técnicas POA podem ser divididas em dois grupos: a oxidação fotocatalítica homogênea, com o uso de UV (luz ultravioleta) e peróxido de hidrogênio ou UV/ fotocatalisador semicondutor. Nestes processos ocorre a reação entre os radicais hidroxila e os componentes orgânicos na presença de oxigênio e luz ultravioleta. Vantagem única de sua aplicação é que os elementos orgânicos são completamente 252 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

253 mineralizados, sendo o produto final dióxido de carbono, água e alguns ãnions, como nitrato, sulfato ou cloreto (KARTINI, 2004). Neste contexto, o presente estudo objetiva avaliar a eficiência de aplicação de três diferentes nanocatalisadores no tratamento de águas contendo fenol via fotocatálise em escala laboratorial. MATERIAL E MÉTODOS Os experimentos foram realizados utilizando-se 2L de efluente sintético, fixando a concentração inicial do efluente (10 ppm), a quantidade de catalisador utilizada (2g) e o número de lâmpadas UV ativo (12 lâmpadas de 8W), variando-se o tipo de catalisador. Foram realizados experimentos de fotocatálise com coleta de amostras durante 2h, a cada 15min. A Figura 1 apresenta o reator utilizado. Figura 1 - Reator de fotocatálise utilizados para os experimentos. RESULTADOS As Figuras 2 e 3 mostram os resultados comparativos de remoção de fenol entre os nanocatalisadores aplicados nos experimentos. Figura 2 - Efeito do tempo de residência na concentração residual de fenol. Condições: 1g/L de catalisador, 2 L de efluente. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

254 não conseguindo atingir índices maiores, geralmente após 2 horas de agitação. REFERÊNCIAS Figura 3 - Efeito do tempo de residência na remoção de fenol. Condições: 1g/L de catalisador, 2 L de efluente. Os catalisadores utilizados nos ensaios são denominados Ti-Lap, Ti-Lap-NT, Ti-Lap-NA, Ti- Lap-NA 600º e Ti-Lap-NA 700º. Os dois últimos correspondem ao catalisador Ti-Lap-NA com diferentes temperaturas de calcinação. O objetivo dos experimentos foi verificar o efeito da alteração na rota de síntese na degradação do composto. Os resultados mostraram que maiores índices de remoção (65%) foram obtidos com o catalisador Ti-Lap. Pode ser observado que a concentração de fenol foi reduzida de forma significativa nos primeiros 30 min de reação para a amostra de Ti-Lap-Na. As amostras de Ti-Lap e Ti-Lap-NT mostraram leve redução nos primeiros 30 min com alterações posteriores. CONCLUSÃO Com base nos resultados apresentados observa-se que, comparando os resultados obtidos na aplicação de cada nanocatalisador, a amostra Ti-Lap foi a mais eficiente, chegando a índices de remoção de até 65%. Observa-se também que, após determinado tempo de residência, a curva de remoção estabiliza KARTINI, I. Synthesis and characterisation of Mesostructured titania for Photoelectrochemical Sollar cells Tese (Doutorado em Engenharia) - Universidade de Queensland, Australia, MUNEER, M. et al. Heterogeneous photocatalysed reaction of three selected pesticide derivatives, propham, propachlor and tebuthiuron in aqueous suspensions of titanium dioxide. chemosphere, v. 61, p , SERPA, Ana Lidia Wild. Adsorção de fenol e de azul de metileno em flocos de carvão ativado pulverizado Dissertação (Mestrado em Engenharia), Faculdade de Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, TZIOTZIOS, G. et al. Biological phenol removal using suspended growth and packed bed reactors. Biochemical engineering Journal, v. 26, p , WOODSIDE, G.; KOCUREK, D. environmental, Safety, And Health engineering. New York, John Wiley & Sons, AGRADECIMENTOS Os pesquisadores agradecem à ULBRA, ao apoio técnico do CEPPED, à Universidade Queensland (Austrália) e ao CNPq pelos recursos recebidos. 254 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

255 Aprimoramento de um Motor a Combustão Interna lu í s Fe r n a n d o Ba c k e s d e le o n¹ lu i z ca r lo s ge r T z² ch a r l e s re c h² an d r é ce r v i e r i² ra Fa e l an T ô n i o ca M Pa r s s i la r a n J a 3 RESUMO O presente trabalho trata do aprimoramento de um motor a combustão interna, através diminuição de perdas por bombeamento, da diminuição de atrito interno e da otimização do controle do sistema de alimentação e ignição de um motor monocilíndrico, 35 cc, 4 tempos e ciclo otto. Para desenvolver esta pesquisa foi utilizado um composto redutor de atrito baseado em bissulfeto de molibdênio, além de aumentar a razão de compressão, sistema de injeção e ignição eletrônica e modificação dos coletores de admissão e escape. Os dados estudados foram obtidos em um dinamômetro de bancada, com uma célula de carga para medir torque e outra para medir massa de combustível consumida e a rotação foi medida através de um sensor Hall palavras-chave: eficiência energética, injeção eletrônica, rendimento, atrito. ABSTRACT This paper work consists in the improvement of an internal combustion engine, trought reduction of friction losses, reduction of pumping losses and fuel injection and igntion control of a monocylinder engine, 35cc, ¹ Aluno do Curso de Engenharia Mecânica Automotiva-Bolsista PROICT/ULBRA ² Professor do Curso de Engenharia Mecância/ULBRA 3 Professor-Orientador do Curso de Engenharia Mecânica/ ULBRA e do PPG em Engenharia/ULBRA (rafaellaranja@ yahoo.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

256 4 stroke and otto cycle. Likewise was used an friction reductor compound based on bisulfide of molibdenium, raise of the compression ratio, eletronic ignition and fuel injection and new intake and exhaust headers. Was utilized for that a bench dynamometer, to results collect, equipped with a load cell to measure torque and another to measure consumed fuel mass. Keywords: energy efficiency, eletronic fuel injection, performance, friction. INTRODUÇÃO Análise do consumo de energia e combustíveis é fundamental na produção e utilização de qualquer equipamento, quando são consideradas as emissões de poluentes e a escassez dos recursos naturais. Uma das principais metas da engenharia mecânica é o desenvolvimento de sistemas com melhor aproveitamento de energia. As vantagens não são apenas as diminuições de custos, mas também a diminuição de emissões expelidas através do sistema de descarga. Sistemas automáticos e o uso racional de energia vêm recebendo atenção de forma crescente por estarem diretamente relacionados com a preservação ambiental. POTÊNCIA Conforme Giacosa (1999), a energia gerada pela combustão dentro do cilindro não se transmite integralmente ao virabrequim do motor, pois uma parte dela é perdida pelas resistências passivas. Existem três classes de potência: potência indicada, potência absorvida pelas resistências passivas e potência efetiva no eixo. A potência indicada pode ser calculada partindo do ciclo indicado, cuja área representa o trabalho realizado pela mistura no interior do cilindro durante um ciclo, a potência efetiva é obtida medindo-se com um freio o trabalho no eixo virabrequim do motor e a potência absorvida pelas resistências passivas é medida, fazendo-se girar o motor, sem que haja combustão, com o uso de uma outra fonte de potência externa. A potência absorvida pelas resistências passivas, também pode ser obtida pelo cálculo da diferença entre a potência indicada e a potência efetiva: N i = N p + N e (1) Onde: N i = Potência indicada [W]; N p = Potência absorvida pelas resistências passivas [W]; N e = Potência efetiva [W]. POTÊNCIA EFETIVA De acordo com Giacosa (1999), a potência efetiva é a potência medida no eixo virabrequim do motor, também chamada de potência ao freio, porque pode ser medida com o uso de um dispositivo frenante adaptado no eixo do motor, permitindo que se meça o valor do momento frenante, conhecendo este valor e o número de revoluções por minuto do motor, pode-se calcular a potência efetiva. Como exemplo de dispositivo frenante utiliza-se o freio de Prony. O dispositivo mostrado na Figura 1, é constituído de uma roda de raio r, fixa ao eixo do motor, disposta no centro de duas sapatas de freio reguláveis, um braço de comprimento R, que fixa as sapatas numa extremidade e possui mobilidade dentro de um certo ângulo, sendo que na outra extremidade é fixa um peso F : 256 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

