DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Transcrição

1 1 DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL Nº APELANTE 1: MUNICÍPIO DE DUQUE DE CAXIAS APELANTE 2: LUISA VICTORIA BAIENSE DA SILVA APELADOS: OS MESMOS RELATOR: DES. GABRIEL ZEFIRO APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. QUEDA EM BUEIRO NA VIA PÚBLICA. OMISSÃO ESPECÍFICA DO ESTADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. DEVER DE INDENIZAR QUE FOI CORRETAMENTE AFERIDO. CABIMENTO DO DANO MORAL. VÍTIMA COM 06 (SEIS) ANOS DE IDADE À ÉPOCA DO SINISTRO. CORTE PROFUNDO NA PERNA ESQUERDA, ABAIXO DO OELHO, COM NECESSIDADE DE EXTENSA SUTURA NO LOCAL. TRAUMAS E SOFRIMENTOS ALÉM DO NORMAL. VALOR DA INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE DANO MORAL QUE DEVE SER MAORADO PARA R$ ,00 (DEZ MIL REAIS). DANO ESTÉTICO DEVIDAMENTE CONFIGURADO. O FATO DE A CICATRIZ VIR A SE TORNAR MENOS VISÍVEL COM O TEMPO, NÃO AFASTA A CONDENAÇÃO IMPOSTA. AFETAÇÃO DA VAIDADE FEMININA. QUANTUM INDENIZATÓRIO, NO QUE SE REFERE AO DANO ESTÉTICO, QUE DEVE PASSAR PARA R$ ,00 (DEZ MIL REAIS), DIANTE DAS PECULIARIEDADES DO CASO CONCRETO. DESACOLHIMENTO DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO PELO PERÍODO DE INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. VÍTIMA MENOR DE IDADE QUE NÃO EXERCIA QUALQUER ATIVIDADE REMUNERADA A SER COMPENSADA. MODIFICAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS DAS CONDENAÇÕES. DANO MORAL E ESTÉTICO QUE DEVEM SOFRER A CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO ARBITRAMENTO E UROS DE MORA DO EVENTO DANOSO, NA FORMA DA LEI 9.494/97, COM AS ALTERAÇÕES DA LEI /09. CORREÇÃO MONETÁRIA DO DANO MATERIAL QUE DEVE SER FIXADA A CONTAR DO EFETIVO DESEMBOLSO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA ARBITRADOS NOS TERMOS DA LEI E EM LIMITE RAZOÁVEL. PROVIMENTO PARCIAL DE AMBOS OS RECURSOS, NA FORMA DO ARTIGO 557, 1º-A, DO CPC.

2 2 DECISÃO Trata-se de ação na qual a 2ª apelante alega, em síntese, que, em 20/11/2009, ao caminhar pela calçada da Rua General Manoel Rabelo, no Município de Duque de Caxias, veio, inesperadamente, a cair com o membro inferior esquerdo no interior de um bueiro de águas pluviais, que se encontrava com a grade de proteção quebrada, localizado rente ao passeio público, padecendo, de imediato, de intensas dores. Afirma que os danos que sofreu têm uma origem: o descumprimento da responsabilidade objetiva do réu, de garantir a incolumidade física do cidadão, através da adequada manutenção e conservação de seus equipamentos instalados em via pública. Assim, requer a condenação do Município no pagamento de dano material, moral e estético, bem como ao pagamento de todo o período de incapacidade física da parte autora, a ser determinado em perícia médica. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar o Município de Duque de Caxias no pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de dano moral, R$ 5.000,00 (cinco mil reais) de dano estético e R$ 76,95 de dano material. Impôs ao réu, ainda, o pagamento das custas e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação. Apelação tempestiva do MUNICÍPIO DE DUQUE DE CAXIAS, às fls. 144/154, na qual alega, em síntese, que o valor arbitrado a título de dano moral se mostrou excessivo, devendo ser reduzido; que o marco inicial dos juros de mora e da correção monetária devem ser estabelecidos a contar da sentença, com observância da Lei 9.494/97; que a condenação por dano estético é incabível, visto que não restará qualquer marca do evento lesivo ocorrido e que os honorários advocatícios foram fixados de forma incorreta, devendo ser reconhecida a sucumbência recíproca.

