Há poucos dias a Igreja reviveu o grande mistério da Encarnação de Cristo, vindo na terra para a salvação de todos os homens. Jesus se apresentou a

Transcrição

1 Há poucos dias a Igreja reviveu o grande mistério da Encarnação de Cristo, vindo na terra para a salvação de todos os homens. Jesus se apresentou a nós com a doçura e a ternura de um menino, na simplicidade e na pobreza. O mundo parou e se inclinou para adorá-lo. A liturgia deste domingo nos apresenta a vida da santa família de Nazaré, da qual toda família cristã pode e deve inspirar-se para viver no amor, na alegria e na esperança de encontrar o Cristo. Hoje a liturgia eucarística celebra a família, recordando a Família de Nazaré, família por excelência, porque nela estava presente Jesus, o Santo, como havia dito o arcanjo Gabriel a Maria na anunciação (Lc 1,35). A família é um dom sagrado de Deus; dom que remete às origens da própria raça humana. Toda família cristã deve ter como exemplo a Santa Família para viver no amor, na fé e na esperança. Em nosso tempo cada geração se crê autosuficiente, emancipada. Mas a ruptura dos anéis que une cadeia não favorece ninguém. A emancipação familiar das novas gerações parece trazer liberdade, mas perde-se em proximidade e em intimidade, em afeto e em ternura, em colaboração e em solidariedade. Certo autor escreveu: "Chega a ser um clichê falar da importância da família em nossa vida, mas, como a maioria dos clichês, é pura verdade. Sua família é quem você é. O relacionamento com a família é a fonte primordial de estabilidade e força. Também Jesus cresceu em uma família. Imaginamos a casa de Nazaré como um refúgio de paz e harmonia. Mas o texto do Evangelho que lemos para a festa da Santa Família é surpreendente. Faz 1

2 uma breve referência ao único episódio da vida que o menino Jesus viveu em Nazaré; dele o Evangelho afirma que "crescia em sabedoria, idade e graça diante de Deus e dos homens": depois... silêncio até aos 30 anos. São muitos os ensinamentos que encontramos no Evangelho para a festa de hoje. Em primeiro lugar, o Evangelho faz notar que também a Santa Família teve que enfrentar desilusões e incompreensões. A encarnação do Filho de Deus não lhe poupou o difícil caminho das relações humanas. José e Maria se assemelham a muitos pais que também hoje estão ansiosamente em busca dos próprios filhos. Em segundo lugar o texto do Evangelho apresenta Jesus que cumpre os passos decisivos rumo à maturidade humana e, sublinha que a sua maturidade é integral. Não se pode, de fato, crescer em idade sem avançar no crescimento espiritual. A sabedoria e a graça não se opuseram em Jesus. E não podem opor-se no desenvolvimento evolutivo dos filhos de nossa época. Em terceiro lugar o ensinamento que podemos colher do trecho do Evangelho de hoje é que a narração da perda de Jesus no templo está estreitamente ligada com a narração da sua paixão e morte. Em ambos os casos Jesus fica "perdido" por três dias. Em ambos os casos é "encontrado" enquanto explicava a Escritura: em primeiro lugar é encontrado pela sua própria família, enquanto explicava as Escrituras aos doutores da lei e, mais tarde, depois dos trinta anos, é encontrado e reconhecido pelos aos discípulos de Emaús, ao explicar-lhes as Escrituras: "Não ardia o nosso 2

