15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental ESTABILIDADE DE TALUDE EM MACIÇO ROCHOSO, BAIRRO DUVAL DE BARROS, IBIRITÉ, MG.

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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental ESTABILIDADE DE TALUDE EM MACIÇO ROCHOSO, BAIRRO DUVAL DE BARROS, IBIRITÉ, MG. Larissa Flávia Montandon Silva 1 ; Ítalo Prata de Menezes 2. Resumo A ocupação desordenada das encostas, geralmente realizado por pessoas sem o conhecimento geológico-geotécnico do meio que estão se inserindo, tem como consequência a realização de intervenções que agravam o risco geológico natural. Para evitar desastres deste tipo, é importante realizar um estudo prévio para determinar se há a possibilidade de deslizamentos, tombamentos ou outro tipo de movimento de massa. O presente estudo foi desenvolvido em um talude rochoso na região metropolitana de Belo Horizonte, identificado durante o trabalho de campo realizado no âmbito do projeto Setorização de Riscos a Movimentos de Massa e Inundações executado pela CPRM. O maciço em questão corresponde a um milonito pertencente ao Complexo Belo Horizonte, e que segundo as classificações geomecânicas pelos Sistemas RMR e Q, trata-se de um maciço de qualidade pobre, com foliação mergulhando na direção da face do talude e que apresenta um sistema de descontinuidades que podem, eventualmente, condicionar a geração de deslizamentos em cunha ou deslizamentos planares. Foram realizadas análises cinemáticas utilizando estereogramas de projeção que indicaram a possibilidade de ocorrência de ruptura planar pelo plano da foliação, sendo restrita a pequenos blocos, e ruptura em cunha pela interseção do plano de foliação com a família de fratura (NE-SW) e com fraturas aleatórias no maciço, e pela interseção da família E-W com as fraturas aleatórias. Esta caracterização preliminar reforça a necessidade de estudos de detalhe, tais como ensaios de laboratório e análise de estabilidade por softwares específicos, com o objetivo de determinar o fator de segurança do talude. Abstract The slopes disordered occupation, usually performed by people without the geological and geotechnical knowledge of the environment, leads for interventions that exacerbate the natural geological risk. To avoid such disasters, it is important to perform a preliminary study to determine whether there is a possibility of planar sliding, toppling slides or another type of mass movement. This study was carried out on a rocky slope in the metropolitan region of Belo Horizonte, identified during field work carried out under the project "Setorização de Riscos a Movimentos de Massa e Inundações" executes by CPRM. The rock mass consists of a mylonite belonging to the Complexo Belo Horizonte, which according to the geomechanical ratings by RMR and Q Systems, it is a poor mass quality, with foliation dips toward the face of the slope and that has discontinuities system that may, eventually, generate wedge slides or planar slides. Kinematic analysis using stereographic projection method were performed which indicated the possibility of planar failure by the foliation plane, being restricted to small blocks, and wedge failure by the intersection of the foliation plane with the NE-SW family fracture and random fractures of the rock mass, and the intersection of the E-W family with random fractures. This preliminary characterization reinforces the need for detailed studies, such as laboratory testing and stability analysis for specific software, in order to determine the slope safety factor. Palavras-Chave estabilidade de talude, análise cinemática, milonito, Complexo Belo Horizonte. 1 2 Geól., Serviço Geológico do Brasil CPRM, (31) 3878-0312, larissa.montandon@cprm.gov.br Geól. MSc. Serviço Geológico do Brasil CPRM, (31) 3878-0312, italo.menezes@cprm.gov.br 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1

