HISTOLOGI E CURTIMENTO D PELE DO Pseudoplatystoma corruscans (Osteichthyes) UTILIZNDO O TNINO VEGETL COMO PRODUTO CURTENTE E DOIS TIPOS DE RMZENMENTO Luiz ntonio ispo *, Doroty Mesquita Dourado, Helder ntonio Souza, Rosemary Matias e Maria Luiza Rodrigues de Souza * Laboratório de Pesquisa em Histopatologia e iologia Molecular, Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal - UNIDERP. v. lexandre Herculano, 1400- CEP: 79037-280, Campo Grande, MS, inecon@terra.com.br Resumo O objetivo deste trabalho foi avaliar morfologicamente a pele do pintado curtida com extrato vegetal, utilizando dois tipos de armazenamento. Utilizou-se 3,00 kg de peles de pintado dividido em dois lotes, sendo 1,5 kg de peles com acondicionamento recomendável na literatura (Grupo 1) e 1,5 kg de peles com armazenamento após 2 horas da retirada do animal (Grupo 2), além disso, foi realizado um grupo controle negativo utilizando a pele in vivo sem curtimento as quais foram submetidas a análise histologia padrão. s peles do Grupo 1 e Grupo 2 após curtimento a base de tanino natural, foi, também, submetida a análise histológica. Os resultados de ambos os grupos, foram comparados com o controle negativo, ficando evidente que o controle o uso de metodologias padrões de conservação da pele é um dos fatores primordiais para que o processo de curtimento seja eficiente e que o produto preserve as características da pele natural, atendendo as exigências do mercado consumidor e apresente potencial para a industrialização. Introdução pele de peixe é um produto que possui alta qualidade e resistência, porém ao ser retirada do animal precisa ter um armazenamento eficiente e adequado para que não ocorra autólise do tecido e perda do material (lmeida, 1998). Segundo Luz (2000), para se obter boa conservação das peles é necessária que estas se contaminem o mínimo possível durante o abate e seu posterior transporte ao local para conservação. conservação tem por finalidade interromper a decomposição da matéria-prima, conservando-a até o início do processamento. Este processo baseia-se na desidratação da pele impedindo o desenvolvimento bacteriano e ação enzimática. Geralmente o sal é utilizado. desvantagem de sua utilização se refere à enorme quantidade a ser empregada ocasionando problemas de poluição. Por outro lado, o processo de armazenamento por resfriamento o condicionamento é iniciado com uma temperatura de 3ºC e depois levadas à temperatura de -1ºC que deve permanecer constante. Neste tipo de conservação, as peles podem permanecer durante um mês. O congelamento de peles é condenado por alguns autores, por acreditarem que os cristais de gelo rompem à estrutura de colágeno de que são constituídas as peles. Outros não aceitam esse critério por não ter sido devidamente demonstrado o efeito do congelamento. Considerando que uma das espécies nativa da região do Pantanal - MS e cultivadas em Mato Grosso do Sul está Pseudoplastystoma corruscans, um peixe de couro cuja principal
característica externa é a ausência de escamas sobre o corpo, sendo revestido por uma pele espessa que vem sendo aproveitada em baixa escala por Pescadores ribeirinhos e descartadas pelas indústrias de filetagem da região MS, e, que para o aproveitamento tecnológico da pele desta espécie por meio do curtimento se faz necessário estudar os processos utilizados de armazenamento da pele bem como um dos métodos utilizados para avaliar este processo tem como base a histológica este trabalho teve como objetivo de avaliar morfologicamente a pele do pintado curtida com tanino vegetal utilizando dois tipos de armazenamento (com sal e com resfriamento em freezer doméstico) como forma de conservação das peles. Material e Métodos O peixe escolhido para este estudo foi o pintado (Pseudoplatystoma corruscans), com peso de 1,4 a 2,5 kg, com comprimento total 48,7cm e padrão 43,9 cm, doado pela Piscicultura Mar e Terra. O curtimento das peles foi efetuado de acordo com Hoinacki (1989) e Souza (2004), Souza et al.(2006), tanto para as peles adequadamente armazenadas sob resfriamento imediato e para as peles com armazenamento após 2 horas da retirada do animal, ou seja, aquelas que ficaram um tempo anterior em temperatura ambiente antes do resfriamento final. O processo de curtimento foi realizado no laboratório de Pesquisa em Histopatologia da UNIDERP seguindo as etapas: remolho descarne, caleiro, desencalagem, purga, desengraxe, píquel, curtimento, neutralização, recurtimento, tingimento, engraxe, secagem e amaciamento. O estudo histológico realizado na pele in natura foi para observar a morfologia da derme. O material foi retirado do peixe após anestesia, fixado em formol 10% tamponado por 24 horas e processado em concentrações crescentes de álcool, diafanizado em xilol e incluído em parafina. s peles foram cortadas em micrótomo com 5 µm de espessura e coradas em hematoxilina-eosina (HE), tricrômico de Masson (TM) e Picrosirius Hematoxilina (PH). pós foram montadas em lâminas histológicas com entellan. Resultados e Discussão Neste trabalho a pele do pintado foi analisada antes e após o curtimento. través da análise morfológica, a pele mostrou-se formada por três camadas distintas: epiderme, derme e hipoderme, porém a descrição relatada a seguir restringe-se à camada dérmica antes do curtimento. derme compacta encontra-se abaixo da epiderme e está formada por tecido conjuntivo denso modelado, constituído por fibras colágenas espessas, onduladas e paralelas à superfície da epiderme. O arranjo dessas fibras mostrou-se organizado em fibras longitudinais, verticais e transversais proporcionando resistência ao tecido (Figura 2). Em peixes em que a locomoção se dá pelos movimentos de ondulações, a derme é composta por um espesso arranjo cruzado de fibras colágenas que se envolvem helicoidalmente ao redor do corpo, sustentando a transmissão de força ao longo da coluna vertebral (Greven et al., 1995). resistência da pele varia de acordo com a distribuição e disposição das fibras colágenas da derme, a técnica de curtimento empregada, a espécie de peixe, bem como a espessura dessa pele.