3 coração enquanto ele nos falava pelo caminho?" E assim Jesus deve ser sempre encontrado. No momento do encontro de Jesus no templo o Evangelho refere algumas perguntas e respostas entre Maria e Jesus. «Filho, por que agiste assim conosco?» Maria faz uma pergunta séria. Não consegue entender seu filho. Esta é a pergunta que muitos cristãos muitas e muitas vezes fazem a Deus. E está certo, pois a oração é, entre outras coisas, um meio de procurar conhecer os desígnios do Senhor sobre a nossa vida. «Por que me procuráveis?» Á pergunta de Maria Jesus responde com esta primeira pergunta. A procura é um comportamento típico dos cristãos. Mas quem procura deve muitas vezes levar em consideração as razões últimas da sua busca: "Por que procuro?" «Não sabíeis que devo ocupar-me das coisas de meu Pai?» Jesus revela a sua obediência irrestrita ao Pai. A expressão propositadamente genérica as «coisas» do meu Pai» indicam a totalidade. Casa, interesses, desejos, vontade, projetos; tudo é para Deus, com ele e nele. Esta pergunta retórica de Jesus é dirigida a todos aqueles que julgam conhecê-lo. Jesus confessa que a lei de Deus é a sua casa e que a casa de Deus é a sua lei. Esta é a sua vocação e a sua missão. Caros irmãos e irmãs, Nazaré evoca a terra de Maria, a mãe de Jesus, a Virgem de Nazaré, a pátria, o lugar de origem das pessoas mais amadas de Deus. Nazaré evoca o seio materno, o ventre virginal de Maria, o beijo do céu. 3

4 Nazaré foi o lugar onde o Verbo se fez carne no silêncio da noite, silêncio de discrição e de mistério. Nazaré foi a casa, o aconchego, a escola de Jesus, o Filho de Maria, o Verbo feito carne. Nazaré foi a testemunha dos dias escondidos, do tempo do anonimato, dos anos íntimos da vida de Jesus, de Maria e José. Então, Nazaré é para nós luz para não perecermos na rotina, ou no tédio da monotonia ou da inércia. Nazaré é ensinamento para não afundarmos no abismo de uma vida cinza e cotidiana, pois é nossa escola de simplicidade e de humildade. Em Nazaré Deus se deixou cuidar, aleitar ao seio, educar; e fez isso na pessoa de seu Filho Jesus. Em Nazaré modelou o seu coração de homem no calor do amor de sua mãe. Em Nazaré Jesus aprendeu com sua mãe que não podia ser apagada a luz porque seria muito difícil acendê-la de novo; que a lâmpada devia ser posta no candelabro para poder iluminar toda a casa. Em Nazaré com sua mãe compreendeu que não se pode por remendo novo em roupa velha, porque o remendo novo repuxa a roupa velha e o buraco se torna maior. Em Nazaré, na escola de Maria, Jesus compreendeu o efeito do fermento, do sal, a fermentação do vinho novo em odres velhos. Em Nazaré, Jesus, observando Maria e José, se tornou um artesão responsável. Nazaré deu identidade ao filho de Maria. Ele foi chamado Jesus de Nazaré, o filho de José o carpinteiro de Nazaré. Nazaré deve ser o ponto de referência dos cristãos, porque é o lugar onde nos é ensinado como 4

5 se vive junto em família, em comunidade; a crescer como pessoas, a amadurecer nas relações, a progredir na graça e no conhecimento das realidades humanas, do ponto de vista de José e Maria que viram todos os acontecimentos de maneira sacramental, transcendente. Nazaré nos ensina a valorizar as coisas de Deus segundo Deus, espelhando-se em Maria e Jesus, que responderam, dóceis, á vontade divina com palavras semelhantes ao: "Faça-se em mim segundo a tua palavra" e "Não seja como eu quero, mas como tu queres, o Pai". Nazaré é o segredo dos dias operosos de Jesus, de sua socialização, dos seus itinerários de solidariedade, de sua pregação coerente, de sua sensibilidade íntima. Ali Jesus viu como a choca reunia os seus pintinhos, ou como o pastor guiava os seu rebanho. De Nazaré Jesus tomou as imagens para as sua parábolas. Nazaré, pequeno vilarejo da Galiléia e lugar da vida da Santa Família representa a inteira vida de todo discípulo para acolher, cuidar e fazer crescer o Senhor no próprio coração e na própria existência. Para todas as famílias enviamos agora uma oração e uma bênção: Ó Deus, nosso criador e Pai, quiseste que o teu Filho, gerado antes da aurora do mundo, se tornasse membro da família humana; reaviva em nós a veneração pelo dom e o mistério da vida, para que os pais se sintam partícipes da fecundidade do teu amor, e os filhos cresçam em sabedoria, idade e graça, rendendo louvor ao teu santo nome. Amém. 5

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