1. INTRODUÇÃO Os escorregamentos ou deslizamentos consistem no movimento rápido de massas de solo ou rocha, geralmente bem definidas quanto ao seu volume, cujo centro de gravidade se desloca para baixo e para fora de um talude natural, de corte ou aterro (Infanti Jr, N. & Fornasari Filho, N., 1998). Trata-se do tipo de acidente geológico de ocorrência mais comum no Brasil, principalmente no período chuvoso. Nos grandes centros urbanos, onde a ocupação é mais intensa, a construção de moradias avança com facilidade para terrenos geologicamente desfavoráveis, onde é feita sem critérios e normalmente com baixo padrão construtivo. Com o intuito de identificar e caracterizar áreas com ocorrência de inundações, enxurradas e deslizamentos, o Serviço Geológico do Brasil CPRM, inserido no Programa Nacional de Gestão de Riscos a Desastres Naturais, executou o mapeamento de risco nas áreas urbanas de diversos municípios do Brasil, dentre eles o município de Ibirité, localizado na região metropolitana de Belo Horizonte Minas Gerais (Figura 1). Durante a execução da Setorização de Risco do Município de Ibirité, foi identificado na Rua Cosme Velho, nº185, no bairro Duval de Barros, um talude de corte em rocha no quintal de uma residência. No contexto desse projeto, foi realizada a avaliação e descrição sucinta dos riscos geológico iminente existente para os moradores. Posteriormente, com o intuito de realizar a análise de estabilidade do talude, retornou-se ao local para obtenção de parâmetros geotécnicos para a caracterização geomecânica do maciço rochoso e para análise cinemática de suas descontinuidades. Figura 1 Mapa de Localização do maciço rochoso estudado. 2. METODOLOGIA Para a realização da análise de estabilidade do talude do referido maciço rochoso, foram desenvolvidas as seguintes etapas de estudo: caracterização da área de estudo; caracterização do maciço rochoso, e; análise cinemática por estereogramas de projeção. A caracterização do maciço rochoso se deu através de trabalho de campo visando descrever a litologia e o grau de alteração e resistência, bem como a medição de suas descontinuidades e seus respectivos aspectos de espaçamento, persistência, abertura, rugosidade, material de preenchimento e condições de umidade. Esse levantamento foi executado de acordo com as instruções ISRM (1983). Os dados obtidos pelo levantamento de campo relativo às características do maciço e de suas descontinuidades foram utilizados para obtenção da classificação geomecânica do maciço, tendo como referência o Sistema de Classificação de Maciços Rochosos (RMR) de Bieniawiski (1989) e também o Sistema Q de Barton et al. (1974). Tais sistemas foram escolhidos por serem 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 2

as classificações mais frequentemente utilizadas atualmente, além de fornecerem as faixas de parâmetros de resistência (coesão e atrito) nas quais, provavelmente o maciço se enquadra (Serra Júnior & Ojima, 1998). Para o cálculo de RQD foi utilizado a equação 1 proposta por Priest e Hudson (1976), na qual através do número médio de descontinuidades por metro linear, é possível obter um equivalente do parâmetro RQD que quantifica o total de espaçamentos (S) entre as descontinuidades iguais ou superior a 10 cm. (1) Onde f = número médio de descontinuidades por metro. Para tal, utiliza-se a técnica onde uma linha é demarcada horizontalmente em frente à face do talude onde as descontinuidades se apresentam em seu espaçamento médio, e realiza-se medidas das distâncias entre cada descontinuidade onde a linha horizontal as intersectam. A análise cinemática foi realizada através do método de projeção estereográfica de Hoek e Bray (1981), onde é possível correlacionar espacialmente as descontinuidades do maciço rochoso com a face do talude. Para tanto foi utilizado o software Dips 6.0, da RocScience. 3. CARACTERIZAÇÃO GEOLOÓGICA DO MACIÇO ROCHOSO O maciço rochoso estudado está inserido no contexto do embasamento meridional do Cráton São Francisco, caracterizado por terrenos granito-gnáissicos migmatíticos de idade meso a neoarqueana do denominado Complexo Belo Horizonte (Romano et. al., 2014). A figura 2 mostra a localização do ponto com relação à área do município de Ibirité e seu contexto geológico. Figura 2 Contexto geológico do maciço rochoso estudado (CMPR, 2009 Folha Contagem). Nota-se que o maciço de interesse está localizado exatamente em uma zona de falha transcorrente de direção NE-SW. Trata-se de um sericita-quartzo xisto, de coloração bege, sendo litologicamente um milonito característico de zonas de cisalhamento do Complexo Belo Horizonte (Figura 3). 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 3