Junqueira et al. (1983) constataram que é interessante realizar o estudo histológico da arquitetura das fibras colágenas da derme compacta dos peixes, pois estas fibras constituem os principais componentes responsáveis pela estabilização da matéria-prima durante o processo de curtimento, gerando o couro; essas fibras propiciam uma resistência tênsil, fornecendo assim à pele, uma consistência semelhante ao do couro, apropriada para resistir às pressões geradas quando o corpo do animal é distendido. V T Figura 2. Fotomicrografia da derme compacta do pintado antes do curtimento mostrando fibras: longitudinal (setas), vertical (V) e transversal (T). Em, HE/400x; em, TM/100x. lém dão estudo histológico da pele do pintado, neste trabalho, foi também realizado uma comparação de dois tipos de armazenamento, com congelamento imediato das peles e o inadequado, 2 horas após a retirada da pele, para testar a importância do armazenamento que estará repercutindo na qualidade do produto obtido. Uma parte da pele foi acondicionada dentro dos padrões previstos e a outra recebeu um tratamento diferenciado, mimetizando problemas que podem ocorrer quando o armazenamento utilizado é o congelamento. Como observado na Figura 3 houve diferença no aspecto geral do couro. O couro do pintado com armazenamento adequado estava macio e consistente (), sem nenhum odor que revelasse deterioração e visualmente conservou sua estrutura característica em relação à pele. O couro com armazenamento inadequado apresentou espessura, tonalidade, desenho da pele diferenciado em relação à pele armazenada dentro das condições ideais, mostrando um aspecto áspero nas regiões adaxial e abaxial, descaracterização longitudinal referente ao comprimento do corpo do peixe, cor escura e perda do desenho da pele que é uma característica da pele do pintado (). Existem fatores que podem causar modificações na pele quando mal armazenadas, tais como, a liberação de muco por células situadas na epiderme da pele dos peixes. O processo ocorre como uma reação do organismo ao ambiente adverso encontrado fora da água e também contribui para a deterioração rápida da pele ou pescado, uma vez que a maior parte do muco é constituída pela mucina, uma glicoproteína, que é um excelente meio de desenvolvimento de microrganismos (Geromel, 1989).
Figura 3. Pele do pintado após o curtimento com extrato vegetal demonstrando o resultado final após o curtimento com armazenamento (congelamento em freezer) imediato após a retirada da pele do peixe () e o armazenamento inadequado com material sendo congelado após 2 horas da retirada do peixe (). Segundo Machado (1984), o abaixamento da temperatura é um dos fatores mais importantes na conservação do pescado ou do peixe como um todo. Em decorrência do mal acondicionamento ocorre a proliferação das bactérias, e o aumento da temperatura tem influência sobre a velocidade das reações químicas que aceleram a decomposição da pele. Para resfriar e manter o peixe em condições de resfriamento são necessárias quantidades de gelo para reduzir a temperatura de 0 a 2 C e se manter nesta faixa. O gelo em barra é utilizado após moagem, o tamanho das partículas varia de acordo com o tamanho do peixe. Gelo muito grosseiro pode danificar mecanicamente o pescado (injúrias físicas), dilacerando os tecidos e possibilitando uma invasão bacteriana acelerada. pele quando retirada do peixe deve ser acondicionada para que as células estejam em homeostase. Se o material for mal acondicionado pode ocorrer autólise do tecido levando a morte por necrose como observado nas figuras e D. Pode-se notar que após a coloração pelo HE, a região intermediária da derme apresenta-se muito acidófila, o que sugere perda da estrutura normal do tecido como se no local as proteínas estivessem desnaturadas. Esse quadro é semelhante ao descrito na necrose por coagulação caracterizada por desnaturação das proteínas citoplasmáticas, degradação das organelas celulares e tumefação celular (Robbins, 1996). aparência morfológica da necrose resulta de dois processos essencialmente concomitantes: (1) digestão enzimática da célula e (2) desnaturação de proteínas que ocorrem pela ação das enzimas catalíticas lisossômicas das próprias células mortas, quando então a digestão enzimática é chamada de autólise (Robbins, 1996). Na Figura 4 ( e C) nota-se que a estrutura do tecido está preservada. s fibras colágenas estão orientadas, mostrando que após o curtimento houve perda das ligações entre elas, sem perda da organização em fibras longitudinais, transversais e verticais. Essa organização se deve possivelmente ao tipo de armazenamento e do material utilizado no curtimento. Os taninos,
independente de ser vegetal, sintético ou a combinação dos dois, proporcionam uma maior espessura ao couro. São produtos que fazem com que o couro esteja mais encorpado e macio. C D Figura 4. Pele curtida com extrato vegetal. Em e C, acondicionamento correto. Fibras colágenas mais soltas e íntegras; Em e D, acondicionamento incorreto. Pode-se observar necrose por coagulação (seta). HE/100x. Figura 5. Pele curtida com extrato vegetal. Em, acondicionamento correto. Fibras colágenas mais soltas e íntegras. Em, acondicionamento incorreto. Pode-se observar necrose por coagulação (seta). TM/100x.