257 Figura 1 - Dinamômetro do tipo freio de Prony (DUTRA 1993). No caso do equipamento a potência efetiva será dada pela equação em watts. Ne = 2 πrmn (2) Sendo: F = Força [N]; R = Raio [m]; n = Número de revoluções do motor por unidade de tempo [Hz]. POTÊNCIA ABSORVIDA PELAS RESISTÊNCIAS PASSIVAS De acordo com Giacosa (1999), a potência absorvida pelas resistências passivas é a diferença entre a potência indicada e a efetiva. N f = N i - N e (3) Sendo: N i = Potência Indicada [W]; N e = Potência Efetiva [W]. Esta potência é utilizada para superar os atritos entre as partes mecânicas do motor, como o trabalho de bombeio, acionar acessórios, bomba d água, bomba de óleo, etc. Devido à dificuldade de medição das forças de atrito e pelas variações do resultado nas condições de funcionamento do motor, se torna mais conveniente medir a potência efetiva do motor com uso de um dinamômetro e depois com a ignição desligada usar o dinamômetro para impulsionar o motor nas condições medidas anteriormente (rotação), dessa maneira a potência utilizada pelo dinamômetro para fazer o motor girar será a potência perdida em atrito pelo motor. Conhecendo a potência indicada e a efetiva, podemos obter o rendimento mecânico do motor Giacosa (1999). (4) Onde: N i = Potência Indicada [W]; N e = Potência Efetiva [W]. Da potência total perdida (em condições de carga plena), aproximadamente 60% é devida ao atrito do êmbolo e das bronzinas, 25% no bombeio e o restante por atritos de outros acessórios (GIACOSA 1999). RENDIMENTO TERMODINÂMICO Conforme Giacosa (1999), o rendimento termodinâmico é a relação entre trabalho indicado, medido pela área do ciclo indicado, e o equivalente em trabalho do calor gasto para obtê-lo. Equivale ao produto dos rendimentos térmico ideal e rendimento indicado. O rendimento térmico ideal é a relação entre trabalho médio pela área do ciclo ideal e o equivalente em trabalho do calor introduzido no ciclo. O rendimento térmico dos ciclos ideais é: (5) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

258 Sendo: ρ = Relação de compressão; k = Eficiência Térmica, sendo: k = 1,4, para o ar. O rendimento indicado é a relação entre a área do ciclo indicado e a do ciclo ideal, levando em consideração que a diferença entre o ciclo ideal e o real depende em grande parte da qualidade termodinâmica da câmara de combustão (forma e disposição das válvulas, da vela ou do bico injetor). O rendimento mecânico é a relação do trabalho útil medido sobre o eixo do motor e o trabalho indicado, tendo em conta o trabalho perdido em atritos pelo próprio mecanismo do motor. O rendimento mecânico está normalmente compreendido entre 0,8 e 0,9, sendo que valores mais baixos se referem a motores de alto giro e de pequena cilindrada. O rendimento total de um motor é a relação entre o trabalho útil no eixo do motor e o equivalente a energia calorífica do combustível consumido ou seja, é o produto do rendimento termodinâmico pelo mecânico (Hey Wood, 2001). h i = h t h m 6) Onde: n t = Rendimento termodinâmico; n m = Rendimento mecânico. O objetivo deste trabalho é aumentar a eficiência energética de um motor ciclo otto, quatro tempos. Para obter este resultado será utilizado um sistema de injeção e ignição eletrônica marca Fueltech modelo RacePRO 1Fi+, um composto redutor de atrito baseado em bissulfeto de molibdênio, marca Molykote modelo D-321R, será aumentada a taxa de compressão através de uma biela mais longa, e modificado a geometria dos coletores de admissão e descarga, espera-se com estas modificações extrair dados referentes à rotação e consumo que evidenciem a diferença da potência e consumo específico em um motor com maior emprego de avanços tecnológicos para o seu funcionamento. MATERIAL E MÉTODOS O motor utilizado é um Honda GX35 quatro tempos, monocilíndrico com duas válvulas e um comando no cabeçote, sistema OHC, cabeçote fundido ao bloco, com acionamento de válvulas por correia dentada, de 980 W de potência, consumo específico 360g/kW-h com razão de compressão de 8:1, rotação máxima de r.p.m, e torque máximo de 1,6 Nm. O óleo lubrificante indicado é o de viscosidade SAE 10W30 e API SL, possuindo um sistema de lubrificação por pulverização, o combustível recomendado é a gasolina com 86 octanas ou mais (Honda, 2008). Este motor é utilizado em em roçadeiras e bombas d agua. Na ULBRA é utilizado como propulsor de veículos super econômicos. Para realizar os ensaios, foi utilizado uma bancada dinamométrica, conforme Figura 2, construída no próprio Laboratório de Tecnologia Automotiva da Ulbra. Esta consiste em um motor/gerador elétrico, um sistema de acoplamento ao motor Honda GX35 (Figura 3) e uma célula de carga, que pode ser visualizada na Figura 4, ligada ao braço de alavanca que é fixo a carcaça do gerador elétrico. O reservatório de combustível é fxado em uma célula de carga, conforme Figura 5, que mede a variação do peso no tempo. Através desta medição é possível estimar a massa de combustível consumida em tempo real. Uma terceira parte da bancada consiste no sistema de variação de carga do motor, com lâmpadas e interruptores de controle. 258 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

259 Figura 2 Bancada dinamométrica Figura 3 Acoplamento do motor a combustão com o gerador elétrico. Figura 5 Célula de carga para massa de combustível. O sistema de injeção eletrônica utilizado é da marca Fueltech, modelo RacePRO 1Fi+ (Figura 6), este sistema permite o acerto dos parâmetros do motor. Aliado a isso, a eliminação da necessitade de um venturi por parte do sistema original de alimentação, carburador, diminui parte das perdas por bombeamento. A ignição também é capaz de aumentar o centelhamento da vela do motor, melhorando a qualidade da combustão na câmara de combustão. Para facilitar o acerto, foi utilizado também um sistema de sonda lambda banda larga Bosch LSU 4.2 de 5 fios com controlador Fueltech Wideband (Figura 7). Figura 4 Célula de carga acoplada ao gerador Figura 6 Sistema de injeção e ignição eletrônica. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