Figura 3 Características do litotipo que constituí o maciço rochoso. 4. CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA DO MACIÇO ROCHOSO O maciço rochoso é composto por sericita-quartzo xisto de textura silto-arenoso (areia fina), moderada a levemente alterado, e resistência branda a muito branda (saprolito). Os parâmetros de resistência e alteração utilizados para a caracterização do maciço rochoso foram adaptados de Brown, 1981 "Suggested Methods for Rock Characterization Testing and Monitoring" ISRM. A xistosidade principal da rocha apresenta atitude média de 120/61, paralela à face do talude (118/62) e concordante com a direção da zona de cisalhamento de direção NE-SW. O maciço rochoso possui duas famílias de fraturas, a primeira com direção NE-SW e a segunda com direção de E-W (Figura 4). A família NE-SW é mais bem desenvolvida ao longo do maciço apresentando ângulos de mergulho subverticais a verticais. A segunda família de fraturas apresenta ângulos de mergulho mais baixos, em torno de 45º. A Tabela 1 mostra as características das famílias de fraturas, tais como espaçamento, persistência, abertura, rugosidade, alteração e preenchimento. Figura 4 Estereogramas das descontinuidades medidas no maciço rochoso. À esquerda, os polos e os planos principais de cada fratura; à direita o diagrama de rosetas indicando as direções das duas famílias de fraturas principais. Tabela 1 Características das famílias de fraturas. Família Orientação Espaçamento (m) Persistência (m) NE-SW 318/89 0,13 0,30 0,40 3,00 Abertura Rugosidade Preenchimento Fechada a 2 mm Ondulada áspera a lisa Sem preenchimento E-W 186/47 0,70 2,00 4,00 Fechada Ondulada áspera a lisa Sem preenchimento - Dispersas 0,15 0,30 0,50 1,00 Fechada a 2 mm Ondulada áspera a lisa Sem preenchimento 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 4

Conforme descrito na metodologia, o cálculo do RQD foi realizado segundo a equação Priest e Hudson (op. cit.) utilizando-se da técnica onde uma linha é demarcada horizontalmente em frente à face do talude. As figuras 5 e 6 mostram duas das porções do maciço de onde foram obtidos número médio de descontinuidades por metro. A partir disso, obteve-se uma média de 3,33 fraturas por metro linear, com o espaçamento médio de 0,30 metros, logo, um valor de RQD de 95%. Figura 5 Três fraturas da mesma família intersectam a trena em 1 metro, com espaçamento médio de 0,50m. Figura 6 Porção mais fraturada do maciço, onde quatro fraturas da mesma família intersectam a trena no espaço de 1 metro, com espaçamento variando de 0,13 a 0,31m. 5. CLASSIFICAÇÃO GEOMECÂNICA DO MACIÇO ROCHOSO A determinação das classes de maciço foi realizada de acordo com o sistema RMR (Rock Mass Rating) de classificação do maciço rochoso de Bieniawski (1989) e pelo Sistema Q de Barton (1974). O RMR constitui um sistema de classificação que permite relacionar índices de qualidade com parâmetros geotécnicos do maciço. A incidência destes parâmetros no comportamento geomecânico do maciço rochoso se expressa por meio do índice de qualidade RMR que varia de 0 a 100 pontos. Esta classificação leva em conta os seguintes parâmetros geomecânicos: resistência uniaxial da matriz rochosa; RQD (Rock Quality Designation); espaçamento das descontinuidades; condição das descontinuidades; condições hidrogeológicas; e orientação das descontinuidades com relação à escavação. Seguindo a metodologia descrita para definição dos parâmetros geotécnicos e os critérios de classificação geomecânica RMR, o maciço estudado apresenta a seguinte caracterização geotécnica (Tabela 2). Tabela 2 Caracterização dos parâmetros do maciço rochoso estudado para Sistema RMR (Bieniawski 1989). Parâmetro Característica do Maciço Peso Observações Resistência da rocha intacta 5-25 MPa 2 Correlacionado com o grau de resistência observado em campo de acordo com Brown, 1981. RQD 95% 20 Calculado no item 3. Espaçamento das fraturas 150 700 mm 10 - Condições das Fraturas Água subterrânea Superfícies onduladas lisas a ásperas; descontinuidades fechadas a 2 mm de abertura, paredes moderadamente alteradas. O maciço se encontrava seco, no dia da vistoria. 20-10 - Direção e Mergulho A direção e mergulho da xistosidade são paralelos à face do talude, apresentando uma condição aceitável. -25-15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 5