3 3 Apelação tempestiva de LUISA VICTORIA BAIENSE DA SILVA, às fls. 155/171, na qual pretende a reforma parcial da sentença sob a alegação, em síntese, de que o quantum indenizatório a título de dano moral e estético deve ser majorado, por não ter sido observado o caráter compensatório e punitivo da reparação extrapatrimonial; que se mostrou equivocado o fundamento utilizado pelo magistrado para afastar o pedido de indenização pelo período em que restou comprovada a incapacidade total temporária da autora, pois o eventual salário que recebe, ou a ausência dele, é apenas um parâmetro para a base de cálculos da indenização da incapacidade, temporária ou permanente, sendo que, até mesmo o adolescente, a criança, a dona de casa e o estudante, possuem direito à indenização pelo período de incapacidade total temporária. Por fim, no tocante à indenização a título de dano material, afirma que o marco inicial dos juros de mora deve ser a data do fato danoso, ou seja, a partir do desembolso das mencionadas despesas (...). Contrarrazões da segunda apelante às fls. 174/181 e do primeiro recorrente às fls. 182/189. O Ministério Público ofereceu o parecer de fls. 215/223, opinando pelo desprovimento do recurso da autora e provimento parcial do recurso do réu, apenas no que se refere ao termo inicial dos juros e correção monetária. É o relatório. Os fatos da causa são incontroversos. A autora, quando caminhava com sua genitora pela via pública, caiu em um bueiro que se encontrava com a grade de proteção danificada, sofrendo corte em sua perna esquerda.

4 A sentença acolheu o pedido de indenização a título de dano moral e estético, fixando cada um em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), bem como determinou o reembolso dos gastos farmacêuticos correspondentes ao acidente em questão. 4 A hipótese em julgamento não é de omissão genérica no tocante ao serviço estatal, mas específica. O ente público tem o dever de zelar pela manutenção da via pública; é o dever genérico. Contudo, cabia-lhe fechar corretamente o bueiro que se encontrava indevidamente aberto; é o dever específico (00021/ fotos do local). A demora em tomar as providências necessárias para o reparo do bueiro em questão, ou mesmo em adotar providências imediatas de isolamento da área, foi a causa eficiente para a ocorrência do sinistro em questão. Portanto, daí decorre o dever de indenizar do ente público, tal como corretamente concluiu o magistrado a quo. Tanto assim que o Município de Duque de Caxias não contesta a obrigação de reparar o dano moral reclamado. Insurge-se apenas contra o valor arbitrado, ao argumento de que seria excessivo. Dessa mesma condenação, a autora persegue a majoração. Assim, passa-se à análise desse tópico. A apelante, à época do acidente, encontrava-se com 06 (seis) anos de idade. Precisou ser levada ao Hospital, passando por traumática sutura na extensa ferida em sua perna esquerda. Ora, são inquestionáveis as consequências do acidente sofrido pela autora, que superam, e muito, o simples aborrecimento cotidiano ou mesmo as sensações negativas que os pequenos machucados produzem na vida de quase toda criança e que são resultados comuns das peraltices da infância. Ademais, além do trauma, do susto e do medo que experimentou no momento do acidente, sem dúvida alguma, sofreu as dores físicas de todo o procedimento médico realizado, bem como os inconvenientes padecimentos orgânicos que se sucederam.

5 Por outro lado, até a completa cicatrização da ferida e restabelecimento da saúde, no aspecto geral, sua rotina infantil, provavelmente, deve ter passado por limitações e proibições que a impediram de realizar as mais comezinhas brincadeiras inerentes à sua idade. 5 Nesse contexto, tem-se que a indenização fixada na sentença deve ser revista. Na fixação do valor indenizatório, deve-se atentar aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando-se o locupletamento da parte adversa. O quantum indenizatório deverá corresponder a um valor proporcional ao dano sofrido, bem como suas consequências, atentando-se ao seu caráter punitivo e pedagógico. Assim, mostra-se adequado com os fatos acima narrados o valor para a indenização por danos morais em R$ ,00 (dez mil reais). No tocante ao dano estético, buscam as partes igualmente sua alteração. O 1º apelante persegue a exclusão dessa condenação e a 2ª apelante a majoração do valor fixado a esse título. A análise dos autos indica que no momento do acidente, como já dito, a autora estava com pouco mais de 06 (seis) anos de idade e quando da prova pericial já contava com quase 09 (nove) anos. Por outro lado, sobre o referido tópico, o perito afirmou em seu laudo que presentemente a autora tem cicatriz que configure dano estético, porém com o decorrer do crescimento sua aparência não deverá permanecer inestética (00097/00101-laudo). O que se conclui é que não se encontra correta a afirmação do 1º apelante de que a condenação por dano estético é incabível, visto que não restará qualquer marca do evento lesivo ocorrido.

