Preservação documental: Resgatar o passado, facilitar o acesso, construir o futuro



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Transcrição:

Preservação documental: Resgatar o passado, facilitar o acesso, construir o futuro Esther Caldas Bertoletti Técnica consultora em Documentação da Fundação Biblioteca Nacional/MinC Coordenadora Técnica do PROJETO RESGATE BARÃO DO RIO BRANCO Sócia Titular do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro/IHGB I RESGATAR O PASSADO Quando nascemos já encontramos, quer na nossa família, quer na sociedade onde vivemos, um passado que, na maioria das vezes, foi construído, ano após ano, e se materializa, principalmente em papéis... Papéis os mais diversos: nossa certidão de nascimento, de batismo, retratos de nossos avós... A mesma coisa acontece com as sociedades... papéis são acumulados, fotografias são guardadas... tudo a nos contar algo do nosso passado... seja pessoal, seja coletivo... Muitos cuidaram (e houve até alguns que não cuidaram) desses papéis, mas hoje, já conscientes de sua importância, temos a obrigação de preservá-los para os nossos filhos e para os outros membros da sociedade que virão depois de nós... Resgatar o passado é hoje nossa obrigação, e também um preceito constitucional do Estado, pois cada um de nós tem DIREITO a ter acesso à sua história, à sua memória. Conversaremos aqui apenas de papéis, pois já de algum tempo (infelizmente não há tanto tempo atrás como seria desejado) o conceito de patrimônio cultural foi compreendido pela sociedade e cuidou-se de preservá-los, incluindo-se nos bens culturais os monumentos e até o entorno, as cidadesmonumentos, os casarios históricos, as praças, para além dos prédios (igrejas principalmente) e os objetos tridimensionais, sejam os incorporados, como os altares, os lambris, como os agregados, imagens, móveis, como mesas, cadeiras etc.. e demais objetos, os mais diversos. E não nos esqueçamos dos acervos fílmicos, fonográficos, que documentam a memória do cinema e da música, os discos em vinil, os 78 rotações, os long-plays, as fitas cassetes, os Cds, os Dvds e o que mais venha por aí... Não devemos esquecer dos bens imateriais, tão lembrados hoje em dia, e que vêm sendo classificados e tombados seja a níveis internacional, nacional, estadual e mesmo local: manifestações musicais, danças, o fazer artesanal, e até o acarajé...c ujos

registros estão muitas vezes guardados nos vários suportes tradicionais, desde o papel, o fílmico, as cassetes de gravação, as fotografias, etc. etc. etc... Mas, sobre quais papéis gostaria de falar? a) Primeiramente, falaremos dos manuscritos, já que em épocas mais antigas (não estou me referindo aos tempos dos etruscos, obviamente) era através da escrita manuscrita, em papéis artesanais, que os nossos antepassados deixavam o traço de sua presença, seja nos negócios, seja nas famílias, Refirome, também, aos mapas e aos desenhos manuscritos que ajudaram os homens a conhecer e reconhecer as novas terras; b) E temos também os papéis datilografados, produzidos com as máquinas de escrever (muitos dos jovens aqui nem as conhecem) dos quais guardamos com extrema dificuldade as famosas cópias em carbonos, muito esmaecidas...; c) E chegamos ao mundo dos papéis impressos, dos mais variados tipos, avulsos, encadernados, livros, jornais, revistas, plantas, mapas, gravuras, etc... um sem número de tipos de informação que chegaram em suporte papel, das mais variadas qualidades e gramaturas... papéis de trapo, papéis de fibra, papéis modernos... cada vez mais frágeis... Em função dessa fragilidade, comprovada já há algum tempo ( pelo menos na metade do século XX ), por volta dos anos 50, a preocupação em todas as instituições de preservação de memória em qualquer país do mundo tem sido a conservação preventiva, a preservação das informações através de novos suportes ( antigamente tínhamos as cópias dos textos originais, em manuscritos, sempre à mão, depois chegaram os microfilmes, e hoje a forma digital... até a próxima descoberta)... O que muito se discute hoje em dia, nos congressos internacionais da nossa área (bibliotecas, arquivos e centros de informação) é exatamente a grave problemática da preservação dos documentos... seja do ponto de vista de salvaguarda dos originais, da ambientação adequada de sua guarda, até chegarmos às formas alternativas de consulta, para evitar o manuseio que estraga os originais... Vários e importantes centros de preservação, principalmente de Bibliotecas e Arquivos Nacionais, mas sem esquecer as grandes Universidades, que possuem acervos históricos sob sua guarda (estou a me referir às universidades americanas, principalmente) preocupam-se cada vez mais com o problema. E, há vários anos estão a buscar soluções quase que mágicas para a salvaguarda dos originais... Não existe mágica, o que temos é um grande trabalho pela frente, um imenso esforço e, principalmente, muita consciência e algum dinheiro... O que podemos fazer, nós, os profissionais ligados às instituições que custodiam acervos históricos, arquivos municipais, estaduais, nacional, bibliotecas municipais (a Biblioteca Municipal Mário de Andrade possui