pós o curtimento, a pele também foi avaliada em relação a quantidade de fibras colágenas. E para isso o couro foi cortado, corado em Picrosirius-Hematoxilina (PH) e observado em microscópio de polarização. Os cortes histológicos mostraram que os feixes de fibras de colágeno se dispõem em ângulos próximos a 45º ao longo da pele e cruzam com os outros que lhes são perpendiculares. Nota-se também que a camada de fibras se sobrepõem, ocorrendo uma amarração entre elas, formando feixes de fibras muito longos e bem orientados. Devido à disposição desses feixes de fibras, o couro de peixe adquire uma elevada resistência relativa e grande maciez, o que possibilita seu aproveitamento para confecção de muitos artefatos, destacando também o efeito ornamental (Flores, 1996). s análises do couro do pintado confirmam a observação de Junqueira et al. (1982) que a espessura das fibras colágenas têm a função principal na determinação do comprimento de onda das cores de polarização das secções coradas com Sirius Red. Figura 6. Representação do couro através da reação para fibras colágenas, Picrosirius-Hematoxilina (PH). Em, pele com armazenamento correto. Pode-se observar maior quantidade de fibras colágenas do tipo I (em vermelho). Em, armazenamento inadequado. Observação em microscópio de polarização. PH/100x. Sabe-se que as moléculas de colágeno são ricas em aminoácidos básicos, reagindo fortemente com corantes ácidos. Sirius Red é um corante para moléculas longas, reage com colágeno e promove um aumento da sua birrefringência normal devido ao fato de que muitas moléculas do corante são alinhadas em paralelo com o longo eixo da molécula de colágeno (Junqueira et al., 1979). O aumento da birrefringência promovida pelo método de polarização por Picrosirius é, portanto, específica para estruturas de colágenos compostas de agregados de moléculas orientadas. Este método de análise mostra que os tipos I e III colágenas das fibras colágenas possuem diferentes cores de interferência e intensidades de birrefringência no mesmo corte histológico (ornstein & Sage, 1980; Minor, 1980; Perez-Tamayo & Montfort, 1980). pesar do corante Sirius Red ligar-se inespecificamente aos componentes de caráter básico do tecido, o fenômeno do aumento de birrefringência ocorre exclusivamente com o colágeno. ssim, a coloração com PH associada à microscopia de polarização, constitui-se em
método histoquímico específico para definir a orientação de moléculas de colágeno (Junqueira et al.,1982; Montes & Junqueira,1991). Conclusão O armazenamento adequado é fator primordial para que o processo de curtimento seja eficiente e que o produto preserve as características vantajosas da pele, atendendo as exigências do mercado consumidor e apresente potencial para a industrialização. gradecimentos gradecimentos à UNIDERP, à FUNDÇÃO MNOEL DE RROS e à PISCICULTUR MR E TERR, pelo apoio na realização desse experimento. Referências HOINCKI, E. Peles e couro: origens, defeitos e industrialização. 2.ed. Porto legre: CFP de rtes Gráficas Herique d Ávila ertaso, 1989. PROCHMNN,. M. Estudo da cadeia produtiva da piscicultura. Campo Grande-MS: UFMS: SEPROD: SERC: Fundação Cândido Rondon, 2003, 76 p. (no prelo). SOUZ, M.L.R. Tecnologia para processamento das peles de peixe. Maringá: Eduem, 2004. 59p. (Coleção Fundamentum, 11). SOUZ, M.L.R. et al. Histologia da pele da carpa prateada (Hypophtalmichthys molitrix) e teste de resistência do couro. Revista rasileira de Zootecnia, v.35, n.4, p. 1265-1272, 2006.