Concreto como um Material Estrutural
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- Pedro Henrique Gomes Brunelli
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1 1 Concreto como um Material Estrutural O leitor deste livro provavelmente é alguém interessado na utilização do concreto em estruturas, sejam pontes, edifícios, rodovias ou barragens. Do ponto de vista dos autores, para que seja possível utilizar o concreto de maneira satisfatória, o projetista e o executante devem estar familiarizados com a tecnologia do concreto. Atualmente dois materiais estruturais são os mais utilizados: o concreto e o aço. Algumas vezes eles se complementam e, outras, competem entre si, de maneira que muitas estruturas de mesmo tipo e função podem ser construídas com qualquer um desses materiais. Ainda assim, as universidades e escolas de engenharia ensinam muito menos sobre concreto do que sobre o aço. Isso poderia não ser importante se, na prática, o engenheiro de campo não precisasse saber mais sobre concreto do que aço. Segue uma explicação. O aço é produzido sob condições rigidamente controladas, sempre em um ambiente industrial sofisticado. As propriedades de cada tipo de aço são determinadas em laboratório e apresentadas no certificado do fabricante. Portanto, o projetista de estruturas metálicas precisa somente especificar o aço conforme as normas, e o construtor deve somente garantir que o aço correto seja utilizado e que as conexões entre os elementos sejam adequadamente executadas. Em um canteiro de obras de um edifício em concreto, a situação é totalmente diferente. A qualidade do cimento é garantida pelo fabricante de maneira similar ao aço e, quando um cimento adequado é escolhido, sua qualidade dificilmente será causa de falhas em estruturas de concreto. Entretanto, não é o cimento o material de construção, e sim o concreto. O cimento está para o concreto assim como a farinha está para um bolo, sendo a qualidade do bolo dependente do cozinheiro. É possível obter concreto de qualidade especificada a partir de uma empresa fornecedora de concreto pré-misturado, mas mesmo nesse caso são somente as matérias-primas que são adquiridas. O transporte, o lançamento e, acima de tudo, o adensamento influenciam em muito a qualidade final do produto. Além disso, diferentemente do aço, as opções de misturas são quase infinitas e, portanto, a seleção não pode ser feita sem um sólido conhecimento das propriedades e do comportamento do concreto. Isso é atribuição do projetista e do responsável pela especificação, que determinam a qualidades potenciais do concreto, sendo a competência do
2 2 Tecnologia do Concreto executante e do fornecedor que controla a qualidade efetiva do concreto na estrutura acabada. Ou seja, eles devem estar totalmente familiarizados com as propriedades do concreto e com sua produção e lançamento. O que é o concreto? Uma visão geral do concreto como um material nesse momento é difícil, pois não serão citados conhecimentos específicos ainda não apresentados. Serão então citadas somente algumas características do concreto. O concreto, no sentido mais amplo, é qualquer produto ou massa produzido a partir do uso de um meio cimentante. Geralmente esse meio é o produto da reação entre um cimento hidráulico e água, mas atualmente mesmo essa definição pode cobrir uma larga gama de produtos. O concreto pode ser produzido com vários tipos de cimento e também conter pozolanas, como cinza volante, escória de alto-forno, sílica ativa, adições minerais, agregados de concreto reciclado, aditivos, polímeros e fibras. Além disso, esses concretos podem ser aquecidos, curados a vapor, autoclavados, tratados a vácuo, prensados, vibrados por impactos (shock-vibrated), extrudados e projetados. Este livro considerará somente a mistura de cimento, água, agregados (miúdos e graúdos) e aditivos. Isso gera imediatamente uma pergunta: qual é a relação entre os constituintes dessa mistura? Existem três possibilidades. Na primeira, o meio cimentício, ou seja, os produtos da hidratação do cimento é considerado o principal material de construção, com os agregados cumprindo o papel de enchimento barato ou mais barato. Na segunda, os agregados graúdos podem ser interpretados como uma espécie de pequenos blocos de alvenaria, unidos pela argamassa, isto é, a mistura de cimento hidratado e agregados miúdos. A terceira possibilidade é entender que o concreto consiste em duas fases: a pasta de cimento hidratada e os agregados e, como resultado, suas propriedades são regidas pelas propriedades das duas fases, bem como pelas interfaces entre elas. A segunda e a terceira visão têm algum mérito e podem ser utilizadas para explicar o comportamento do concreto. A primeira, que considera a pasta de cimento diluída pelos agregados, deve ser rejeitada. Suponha que seja possível comprar cimento mais barato que os agregados: você usaria uma mistura somente de cimento e água como material de construção? A resposta é um enfático não, porque as alterações de volume 1 da pasta de cimento hidratada são muito grandes: a retração da pasta de cimento pura é quase dez vezes maior que a retração 2 de um concreto com 250 kg de cimento por metro cúbico. Praticamente o mesmo ocorre com a fluência 3. Além disso, o calor gerado pela hidratação 4 de uma grande quantidade de cimento, principalmente em climas quentes 5, pode levar à fissuração 6. Deve ser destacado também que a maioria dos agregados são menos propensos a sofrerem ataques 1 2