260 Para reduzir o atrito interno foi utilizado o produto D-321R da marca Molykote, composto redutor de atrito, baseado em bissulfeto de molibdênio. É aplicado a peças metálicas, de coloração grafite, tem como objetivo evitar o contato do metal com metal nos casos de falta de lubrificação. Os coletores de admissão e exaustão foram confeccionados devido a utilização da injeção eletrônica e uma sonda lambda. Foram desenvolvidos com o mínimo de curvas possíveis e com curvas de maior raio possível, como diâmetro interno compatível com o diâmetro interno dos dutos do cabeçote. Foi utilizado alumínio e plástico no coletor de admissão e aço carbono no coletor de exaustão. Figura 8 Relação entre rendimento térmico teórico e razão de compressão. O sistema de aquisição de dados é composto por um computador em que foi instalada uma placa da National Instruments modelo NI PCI-1200 e o programa utilizado para a coleta dos dados oriundos das células de carga posicionadas na bancada dinamométrica foi o LabVIEW. Utilizou-se, também, um leitor de sonda lambda banda larga Fueltech Wideband Meter para monitoramento do resultado da combustão. TESTES E ENSAIOS Figura 7 Coletor de descarga com sonda lambda banda larga. A razão de compressão foi alterada através da modificação do comprimento da biela do motor, foi possível diminuir o volume total da câmara de combustão quando o êmbolo encontra-se em PMS sem afetar o deslocamento. Com isto foi possível elevar a razão de compressão de 8:1 para 11:1. Esta modificação está ligada diretamente ao aumento do rendimento térmico do motor, conforme equação 5 e Figura 8. A seguir serão descritos os testes utilizados para determinar a potência e o consumo em relação às modificações realizadas no motor em estudo. EXPERIMENTO - Considerando-se o objetivo principal desse trabalho que é determinar as mudanças de comportamento do motor Honda GX35, ao reduzir o atrito, atuar sobre o controle de alimentação de combustível e ignição, da alteração da geometria dos coletores, enumeraram-se os experimentos realizados com a utilização do freio dinamométrico. 260 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

261 O propósito desse experimento consiste em fazer o motor trabalhar a carga plena, válvula de aceleração totalmente aberta, variando rotação, e com isso determinar sua potência e o consumo específico. Para aquisição desses dados foram usadas duas células de carga, uma para se medir a variação da massa do combustível e outra colocada no braço de alavanca acoplada ao freio. RESULTADOS Figura 9 Gráfico do consumo. A cada 10 s foram coletados dados fornecidos pelas células de carga instaladas no reservatório do combustível e no braço de alavanca do gerador e rotação através de um sensor Hall, conforme Tabela 1. Tabela 1 Resultados obtidos através da bancada dinamométrica. Rotação [rpm] Consumo [gf] Potência [W] , , , , , , Consumo Específico [g/kwh] Figura 10 Gráfico da potência. Através dos resultados encontrados na Tabela 1, foi possível desenhar os gráficos da potência, consumo e consumo específco, assim como da diferença de potência do motor original para o modificado, mostrados nas Figuras de 9 a 12. Figura 11 Gráfico do consumo específico. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

262 rotação. Para se atingir este objetivo foi acoplado ao motor um freio em forma de gerador para a variação da carga, e por consequencia, rotação, e através dos testes executados conclui-se que o motor pode ser aprimorado com o objetivo de se obter maior potência específica e menor consumo específico, reduzindo, então, os índices de poluição e ao mesmo tempo preservando recursos naturais. Os resultados obtidos nos testes mostraram que com as modificações sugeridas no trabalho é possível obter uma diferença na potência máxima de 165 W e um decréscimo no consumo específico de 71 g/kwh. REFERÊNCIAS Figura 12 Gráfico comparativo da potência. CONCLUSÃO O presente trabalho teve como principal objetivo à determinação da diferença do rendimento do motor Honda GX35 na sua forma original e com aprimoramentos tecnológicos, à carga plena variando a HONDA. OWNeR S MANUAL: GX 35. Disponível em: < engines.com> Acesso em: 10 jun HEYWOOD, John B. Internal combustion engine fundamentals. New York: McGraw- Hill, GIACOSA, Dante Motores endotérmicos. São Paulo: Cientifico Médica, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

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265 Contemporaneidade na pintura: o campo específico Ja n d e r lu i z ra M a 1 ic l e i a Bo r s a cat Ta n 2 RESUMO Esta pesquisa se desenvolve a partir da observação de obras artísticas contemporâneas que trazem consigo referências a problemáticas da pintura, e a utilização destes recursos por artistas que não trabalham necessariamente com pintura, mas com questões específicas do campo pictórico. Este trabalho insere-se na pesquisa Pintura Contemporânea Em Seu Campo Específico iniciada em março de 2007 e constitui parte de sua reflexão teórica. Propõe, primeiramente, uma análise de algumas possíveis questões pictóricas que encontram lugar em obras artísticas contemporâneas. Dentre estas, encontra-se o uso das camadas da pintura, das transparências, da planaridade, da perspectiva linear, das sobreposições, das justaposições e de colagens; no segundo momento aborda como estes elementos são usados e apropriados por artistas em suas poéticas e de que maneira são aplicadas em algumas obras especificas. Como exemplos e objetos de análise, são referenciados alguns trabalhos de Daniel Senise, Lucia Koch, Myra Gonçalves, Hélio Oiticica, Amélia Brandelli e Karin Lambrecht que levam estas reflexões a um novo patamar, tratando da pintura em um campo específico. palavras-chave: pintura contemporânea, problemáticas pictóricas, pintura. 1 Bacharel em Artes Visuais /UFRGS, Aluno de Licenciatura em Artes Visuais/UFRGS Bolsista IC/CNPq 2 Professora Orientadora do Curso de Artes Visuais/UFRGS e da Pós-Graduação em Artes Visuais/UFRGS (icleiacattani@ uol.com.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

266 ABSTRACT This research is developed from observation of contemporary artworks that bring references to issues of painting, and use these resources for artists who do not necessarily work with paint, but with specific issues of the pictorial field. This work is part of the research Contemporary Painting in their specific field began in March 2007 and is part of his theoretical reflection. Proposes, first, an analysis of some potential issues that are pictorial place in contemporary artworks. Among these, is the use of layers of paint, the transparencies, the flatness of linear perspective, overlay, and the juxtapositions of collage; in the second step addresses how these elements are used and appropriated by artists and their art how they are applied in some specific works. Examples and analysis objects are referenced some work of Daniel Senise, Lucia Koch, Myra Gonçalves, Hélio Oiticica, Amelia Brandelli and Karin Lambrecht that lead to thoughts a new level, dealing with the painting in a specific field. Keywords: contemporary painting, pictorial problems, painting. INTRODUÇÃO A presente pesquisa se desenvolve a partir da observação de: obras artísticas contemporâneas que trazem em si questões referentes a problemáticas da pintura; e da ocorrência de tais problemáticas em obras que não são enquadradas necessariamente como pintura, mas que possuem relações com o campo pictórico. Quando se fala de problemáticas da pintura, fala-se de paradigmas presentes em determinados espaços e épocas da história da arte, que nortearam as produções pictóricas correspondentes. Estes paradigmas, observados e trabalhados pelo artista contemporâneo, ganham novo fôlego e novo sentido dentro da produção artística atual. Este cruzamento de sentidos, entre o velho e o novo, é o foco onde esta pesquisa se posiciona. Dentre as problemáticas trabalhadas na atualidade, procurou-se abordar algumas muito específicas como: o uso de camadas da pintura, as transparências, a cor, as justaposições, a diversidade de materiais empregados, a perspectiva linear e a planaridade. Esta análise insere-se como um elemento da pesquisa Pintura Contemporânea Em Seu Campo Específico 1, iniciada em março de 2007 pela Profª Drª Icleia Borsa Cattani, e constitui parte de sua reflexão teórica. Primeiramente, procurou-se analisar o que se definiu como pintura, ou campo pictórico, em alguns momentos mais recentes da história da arte. Esta análise é importante para discutir de que maneira estas questões acima mencionadas, próprias da pintura, são tratadas em obras artísticas contemporâneas, principalmente por serem encontradas em obras com características tão diversas ao que se poderia entender como pertencentes a um campo específico da pintura. No segundo momento aborda-se como estes elementos da pintura são apropriados por artistas em suas poéticas e de que maneira são tratados em algumas obras especificas. Como exemplos e objetos de análise, são referenciados alguns trabalhos de Daniel Senise, Lucia Koch, Myra Gonçalves, Hélio Oiticica, Amélia Brandelli e Karin Lambrecht que levaram estas reflexões a um novo patamar, tratando da pintura, ora 1 Grupo de Pesquisa registrado no CNPq/ Lattes. 266 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

