Gerenciamento de microbacias com vocação agrícola em Santa Catarina Projeto Piloto com estudos agro-hidrológicos integrados

Documentos relacionados
Gerenciamento das Microbacias: Victoria, Vieira e Pereira

ESTUDOS AGRO HIDROLÓGICOS INTEGRADOS EM MICROBACIAS AGRÍCOLAS DE SANTA CATARINA

O GERENCIAMENTO DE MICROBACIAS COM VOCAÇÃO AGRÍCOLA EM SANTA CATARINA: ESTUDOS AGRO-HIDROCLIMATOLÓGICOS INTEGRADOS

Estratégias de conservação de solo e da água em pequenas bacias hidrográficas. Jean PG Minella

AJUSTE DA LÂMINA DE IRRIGAÇÃO NA PRODUTIVIDADE DA CULTURA DO FEIJÃO

Prof. Vital Pedro da Silva Paz

SIMULAÇÃO DE PRODUÇÃO DE SEDIMENTOS COM A UTILIZAÇÃO O MODELO SWAT NA BACIA DO RIO DAS PEDRAS (GUARAPUAVA-PR)

Roteiro. Definição de termos e justificativa do estudo Estado da arte O que está sendo feito

PLANEJAMENTO DE IRRIGAÇÃO DA CULTURA DO FEIJÃO NO MUNICÍPIO DE BOTUCATU COM AUXÍLIO DO SOFTWARE CROPWAT

8 th WORLD WATER FORUM BRASÍLIA- BRASIL, MARCH 18-23,

COLETA E PRESERVAÇÃO DE AMOSTRAS DE ÁGUA E SEDIMENTO

8 Conclusões e Considerações Finais

Sumário. Apresentação I Apresentação II Apresentação III Prefácio Capítulo 1 Introdução... 37

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA PROGRAMA DE DISCIPLINA

Modelagem hidrológica da bacia hidrográfica do Rio Macaé utilizando o MOHID Land

Água na produção de alimentos e Gestão compartilhada dos Recursos Hídricos: desafios e oportunidades

Estudos dos impactos da agricultura na quantidade e qualidade da água no solo e nos rios

BACIA ESCOLA DO CAMPUS DA UFSC Implantação de ensino prático nas aulas de Hidrologia.

PROCESSAMENTO E CLASSIFICAÇÃO DE IMAGENS DE SATÉLITE PARA CARACTERIZAÇÃO DE USOS DO SOLO

PERFIL DE APRENDIZAGENS 7ºANO

Rozely Ferreira dos Santos

Irrigação do cafeeiro

DIRETRIZES PARA PROJETO

Gestão e segurança dos recursos hídricos AGO 2018

Epagri. Conhecimento para a produção de alimentos

BANCO DE DADOS AGROCLIMA

FLORESTAS PARA PRODUÇÃO DE ÁGUA

SISTEMA DE MONITORAMENTO AGROCLIMÁTICO DA REGIÃO DE DOURADOS, MS. Palavras-chave: suporte à decisão, agrometeorologia, estação meteorológica.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE INSTITUTO FEDERAL DE SERGIPE APLICAÇÕES DO SWAT. Marinoé Gonzaga da Silva

Bacia Hidrográfica divisores de água rede de drenagem seção de controle.

PROJETOS DE PESQUISA VINCULADOS AO MESTRADO PROFISSIONAL EM GEOGRAFIA

A IMPORTÂNCIA DA INSTALAÇÃO DE ESTAÇÕES FLUVIOMÉTRICAS E PLUVIÔMETRICAS PARA O ESTUDO DA HIDROLOGIA: CASO DA BACIA DO RIO JUQUERIQUERÊ

COMPARAÇÃO DOS MÉTODOS DE ESTIMATIVA DE ETc PARA O FEIJÃO- COMUM EM UNAÍ - MG

Geografia (7.º,8.º e 9.º anos)

