Em tempos de praticar o mutualismo
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- Benedicta Barreto Bonilha
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1 Reflexões Em tempos de praticar o mutualismo Montepios, Tontinas e ROSCA s Montepios Consta que foi Francisco de Assis 1 quem fundou, em 1674, a primeira casa que concedia empréstimos a pobres com garantia de roupas, móveis e outros objectos de casa. Em italiano chamavam-se Monte di Pietá. De Itália a ideia passou para França onde se chamavam Mont-de-Pieté. Para Espanha com o nome de Monte Pio ou Montepio. E para Portugal com o nome de Montepio. Tontinas É outra espécie de associação mútua a que estão associados os Montepios. Foram concebidas inicialmente pelo banqueiro napolitano Lorenzo de Tonti (daí o nome de Tontinas) para angariar fundos para um Cardeal. Funcionavam inicialmente assim: cada membro depositava certa ou certas quantias em dinheiro para constituir uma renda vitalícia que, em data determinada, era repartida pelos membros ou atribuído o saldo da tontina aos sobreviventes. Mais tarde algumas previam o pagamento periódico de rendimentos. Vieram a ser proibidas (na acepção de seguro e levantamento de capital) porque os membros vivos eliminavam-se uns aos outros para diminuírem o leque de pessoas que recebiam o capital investido no fim do prazo 2. ROSCA s Rotating Savings and Credit Associations (associações mútuas de poupança e crédito) Encontram-se um pouco por todo o mundo e com diferentes nomes em diferentes regiões e países. 1 Sendo o Presidente da Assembleia-Geral do Montepio Geral, o Sr. Pe. e Dr. Vítor Melícias, o leader dos franciscanos portugueses, quem melhor para interpretar o pensamento de São Francisco de Assis? Portanto para nos ensinar como deve ser o mutualismo temos seguramente o melhor interlocutor do mundo nas nossas fileiras. 2 Veja-se o filme The Wrong Box com base no romance policial com o mesmo título que retrata essa realidade. 1
2 Estas instituições serão as herdeiras e sucessoras das Tontinas. Consistem num grupo de pessoas, por exemplo 10, que se juntam e associam e contribuem, por mês, com, por exemplo, 20 euros para um fundo durante 1 ano. O elemento mais rico ou o mais capaz é quem fica com o dinheiro. O capital acumulado é emprestado a um dos membros, que paga juros aos membros do grupo e amortiza a dívida ao fim do prazo fixado. O total da ROSCA é devolvido no final aos participantes, conforme ficou inicialmente estipulado, ou aos sobreviventes, ou ao último sobrevivente, ou ao que for escolhido à sorte. São intermediários financeiros do sector financeiro informal com grande impacto nos países em vias de desenvolvimento, no âmbito das políticas de desenvolvimento e alívio da pobreza (microcrédito). Corporate Governance O que quer significar Corporate Governance? É o conjunto de boas práticas a adoptar por uma entidade com vista a um modelo estrutural eficiente quanto: À gestão; Ao relacionamento com os associados; Ao relacionamento com os trabalhadores; Ao relacionamento com os clientes e outras entidades em geral. Trata-se, pois, dos mecanismos que asseguram aos associados uma gestão transparente e o retorno do seu investimento, o que na prática se traduz: Em primeiro lugar, nos modos de eleição dos corpos sociais, no sentido de que quanto maior for a influência dos associados e transparência neste processo, melhor o nível de governance. Em segundo lugar, na separação de funções entre os administradores, na especialização da supervisão (o Conselho Fiscal) de forma a permitir mais transparência e um controlo independente das contas e actos de gestão, além 2
3 da fixação de matérias que constituem conflitos de interesses dos membros dos corpos sociais. Em terceiro lugar, no modelo de relacionamento com os trabalhadores. Um modelo que induz a falta de diálogo ou qualquer forma de retracção da criatividade dos trabalhadores não pode gerar eficiência nos resultados. Em quarto lugar, o relacionamento com os associados e clientes e outras entidades em geral. Quanto aos clientes, pontos como a estratégia do negócio e o controlo de risco, para além das formas de medir a sua satisfação, são critérios para se avaliar da bondade do modelo de governação. Já quanto aos associados, o princípio uma pessoa um voto é sinónimo do melhor que há em matéria de modelo de governação. A ligação Associado Associação (ou seja, participação nas AG segundo o princípio uma pessoa um voto e a maior proactividade nas relações dos órgãos de gestão versus Associado no ínterim entre Assembleias-Gerais) é que é o objectivo máximo, o objectivo essencial das boas práticas a que se reconduz a essência da corporate governance, posto que, como se disse atrás: quanto maior for a influência dos associados, melhor o nível de governance. Sector social da economia Resulta dos artigos 80.