6 6 O fato de a cicatriz, resultante do corte profundo que sofreu a autora, vir a se tornar menos visível com o decorrer do tempo, não afasta a existência do dano estético, como defende o Município de Duque de Caxias. No caso em julgado, deve ser levada em consideração a vaidade feminina, que se intui será afetada para sempre na vida da autora. Com efeito, desde pequenas as meninas trazem em si a essência do culto ao corpo e do poder da beleza, o que muitas vezes é reforçado com a cultura dos valores ligados ao gênero de fêmea, associados aos padrões reproduzidos pela sociedade em que vive e que são introjetados por sua família; a menina é o espelho da mãe. Assim, é de se concluir que a localização da marca (abaixo do joelho), ainda que se torne mais superficial com o tempo, trará repulsa à autora (00028/00029 fotos da localização do corte). Oxalá se tornará adolescente e depois uma jovem do seu tempo. Então, passará a usar biquínis, saias, vestidos, ou outras indumentárias típicas do universo feminino, em que aparecerá a parte inferior de sua perna com o traço que não conseguirá apagar, ainda que se trate de um leve vestígio em sua epiderme. O constrangimento, a afetação de sua autoestima e o mal estar que passará na frente das pessoas e, em especial, do sexo oposto, é mais que presumível; é certo e defensável. Portanto, não há dúvida que no caso em questão restou devidamente configurada a ocorrência de dano estético. á no que se refere ao valor atribuído a tal condenação, verifica-se que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), fixados na sentença, mostrou-se reduzido frente a relevância do dano. Melhor será fixar a indenização em R$ ,00 (dez mil reais), valor que resultará em correta observância dos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade.

7 7 Passando-se à análise do pedido de pensionamento deduzido pela autora, referentes aos 10 (dez) dias em que esteve incapacitada para as suas atividades normais, o que se conclui é que a sentença mostrou-se correta ao negar tal requerimento. Isso porque, à época dos fatos, como já dito, a vítima tinha apenas 06 (seis) anos de idade. Portanto, não se encontrava em fase da vida que seja permitido o trabalho, ainda que na condição de aprendiz. Com certeza, iniciava-se nos bancos escolares, de onde não resultam prejuízos financeiros a serem compensados. Assim, desarrazoado e sem base legal ou fática o pedido deduzido a título de pensionamento pelo período em que teve a sua capacidade funcional afetada. Analisadas as verbas indenizatórias pleiteadas e acolhidas, passa-se ao exame dos juros e correção monetária que incidem sobre as referidas condenações. De fato, há um pequeno equívoco na sentença que deve ser acertado. O dano moral e o estético deverão ser corrigidos monetariamente a contar da fixação (no caso, da alteração sofrida em sede de apelação) e os juros de mora a partir do evento danoso, nos termos da Lei 9.494/97, com as devidas alterações da Lei /09. Quanto ao dano material, a correção monetária correrá a partir do efetivo desembolso das despesas farmacêuticas, conforme notas fiscais constantes nos autos, e os juros de mora a contar da citação, na forma da Lei 9.494/97, com as devidas alterações da Lei /09.

8 Por derradeiro, deixa-se consignado que, ao contrário do que defende o 1º apelante, a verba de sucumbência foi corretamente aplicada, estando de acordo com a regra emanada do art. 21, parágrafo único, do CPC, não ensejando a sentença qualquer alteração neste ponto. 8 Isto posto, dou parcial provimento a ambos os recursos, na forma do artigo 557, 1º-A, do CPC, para majorar o dano moral e o estético ao valor de R$ ,00 (dez mil reais), cada um, com correção monetária a partir do presente arbitramento e juros de mora do evento danoso, na forma da Lei 9.494/97, com as devidas alterações da Lei /09, e, por fim, para determinar que a correção monetária, em relação ao dano material, passe a contar do efetivo desembolso, com juros de mora a partir da citação, nos termos da Lei 9.494/97, com as devidas alterações da Lei /09. Mantida, no mais, a sentença. Rio, 15 de agosto de RELATOR DES. GABRIEL DE OLIVEIRA ZEFIRO