COEFICIENTE DE CULTIVO (K c ) DO MILHO SAFRINHA PARA A REGIÃO DE DOURADOS MS

PARAMETROS DE CRESCIMENTO E PRODUÇÃO DA CULTURA DO PIMENTÃO

Hidrologia Bacias hidrográficas

COMPARAÇÃO ENTRE TRÊS MÉTODOS PARA ESTIMAR A LÂMINA DE IRRIGAÇÃO DO FEIJOEIRO NA REGIÃO DE BAMBUÍ-MG

DESENVOLVIMENTO DE UM SISTEMA DE CONTROLE DOS PARÂMETROS DE UMIDADE E TEMPERATURA PARA ESTUFAS AGRÍCOLAS

VARIAÇÃO ESPAÇO-TEMPORAL DA EVAPOTRANSPIRAÇÃO DE REFERÊNCIA NO ESTADO DO CEARÁ

ANÁLISE QUANTITATIVA PRELIMINAR DE ESTUDOS DE MEDIÇÃO DE PARÂMETROS DE QUALIDADE DA ÁGUA NA BACIA DO RIO NEGRO-RS

PRECIPITAÇÃO PLUVIAL E EVAPOTRANSPIRAÇÃO DA CANA-DE- AÇÚCAR NA REGIÃO DE RIO LARGO-ALAGOAS

O objetivo primeiro do sistema é a disponibilização da informação, de forma coerente, ao usuário final.

INFLUÊNCIA DA DEFICIÊNCIA HÍDRICA ANUAL NO ZONEAMENTO CLIMÁTICO DE QUATRO CULTURAS NA BACIA DO RIO ITAPEMIRIM, ES. RESUMO

DEMANDA HÍDRICA DO CONSÓRCIO MILHO E BRAQUIÁRIA EM MATO GROSSO DO SUL

CAPÍTULO 7 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Augusto José Pereira Filho Departamento de Ciências Atmosféricas Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas

Estimativa de coeficientes de cultura (Kc) da fase inicial de culturas anuais no Estado do Mato Grosso

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE. Antenor de Oliveira Aguiar Netto. Março 2011

LINHA DE PESQUISA: DINÂMICAS DA NATUREZA

Veracel Celulose S/A Programa de Monitoramento Hidrológico em Microbacias Período: 2006 a 2010 RESUMO EXECUTIVO

ANÁLISE ALTIMÉTRICA DA BACIA HIDROGRÁFICA DE CAMARATUBA-PB

ANÁLISE DAS TENDÊNCIAS EM SÉRIES PLUVIOMÉTRICAS NAS BACIAS DO RIO VAZA BARRIS E ITAPICURU, NO ESTADO DE SERGIPE

Eixo Temático ET Recursos Hídricos CARACTERIZAÇÃO FÍSICA DA MICROBACIA DO RIACHO DAS COBRAS, SANTO ANDRÉ-PB E GURJÃO-PB

MODELAGEM E DESENVOLVIMENTO DE SOFTWARE PARA CÁLCULO DE EVAPOTRANSPIRAÇÃO PELOS MÉTODOS DE PENMAN-MONTEITH E THORTHWAITE

Hiliene da Costa de Carvalho 1, George Leite Mamede 2

X Simpósio de Recursos Hídricos do Nordeste

Disciplina: Fundamentos de Hidrologia, Irrigação e Drenagem

ANÁLISE MORFOMÉTRICA DA SUB-BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ESPINHARAS-PB

Abordagem Integrada para a Otimização da Gestão de Águas e Efluentes

Política de Combate a Inundações de Belo Horizonte. Prefeitura de Belo Horizonte

Agricultura de Precisão - escience

ESTIMATIVA DA EVAPOTRANSPIRAÇÃO DE REFERÊNCIA PARA O MUNICIPIO DE APODI-RN

PROGRAMA ANALÍTICO E EMENTA DE DISCIPLINA DA PÓS GRADUAÇÃO

MUDANÇAS DE COBERTURA VEGETAL E USO AGRÍCOLA DO SOLO NA BACIA DO CÓRREGO SUJO, TERESÓPOLIS (RJ).

ESTUDO DA DISPONIBILIDADE HÍDRICA NA BACIA DO RIO PARACATU COM O SOFTWARE SIAPHI 1.0

Política Nacional de Recursos Hídricos

Estimativa de escoamento superficial na bacia do rio Sapucaí por meio de modelagem hidrológica dinâmica

CÂMARA TÉCNICA DE MONITORAMENTO HIDROLÓGICO - CTMH

PRECIPITAÇÕES EXTREMAS

Retrospectiva sobre regimes hidrológicos e importância do planejamento urbano na prevenção quanto a eventos extremos

Chuvas Intensas e Cidades

Recursos Hídricos. Racionalização do uso da água no meio rural. Anexo III-f. Prospecção Tecnológica. Síntese de Painel de Especialistas