acervos raríssimos, quer manuscritos, quer impressos e fotográficos), estaduais e a nossa Biblioteca Nacional, os Institutos Históricos, seja o Brasileiro, sejam os Estaduais ou os Municipais, e tantas outras instituições de memória espalhadas por este nosso imenso país tropical... (abençoado por Deus...)? O que podemos fazer para salvar as coleções que, por algum tempo, estão sob a nossa responsabilidade, como antes estiveram sob a responsabilidade de outros... Todo o nosso esforço hoje deverá estar voltado para a preservação desses acervos... e temos que convencer aos nossos superiores das nossas convicções... Convencê-los a destinar recursos para a salvaguarda dos acervos sob a nossa responsabilidade, pois costumo repetir sempre que cada um de nós é responsável pelo que nos é entregue...somos responsáveis perante os futuros cidadãos, assim como o somos em relação aos nossos filhos e netos... E todo o esforço é pouco... muito já se perdeu... não podemos conscientemente deixar perder nenhum pedaço da nossa história... Temos, pois, de resgatar o passado, com as tecnologias que hoje se nos oferecem, construindo verdadeiros mares-oceanos de documentos, como o que o PROJETO RESGATE está conseguindo realizar. Há, exatamente, cerca de 15 anos, começamos a delinear e a sonhar em trazer, sob a forma de microfilmes, toda a documentação colonial existente no Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa como primeira etapa de um grande e ambicioso projeto. Hoje já temos mais de 300.000 documentos lidos, resumidos em verbetes, microfilmados, digitalizados a partir dos microfilmes, são mais de 3 milhões de páginas manuscritas, mais de 300 anos de história que estavam lá em Lisboa, guardadas em diversas instituições e que foram nos anos 30 reunidas em um único arquivo, o antigo Arquivo Histórico Colonial, hoje Arquivo Histórico Ultramarino ( felizmente ficaram bem guardados, pois Portugal não é um país tropical). Mas falar do PROJETO RESGATE é rememorar o esforço feito por muitos desde a nossa Independência política, em 1822... Efetivamente, desde a criação do IHGB, em 1838, que se opera e sonha em copiar, àquela altura, à mão, os documentos sobre o nosso passado colonial, e muito foi feito neste sentido. Inúmeros foram os copistas que estiveram não só em Portugal como em outros países europeus, principalmente Holanda, França, Espanha, Itália, para trazerem os documentos para que muitos pudessem ler e escrever e/ou reescrever a nossa história... Basta ler José Honório Rodrigues para acompanharmos o labor dos letrados e dos literatos, ao longo dos anos, o esforço do Imperador, dos Governos Republicanos na Primeira República e até mesmo mais recentemente, chegando aos nossos dias. Modernamente, pode ser estabelecido o modus faciendi e operandi e, em cerca de 15 anos, equacionarmos o trabalho, com

resultados bastante concretos e já disponibilizados em mais de 150 instituições espalhadas por todos o Brasil e em alguns países, ao alcance pois de milhares de pesquisadores, com a tentativa de acesso via internet através da Universidade de Brasília/UNB Mas, passemos ao segundo ponto. II- FACILITAR O ACESSO Que significa para nós as palavras facilitar o acesso, acesso livre ( e estamos vendo uma verdadeira guerra entre os americanos e os europeus com relação às bibliotecas digitais disponibilizando obras clássicas, já de domínio público...), nós que trabalhamos em instituições que guardam acervos históricos, que somos procurados diariamente pelos pesquisadores, os nossos leitores/usuários...? Nunca é demais enfatizar que o direito à memória é um direito do cidadão... Podemos nós, sob a desculpa de preservar os originais, negarmos o acesso às fontes do nosso passado? Desde sempre, digo que não... Não podemos e não devemos negar o acesso. Cabe a cada um de nós, em nossas instituições e no nosso tempo presente, encontrarmos as formas alternativas de dar vistas, de dar acesso à informação contida nos documentos, seja aquela informação de interesse privado, do cidadão, que diz respeito à sua vida pessoal, seja àquelas de interesse público de caráter histórico... Se temos Universidades, se temos cursos de mestrado e doutorado, como essas pessoas, esses cidadãos, podem realizar seus trabalhos sem usarem o acervo custodiado em nossas instituições? Há bem pouco tempo uma notícia nos jornais falava que o Brasil lidera, na América Latina, a formação de mestres e doutores ( Jornal VALOR de 05/12/05). Fala a notícia que em 1976 existiam 673 cursos de pós-graduação no Brasil ( e foi nesta época que tivemos os primeiros pesquisadores deslocando-se para Lisboa para consultarem os documentos coloniais, para escreverem as suas dissertações e teses), hoje já são mais de 3.000. Cabe-nos sim, a todos nós dedicarmos o melhor do nosso engenho e arte para organizar e/ou re-organizar, da melhor maneira possível, o acervo; disponibilizá-lo através de suportes alternativos se os originais encontrarem-se muito fragilizados, seja através do tradicional e sempre presente microfilme, seja através da moderna digitalização para preservação uma vez que inibe o acesso direto aos documentos... Mas devemos resolver o impasse. Pois de nada vale guardamos os documentos em cofres, a sete chaves, em arquivos modernos, deslizantes, em prateleiras super ambientadas (o que nem sempre