3 Capítulo 1 Concreto como um Material Estrutural 3 químicos 7 que a pasta de cimento, ainda que esta seja bastante resistente. Portanto, independentemente do custo, o uso de agregados no concreto é vantajoso. O bom concreto Vantajoso significa que a influência é boa, e pode ser na verdade, deve ser questionado: o que é um bom concreto? É mais fácil anteceder a resposta citando que o concreto ruim, infelizmente, é um material de construção muito comum. Por um concreto ruim entende-se uma substância com consistência 9 similar a uma sopa, que endurece com aspecto de uma colmeia 10, não homogêneo e fraco. Esse material é produzido simplesmente pela mistura de cimento, agregados e água. O surpreendente é que os ingredientes do bom concreto são exatamente os mesmos, e a diferença é relacionada ao know-how. Com esse know-how, pode ser produzido um bom concreto, e existem dois critérios pelos quais ele pode ser definido: deve ser satisfatório em seu estado endurecido 11, e em seu estado fresco 12, enquanto é transportado da betoneira até o lançamento nas fôrmas. Em geral, as exigências no estado fresco são que a consistência da mistura seja tal que o concreto possa ser adensado 13 com os meios disponíveis no canteiro de obras e que a mistura também seja coesa 14 o suficiente para ser transportada 15 e lançada sem segregação 16 com os meios disponíveis. É óbvio que essas exigências não são absolutas, mas dependem de se o transporte é feito por uma caçamba com descarga pela parte inferior ou por um caminhão comum (claro que esta última não é considerada uma boa prática). Quanto ao concreto no estado endurecido 17, é considerada como exigência usual uma resistência à compressão satisfatória 18. A resistência é invariavelmente especificada porque é fácil de ser medida, embora o número resultante do ensaio certamente não é o valor da resistência intrínseca do concreto na estrutura, mas somente de sua qualidade. Em todo caso, a resistência é uma maneira fácil de verificar o atendimento às especificações 19 e obrigações contratuais. Entretanto, também existem outras razões para a preocupação com a resistência à compressão, já que várias propriedades do concreto estão relacionadas a ela, como: massa específica 20, impermeabilidade 21, durabilidade 22, resistência à abrasão 23, resistência ao impacto 24, resistência à tração 25, resistência a sulfatos 26 e várias outras, mas não à retração 27 e não necessariamente à fluência 28. Não está sendo dito que essas propriedades são simples e exclusivamente função da resistência à compressão, e uma questão bem conhecida é se a durabilidade 29 é mais bem-assegurada pela especificação da resistência 30, da Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo
4 4 Tecnologia do Concreto relação água/cimento 31 ou do consumo de cimento 32. O ponto é que, de forma muito geral, um concreto de resistência mais elevada tem mais propriedades desejáveis. Um estudo detalhado de tudo isso é sobre o que trata a tecnologia do concreto. Materiais compósitos O concreto tem sido citado como um material bifásico. Agora esse tema será aprofundado, com ênfase no módulo de elasticidade 33 do material compósito. Em termos gerais, um material compósito, constituído por duas fases, pode ter duas formas fundamentalmente diferentes. A primeira delas é um material compósito ideal duro, que tem uma matriz contínua constituída por uma fase elástica com alto módulo de elasticidade e partículas de menor módulo dispersas. O segundo tipo de estrutura é a de um material ideal macio, constituído por partículas elásticas com alto módulo de elasticidade, dispersas em uma fase matriz contínua com módulo mais baixo. A diferença entre os dois casos pode ser grande quando se calcula o módulo de elasticidade do compósito. No caso de um compósito duro, considera-se que a deformação é constante em qualquer seção transversal, enquanto as tensões nas fases são proporcionais ao seu módulo respectivo. Esse é o caso da Fig (esquerda). Por outro lado, para um material compósito macio, o módulo de elasticidade é calculado a partir da consideração de que a tensão é constante em qualquer seção transversal, enquanto a deformação nas fases é inversamente proporcional ao módulo respectivo. Isso está representado na parte direita da Fig. 1.1, e as equações correspondentes são: para um material compósito duro e para um material compósito macio onde E = módulo de elasticidade do material compósito E m = módulo de elasticidade da matriz E p = módulo de elasticidade da fase particulada g = fração volumétrica das partículas Não se deve ver de forma ingênua a simplicidade dessas equações e concluir que tudo o que deve ser conhecido é se o módulo de elasticidade do agregado é maior ou menor que o da pasta. O fato é que essas equações representam limites para o módulo de elasticidade do compósito. Como na realidade a distribuição dos agregados no concreto é aleatória, sequer os limites podem ser alcançados, tampouco podem ser Capítulo 19 33