MANUAL DE PROJETOS DE SANEAMENTO MPS MÓDULO 12.9

Ciclo Hidrológico e Bacia Hidrográfica. Prof. D.Sc Enoque Pereira da Silva

CIA DE SANEAMENTO BÁSICO DO ESTADO DE SÃO PAULO PROGRAMA PILOTO PARA IMPLANTAÇÃO DO PLANO DE SEGURANÇA DA ÁGUA NA SABESP

MÉTODOS DE ESTIMATIVA DA EVAPOTRANSPIRAÇÃO DE REFERÊNCIA DIÁRIA PARA A REGIÃO DO ALTO VALE DO ITAJAÍ, SC

Disciplina: Geografia Perfil de Aprendizagens Específicas O aluno é capaz de:

RESOLUÇÃO N o 91, DE 5 DE NOVEMBRO DE 2008

ANÁLISE TERMOHIGROMÉTRICA NOS EIXOS VIÁRIOS CENTRAIS DA MALHA URBANA ORIGINAL DE SINOP-MT

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM IRRIGAÇÃO E DRENAGEM

PRIORIZAÇÃO DE ÁREAS DE RESTAURAÇÃO PARA SEGURANÇA HÍDRICA. Edenise Garcia, Eileen Acosta, Marília Borgo, Ricardo Galeno The Nature Conservancy

PROJETO SONDA: MONITORAMENTO DOS DADOS DA PLATAFORMA DE OURINHOS.

Atuação da Sala de Situação PCJ no Monitoramento Hidrológico das Bacias PCJ

em destaque Redes de Monitorização Hidrometeorológicas ENQUADRAMENTO Manuela Saramago

POLÍTICAS NACIONAL E ESTADUAL DE RECURSOS HÍDRICOS

CONSTRUINDO O PLANO MUNICIPAL DO MEIO AMBIENTE

Estimativa de coeficientes de cultura (Kc) da fase de florescimento para milho e sorgo no Estado de Minas Gerais

CONDIÇÕES HÍDRICAS DO ESTADO DA PARAÍBA SOB DIFERENTES CENÁRIOS DO TEMPO.

IX SIMPÓSIO DE MEIO AMBIENTE INOVAÇÕES SUSTENTÁVEIS ANAIS DE RESUMOS EXPANDIDOS. Editor. Gumercindo Souza Lima ISSN

Manejo de bacias hidrográficas Jogando água

Submódulo 9.6. Acompanhamento e previsão meteorológica e climática

Escola Básica Carlos Gargaté - Mais de 20 Anos a Educar. Departamento de Ciências Sociais e Humanas 2018/ Geografia (7.º,8.º e 9.

ANÁLISE DA PRECIPITAÇÃO E DO NÚMERO DE DIAS DE CHUVA NO MUNICÍPIO DE PETROLINA - PE

CC54Z - Hidrologia. Precipitação: definição, métodos de medição e grandezas características. Universidade Tecnológica Federal do Paraná

Processos Hidrológicos CST 318 / SER 456. Tema 1 Introdução ANO 2017

VARIABILIDADE ESPAÇO-TEMPORAL DA VAZÃO ESPECÍFICA MÉDIA NO ESTADO DE GOIÁS

CARACTERIZAÇÃO DO COMPORTAMENTO HIDROLÓGICO ECORREGIÕES DO CERRADO RESUMO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS EM NÍCKOLAS C. SANTANA; LINEU NEIVA RODRIGUES

Sustentabilidade e uso de água: a Paraíba no contexto da discussão

Transcrição:

Gerenciamento de microbacias com vocação agrícola em Santa Catarina Projeto Piloto com estudos agro-hidrológicos integrados Flávio Renê Brea Victoria Pesquisador Epagri Doutor em Engenharia Agrícola Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos 1. Introdução O sistema natural em bacias hidrográficas caracteriza-se pela complexidade, com a interação extremamente dinâmica entre seus elementos constituintes. O ciclo hidrológico e o clima, com a variabilidade dos seus elementos e grande interação com os constituintes físicos da bacia, são responsáveis pelo fornecimento e troca de energia. As influências de ações humanas completam o quadro de equacionamento complexo, tornando mais difíceis as decisões dos agricultores, lideranças comunitárias, políticos e empreendedores. Na Figura 1 podem se visualizados os elementos constituintes, necessários para análise dos sistemas em bacias hidrográficas. Nas bacias hidrográficas agrícolas encontra-se percentual considerável do patrimônio da natureza, estando, o seu manejo e preservação, principalmente sob a responsabilidade dos agricultores. Entretanto, os agricultores o fazem de forma praticamente empírica, conforme os conhecimentos acumulados ao longo dos tempos, sendo necessário esforço das áreas técnicas no sentido de qualificar as ações e decisões no campo. Em função disso, é preciso desenvolver metodologias focadas na aplicação, que permitam disponibilizar as modernas técnicas de análise principalmente as advindas do uso de modelos computacionais-, e possibilitem decodificar as complexas informações sobre os sistemas naturais, colocando indicadores e conclusões à disposição dos agricultores, técnicos, prefeitos, e demais decisores, no âmbito da bacia hidrográfica e da região onde a mesma encontra-se inserida. O desenvolvimento de conceitos e princípios de abordagem multiescala, aliado ao desenvolvimento de equipamentos de baixo custo, tem proporcionado ações de conhecimento e modelagem de microbacias-piloto no componente água do Projeto Microbacias 2 conduzido no estado de Santa Catarina, viabilizando a aplicação da modelagem, a geração de conhecimentos com enfoque sistêmico, e, assim, a paulatina construção de conhecimentos locais nas microbacias. Dessa forma, será possível subsidiar os processos participativos locais, contribuindo com maior eficiência e eficácia para concretizar medidas adequadas de exploração, prevenção a adversidades e desenvolvimento regional sustentável, considerando-se as necessidades atuais e futuras das comunidades. As ações desenvolvidas compõem o desenvolvimento de equipamentos de suporte aos trabalhos de pesquisa em microbacias, de aplicação preliminar de modelos, de desenvolvimento de metodologias para instalação de rede hidrológica, e da instalação de equipamentos de monitoramento hidroclimatológico, com vistas ao conhecimento das especificidades do ambiente local (nas microbacias) onde se desenvolvem as atividades humanas. As atividades humanas interferem na natureza local, e, simultaneamente, sofrem com as características e variabilidades naturais. Por isso, torna-se fundamental conhecer as interações existentes, visando aprimorar a convivência dos agricultores com as 1

adversidades, e potencializar as atividades econômicas dependentes do clima, fazendo da água e da sua disponibilidade, fator diferencial de desenvolvimento, através de práticas e ações mais adequadas a serem adotadas pelos agricultores e pelas comunidades, nas interfaces rural-urbano. Com esse enfoque, busca-se articular conhecimentos com potencial de resposta aplicada à realidade das ocorrências hídricas/hidrológicas locais. E assim, contribuir para a orientação da tomada de decisão aos agricultores, técnicos, políticos e administradores em bacias hidrográficas agrícolas, visando a adoção de adequadas políticas públicas e privadas de desenvolvimento regional. Plani-Altimetria Clima/Prec. Imagens Planta Carac. Físicas/Subsolo Vazão Bacia Solo Manejo Consumidores Lavoura/Investir Mercado e Riscos Figura 1. Elementos constituintes dos sistemas complexos em microbacias. 2. Objetivos A presente etapa dos trabalhos tem como objetivo a constituição das 7 micro-bacias piloto do projeto Microbacias 2, conduzido em Santa Catarina, como micro-bacias experimentais piloto para o estudo de gestão integrada e sustentável de água e recursos hídricos. A distribuição das microbacias piloto em Santa Catarina pode ser visualizada na Figura 2. Foram estabelecidas as microbacias de estudo: Tarumanzinho (Águas Frias-Oeste Catarinense), Doze Passos (Ouro-Meio Oeste Catarinense), Mato Escuro (Palmeira-Planalto Sul Catarinense), Rio Tigre (Canoinhas- Planalto Norte Catarinense), Concórdia (Lontras-Alto Vale do Itajaí), Alto Cubatão (Águas Mornas- Litoral Centro Catarinense), e Maracanã (Sombrio-Litoral Sul Catarinense). 2