ocorre, como vocês bem sabem) negando o direito à memória, ao acesso à informação contida nos documentos. Devemos pois encarar o problema de frente... encontrar forças para convencer aos nossos superiores (tarefa sempre muito difícil) a investir dinheiro e pessoal (relembro aqui Carlos Drummond de Andrade, o nosso eterno poeta, em crônica publicada no Jornal do Brasil e na Folha de S.Paulo, saudando o início do PLANO NACIONAL DE MICROFILMAGEM DE PERIÓDICOS BRASILEIROS NA BIBLIOTECA NACIONAL, em 1979) na organização e preservação dos nossos documentos... seja de um passado mais remoto ou do passado mais próximo, pois o que se produz hoje precisa ser também preservado... E hoje, estamos todos enfrentando o problema de como guardar e/ou preservar os documentos produzidos e que só circulam em meios digitais... Os maravilhosos e-mails... os faxes, cujos originais às vezes nos esquecemos de enviar pelo correio... e que tiramos cópias tipo xérox para levarmos a despacho... Diversas tecnologias, chamadas de híbridas, estão hoje a girar em torno de nós, a povoar os nossos sonhos e chamar a nossa atenção e exigir o aprofundar do nosso conhecimento para que possamos escolher uma ou mais de uma, dentre as muitas que se nos oferecem a cada dia... Quantos dados foram se perdendo ao longo dos últimos anos por causa de software escolhidos e que depois perderam as informações, programas de computadores tão criteriosamente escolhidos e que depois perderam-se no tempo e no espaço... Todos nós temos alguma história para contar a respeito... principalmente os mais velhos. Sou daquele grupo que acredita e defende o microfilme... E comigo estão centenas de técnicos das mais importantes bibliotecas e arquivos do mundo... Microfilmar sempre... Digitalizar, às vezes... Mas como fazer e o que fazer?...já existem diversos opções, microfilmar primeiro e digitalizar a partir do microfilme, digitalizar e passar do formato digital para o microfilme... apenas digitalizar... Este tema está na ordem do dia em revistas e congressos nacionais e internacionais. E a cada dia vemos nos jornais projetos considerados salvadores dos acervos, pois estão digitalizando os documentos, sejam jornais, sejam fotos, sejam manuscritos, sejam, mapas, plantas. Tudo bem, vale a pena digitalizar para retirar do manuseio intenso os originais, para melhor guardar os originais, mas tenhamos todos consciência de que a digitalização por si só não preserva... Quanto mais lemos os textos técnicos, mais temos dúvidas e os exemplos que nos levam a ter muita atenção e cautela, chegam de todas as partes, seja do Arquivo Nacional americano, em Washington, seja das Bibliotecas Nacionais da Holanda, da França, de Portugal...

A cada vez vemos aumentar a microfilmagem sistêmica, a preservação pela microfilmagem em massa, contínua dos jornais, das revistas, das coleções manuscritas, dos códices... Exemplos que vamos colhendo aqui e ali, experiências que vamos conhecendo aqui e ali... textos que vamos lendo em revistas técnicas e em anais de congressos, nacionais e internacionais, além das informações que vamos recebendo sugerindo sempre muito bom senso. Inúmeras têm sido as perdas e os danos ocorridos no nosso universo da área de documentação histórica, no mundo ligado ao nosso trabalho... FACILITAR SEMPRE, FACILITAR SIM O ACESSO, mas com todos os cuidados necessários... E tenho a certeza de que os pesquisadores, os nossos usuários e leitores hoje, estão cada dia mais conscientes deste nosso papel de responsáveis, de encarregados da salvaguarda da memória nacional... O reconhecimento, as palavras de agradecimento nas dissertações de mestrado, nas teses de doutorado, nos livros publicados, certamente não são pela facilidades selvagem de acesso, mas pelo acesso consciente... Ousaria até dizer, fazendo um paralelo com uma situação muito comum hoje em dia e que até a Igreja Católica está começando a reconhecer... sexo consciente... por causa da AIDs.. Assim, tenhamos um ACESSO CONSCIENTE POIS... E dediquemos todo o nosso esforço para conseguirmos microfilmar, organizar e preparar, armazenar, bem guardar, o acervo sob a nossa responsabilidade para que dure para além do nosso tempo presente, pois é com esses documentos do passado que iremos CONSTRUIR O FUTURO... III- CONSTRUIR O FUTURO Para concluir, gostaria de dizer-lhes que é garimpando nos documentos do nosso passado que iremos encontrar informações que nos permitirão melhorar o nosso futuro, construir um futuro melhor, mais verdadeiro e digno, para os que virão depois de nós... Muitos de nós estamos semeando para outros colherem... assim foi e assim sempre será... Sejamos nós, aqui e agora, os semeadores na preservação dos documentos que conseguiram chegar até os nossos dias, sobrevivendo às intempéries, à incúria dos homens, aos maus tratos dos consulentes, ao descaso, à inconsciência de tantos... Quantos de nós já nos deparamos com textos-denúncias sobre situações dos acervos documentais, não só no Brasil mas em muitos outros países... As coleções de jornais, do mundo inteiro, merecem destaque... impressos em papéis muito fragéis, por sua própria textura e composição (o papel jornal no mundo inteiro é preparado dentro das mesmas especificações técnicas, seja ele

