Caracterização da atividade produtiva do fruto Açaí (Euterpe-oleracea Mart) no Baixo Tocantins: comunidade Costa Maratauíra, Abaetetuba/PA.

Transcrição

1 Caracterização da atividade produtiva do fruto Açaí (Euterpe-oleracea Mart) no Baixo Tocantins: comunidade Costa Maratauíra, Abaetetuba/PA. Characterization of productive activity of the fruit of the acai (Euterpe oleracea Mart-) in the Lower Tocantins: Costa Maratauíra community, Abaetetuba / PA. MONTEIRO, Adelson da Silva¹; SILVA, Rozangela Sousa da ²; COSTA, Ana Paula Dias 2. ¹Faculdade Ideal, Belém, PA, adelsonmsilva@yahoo.com.br; ²Universidade Federal do Pará, Belém, PA, rozsilva@hotmail.com; apd.costa@terra.com.br. Resumo: A palmeira do açaí (Euterpe-oleracea Mart) é bem marcante na região de estuário Amazônico, fazendo parte da composição da floresta de várzea. Sua importância na vida do ribeirinho vai além do consumo de subsistência, é cultural, e traz grande contribuição para a economia da cidade, pela produção, comercialização e exportação dos subprodutos. Este trabalho tem como objetivo identificar e caracterizar as diversas formas de cultivo, manejo e comercialização do fruto açaí, desenvolvidas pelas famílias da comunidade Costa Maratauíra, Abaetetuba/PA. Os métodos incluíram levantamento bibliográfico, entrevistas, com informantes chaves da comunidade e aplicação de questionários semiestruturado. O estudo demonstrou a presença forte e determinante do açaí na vida dos ribeirinhos como gerador de renda, alimento e identidade cultural. Palavras-chave: área de várzea, estuário amazônico, ribeirinho, consumo de subsistência. Abstract: The açaí palm tree (Euterpe-oleracea Mart) is very outstanding in the Amazon estuary region, being part of the composition of the floodplain forest. Its importance in the riverine populations lives goes beyond the subsistence consumption; it s cultural, and brings on a great contribution to the city's economy through the production, commercialization and exportation of by-products. This work aims to identify and characterize the different ways of cultivation, handling and commercialization of the açai fruit, developing by the families from the community Costa Maratauíra, Abaetetuba/PA. The methods included: literature survey, interviews with the main agents from the community, and application of semi- structured questionnaires. The study demonstrated the intense and determinant presence of the açai culture in the riverine populations lives as a generator of income, food and cultural identity. Keywords: floodplain area; Amazon estuary; riverine populations; subsistence consumption. Introdução A palmeira do açaí (Euterpe-oleracea Mart) é bem presente nessa região de estuário Amazônico, fazendo parte da composição da floresta de várzea. Sua importância na vida do ribeirinho vai além do consumo de subsistência. Registrado nas literaturas como prato típico da região consumido por séculos, seu consumo é ancestral (MOURÃO, 2010). 1

2 Nas últimas três décadas, o açaizeiro vem se destacando por seu impacto positivo na economia paraense. A produção de frutos, que provinha quase que exclusivamente do extrativismo, a partir da década de 1990, passou a ser obtida também de açaizais nativos manejados e de cultivos implantados, principalmente nas áreas de várzea (PINHEIRO; FERREIRA, 2010). O município de Abaetetuba destaca-se na produção de açaí, pelo grande número de açaizais, cultivados pelos ribeirinhos das diversas ilhas do município. O fruto é alimento indispensável para a grande parcela da população Abaetetubense. Além de fazer parte da dieta, é cultural, e traz grande contribuição para a economia da cidade, pela produção, comercialização e exportação dos subprodutos. Na economia, a atividade predominante é o setor de comércio e serviços, que conta com uma ampla rede de estabelecimentos das mais diversas atividades, além de oferecer uma ampla variedade na área da alimentação. Podemos destacar alguns desses alimentos: pescados, mariscos e os dos diversos frutos, como o açaí (Eutepe oleracea), pupunha (Bactris gasipaes), manga (Mangifera indica.), bacuri (Platonia insignis), cupuaçu (Theobroma grandiflorum), que em grande parte são oriundos das ilhas próximas que abastecem a feira do município. Na tentativa de perceber e compreender as informações sobre as estratégias adotadas no sistema de produção de ribeirinhos, o estudo em questão visa identificar e caracterizar as diversas formas de cultivo, manejo e comercialização do fruto açaí, desenvolvidas pelas famílias da ilha de Costa Maratauíra. Metodologia Delimitação do local A microrregião de Cametá mais conhecida como Território do Baixo Tocantins, é formada por três rios de grande expressividade no cotidiano de sua população, são os Rios Mojú, Pará e Tocantins. Composto pelos municípios de Abaetetuba (Figura1), Igarapé- miri, Cametá, Mocajuba, Baião, Limoeiro do Ajurú, e Oeiras do Pará (IDESP, 2013) e pelas majestosas áreas de várzea e terra firme, todo esse ecossistema apresenta extensa relação da população com o meio natural (Cardoso et al., 2007). 2