Assim, o maciço rochoso na área de estudo, apresenta pontuação 37, sendo considerado um maciço pobre da Classe IV, segundo o Sistema RMR. O Sistema Q baseia-se na avaliação do maciço rochoso a partir das características das descontinuidades, do valor de RQD, da presença de água e das condições de tensão in situ. O valor Q pode ser obtido pela seguinte equação 2: x x (2) Onde: RQD é a qualidade da rocha; J n, J r, J a e J w representam respectivamente o índice para o número de famílias de descontinuidade; de aspereza (rugosidade); de alteração; e o fator de redução devido à água; além do SRF (Stress Reduction Factor) que é o fator de redução devido ao campo de tensões in situ. A tabela 3 mostra os valores dos índices de Barton (1974) para o maciço rochoso estudado. Tabela 3 Índices de Barton (1974) para o maciço rochoso estudado. Parâmetro/Índice Característica do Maciço Rochoso Valor do Índice de Barton Observações RQD 95% Excelente - Jn Apresenta duas famílias de fraturas, descontinuidades dispersas, dentre elas as fraturas correspondentes a fraturas de alívio de tensão (desconfinamento). 6 - Jr Ondulada lisa, algumas vezes áspera. 2-3 Opta-se pela pior situação J a Paredes das descontinuidades levemente alteradas e oxidadas, eventualmente preenchida com partículas de areia. 2 - J w O maciço se encontrava seco no dia da vistoria. 1 - SRF O maciço se encontra na superfície e em uma zona de cisalhamento. 5 Optou-se pelo item a).b. do índice SRF, por melhor se adequar a situação do maciço exposto. RQD/ J n - 16 - J r/ J a - 1 - J w/ SRF - 0,2 - Avaliando-se os índices de Barton com relação ao maciço rochosos de Ibirité, chega-se a um valor de Q igual a 3,2, correspondendo a um maciço de qualidade pobre. Pela classificação do maciço estudado, segundo o Sistema RMR (Maciço Pobre, Classe IV), os valores prováveis para o ângulo de atrito estão entre 15º e 25º e coesão entre 100 e 200 KPa. Pelo critério de Barton a faixa de valores para o ângulo de atrito está entre 25º a 30º. O Sistema Q não fornece valores de coesão. 6. ANÁLISE DE ESTABILIDADE ANÁLISE CINEMÁTICA Para análise cinemática foi utilizado o valor de ângulo de atrito de 25º, pois a pontuação no Sistema RMR (37 pontos) é próxima ao limite com a Classe III na qual a faixa do ângulo de atrito é 25-30º; Além disso, 25º é o valor de ângulo de atrito coincidente com o valor obtido segundo a classificação do Sistema Q. Acrescenta-se o fato que a maior abrangência conferida pelo ângulo de atrito de 15º à área crítica nos estereogramas não atinge novos pontos suscetíveis a rupturas planares ou tombamentos. Já com relação à ruptura em cunha, atribuindo-se um ângulo de atrito menor (15º), alguns pontos de interseção entre planos de descontinuidade do maciço seriam incluídos, mas somente entre as fraturas dispersas no maciço, não das famílias principais e foliação. O total de interseções críticas passaria de 29,10% para 31,22% se fosse considerado 15º para o ângulo de atrito. 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 6

Avaliando-se a principal descontinuidade do maciço (xistosidade) com relação à possibilidade de ocorrência de rupturas planares e tombamentos, verifica-se que a média geral de sua atitude e que 60% das medidas de foliação obtidas em campo, encontram-se na área crítica a ocorrência de deslizamentos planares (Figura 7). Já com relação a tombamentos, não existe possibilidade de ocorrência para os planos de foliação do maciço. Para as famílias de fraturas, não se observa a possibilidade de rupturas planares, ou mesmo tombamentos. As principais possibilidades de ocorrência de ruptura em cunha (Figura 8) são pela interseção da foliação com a família NE-SW, e de ambas as famílias de fraturas (NE- SW e E-W) e da foliação com as fraturas dispersas de atitudes 345/83, 14/82, 86/76 e 59/64. Figura 7 Estereograma da análise cinemática de ruptura planar com relação aos planos de foliação. Figura 8 - Estereograma da análise cinemática de ruptura em cunha com relação aos planos de foliação, as famílias de fraturas e as demais descontinuidades dispersas. 