267 em um campo específico, ora em um campo ampliado. Estas reflexões sobre questões específicas da pintura são relevantes no sentido de possibilitar a compreensão de que a pintura permanece como pesquisa na arte contemporânea, porém, abordada de diversas maneiras: inovadoras e condizentes com a contemporaneidade. ALGUNS CONCEITOS SOBRE A PINTURA CONTEMPORÂNEA Na contemporaneidade, observamos a ausência de limites pré-determinados que possam conferir à arte algum tipo de delimitação de linguagem, dividindo a arte em pintura, escultura e etc. Na atualidade as experimentações, no âmbito de cruzamentos de linguagens e mídias, são muito presentes. Porém, ao longo do século XX, houve vários posicionamentos críticos, tanto de artistas como de críticos de arte, que buscaram a compreensão do lugar da pintura, como uma linguagem específica em determinados momentos. Na década de 1960, apresentando um discurso referenciado nos conceitos de autocrítica e de pureza, Greenberg 2, defendeu as competências próprias de cada linguagem como a pintura e a escultura, como meio de sobrevivência e legitimação das mesmas. Na pintura, Greenberg defendeu a pureza do meio através da eliminação de características não naturais a este, como a representação perspectiva e o volume escultórico (elementos ilusionistas). Segundo ele, estas características não fariam parte da pintura como linguagem, mas sim da escultura. A planaridade, o formato do suporte e as propriedades das tintas seriam as qualidades realmente determinantes na pintura. Já nos anos 1970, Rosalind Krauss 3 propôs uma nova abordagem sobre a arte, porém, ainda seguindo a tendência colocada por Greenberg de uma visão compartimentada do campo artístico. Segundo sua definição de campo expandido, a pós-modernidade apresentaria possibilidades múltiplas de construção. As obras de arte ainda seriam trabalhadas envolvendo questões próprias de um determinado campo como, por exemplo: a pintura, a escultura e etc. Porém as características próprias de cada campo ou linguagem poderiam ocorrer em um estado expandido, pois, naquele momento, o termo específico e histórico (exemplo: pintura) não abrangia a totalidade das características das obras que se firmaram naquela época: como a instalação, a land-art e etc. Deste modo, a autora pretendia manter classificações dentro de uma linguagem, mesmo que as obras apresentassem algumas características diversas à mesma. Na atualidade, pode-se afirmar que existem artistas que lidam com as questões historicamente propostas pela pintura, como também fazem uso de referências a questões próprias da contemporaneidade miscigenação de linguagens -, surgindo assim os hibridismos e as mestiçagens. Quando se trata de pintura, o que se vê hoje, são estudos e desdobramentos de pesquisas, que podem ser entendidas como experimentações em busca de novos espaços para o campo pictórico. 2 GREENBERG, Clement. Pintura Modernista. In: arte y Cultura: ensayos criticos. Barcelona: Gustavo Gili, KRAUSS, Rosalind E. La originalidad de la Vanguardia y otros mitos modernos. Alianza Editorial: Madri, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

268 Deste modo, na contemporaneidade, é de grande utilidade o conceito de mestiçagem 4 no momento de compreender a constituição de uma determinada obra que envolva questões centrais da pintura. Pois este conceito de mestiçagem é definido como a coexistência entre o velho e o novo, as novas tecnologias e as velhas práticas, somando-se umas às outras sem manter um eixo ou uma linha que delimite os elementos entre si, mantendo determinadas zonas de tensão na obra. Hoje, nas obras produzidas, observa-se um esquema de possibilidades abertas em partes que se combinam e recombinam sem restrições de linguagens. Neste contexto, há obras em que ocorre um entrecruzamento entre linguagens (tradicional com o uso de uma nova tecnologia), bem como há obras que se utilizam de uma única linguagem, aplicada de maneira nova sobre outros meios. Assim, há a possibilidade de inúmeros sentidos e significações que se alteram tanto quanto há possibilidades de combinações entre os elementos. Deste modo, esta abordagem tenta identificar estes cruzamentos pelo prisma da mestiçagem. Focalizando, também, alguns pontos específicos e históricos que caracterizam tradicionalmente o campo da pintura e procurando relacioná-los com questões presentes em obras contemporâneas. PERSPECTIVA E PLANARIDADE: A OBRA DE DANIEL SENISE A perspectiva e a planaridade são questões historicamente ligadas à pintura e estão diretamente 4 CATTANI, Icleia Borsa. Mestiçagens na Arte Contemporânea: Conceito e Desdobramentos. In: Mestiçagens na arte Contemporânea. Porto Alegre: Editora da UFRGS, relacionadas ao âmago da concepção dos espaços pictóricos do Renascimento, do Impressionismo e do Cubismo respectivamente. Figura 1 - Daniel Senise: Cícero, 2009, acrílica em colagem sobre alumínio, 200cm x 155cm Em relação ao Renascimento, Francastel 5 afirma que o espaço perspectivo foi fruto de um processo gradual que instituiu o suporte da pintura como uma janela, onde o primeiro plano seria como um vidro transparente. E na modernidade, os meios da pintura que eram dissimulados no realismo, passam a ser reconhecidos como propriedades positivas (GREENBERG, 1960). Dentre estes meios, a planaridade do suporte assume um lugar de destaque no desenvolvimento da pintura. Na contemporaneidade, estas duas questões perspectiva e planaridade - são abordadas em obras de alguns artistas. Como exemplo cita-se Daniel Senise que optou pela pintura utilizando a técnica de frottage 6 com tinta óleo. Senise extrai texturas 5 FRANCASTEL, Pierre. Pintura e Sociedade. São Paulo: Martins Fontes, Foi desenvolvida pelo pintor, escultor e artista gráfico alemão, Max Ernst, em No frottage o artista utiliza um lápis ou outra ferramenta de desenho e faz uma fricção sobre uma superfície texturizada. 268 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

269 de diversos assoalhos e superfícies ressaltando o aspecto planar de sua pintura, ao mesmo tempo em que, através da colagem e justaposição destas texturas recortadas, traz a representação da perspectiva (Figura 1). O embate entre planaridade e perspectiva confere certas zonas de tensão às suas obras. TRANSPARÊNCIA E COR: CORREÇÕES DE LUZ DE LUCIA KOCh Outro elemento ligado à pintura diz respeito à transparência. Esta foi introduzida na pintura através da técnica de veladura: uma conquista alcançada no século XV pela difusão das tintas com base oleosa e que consistia na sobreposição de finas camadas com pigmento moderado, proporcionando atenuações e jogos de luz jamais alcançados com outras técnicas envolvendo tintas a base de água. Figura 2 - Lucia Koch, Correções de Luz. Placa de acrílico sobre janela, Fundação Iberê Camargo, No momento contemporâneo, a transparência persiste como elemento de pesquisa entre os artistas. Como um dos focos da pesquisa optou-se por analisar o modo como a artista Lucia Koch utiliza este elemento em suas obras. Na obra Correções de Luz (Figura 2), a artista trabalha com a transparência e a cor. Neste caso estas duas características pictóricas apresentam-se de modo a trabalhar a percepção do espectador, tal como ocorria quando os antigos mestres da pintura utilizavam tais recursos. Mas estas características, outrora cristalizadas em um corpo pictórico da matéria e da tinta, agora ocorrem sem este corpo: a artista trabalha apenas a luz na ambiência do espectador, utilizando filtros coloridos sobre aberturas como janelas. CAMADAS: OS quimigramas DE MyRA GONÇALVES A utilização de camadas é própria dos processos pictóricos e se apresentou de diversas maneiras em determinados períodos da história da arte: no Renascimento, o uso de camadas de tinta esteve diretamente ligado ao desenvolvimento de pinturas cada vez mais próximas de imagens ópticas através do chiaroscuro 7, esfumato 8 e da veladura; no Cubismo, utilizando processos diversos com camadas papier collé 9 os artistas encontraram 7 o sfumato permite uma passagem harmônica e suave entre volumes e objetos, eliminando a marca da linha de contorno e dando maior naturalidade à pintura. 8 o chiaroscuro é empregado para dar volume através do jogo de tons claros e escuros. Este jogo escultórico pode obedecer a um esquema com uma única fonte de luz ou, como era mais praticado, a vários focos de luz conforme a necessidade de ressaltar determinados volumes. 9 É uma técnica de pintura, do tipo colagem. Com papier collé o artista cola os pedaços de material liso (papel, oleados, jornal) sobre a tela como uma pintura. Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