3 Fonte: Google Maps (2014), elaboração dos autores. Figura1: Mapa de localização do município de Abaetetuba Geograficamente o município de Abaetetuba está localizado há de latitude sul e de longitude a oeste de Grenwich. Limita- se ao norte com o Rio Pará e o município de Barcarena, a leste com o município de Mojú, e oeste com o município de Igarapé- Miri, Limoeiro do Ajuru e Muaná (IDESP, 2013). A comunidade da ilha Costa Maratauíra, distante aproximadamente de 30 a 40 minutos, da sede do município, tem seu acesso unicamente pelo rio Maratauíra, nome este que a dá origem. Tem em sua economia a dinâmica de extração e comercialização de produtos florestais não madeireiros e a pesca. Sendo uma das principais fornecedoras do fruto açaí, na feira da cidade. Na comunidade de Costa Maratauíra o consumo de açaí é passado de geração em geração, e está presente todos os dias nas mesas das famílias como componente da alimentação básica. A tradição também impera nos ensinamentos sobre manejo, cultivo, e coleta do fruto, além do uso de técnicas implantadas, e das tradicionais ferramentas ainda rústicas, utilizadas como: rasas, peneiros e peconhas, confeccionados na própria comunidade (Figura 2). Sem contar com a mão de obra nativa utilizada, contratada pelos ribeirinhos, para a retirada do fruto e extração de palmito, segundo eles, processo responsável pela renovação do plantio. 3

4 Foto 1: Adelson Monteiro, Figura 2: Utilização da mão de obra nativa e de objetos tradicionais na coleta do fruto. Amostragem A pesquisa foi realizada de julho a agosto de 2014 na comunidade Costa Maratauíra que apresenta 60 famílias, deste total foram entrevistados 25. O critério de escolha dos entrevistados restringiu-se ao sistema de produção e comercialização do fruto. Para sistematização dos dados foram aplicados 25 questionários semiestruturados, que consistia: na descrição do produtor, condição fundiária, via de acesso, transporte, cultivo, manejo e formas de comercialização do fruto açaí e entrevistas com informantes chaves da comunidade. Foram utilizados dados secundários de órgãos oficiais, IBGE e IDESP; levantamento bibliográfico existente acerca da atividade de manejo e comercialização no município de Abaetetuba. A partir da análise dos dados, partiu-se então para a identificação e caracterização do sistema de produção. Resultados e discussões Em análise ao Na observação do sistema de produção identificaram-se características relacionadas ao cultivo, manejo e comercialização do fruto açaí na comunidade. Observadas no quadro 1. 4

5 Quadro 1: Caracterização do sistema de produção desenvolvidas pelos ribeirinhos na ilha Costa Maratauíra: Características Cultivo Manejo Mão de obra Coleta do fruto Normalmente ocupa a área total do terreno. Parte do plantio é nativa e a outra é enriquecida com mudas nativas. As mudas para a formação de novas áreas são provenientes das áreas nativas. O plantio é feito em área de várzea. É utilizado manejo tradicional com pouca intervenção técnica, consiste em áreas sem espaçamento de touceira para touceira, limpeza da área e das linhas formadas, manualmente, com corte das folhas e galhos de outras espécies de árvores com terçados e facão. São deixadas três árvores por touceira. No desbaste, as touceiras em que o número de árvores excede três são cortadas e retiradas o palmito, os restos das árvores são deixados no local para apodrecimento e fertilização do solo. A mão de obra é familiar e a contratada é absorvida de membros da comunidade, para a coleta do fruto açaí (Euterpe oleracea Mart) e também para extração do palmito. Essas contratações são feitas somente no período de safra que vai de Agosto até Dezembro. O valor pago na safra de 2013 girou em torno de R$30,00, trabalhado quatro dias semanais, realizadas geralmente no período da manhã, das 06:00hs às 09:00hs. Na entre safra não há contratação de mão de obra externa, é utilizado apenas à mão de obra dos familiares. A coleta é totalmente artesanal, com as seguintes práticas: 1) utilização de plásticos, embaixo dos açaizeiros, com o intuito de reduzir o desperdício do fruto; 2) para a coleta dos frutos utilizam peconhas (folha da palmeira torcida e enrolada em forma de círculo); o fruto é debulhado (retirado do cacho) em rasas e peneiras, fabricados na comunidade; em seguida é feita a seleção dos frutos, onde os caroços mais escuros são separados do paral (fruto em fase de amadurecimento) pra em fim ser comercializados. 5