5 Capítulo 1 Concreto como um Material Estrutural 5 Tensão = 2 matriz partículas matriz partículas 1 g g 1 g g (a) (b) Figura 1.1 Modelos para: (a) material compósito duro e (b) material compósito macio. atendidos os requisitos de equilíbrio e compatibilidade. Para fins práticos, uma aproximação razoável é dada pela expressão para os materiais macios para misturas com agregados normais 34. Para misturas com agregados leves, a expressão para materiais compósitos duros é mais apropriada. Do ponto de vista científico, existe algo mais a ser dito sobre o enfoque bifásico e que pode ser aplicado para a fase cimentícia sozinha como uma espécie de segundo passo. A pasta de cimento 36 pode ser vista como constituída de grãos duros de cimento anidro em uma matriz macia de produtos de hidratação 37. Os produtos de hidratação, por sua vez, consistem em poros capilares 38 macios em uma matriz dura de gel de cimento 39. Equações apropriadas podem ser facilmente apresentadas, mas, para o objetivo atual, é suficiente saber que rígido e macio são termos relativos e não absolutos. Papel das interfaces As propriedades do concreto são influenciadas não somente pelas propriedades de suas fases constituintes, mas também pela existência de suas interfaces. Para analisar esse aspecto, deve-se destacar que o volume ocupado por um concreto fresco adequadamente adensado é um pouco maior do que seria o volume compactado dos agregados contidos nesse concreto. Essa diferença significa que não há um contato direto entre as partículas de agregados, mas sim que elas estão separadas umas das 34 Capítulo 3 35 Capítulo
6 6 Tecnologia do Concreto outras por uma fina camada de pasta de cimento, ou seja, estão cobertas pela pasta. Essa diferença de volume é tipicamente 3%, às vezes mais. Um corolário dessa observação é que as propriedades mecânicas do concreto, como a rigidez, não podem ser atribuídas às propriedades mecânicas da aglomeração de agregados, mas sim às propriedades individuais das partículas dos agregados e da matriz. Outro corolário é que a interface influencia no módulo de elasticidade do concreto. A importância das interfaces é apresentada no e uma figura nesse capítulo (Fig. 6.11) mostra as relações entre tensão-deformação 40 para os agregados, a pasta de cimento pura e o concreto. Aqui surge um primeiro paradoxo: o agregado sozinho apresenta uma relação tensão-deformação linear, da mesma forma que a pasta de cimento pura; entretanto, o material compósito constituído pelos dois, ou seja, o concreto, tem uma relação curva. A explicação se deve à influência das interfaces, conhecidas como zona de transição (), no desenvolvimento de microfissuração 41 nessas interfaces quando submetidas a carregamentos. Essas microfissuras se desenvolvem progressivamente nas interfaces, em ângulos variáveis com as tensões aplicadas; portanto, ocorre um aumento progressivo na intensidade da tensão localizada e na magnitude da deformação. Assim, a deformação aumenta em uma velocidade maior que a tensão aplicada e a curva tensão-deformação continua a se curvar com um comportamento aparente pseudoplástico. Forma de abordagem do estudo do concreto A apresentação feita introduziu vários termos e conceitos que podem não ser bem claros ao leitor. O melhor procedimento é estudar os capítulos seguintes e então retornar a este. A ordem de apresentação é a seguinte. Inicialmente, os ingredientes do concreto: cimento 42, agregados normais 43 e água de amassamento 44. Em seguida, o concreto no estado fresco 45. O capítulo seguinte discute a resistência do concreto, sendo esta, uma das propriedades mais importantes do concreto e sendo sempre destacada na especificação. Tendo sido instituído como produzir concreto e o que é fundamentalmente exigido, abordam-se algumas técnicas: mistura e manuseio 47, uso de aditivos para modificar propriedades nesse estágio 48 e métodos de tratar os problemas com temperatura 49. Nos capítulos seguintes, são tratados o desenvolvimento da resistência 50, outras propriedades resistentes além da resistência à compressão e à tração 51 e o comportamento sob tensão 52. Em seguida, aborda-se o comportamento em ambientes normais 53, durabilidade 54 e, em um capítulo separado, a resistência ao gelo e degelo Capítulo 3 44 Capítulo Capítulo 7 48 Capítulo 8 49 Capítulo 9
7 Capítulo 1 Concreto como um Material Estrutural 7 Após o estudo das diversas propriedades do concreto, são abordados os ensaios e a verificação da conformidade às especificações 57 e finalmente a dosagem 58, pois afinal de contas é isso que um engenheiro deve ser capaz de fazer de maneira a escolher a mistura adequada para um determinado uso. Dois capítulos ampliam o conhecimento sobre materiais menos comuns: o concreto leve 59 e os concretos especiais 60. Como fechamento, são revisadas as vantagens e desvantagens do concreto como material estrutural. 50 Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo
Sumário. 1 Concreto como um Material Estrutural 1. 2 Cimento 8
Sumário 1 Concreto como um Material Estrutural 1 O que é o concreto? 2 O bom concreto 3 Materiais compósitos 4 Papel das interfaces 5 Forma de abordagem do estudo do concreto 6 2 Cimento 8 Produção do
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