270 lugar para construções com camadas de diferentes materiais; e na contemporaneidade, os procedimentos com camadas persistem, porém com outras leituras. Como exemplo toma-se o trabalho de Myra Gonçalves que desenvolve experimentações com fotografia, realizando uma pesquisa sobre a utilização do papel fotográfico como meio para a sua produção artística. Usando elementos de processos como o fotograma e o quimigrama 10, a artista trabalha sobre a emulsão do papel fotográfico. Com pincéis, pontas secas, e o uso de fixador, revelador e outros, Myra remove certas regiões da película fotossensível revelando camadas subjacentes do material fotográfico, mostrando cores e tonalidades outrora ocultas. Desta maneira, obtém resultados do cruzamento de materiais fotográficos com elementos da linguagem pictórica (Figura 3). Figura 3 - MYRA GONÇALVES: S/t, 2003, quimigrama colorido, 30cm x 45cm, 2007 MATERIALIDADE NA PINTURA: AS POÉTICAS DE AMÉLIA BRANDELLI E KARIN LAMBREChT Os procedimentos e as operações dos artistas com materiais diversos foram fundamentais para a construção de novos espaços dentro da pintura, ao longo da história. Na contemporaneidade, a escolha dos materiais possui motivações de muitas ordens como a carga simbólica e o resultado estético, abrindo a possibilidade do uso de praticamente qualquer material para se trabalhar em arte e em processos pictóricos. Como exemplo destes processos tomam-se as obras de Karin Lambrecht e Amélia Brandelli. Nos trabalhos de Karin Lambrecht, mais especificamente nos trabalhos pertencentes à série Registros de Sangue (Figura 4), a artista utiliza materiais repletos de carga simbólica. Karin explora outras formas de suporte como, por exemplo, panos e toalhas de valor pessoal, que pertenceram a sua avó. Estes panos são pintados ou sofrem impressões feitas com sangue de cordeiros. O sangue de cordeiro possui diversas relações com inúmeras culturas como parte de rituais de catarse ou expiação, e com a própria cultura ocidental, especialmente no cristianismo e na representação do Cristo, ao qual Karin faz referência no seu trabalho Quimigrama: também chamado de pintura química, constitui-se em uma imagem produzida através da utilização da química do processo fotográfico: revelador, fixados, tonalizadores. Sem a interferência de meios mecânicos, tal processo fotográfico produz efeitos de características únicas. Tem na figura do belga Pierre Cordier, seu introdutor. (MONFORTE apud GONÇALVES, 2007, p.22) 11 ARAÚJO, Viviane Gil. Karin Lambrecht : as vestes e o corpo na série registros de sangue. Dissertação (mestrado) - UFRGS. Instituto de Artes. PPGAV, Porto Alegre, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

271 Figura 4 - Karin Lambrecht, Díptico No trabalho de Amélia Brandelli, especialmente os trabalhos que compuseram sua dissertação de mestrado, a materialidade se apresenta de outro modo. Sua poética também se relaciona com os materiais empregados na pintura, porém estes são justapostos (Figura 5). A carga simbólica está presente nos vidros e nas madeiras empregadas. Segundo a artista, o vidro é utilizado como elemento que discute a própria transparência e brilho presentes na história da arte, além de estar ligado à concepção do plano transparente da pintura, quando este pertencia a uma janela representativa e ilusionística no Renascimento. A madeira e sua textura entram em seu trabalho como elementos de paisagem. Sua relação com a paisagem, segundo a artista, está na própria matéria constituinte desta madeira, que é um ser com odor, parasitas, e está ligado à terra 12. Figura 5 - Amélia Brandelli, Rodeada de sombras pela sonolência da folhagem, pelo ouro escuro de girassóis fanados, COR, ESPAÇO E TEMPO: PENETRáVEIS DE hélio OITICICA A cor, outro elemento indissociável da idéia de pintura, é um elemento que não é menor nas discussões e reflexões que se deram ao longo da história da arte. Foi deste modo no Impressionismo, no Fauvismo e nas vanguardas modernistas, fazendo parte também das discussões ocorridas na década de 1960 sobre a morte da pintura BRANDELLI, Amélia Duarte Teixeira. Re-encontros: o sentido poético na justaposição pictórica. Porto Alegre, OITICICA, Hélio. Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Projeto Hélio Oiticica, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

272 Na contemporaneidade, analisando mais especificamente a obra de Hélio Oiticica, a cor passa a ser problematizada em consonância com outros elementos da pintura: o tempo, a estrutura e o espaço. Para Oiticica a cor possuía um tempo próprio. E a tela plana e convencional sobre a parede limitaria este tempo. Os Penetráveis (Figura 6) e Núcleos seriam a interpretação de Oiticica à mudança de tempos destas estruturas, onde o espectador (agora incitado a interagir com a obra) poderia ter a real experiência da cor, em um tempo diferente do convencional um tempo não representado ou fictício -. Figura 6 - Hélio Oiticica, Penetrável Magic Square # meio artístico contemporâneo. A pintura, como campo e linguagem artística não se restringe somente a um campo específico, mas, especialmente na contemporaneidade, surge dentro de um campo pictórico ampliado e mestiço onde a mesma é, muitas vezes, o assunto desenvolvido pelo artista contemporâneo. Ainda no século XIX, a tela, como espaço pictórico, foi o lugar onde o artista trabalhou suas reflexões em relação ao mundo. Porém, a partir dos primeiros indícios da modernidade, mais significativamente dentro das vanguardas, os próprios elementos constitutivos da pintura passaram a ser objeto e alvo de reflexões dos artistas. E estas reflexões se consolidam na contemporaneidade, tanto pelas características investigativas desta época como pela diversidade de recursos que ampliam possibilidades. Os processos envolvendo elementos específicos da pintura proporcionam reflexões sobre o espaço e constroem novas possibilidades na produção artística. Assim, este fenômeno persiste na atualidade e os processos que utilizam tais elementos, em um campo ampliado da pintura, são abordados por diversos artistas do meio artístico brasileiro e internacional. CONSIDERAÇÕES FINAIS Trabalhando com os princípios da perspectiva linear, com a planaridade, com a luz, com a cor, transparências e outros elementos, os artistas abordados nesta análise encontram lugares para pesquisas plásticas distintas, lançando um olhar novo sobre antigas problemáticas da pintura. Apesar de algumas vezes ter-se decretado a morte da pintura, esta continua vigorando no REFERÊNCIAS ARAÚJO, Viviane Gil. Karin Lambrecht: as vestes e o corpo na série registros de sangue Dissertação (Mestrado em Artes) Instituto de Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, BRANDELLI, Amélia Duarte Teixeira. Re- 272 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