produzido na Finlândia, no Japão ou no Brasil) e a idéia mesma do JORNAL, ou DIÁRIO é veicular, difundir as notícias no dia, no jour, como se pode depreender do próprio nome... tanto que lemos e descartamos o jornal no dia seguinte... digo descartamos, nós, pessoas físicas, mas nunca as bibliotecas, os arquivos... que precisam guardar a memória do quotidiano... Todos os países possuem as suas Leis de Depósito Legal. O ideal, o sonho, é que tivéssemos uma lei do depósito legal em três níveis, municipal, estadual e nacional. As bibliotecas/arquivos municipais deveriam guardar todos os exemplares de todas as publicações publicadas no âmbito do Município, as estaduais, no âmbito do território estadual, e a nacional, no âmbito do país, da Nação... Lembro aqui a Lei da Imprensa de 1967 que determina a entrega à Biblioteca Nacional e às Bibliotecas Públicas Estaduais, de todos os exemplares dos jornais e outros periódicos editados no âmbito de seus territórios... Mas a maioria das vezes, a Lei não é cumprida... Oxalá possamos um dia alcançar este objetivo, e termos a figura do depósito legal não apenas dos periódicos, sejam jornais ou revistas, mas de todos os impressos em cada território, a níveis municipal, estadual e federal. Assim cada livro, cada periódico teria pelo menos três exemplares de salvaguarda de memória. Não custa sonhar... Existe hoje um PROGRAMA DA UNESCO intitulado MEMÓRIA DO MUNDO, a nível dos documentos, que assim como monumentos edificados, paisagens, cidades, já permite tombar também CONJUNTOS DE ACERVOS (no Brasil temos a Coleção de fotografias do Imperador, da FBN) ou até um único DOCUMENTO! Eu mesma faço parte da Comissão Nacional do PROGRAMA MEMÓRIA DO MUNDO para os documentos, coordenado por Lygia Guimarães do IPHAN... Preservar o passado, facilitar o acesso, construir o futuro através dos documentos... em suporte papel... é nossa responsabilidade e devemos compartilhar esta grande responsabilidade com nossos colegas e nossos superiores... sempre, com muita consciência e dedicação... Sejamos sonhadores, sejamos otimistas, sejamos guerreiros... Muito obrigada. OUTROS TEXTOS : BERTOLETTI, Esther Caldas. Microfilmagem e Memória Nacional. Papéis Avulsos n. 12. Fundação Casa de Rui Brabosa/Ministério da Cultura. Rio de Janeiro, 1994.

Preservação e acesso de acervos documentais históricos considerados como patrimônio comum. In Revista A & B. Lisboa, 1997 Um mar-oceano de documentos. In Brasil e Portugal.Enlaces e Desenlaces. Real Gabinete Português de Leitura, Rio de Janeiro, 2001 Como fazer programas de reprodução de documentos de arquivo. Ed. ARQ/SP.Arquivo do Estado/Imprensa Oficial do Estado. São Paulo, 2002 Preservação da Memória da Imprensa. In Rumo ao Bicentenário da Imprensa Brasileira. Ed. NEHIB/Rede Alfredo de Carvalho. Salvador, BA. 2002 O PROJETO RESGATE na Biblioteca Nacional. In Revista do Livro 14-44. Ed. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, 2002. A memória da Comunicação Impressa Brasileira e o Exercício da Cidadania. In Comunicação Pública. Ed. Alínea.Campinas, SP. 2004 PROJETO RESGATE e o direito à memória do patrimônio documental. In Revista A & B, Lisboa, 2005