7. DISCUSSÕES DOS RESULTADOS A classificação geomecânica do maciço pelo Sistema RMR (Bieniawski 1989) e Sistema Q (Barton 1974) indicaram um maciço de qualidade pobre, o que condiz com as características descritas em campo, e ocorrências de rupturas planares e em cunha de pequeno a médio porte existentes no local. O método utilizado para o cálculo do RQD baseia-se em uma porção do maciço onde o espaçamento das fraturas seja representativo do todo, indicando basicamente uma média geral do RQD para o todo o maciço. Entretanto ele apresenta porções mais fraturadas que, se consideradas separadamente, apresentaria um RQD inferior. O valor de 95% obtido para o maciço é característico de Classe I (maciço muito bom). Portanto os parâmetros de resistência, influenciado pelo seu grau de alteração, e a orientação das descontinuidades tiveram maior peso, diminuindo a classificação final do maciço. A análise cinemática mostrou a possibilidade de ocorrência de rupturas planares em decorrência da orientação da foliação e da face do talude, e ruptura em cunha pela interseção dos planos de foliação e fraturas. As rupturas planares são restritas a pequenas lascas de rocha, muito em função do mergulho da foliação e o ângulo da face do talude estar no limite da zona crítica a rupturas planares. De acordo com o estereograma da análise cinemática, com um ângulo de face do talude de 58º, não haveria mais a possibilidade de ruptura planar pelos planos da foliação. O topo do talude encontra-se coberto por uma fina camada de concreto, o que diminui ou impede a percolação de água pelas descontinuidades do maciço, promovendo mais facilmente a remoção de material do maciço por escoamento superficial da água (Figura 9). O espaçamento milimétrico da foliação, intersectada por fraturas também dificulta a ocorrência de rupturas planares de maior porte, e facilitam a ocorrência de ruptura em cunha (Figura 10). 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 7

Figura 9 Topo do talude recoberto por uma fina camada de concreto que ajuda na sua impermeabilização e a evitar a percolação da água pelas descontinuidades. Figura 10 Foliação intersectada por fraturas promovendo rupturas em cunha, ou planares de pequeno porte. A ruptura de blocos maiores é principalmente devida à remoção de material na base do talude (Figura 11). Com o descalçamento da base do bloco, este se torna instável pelo seu próprio peso e se rompe em planos de fraqueza (descontinuidades, ou porções mais alteradas) podendo se movimentar por queda ou deslizamento. A ruptura em cunha é formada principalmente pela intersecção da foliação com a família de fratura NE-SW ou com as demais fraturas dispersas. Além disso, é possível haver ruptura em cunha devido à interseção entre as duas famílias de fraturas observadas e as fraturas consideradas aleatórias (Figura 12). Os blocos formados apresentam dimensões decamétricas a métricas. Figura 11 Bloco instável devido à remoção de material da base. Paralelamente a face do talude ele é limitado pela foliação e lateralmente por uma fratura. Figura 12 Blocos formados pela ruptura em cunha, pela interseção entre faturas e a foliação. Um fato ocorrido nessa residência que se tornou de conhecimento da Defesa Civil Municipal, que a motivou a levar a equipe da CPRM ao local, foi um deslizamento do tipo planar que atingiu e interditou a entrada interna da moradia e que poderia ter atingido pessoas no quintal do lote. O deslizamento se deu pelo plano da foliação, no qual há presença de raízes de plantas, o que facilita a percolação de água, em uma porção do maciço onde ele se apresenta mais alterado, correspondendo a um saprolito (Figuras 13 e 14). Segundos informação da moradora, esse deslizamento ocorreu no período chuvoso de dezembro de 2013. Como orientação aos moradores, frisou-se a importância de não realizarem nenhum tipo de intervenção no talude sem o acompanhamento de profissionais especializados, evitar transitar ou permanecer próximo ao maciço, principalmente em períodos chuvosos, e em casos de eventos 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 8