273 encontros: o sentido poético na justaposição pictórica. Porto Alegre, CATTANI, Icleia Borsa. Mestiçagens na Arte Contemporânea: Conceito e Desdobramentos. In:. Mestiçagens na Arte contemporânea. Porto Alegre: Editora da UFRGS, FRANCASTEL, Pierre. Pintura e Sociedade. São Paulo: Martins Fontes, GONçALVES, Myra Adam de Oliveira. A Fotografia sem câmera: revelações de especificidades da fotografia através do quimigrama. Porto Alegre, GREENBERG, Clement. Pintura Modernista. In: Arte y cultura: ensayos criticos. Barcelona: Gustavo Gili, KOCH, Lucia. Lucia Koch Website. Disponível em: < >. Acesso em: 30 abr KRAUSS, Rosalind E. La originalidad de la Vanguardia y otros mitos modernos. Madri: Alianza, OITICICA, Hélio. Hélio Oiticica. Rio de Janeiro: Projeto Hélio Oiticica, SENISE. Daniel. [Site do Artista Daniel Senise]. Disponível em: < senise.com>. Acesso em: 15 mai Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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275 Registros de dança: a trajetória do grupo Terra MíriaM Me d e i r o s st r a c k 1 Fl a v i a Pilla d o valle 2 RESUMO Esta pesquisa busca registrar dados do Grupo Terra, uma companhia gaúcha independente que atuou entre os anos de 1981 e 1984, a nível nacional e internacional. O trabalho identifica a formação do grupo; mapeia a produção artística; traz questões abordadas em obras relevantes; e busca traçar, ao longo da investigação dos registros, considerações sobre o panorama histórico da cena de dança teatral do Rio Grande do Sul. Num primeiro momento, a pesquisa coleta fotos, imagens, recortes de jornais e programas de espetáculos, para mapear a trajetória do grupo. Posteriormente, realiza entrevistas com membros do grupo para se ter acesso a outras idéias e interpretações que não estão ainda escritas. A pesquisa se identifica com o que se tem chamado de Nova História, isto é, uma nova forma de visualizar a história escrita, que considera o olhar particular e reconhece que a realidade é um ponto de vista embebido de pré-concepções. Por fim, o Grupo Terra se configurou como um grupo de grande expressão no cenário gaúcho do início dos anos de Deste grupo, muitos profissionais ainda se encontram atuantes, dentro e fora do Brasil. palavras-chave: dança, Rio Grande do Sul, história, Grupo Terra. ABSTRACT This study wants to register data of Terra Group, an independent south Brazilian company that acted between the years of 1981 and 1984, at national and international level. This work identifies the formation of the group; 1 Acadêmica do curso de Dança/ULBRA Bolsista PROICT/ ULBRA 2 Professora- Orientadora do curso de Dança/ULBRA (danca@ ulbra.br) Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

276 relates its artistic production; brings approached aspects of relevant pieces; and search to relate, as long the study takes, considerations about the historical view of theatrical dance of Rio Grande do Sul. First, this research collects pictures, images, newspapers and programs of spectacles, to clear the group trajectory. Then, it makes interviews with group members to access other ideas and interpretations not still written. This research identifies itself to the New History, it means, a new way to visualize the written history, which takes account the particular look and recognizes that reality is a point of view surrounded of preconceptions. Indeed, the Terra Group was a group of great expression in the south Brazilian scene in the beginning of the years 1980s. From this group, many professionals still are acting, inside and outside Brasil. Keywords: dance, Rio Grande do Sul, history, Grupo Terra. INTRODUÇÃO Esta pesquisa surge a partir da preocupação com a investigação científica dos fatos e personalidades locais e seu registro através da escrita. Os livros de história da dança normalmente tratam da história da dança européia e americana e, quando se referem ao Brasil, tendem a se concentrar na história do eixo Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador. O presente trabalho se propõe a suprir uma demanda regional pela preservação da memória da dança, criando oportunidades para que as futuras gerações tenham possibilidade de acesso a esse conhecimento. Ainda hoje, apesar de trabalhos estarem surgindo no âmbito universitário, poucas pessoas tem se preocupado em registrar e difundir a dança do Rio Grande do Sul. Preservar a memória da dança e conhecer suas raízes, através de um estudo histórico, é importante para sua valorização, registro, cultura e formação de uma identidade cultural forte no Estado. Segundo Layson (1995): [...] a história é frequentemente justificada por seu valor inerente, uma vez que o passado de qualquer grupo de pessoas é considerado como um legado cultural a ser valorizado. Além disso, a história parece prover ligações entre o passado e o presente e assim, através do seu estudo, o aqui e agora pode ser informado. O presente trabalho busca registrar a trajetória do Grupo Terra, uma companhia gaúcha independente que atuou entre os anos de 1981 e 1984, a nível nacional e internacional. O trabalho identifica a formação do grupo; mapeia a produção artística, buscando, dentro dos recursos e registros existentes, um banco de dados audiovisual 1 ; traz aspectos abordados em obras relevantes, registrando outras questões como colaborações, escolhas musicais, elementos cênicos, críticas de época, etc.; e busca traçar, ao longo da investigação dos registros, considerações sobre o panorama histórico da cena de dança teatral do Rio Grande do Sul. Neste sentido, esta pesquisa quer informar futuras gerações sobre a dança construída no Rio Grande do Sul, mais especificamente em Porto Alegre. Que aspectos sobre a história da dança em Porto Alegre emergem na investigação da história deste grupo de dança local? Esta pesquisa não busca estabelecer a verdade absoluta ou esgotar tudo sobre o assunto, apenas organizar dados de forma a oferecer ao leitor um ponto de vista. 1 Há um DVD com imagens do grupo disponível na coordenação do Curso de Dança da ULBRA Canoas. 276 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

277 MATERIAL E MÉTODOS Ao revitalizar a memória, remonta-se eventos de uma época determinada através do ato da escrita. Ao registrar, une-se os diversos pontos de vista, seja da mídia, dos registros existentes e dos depoimentos e dados colhidos. O percurso se faz ao caminhar e as escolhas vão acontecendo rizomaticamente, porém percebem-se regiões de silêncio bastante significativas às quais me rendo e tento ouvir o que elas murmuram baixinho ou ecoam. Trabalhar com memória ensina-nos a percorrer essas regiões... Para suprir algumas carências relativas aos lapsos de memória ou por falta de informação ou de registro, tentamos ouvir depoimentos de pessoas que fizeram parte desta história. Sempre existem espaços, lacunas que não serão preenchidas, com as quais aprendemos a conviver, ou deles armamos um quebra-cabeça com as peças que faltam, e que são ocupadas por interpretações mais viáveis (FREIRE, 2005). A partir da perspectiva da Nova História, esta pesquisa concentra-se em um grupo já extinto do estado gaúcho: Grupo Terra. Diferente do paradigma tradicional de fazer história, que pode ser visto como uma visão do senso comum, influenciada mais pela política nacional e internacional do que local, e por uma visão de cima de grandes homens e grandes feitos, a Nova História considera o olhar particular. Na história tradicional os documentos são geralmente registros oficiais que expressam o ponto de vista oficial e se vangloriam da grande ênfase na objetividade. A Nova História propõe que, ao invés de ver este paradigma como a maneira de se fazer história, este deve ser percebido como uma dentre várias abordagens percebidas possíveis do passado, uma vez que a realidade é culturalmente construída. Essa perspectiva é uma forma diferenciada de visualizar a história escrita, na qual considera o olhar particular e reconhece que a realidade é, na verdade, um ponto de vista embebido de pré-concepções associadas a cor, credo, classe ou sexo isto é, não é neutro. Além disso, vai passar pela experiência pessoal do escritor, que não estão isentas de representações. Tudo o que foi um dia poderá vir a ser contado de outra forma, cabendo ao historiador elaborar uma versão plausível, verossímil de como foi. Mesmo admitindo uma certa invariabilidade no ter sido, as formas de narrar o como foi são múltiplas e isso implica colocar em xeque a veracidade dos fatos (PESAVENTO, 2005). A história da dança quer apontar mudanças na dança através dos tempos, destacar feitos importantes e discutir certos eventos. Entretanto, quando os fatos ainda não estão disponíveis necessita-se fazer um trabalho de campo, e utilizar a descrição. O objetivo seria fomentar o alargamento do universo do discurso humano (GEERTZ, 1989). Esta pesquisa busca uma inspiração no olhar etnográfico, que perpassa por procurar narrativas e enredos que nos tornem visíveis para nós mesmos. [...] a análise cultural é (ou deveria ser) uma adivinhação dos significados, uma avaliação das conjeturas, um traçar de conclusões explanatórias a partir das melhores conjeturas, e não a descoberta do continente dos significados e o mapeamento da sua paisagem incorpórea (GEERTZ, 1989). Num primeiro momento, a pesquisa coleta fotos, imagens, recortes de jornais e programas de espetáculos, para mapear a trajetória do grupo. Posterior- Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