6 O acesso e o escoamento da produção são feitos unicamente por meio fluvial. Transporte Comercialização O fruto é transportado em rasas (cestas confeccionadas artesanalmente com fibras de arumã (Ischnosipham Spp) em rabeta (pequena embarcação em madeira com um motor de alta velocidade), e barcos freteiros (embarcações em madeira, de médio porte, que transportam passageiros e mercadorias). A Comercialização se dá de três formas: 1) o fruto é levado pelo ribeirinho até a feira em embarcação própria ou em barcos freteiros, e vendido para batedores de açaí; ou 2) o ribeirinho leva o fruto até a feira em embarcação própria ou em barcos freteiros e vende para atravessadores; e 3) o atravessador vai até as comunidades comprar o fruto, e comercializa na feira para batedores de açaí ou transporta para outros municípios. As características apresentadas mostram um sistema de produção de base agroecológica com potencial para a produção de açaí orgânico. Por adotarem práticas de manejo tradicional, envolvendo coleta, extração artesanal, sem intensificação da atividade, sem utilização de insumos químicos e conservando os recursos naturais disponíveis. Como acredita Altieri (2000), as estratégias baseadas na participação, capacidades, e recursos locais aumentam a produtividade enquanto conservam a base de recursos naturais. Observa-se também que a influência do atravessador é evidente e significativa, principalmente quando se refere à venda do fruto açaí para as indústrias. Setor responsável pelo maior valor pago ao produto. No entanto, as formas de se comercializar o fruto e a forte atuação dos atravessadores, expressa um baixo nível de organização dos ribeirinhos na ilha. Onde poucos conseguem benefícios com o cenário atual, do fruto, que ganha reconhecimento do consumidor nacionalmente e internacionalmente, processo que facilita a comercialização. Apesar da grande influencia do mercado externo impulsionado pela dinâmica da demanda pelo fruto do açaí, ter conduzido a uma mudança por parte dos ribeirinhos que passam a buscar por novas alternativas de exploração do açaí (NOGUEIRA, 2011). Os ribeirinhos da ilha Costa Maratauíra, mantem-se em bases agroecológicas, dada a importância do sistema atual de produção. Justifica-se entender as características adotadas como incentivo gerador de benefício positivos para esta localidade e outras. 6

7 Esse processo é bem observado pelo autor Pinheiro e Ferreira (2010), ressaltando a importância do açaizeiro no cotidiano sócio econômico, cultural e ambiental dos ribeirinhos da região Amazônica. Dentre os magníficos sistemas agroflorestais que se projetam nos estabelecimentos familiares em grande parte na zona rural da cidade, riquíssimos em espécies frutíferas, o açaizeiro tem se destacado como componente desse ecossistema, pela facilidade de reconstituir o revestimento florístico, além de ser importante fonte de alimento e de renda para as populações ribeirinhas exercendo, assim, forte influência na atual dinâmica territorial, econômico-social e cultural de significativas parcelas das populações que habitam esses ecossistemas (PINHEIRO; FERREIRA, 2010). Conclusões O açaí é uma cultura predominantemente dos ribeirinhos, sua produção e os recursos disponíveis na comunidade conferem à dinâmica da natureza local. Papel forte e determinante em suas vidas e em seu trabalho, como gerador de renda, alimento e identidade cultural. Neste sentido, caracterizar a atividade produtiva, possibilita estratégias a serem conduzidas na comunidade, que visem proporcionar um nível de organização dos ribeirinhos com eficiência produtiva e equidade social, para que possam abarcar as políticas públicas disponíveis e facilitar o processo de desenvolvimento local, a partir da conservação e uso de técnicas sustentáveis, dos açaizais. Agradecimentos Agradeço primeiramente a Deus, por não me deixar fraquejar quando fui tentado a abandonar meus sonhos por causa de inúmeros obstáculos que surgiram durante toda esta caminhada. Agradeço também a minha mãe Maria Benedita pela educação que me deu, orientando-me e dando-me força para que nunca desistisse e a meu pai Antônio (in memória), pela postura que deveria tomar diante das dificuldades, aos meus irmãos que sempre apoiaram na concretização deste sonho, aos amigos que estiveram juntos nesta caminhada, a Rozangela e Ana Paula, orientadora e coorientadora respectivamente, pela intensa dedicação, construção e conclusão deste artigo, e a minha filha Amanda de Cássia, a qual se tornou razão principal da minha existência e faz-me cada vez mais ir à busca da concretização dos meus sonhos. Referências bibliográficas 7

8 ALTIERI, M. A. Agroecologia: a dinâmica produtiva da agricultura sustentável. Porto Alegre: UFRGS, p. CARDOSO, A. C., CARVALHO, G. Planos diretores no Tucupi: a experiência de elaboração de planos diretores na região do Baixo Tocantins, estado do Pará. In. Planos diretores participativos: experiências amazônicas. Belém: EDUFPA, PINHEIRO, P.W. dos S., FERREIRA, D.da S., A cultura do Açaí na várzea Amazônica: Circuito espacial produtivo e comercial do açaí nas ilhas de Abaetetuba/PA. Anais do XVI encontro nacional dos Geógrafos. Porto Alegre, julho de Disponível em: Acessado em 19 de agosto de IDESP-Instituto de Desenvolvimento Econômico, Social e Ambiental do Pará. 2013, disponível em: acessado em: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico, Disponível em: Acessado em: 28 de Agosto MOURÃO, Leila. História e natureza: do açaí ao palmito. Revista Territórios e Fronteiras, Mato Grosso, v.3, nº 2, Jul/Dez NOGUEIRA, A.K.M. As tecnologias utilizadas na produção de açaí e seus benefícios socioeconômicos no estado do Pará. Dissertação de mestrado em ciências florestais da Universidade Federal Rural da Amazônia. Belém, p. 8