intensos, proceder a remoção dos moradores para locais seguros. A Defesa Civil do município de Ibirité também foi orientada a buscar consultoria especializada com Engenheiros Geotécnicos a respeito da concepção e viabilidade econômica de projetos de qualquer tipo de obra de contenção no local, uma vez que se trata de um problema limitado a um lote com três moradias. Figura 13 Área onde ocorreu o deslizamento da rocha (saprolito), que interditou a entrada da residência. Havia pessoas no local que quase foram atingidas. Figura 14 Plano de deslizamento planar, favorecido pela foliação da rocha, e a presença de raízes de plantas, preenchendo a descontinuidade e facilitando a percolação da água. 8. CONCLUSÕES O estudo mostrou, através da classificação geomecânica e da análise cinemática por projeção estereográfica, que o maciço localizado na residência da Rua Cosme Velho, no Bairro Duval de Barros em Ibirité encontra-se instável, com possibilidade de ocorrência de rupturas planares e em cunha de pequeno a médio porte. As intervenções para abertura de acesso para moradias da parte de baixo do lote agravaram a condição de instabilidade do talude, uma vez que houve remoção de material da base do maciço, fazendo com que blocos métricos de rocha, limitados pelas descontinuidades do maciço, se tornassem instáveis pela ação de seu próprio peso. A impermeabilização do topo do maciço com a camada de concreto dificulta a percolação de água em suas descontinuidades, evitando assim rupturas de maior porte. Entretanto durante eventos de chuvas intensas e prolongadas podem ocorrer deslizamentos maiores devido à infiltração gradual da água no terreno, situação que condicionou a ruptura planar que ocorreu no quintal da residência. Para que se possa dimensionar melhor as medidas ou obras de contenção desse maciço, ainda é necessária a realização de ensaios para determinação de parâmetros intrínsecos do litotipo. Recomenda-se o ensaio de compressão uniaxial e/ou determinação do índice puntiforme para determinação da resistência da rocha intacta, e ensaio de cisalhamento direto para obtenção do ângulo de atrito e da coesão, além da determinação do peso específico da rocha, que são de fundamental importância para refinar a classificação geomecânica do maciço e a análise cinemática executadas no presente estudo. Esses parâmetros irão subsidiar o cálculo do fator de segurança, onde é possível considerar a influência da saturação da rocha e a geometria do talude nos processos de ruptura. 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 9

AGRADECIMENTOS Aos técnicos da Defesa Civil Municipal de Ibirité por acompanhar os geólogos da CPRM ao local onde se encontra o maciço rochoso investigado, e a Sr a. Rosa Penha de Carvalho, por permitir o acesso a sua residência e pelos relatos das ocorrências de deslizamentos. BIBLIOGRAFIA Barton N., Lien R., Lunde J. 1974. Engineering Classification of Rock Masses. Rock Mechanics. 6(4): 189 236. Bieniawski Z.T. 1989. Engineering rock mass classification. New York: John Wiley. 215p. Brown, E.T., (Ed) 1981. Rock characterization testing and monitoring, ISRM suggested methods. Pergamon, London, 211p. CPRM. Mapa Geológico - Folha Contagem SE.23-Z-C-V, Programa Geologia do Brasil, Escala 1:100.000, 2009. Hoek, E., Bray, J. 1981. Rock Slope Engineering. London, Institution of Min. Metall. & Elsevier Applied Science. Infanti Jr, N., Fornasari Filho, N. 1998. Processos de Dinâmica Superficial. In: A.M.S. Oliveira & S.N.A Brito (ed.) Geologia de Engenharia. São Paulo, ABGE, 131-152. International Society of Rock Mechanics (ISRM). 1983. Métodos para Descrição Quantitativa de Descontinuidades em Maciços Rochosos. São Paulo, ABGE e Comitê Bras. de Mec. Das Rochas, 132p. (Tradução 12). Priest, S.D., Hudson, J.A. (1976). Discontinuity spacing s in rock. Int. Jour. Rock. Mech. Min. Sci. & Geomech. 13, 135-148. Romano, A. W., Geologia e recursos minerais da folha Contagem SE.23-Z-C-V, estado de Minas Gerais, escala 1:100.000 / Antônio Wilson Romano... [et al.]; organizador Luiz Carlos da Silva. Brasília: CPRM, 2014. Serra Júnior, E., Ojima, L. M. 1998. Caracterização e Classificação de Maciços Rochosos. In: A.M.S. Oliveira & S.N.A Brito (ed.) Geologia de Engenharia. São Paulo, ABGE, 211-226. 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 10