278 mente, realiza entrevistas com membros do grupo para se ter acesso a outras idéias e interpretações que não estão ainda escritas. As entrevistas são semi-estruturadas, realizadas num clima de diálogo, registradas através de filmagem. A escolha dessas pessoas deu-se pelo fato de serem pessoas com as quais as pesquisadoras têm alguma relação. Este contato estabelece um laço de confiança que pode ser um meio facilitador da conversa. As tentativas abordadas e os possíveis erros cometidos em campo, constituem informações que serão levadas em conta. Essa pesquisa evita a utilização de protocolos rígidos, determinados a priori. O método não pode ser concebido como algo que aprisiona a investigação. A análise e interpretação dos dados foram feitas durante o processo da pesquisa em si. Conforme o corpo de conhecimentos foi sendo constituído fez-se textos sobre o assunto expondo recortes de um todo. Construir textos ao longo do processo é uma forma de análise, interpretação e organização dos dados coletados. A análise, interpretação e escrita é um momento conectado, no qual se tenta ver o sentido do todo. RESULTADOS A formação do Grupo Terra remete a tentativa anterior de formação de uma Companhia do Estado do Rio Grande do Sul pela Associação dos Professores de Dança do Rio Grande do Sul - ASGADAN. Essa associação já havia tentado formar um grupo de dança estável, porém, sem subsídios oficiais era muito difícil. Até o dia em que a Associação resolveu, primeiro, mostrar um trabalho de alto nível para, depois, lutar por auxílio. Em novembro de 1980, o bailarino e coreógrafo argentino Valério Césio veio a Porto Alegre ministrar um curso de dança a convite de Tony Petzhold. O sucesso foi tão grande que foi montado um espetáculo em apenas quinze dias com coreografias dele em parceria com a ASGADAN. Por conseguirem resultados excelentes neste tempo curtíssimo, a Associação resolveu criar a Companhia convidando o professor Valério para dirigi-la, já que o mesmo soube tão bem aproveitar o pessoal disponível. Em 12 de março de 1981 uma nota no Segundo Caderno do jornal Zero Hora chama a atenção de muitos bailarinos. A Associação dos Professores de Dança do Rio Grande do Sul promove a seleção de bailarinos para fazer parte de sua Companhia de Dança. Segundo a nota, seriam selecionados 14 bailarinos fixos e 16 com bolsa de estudos, para ambos os sexos. Carmina Burana, o primeiro espetáculo, já estava com data marcada: 26 de abril. Pela primeira vez na história da dança de Porto Alegre estaria sendo formada uma Companhia de Dança com a participação de bailarinos profissionais. Segundo Dreher, Queiroz e Steckert (2004) era a realização de um sonho. Era a chance de trabalhar naquilo que gostavam sem precisar sair de sua própria terra, sem precisar tentar vencer em outros lugares. Segundo a crítica de Heemann (1981): uma iniciativa de mérito. A resposta foi tamanha e o nível dos bailarinos tão acima do esperado que a seleção teve que ser feita em mais de um dia. Só assim poderiam analisar as possibilidades dos 50 bailarinos inscritos. Os critérios de escolha do elenco fixo não se limitaram apenas à técnica, mas principalmente à sensibilidade e responsabilidade artística dos bailarinos. A idéia inicial da Companhia era trabalhar sempre junto com a OSPA (Orquestra Sinfônica de Porto Alegre) e, além de Carmina Burana montar mais quatro obras grandes e dezesseis medianas. O espetáculo Carmina Burana foi um sucesso e um marco na carreira dos bailarinos, principalmente 278 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

279 porque, para esta montagem, pela primeira vez no município de Porto Alegre, foi concedido o Prêmio Açoriano de Dança, categoria que até então não existia. A pré-estréia, conforme já dito, se deu em 26 de abril no Clube Aliança na cidade de Novo Hamburgo. As demais apresentações foram no Salão de Atos da PUC (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul) nos dias 28 e 30 de abril e dois e três de maio. Contaram com a parceria da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, regida por Túlio Belardi e mais quatro corais convidados. As coreografias nos mostraram sete paisagens distintas dos conflitos humanos segundo as músicas de Carl Orff. Houve, entretanto, apenas essas apresentações, cujo patrocínio inicial era da Secretaria de Cultura, Desporto e Turismo e apoio da Rede Brasil Sul de Comunicações (RBS). A associação não obteve êxito em relação a patrocinadores e nem apoio do governo e, por motivos que até hoje os ex-bailarinos questionam, o grupo acabou por se dissipar. Eles não sabem ao certo quais foram os empecilhos que impediram os planos da Companhia Estadual de serem levados adiante. Foram três dias de seleção, e participaram centenas de bailarinos de todo o Brasil e de países vizinhos. A companhia foi idealizada pela ASGADAN, na época presidida por Eva Landes, com o apoio da PUC e do próprio Estado. [...] Dois meses depois, ninguém... nenhuma satisfação. Alguns especulam que, uma vez que as próprias escolas patrocinavam a existência do grupo, as mesmas escolas se desentenderam por não terem suas próprias alunas representadas na seletiva. Outros especulam que a briga foi no entendimento de quem dirigiria o grupo. Desta seleção e desta indignação surge o Grupo Terra (VALLE; STRACK, 2009). GRUPO TERRA A maioria dos bailarinos se dispersaram com o fim da Companhia Estadual, mas houveram alguns no qual a inquietude e a vontade de vencer foram maior. Esses resolveram se unir e fundar o grupo que seria um dos mais conhecidos do Rio Grande do Sul: Terra Companhia de Dança. Estes bailarinos foram Andréa Druck, Carlota Albuquerque, Carlos Rosito, Eneida Dreher, Eliane Dupuy, Heloiza Paz Vielmo, Luciana Burgos, Maria José Mesquita, Sayonara Pereira, Simone Rorato e o diretor artístico e coreógrafo Valério Césio, todos integrantes da Companhia de Dança que recém acabara. Os objetivos e as motivações da nova Companhia eram similares às daquela que acabava de findar, como podemos perceber na fala de Valério pela entrevista realizada por Campuoco aos integrantes do grupo em 1981: De nossa parte, a fundação do Grupo Terra busca a criação de um grupo artístico e pedagógico de primeiro nível, para o desenvolvimento e difusão de trabalho da maior seriedade e vitalidade, oferecendo obras coreográficas ligadas às problemáticas de nossa época, ao mesmo tempo em que oferecemos também formação de dança o mais completa possível. Além disto, o grupo também visava não ter barreiras estilísticas de nenhuma espécie e elegeu como personalidade a força e a ductibilidade, motivo pelo qual deram ao grupo o curto e eloqüente nome de nosso planeta: Terra (DREHER; QUEIROZ; STECKERT, 2004). O grupo passou por um demorado período de estruturação, incluindo o Cadastramento Nacional como Pessoa Jurídica (CNPJ) e a legalização de contrato de trabalho com o coreógrafo argentino, Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