Figura 2. Mapa com a localização das microbacias-piloto nas regiões de Santa Catarina. A implementação dessas ações tem o foco de gerar os conhecimentos importantes para a redução dos riscos das atividades agrícolas, considerando-se a importância das ocorrências climáticas na renda rural, e nas decisões com que o agricultor encontra-se rotineiramente envolvido. Tem também o objetivo de gerar informações integradas que permitam a construção paulatina de uma base de conhecimentos locais, proporcionando uma participação mais consciente das comunidades na construção do seu desenvolvimento, de forma a salientar potencialidades, restrições e soluções que subsidiem a adequada dosagem das intervenções humanas junto à natureza, com a busca da melhoria das condições de vida, e a redução da pobreza nos ambientes rurais e urbanos, e suas interfaces. 3. Objetivos específicos - Instrumentalizar 7 micro-bacias piloto de Santa Catarina com estações de monitoramento permanente de fluviometria, de precipitação, e de locais de monitoramento da qualidade da água e de análise de sedimentos, capazes de permitir a determinação da disponibilidade hídrica da bacia, em termos quali-quantitativos, e suas relações com as atividades humanas desenvolvidas nas superfícies. - Viabilizar a adoção de tecnologia de medição e registro permanente de precipitações (Pluviologger ), como complemento fundamental ao conhecimento local, para aplicação dos modelos; - Estabelecer metodologia para localização e instalação, em cada micro-bacia, de uma rede de equipamentos Pluviologgers, em densidade de 5 a 7 km 2 /Unidade, de forma a realizar estudos de distribuição de precipitações e ciclo hidrológico nas microbacias; - Localizar e instalar, em cada micro-bacia, uma estação telemétrica com medição de nível e de precipitação na foz da microbacia, com transmissão horária de dados. - Localizar, em cada micro-bacia, pontos de coleta de água do rio, e de coleta de água de consumo nas propriedades rurais, para monitoramento de qualidade; - Constituir logística operacional de coleta, recepção e armazenamento de dados de precipitação nos pluviologgers e nas estações telemétricas distribuídas nas microbacias; 3

- Constituir logística operacional de coleta dos dados de qualidade da água, de sedimentos nas microbacias; - Constituir logística de armazenamento e disponibilização dos dados on line; - Constituir logística de retorno dos dados coletados e indicadores aplicados, às comunidades locais. 4. Metodologia Abordagem sistêmica e equipamentos para estudos climáticos A busca do enfoque sistêmico conduz à necessidade de articular conhecimentos com potencial de resposta aplicados à realidade das ocorrências hídricas/hidrológicas locais, nas diversas escalas de interesse. Com esse objetivo, estão sendo integradas ações de conhecimento do clima nas microbacias, através da instalação de equipamentos registradores automáticos de precipitação (Pluviologgers), e de rede de determinações de qualidade, para estabelecer as relações climáticas com as atividades desenvolvidas e com a degradação das águas. Iniciou-se o processo de modelagem das microbacias, passando-se a analisar a caracterização dos diversos constituintes agrícolas e hidro-agrícolas, para, em conjunção com as ações de monitoramento de clima, vazões de rios e atividades desenvolvidas, representar as micro-bacias em projeto com abordagem multiescala. Foi realizada a instalação dos equipamentos nas propriedades rurais, nas microbacias-piloto, possibilitando o monitoramento permanente das condições de precipitação na microbacia e de vazão do rio principal dentro de cada microbacia. Um exemplo da distribuição das estações de pluviologgers nas propriedades rurais da microbacia Tarumanzinho, de Águas Frias, pode ser visualizado na Figura 3. A microbacia Tarumanzinho possui 3.719,00ha. Os equipamentos foram instalados nas propriedades dos Srs. Bruschi, Siqueira, Panasolo, Mantovani, Trevelin e Sabino. Precipitação: conhecimento da variável climática dentro da microbacia As precipitações, como principal fonte supridora de água à agricultura de sequeiro, desenvolvida principalmente em Santa Catarina, assim como às demais atividades humanas (população, indústrias, entre outras), necessita de um foco especial, sendo, por isso, objeto de estudos mais aprofundados por parte do componente água do projeto Microbacias 2. Desenvolvimento do Pluviologger Os equipamentos Pluviologger, instalados no projeto Microbacias 2, são resultado de um projeto pioneiro de pesquisa desenvolvido pelo setor de Agrometeorologia da Epagri/Ciram. O projeto iniciou em 1999 e teve como objetivo atender à necessidade de desenvolver tecnologia de baixo custo, que pudesse viabilizar o melhor conhecimento das ocorrências de precipitação dentro das microbacias. Conseqüentemente, essa linha de pesquisa viabilizou a construção de conhecimentos qualificados associados à precipitação em bacias, a partir da caracterização das chuvas locais, abrindo perspectivas significativas para estudos hidrológicos, de calibração de modelos chuva-vazão, de calibração de outros parâmetros de bacias, estudos de microclimas, entre muitos outros estudos de importância para a busca de alternativas às atividades e melhoria da qualidade de vida das comunidades. 4