º e 82.º da Constituição a existência de três sectores de propriedade dos meios de produção, cuja coexistência o Estado tem que garantir, a saber: Público; Privado; Cooperativo e social. 3
4 O sector cooperativo e social que não é residual compreende especificamente (além de outros casos): os meios de produção possuídos e geridos por pessoas colectivas, sem carácter lucrativo, que tenham como principal objectivo a solidariedade social, designadamente entidades de natureza mutualista. O Montepio Geral Associação Mutualista é uma Instituição Particular de Solidariedade Social. A Caixa Económica Montepio Geral anexa é um estabelecimento dependente do Montepio Geral, não tem fins lucrativos e tem a natureza de uma Pessoa Colectiva de Utilidade Pública. São uma e a mesma unidade económica, com os mesmos fins (não se confundam os fins com o objecto ): os do Montepio Geral. Um dos detalhes que se nota por vezes nas instituições do sector social (no caso as instituições mutualistas) é a tendência para comparar a sua actividade (sector social) com a indústria seguradora (sector privado) em vez de a comparar primeiro com as demais mutualidades e de a inserir no âmbito das demais entidades do sector social: mutualidades, misericórdias e demais entidades de acção social representadas pelo CNIS. E, depois, compará-la com os outros sectores de economia concorrente (pública e privada) e com os demais parceiros da economia social, pelo menos ao nível comunitário. Diz-se, v.g., que o Montepio Geral e a sua Caixa Económica Montepio Geral, apenas divergem das entidades do sector privado porque os resultados não os lucros são para o Montepio e não para os associados, ou seja, são para fins de solidariedade social e não para accionistas ou quotistas. Uma visão redutora, simplista e, por isso, perigosa. Ser uma entidade do sector social consistiria apenas numa questão do destino dos resultados. Ao nível comportamental, ao nível da actuação, seria tudo igual ao sector privado. Há que ter em conta todos os aspectos que terão que diferenciar as entidades dos diversos sectores da economia. 4
5 Não é possível, é certo, definir, pela afirmativa, o conjunto de boas práticas que devem nortear a atitude comportamental de uma entidade do sector social, mas é possível, com bom senso e razoabilidade, definir situações que não se adequam a uma entidade do sector social. O certo parece ser que, as boas práticas, o CÓDIGO DE ÉTICA MUTUALISTA, deve assentar no respeito pelos princípios mutualistas, numa interpretação actualizada mas razoável, sendo seguramente estes o cerne da natureza jurídica das entidades mutualistas, o elemento diferenciador para com as demais entidades do sector privado e do sector público da economia. Seria oportuno pensar se não seria útil criar um Centro de Estudos Mutualistas, v.g. ao nível da União das Mutualidades Portuguesas, cuja competência, além do mais, seria dar parecer sobre as práticas que não se coadunam com a natureza jurídicoconstitucional das instituições. Talvez fosse oportuno, também, criar uma estrutura especializada, autónoma ou não, que saísse da União das Mutualidades Portuguesas, União das Misericórdias Portuguesas e Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social, que servisse de apoio à coordenação, desenvolvimento, promoção e modernização dos estabelecimentos dependentes das Misericórdias, Mutualidades e demais IPSS (falamos de farmácias sociais, caixas económicas e outros estabelecimentos dependentes ou valências, geradores de receitas para a promoção do sector social). E avançando em parceria ou em união com o sector cooperativo, aproveitando a externalização do Instituto António Sérgio. Augusto Vieira 5
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