280 e durante este tempo trabalharam na escola de Eneida, a Simon-Dreher Dance, que mais tarde seria fechada para que a bailarina pudesse dedicarse integralmente à companhia. O Grupo procurou logo uma estruturação como entidade particular, pois este era um dos pontos fracos das tentativas anteriores de formação de uma companhia de dança no Estado. Para isso foram criados departamentos jurídico, administrativo, de arquivos, de correspondência constante com o exterior, de representação artística, de pesquisa técnica e teórica de dança, de capacitação pedagógica, de cenografia e vestuário, de arquivo musical e de difusão e relações públicas. A direção artística estava com Valério Césio e a administrativa com Eneida Dreher. Além dos dez integrantes fundadores que formavam o núcleo da Companhia, já contavam com um grupo adjunto de dezesseis bailarinos que participavam das montagens. Havia também um grupo de bolsistas exclusivamente masculino, cuja formação estava nas mãos do núcleo, levando em conta a dificuldade de encontrar bailarinos homens na cidade, e um grupo de aperfeiçoamento intensivo, exclusivamente feminino, cuja formação também estava nas mãos do núcleo. Os grupos de bolsistas e de aperfeiçoamento intensivo contavam com dez integrantes cada um Após o período de estruturação, dançaram pela primeira vez em 02 de agosto de 1981, no Auditório Araújo Viana para a Campanha do Agasalho. Neste espetáculo foi apresentado Bachianas n 5 de Heitor Villa Lobos e, segundo Heloiza Paz Vielmo (apud COSTA; STUMPF, 2004), foi um momento muito especial para todos nós, e para a Companhia um ótimo início. Em 24 de outubro do mesmo ano apresentaram uma Aula Master no Teatro Renascença, onde Valério comunicou às pessoas especializadas em Porto Alegre os novos rumos de sua técnica com uma palestra ilustrada. A partir do dia 14 de novembro, levaram a dança a lugares inusitados como penitenciárias, centros sociais, hospitais psiquiátricos entre outros lugares. Com o projeto Dança para todos, cultura para a comunidade, mais de 100 mil pessoas assistiram a apresentações do Terra, pessoas, estas, que de outra maneira não poderiam ter acesso a esta linguagem da dança. Além disto, dançaram no Gigante do Beira Rio e na inauguração do Centro Cultural de Montenegro. Um dos símbolos do grupo era uma gota vermelha com purpurina em forma de lágrima utilizada na testa, entre o nariz e os olhos. Nosso protesto, nossa alegria, nossa marca registrada. Desta forma ficamos conhecidos. Conquistamos respeito, admiração e platéia (VIELMO apud COSTA; STUMPF, 2004). A estréia oficial do grupo se deu nos dias 29 e 30 de dezembro de 1981 com um espetáculo feito em duas partes. A primeira Building Clown com música de Astor Piazzola e a segunda Essas Canções que reuniu cerca de uma dúzia de composições de Mercedes Sosa. A esta altura, o Grupo já tinha trinta e duas coreografias montadas. Quando o grupo foi criado, no segundo trimestre de 1981, havia apenas um homem entre os bailarinos. Quando dançaram pela primeira vez na Campanha do Agasalho em agosto do mesmo ano, já havia quase um homem para cada bailarina. Já na época da estréia oficial, o time masculino estava reforçado e recebendo elogios da crítica:... excelente grupo masculino, [...] em sua maioria aparentemente bem mais jovens que as moças, mas demonstrando segurança, concentração e ótimo domínio técnico (HOHLFELDT, 1982). 280 Revista de Iniciação Científica da ULBRA /2010

281 O elenco sofreu algumas variações ao longo de sua existência, porém sua principal formação administrativa e artística era: Maestro, coreógrafo e diretor artístico: Valério Césio; Diretora Administrativa: Eneida Dreher; Diretor de Produção: Rosito Di Carmine; Assistente de Coreografia: Simone Rorato; Departamento Legal: Dr. Arlindo Dreher, Dr. Paulo Wainberg, Dra. Lúcia Brunelli; Departamento Contábil: Bel. Cilo Hummes; Professores estagiários: Simone Rorato, Sayonara Pereira; Fotógrafos: Cláudio Etges, Francisco Filho, Irene Santos, Leko Vielmo e Ricardo Tisser; Massagistas: Antonio e Dario Muto; Auxiliares de produção: Equipe Butterflies, Arq. Regina Graciolli, RP. Maria Tereza Brunelli, Bea Rossato e Profª Zica Vargas; Bailarinos: Eneida Dreher, Rosito Di Carmine, Simone Rorato, Andréa Druck, Margareth Markus, Sayonara Pereira, Heloíza Paz, Carlota Albuquerque, Lucia Brunelli, Ana Holderbaun, Eliane Dupuy, Fabiana Bulgarini, Zezé Mesquita, entre outros. As obras que compunham o repertório da Companhia foram: Carmina Burana, música de Carl Orff (1981); Catulli Carmina, música de Carl Orff (1982); Os Triunfos de Afrodite, música de Carl Orff (1982); Blue (fragmentos da obra A. F. F. Chopin), música de John Lennon (1981); Building Clown, música de Astor Piazzolla (1981); Estas Canções, música de Mercedes Sosa (1981); Batalhas, Música de Astor Piazzolla (1982); Solidões I e II, montagem sonora de música popular (1982); Suspiros I e II, Música de Rodolfo Medeiros (1982); Cartão Postal N 1, música de George Gershein (1982); Vozes, música de Carlos Lyra, Tom Jobim, Baden Powell, Toquinho, sobre poemas de Vinícius de Moraes (1982); Building Birds, música de Astor Piazzolla (1983); Expedientes Extraviados, música de Astor Piazzolla (1983); e Five Inn, música de Villa-Lobos (1983) O Grupo abriu o ano de 1982 com o show Para os olhos nas tardes de domingo, projeto temporariamente patrocinado pelas Lojas Renner que consistiu em apresentações gratuitas durante os três últimos domingos de janeiro ao ar livre nos parques Moinhos de Vento, Marinha do Brasil e Farroupilha. Trinta mil pessoas assistiram às apresentações, lotando literalmente os parques, uma iniciativa inédita para a época, principalmente por contar com o patrocínio de uma grande empresa. Em maio daquele ano, puderam dançar ao lado de Mercedes Sosa, a intérprete das músicas do espetáculo Essas Canções, em participação especial na turnê da cantora quando a mesma passou por Porto Alegre. No mesmo mês estrearam o espetáculo As Solidões, onde mostraram Solidões I, já montada por Césio em 1978, quando ministrou um curso em Porto Alegre e Solidões II, que estreou mundialmente nesta data. Nos meses seguintes, fizeram apresentações sem recebimento de cachê para que a verba fosse destinada à reconstrução do Theatro São Pedro. Pelo depoimento de Eva Sopher (apud COSTA; STUMPF, 2004) podemos notar a importância deste gesto: Revista de Iniciação Científica da ULBRA /

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