PEP1-BRUSCHI Telem. Figura 3. Mapa com a localização dos equipamentos pluviologgers nas propriedades rurais e agricultores da Microbacia Tarumanzinho - Águas Frias, no Oeste Catarinense. Instalação A instalação dos registradores de precipitação (Pluviologgers) desenvolvidos pelo Ciram/Epagri, possibilitou uma maior densidade de estações de registro de chuvas dentro das microbacias, tendo-se decidido pela aplicação imediata desse desenvolvimento técnico-científico, às necessidades de conhecimento do clima do Projeto Microbacias 2, através da instalação de 48 Pluviologgers nas microbacias piloto. Para o estabelecimento da densidade de equipamentos a adotar nas microbacias, e a distribuição dos pluviologgers nas microbacias-piloto, foi estabelecida uma estratégia metodológica específica, resultando na determinação do número de unidades, locação preliminar nos mapas, e, seqüencialmente, na validação e instalação nas propriedades, em condições de campo. 5

Os critérios consideraram a densidade de equipamentos nas áreas, as características de variabilidade de relevo, condições de acessibilidade ao local, segurança, entre outras, buscando-se manter densidades de equipamentos de 5 a 7 km2/estação pluviologger. Na Tabela 1 pode-se verificar os valores mínimos recomendados pela World Meteorological Organization (WMO, 1994), que serviram como referência para as abordagens adotadas. Tabela 1. Densidade mínima recomendada para estações de precipitação Tipo Unidade Fisiográfica Densidade mínima recomendada (área em km 2 /estação) Sem registrador Com registrador Costeira 900 9.000 Montanhosa 250 2.500 Planície interior 575 5.750 Onduladas 575 5.750 Pequenas ilhas 25 250 Áreas urbanas 10-20 Área Polar ou árida 10.000 100.000 FONTE: World Meteorological Organization (WMO,1994) Validação das propriedades A etapa de validação dos locais preliminarmente estabelecidos nos mapas, consistiu em percorrer todas as propriedades de cada microbacia, com o objetivo de verificar se, em cada propriedade pré-estabelecida, havia realmente um local que atendesse às recomendações estabelecidas na metodologia. Foi mostrado o protótipo do equipamento aos agricultores, explicados os objetivos da instalação, e o contexto das análises a serem realizadas no projeto microbacias 2, para a aplicação integrada das diversas informações que estão sendo coletadas: de precipitação, solo, poluentes, dados econômicos da propriedade, entre outros, visando realizar recomendações e buscar alternativas para melhorar as atividades e as condições de vida nas comunidades das microbacias. Como regra geral, foi validada a maioria das propriedades pré-determinadas pela metodologia, tendo havido algumas modificações devido à inadequação de paisagem nas imediações da propriedade, ausência do agricultor no local, e mesmo critérios técnicos levantados pelos extensionistas da Epagri nas microbacias. Assim, foi realizada a validação em visita técnica às microbacias-piloto, determinando-se o proprietário (com a respectiva autorização), as coordenadas de locação, e o registro fotográfico de cada local onde os pluviógrafos foaram instalados nas propriedades: instalação de 48 pluviologgers nas 7 microbacias-piloto Estratégias de recebimento, tratamento e armazenamento na base de dados Foi estabelecida a logística de coleta de dados nas estações instaladas, com a definição da metodologia computacional, pessoal e de software. Foram definidas as formas de recebimento dos dados nas bases estaduais de dados da Epagri/Ciram, de forma coerente com o sistema estadual existente, para viabilizar o acesso aos dados, realização de simulações, e geração de conhecimentos aplicados à realidade local. Logística de retorno de dados estratégicos às comunidades Estabelecimento de um Boletim Local do Microbacias 2, como forma de retorno da informações, com a síntese das informações climáticas, de qualidade e técnicas necessárias à construção da participação local, e conseqüente qualificação das decisões. 6

Apesar da chamada era do conhecimento, é preciso que ela se concretize efetivamente, com ações práticas de socialização das informações disponíveis, havendo especial preocupação do projeto nesse sentido. Com a viabilização dessa experiência, pode-se paulatinamente caminhar para o enquadramento e disponibilização de outras informações seletivas, que irão sendo geradas pelo projeto Microbacias 2 (informações da qualidade água e focos de poluição, orientação para a safra, ou outras), de forma a compôr um fluxo permanente de repasse de conhecimentos úteis às comunidades locais. Equipamentos instalados (Figura 4) - Pluviologgers (distribuídos nas propriedades rurais, de forma coerente a realização de estudos de precipitações em partes da bacia); - Estação Telemétrica (com medição de vazão e precipitação na foz da bacia), e transmissão por satélite de hora em hora; - Medidores de vazão, com régua e sensores de pressão. Figura 4. Imagens de equipamentos instalados nas microbacias-piloto em Santa Catarina (Pluviologger, telemetria, régua e sensores de nível do rio). Estações de monitoramento Foi instalada estação de medição automática de vazão com telemetria, na foz da microbacia. Foram estabelecidos diversos pontos de coleta periódica de qualidade da água e de análise de sedimentos, em trechos da microbacia, capazes de permitir a determinação dos efeitos das atividades desenvolvidas na superfície. Será aplicado Sistema de Apoio à Decisão, desenvolvido dentro de um conceito de abordagem multi-escala, para estudar as relações existentes entre as diferentes escalas, em termos hidrológicos e de planejamento do uso da água (Victoria, 2004; Victoria et al., 2005). Para isso, foram distribuídas e instaladas, em cada micro-bacia, as estações fluviométricas automáticas, a rede de pluviologgers automáticos, os locais para coleta 7

de sedimentos, qualidade da água e coliformes. Com a instalação das estações telemétricas de qualidade e vazão, e réguas linimétricas (para aferição), tem-se a transmissão dos dados em tempo real, com intervalo de 1 hora, constituindo no monitoramento de parâmetros fundamentais ao conhecimento da dinâmica dos processos hidrológicos e de antropismo na microbacia. Foram instalados pluviologgers automáticos (pluviologgers), distribuídos nas micro-bacias, de modo a melhor representar as ocorrências espaciais das chuvas, em condições diversas de altitude, exploração, entre outras, e assim permitir ajustes e calibração de modelos chuva-vazão em diversas escalas. Os locais para coleta de amostras para análise de qualidade da água são aqueles onde se determina as vazões de forma automática, além de outros considerados importantes para detectar possíveis ações antrópicas periódicas na microbacia, relacionando-se, simultaneamente, a vazão líquida com as vazões sólidas observadas. Modelagem Estão sendo adequados modelos e bases de dados para trabalharem de forma coerente com a abordagem multiescala proposta por Victoria (2004) Figura 5, e Victoria et al. (2005), com o foco na construção do conhecimento crescentemente qualificado nas bacias (Figura 6). Com a abordagem metodológica do trabalho, tem sido viabilizados instrumentos de aplicação progressiva, conforme a disponibilidade das informações. Nos estudos, busca-se entender as complexas relações envolvendo o ciclo hidrológico e a interferência do homem ao implantar sistemas de cultivos. São adotados os princípios de visão sistêmica relativa dos processos e desta interação desenvolvidos em Victoria (2004), que viabilizam a efetiva capacidade de resposta dos estudos e modelos produzidos, para, paulatinamente, aperfeiçoar o conhecimento dos sistemas reais locais. Assim, torna-se importante a definição entre o enfoque excessivamente detalhado (e por vezes, pouco aplicado), e aquele que efetivamente possibilite o conhecimento crescente dos sistemas naturais, da sua interação com as atividades humanas, e da sustentabilidade ambiental, social e econômica. No projeto estão sendo caracterizadas as atividades desenvolvidas, e tipificados os consumidores de água nos diferentes sub-bacias componentes da microbacia, com georeferenciamento e determinação de suas posições relativas. Dentro das atividades, merecerá especial atenção a caracterização das atividades agrícolas, com determinações pontuais nas propriedades, e do padrão de exploração agrícola em porções típicas da microbacia, com geo-referenciamento e tipificação, para cenarização agropecuária das explorações (Victoria, 2004). No projeto serão aplicados os princípios da abordagem multi-escala desenvolvidos por Victoria (2004), onde é realizada uma abordagem sistêmica da água e dos recursos hídricos em microbacias agrícolas com múltiplos usos. São caracterizadas as condições de agricultura de sequeiro, com a cenarização das questões associadas ao consumo de águas das culturas, quebras de produção, investimentos realizados, riscos associados, lucratividade, efeitos de práticas de cultivo nos solos locais, necessidades de tecnologia, tarifação de água, entre outros sub-processos considerados importantes no contexto da agricultura local. Serão determinadas as necessidades de água das culturas de interesse na bacia e analisadas as condições de manejo da água que possam proporcionar orientações para melhoria da produtividade da água, associando-se aos demais usos de água da bacia para aperfeiçoar o uso dos recursos hídricos e alocar a água disponível segundo critérios estratégicos de desenvolvimento. 8

Esses procedimentos incluem o gerenciamento do uso da água e o estabelecimento da necessidade da implantação de reservatórios reguladores e de suas regras de operação. Com o enfoque multiescala (Victoria et al., 2003; Victoria et al., 2005; Victoria, 2004) busca-se trabalhar de forma interativa, compartilhando resultados, sintetizando Regras de Manejo adotadas e gerando Coeficientes que permitam compreender / visualizar a evolução do Manejo de Água nas Lavouras e as consequências sobre o Multi-uso realizado na escala da Bacia (Ecológico, Urbano, Agro-industrial, Rural, Exploração de Pscicultura, etc..) e sobre as regras de alocação adotadas na bacia. A análise em multi-escala permite, ainda, aprimorar o conhecimento dos processos de consumo de água, com verificações pontuais (espaciais e temporais) e históricas de demandas e atendimentos pela natureza, simulação de cenários de desenvolvimento e análises de efeitos de mudanças nas regras de controle de estruturas hidráulicas, de alocação de água, e uso efetivo dos recursos hídricos locais/regionais. São adotadas as atualizações metodológicas e novos critérios contidos no Boletim FAO 56, para a determinação dos consumos de água das culturas (método Fao-Penman Monteith), além de métodos alternativos indicados para locais com falta de dados, assim como os critérios de determinação de coeficientes de culturas e solos para os estudos de consumo de água (Allen et al., 1998). CLIMA Precipitação, Insolação, Temp. Vento, Umidade, outras. Prec. (mm) Intermitente SOLO B.H Perfil do Solo Etc (m3/s) Variável, e Permanentement e exigida (mm) Qsi (m3/h) Constante T B.H Ponto de Controle Bacia S. I Prec. Bacia (Área captação) (mm) Intermitente RIO Q (m3/s) Variável no tempo Ecológico Urbano Industrial Figura 5. Representação do modelo conceitual de análise integrada de água e recursos hídricos (Victoria, 2004). 9

Conhecimento Qualificado Lavoura 1 Lavouras da Sub-bacia Bacia do Lajeado São José Bacia do Rio do Índio Bacia do Rio Uruguai Figura 6. A construção do conhecimento qualificado nas bacias (Victoria, 2004). 5. Comentários finais Salienta-se a receptividade dos agricultores às ações do projeto, principalmente devido a aplicabilidade integrada de todas as informações que estão sendo levantadas e monitoradas pelas equipes de campo, em consonância com as práticas orientadas pelo serviço de extensão das microbacias. Pretende-se ter sempre o foco da integração de informações e especialidades, com a necessária síntese da complexidade, e geração de indicadores que possibilitem conhecer se as práticas e ações implementadas (tanto pelos agricultores, como filosóficas do próprio projeto) estarão melhorando ou não o uso da água e dos recursos disponíveis, como forma de acompanhar o andamento do Projeto Microbacias 2 como um todo. As análises integradas desenvolvidas no projeto visam construir conhecimentos locais, e dar respostas aos problemas que o agricultor, famílias e comunidades enfrentam, e em cujas complexas temáticas encontra-se permanentemente envolvido o tomador de decisão final: o agricultor. Dessa forma, pretende-se estar contribuindo efetivamente para que a ciência esteja presente no dia a dia das comunidades rurais e urbanas, constituindo-se em instrumento efetivo de melhoria de renda e de construção de conhecimentos soberanos que elevem a qualidade de vida no Brasil. 10

6. Referências bbliográficas Allen RG, Pereira LS, Raes D, Smith M, 1998. Crop Evapotranspiration. Guidelines for Computing Crop Water Requirements. FAO Irrig. Drain. Pap. 56, FAO, Rome, 300 p. Victoria F.R.B., Teixeira J.L., 2001. Integrated tools to mitigate effects of climatic adversities. In: AA Soares and HM Saturnino (eds) Competitive Use and Conservation Strategies for Water and Natural Resources (Proc. 4th. Inter- Regional Conf. on Environment and the Water, Fortaleza, Brazil), ABID, Brasília, pp. 46-55. Victoria, F.B., 2004. Modelação multi-escala para o planejamento e gestão de recursos hídricos em bacias agrícolas com usos múltiplos. Tese de doutoramento. Engenharia Agrícola. ISA-UTL. 247p. Victoria F.B., Viegas Filho J.S., Pereira L.S., Teixeira J.L., Lanna A.E., 2005. Multiscale modeling for water resources planning and management in rural basins. Agricultural Water Management. Special Issue on Land and Water Use: Environmental Management Tools and Practices. August, 2005. 77 (1-3): 4-20. WMO, World Meteorological Organization, (1994). Guide to hydrological practices. Data Acquisition and Processing, Analysis, Forecasting and Others Aplications. WMO-nº.168. 5ed, 1994. 735p., Geneva. 11

12