CONTINUAÇÃO DA AULA 03. OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA e OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS

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Transcrição:

CONTINUAÇÃO DA AULA 03 OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA e OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS 1. DAS OBRIGAÇÕES DE DAR A COISA INCERTA 1.1. Definição: A expressão coisa incerta indica que a obrigação tem objeto indeterminado, mas não totalmente, porque deve ser indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade. É, portanto, indeterminada, mas determinável. Falta apenas determinar sua qualidade. Requisitos Indispensáveis das obrigações de dar coisa incerta a indicação do gênero, ou a quantidade (qualquer desses elementos). Art. 243. A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade. Exemplo: Não pode: ser objeto de prestação, por exemplo, a de entregar sacas de café, por faltar a quantidade; Não pode: ser objeto de prestação da obrigação a entrega de dez sacas, por faltar o gênero; Pode: constitui obrigação de dar coisa incerta a de entregar dez (quantidade) sacas de café gênero), porque o objeto é determinado pelo gênero e pela quantidade. Falta determinar somente a qualidade do café. Enquanto tal não ocorre, a coisa permanece incerta. 1.2. Requisitos Mínimos: indicação do gênero e da quantidade

A indicação ao menos do gênero e quantidade é o mínimo necessário para que exista obrigação, havendo a definição quanto ao gênero e a quantidade, mas falta a individuação da res debita. A determinação da qualidade da coisa incerta, que deverá em princípio ser intermediária. Não estando o devedor obrigado a presta a melhor coisa, e nem tão pouco poderá prestar a pior qualidade. Se, no entanto, da coisa a ser entregue só existirem duas qualidades, poderá o devedor entregar qualquer delas, até mesmo a pior. 1.3. Escolha e Concentração A determinação da qualidade da coisa incerta perfaz-se pela escolha. Feita esta, e cientificado o credor, acaba a incerteza, e a coisa torna-se certa, vigorando, então, as normas da seção anterior do Código Civil, que tratam das obrigações de dar coisa certa. Esta escolha é um ato unilateral que denomina-se concentração. A principal característica dessa modalidade de obrigação reside no fato de o objeto ou conteúdo da prestação, indicado genericamente no começo da relação, vir a ser determinado por um ato de escolha, no instante do pagamento. Portanto, coisa incerta não é coisa totalmente indeterminada, ou seja, não é qualquer coisa, mas uma parcialmente determinada, suscetível de completa determinação oportunamente, mediante a escolha da qualidade ainda não indicada. A definição a respeito do objeto da prestação, que se faz pelo ato de escolha passa a se chamar concentração depois da referida definição, e compete ao devedor a escolha, se outra coisa não se estipulou. Neste caso, em regra, a escolha só competirá ao devedor (salvo disposição em contrário). Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor.

Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente Portanto, a escolha só competirá ao credor se o contrato assim dispuser. Entretanto, as partes convencionar que a escolha competirá a terceiro, estranho à relação obrigacional, aplicando-se, por analogia, o disposto no art. 1.930 do Código Civil: Art. 1.930. O estabelecido no artigo antecedente será observado, quando a escolha for deixada a arbítrio de terceiro; e, se este não a quiser ou não a puder exercer, ao juiz competirá fazê-la, guardado o disposto na última parte do artigo antecedente. Art. 1.929. Se o legado consiste em coisa determinada pelo gênero, ao herdeiro tocará escolhê-la, guardando o meio-termo entre as congêneres da melhor e pior qualidade. 1.4. Perda ou Deterioração da Coisa Incerta Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito. Observação: Os efeitos da obrigação de dar coisa incerta devem ser apreciados em dois momentos distintos: I. Antes da Concentração (coisa incerta) Antes da escolha, permanece ela indeterminada, clamando pela individuação, pois a só referência ao gênero e quantidade não a habilita a ficar sob um regime igual à obrigação de dar coisa certa. Assim, antes da concentração não poderá o devedor alegar perda ou

deterioração, ainda que por força maior ou caso fortuito, pois o gênero nunca perece (genus nunquam perit). II Depois da Concentração (coisa certa) Só a partir do momento da escolha é que ocorrerá a individualização e a coisa passará a aparecer como objeto determinado da obrigação. Cumpre observar que a doutrina critica a expressão antes da escolha prevista no artigo antecedente, pois não basta que o devedor escolha o produto, sendo mister realize ainda o ato positivo de colocá-lo à disposição. Só nesse caso ele se exonerará da obrigação, caso se verifique a perda da coisa. Enquanto esta não é efetivamente entregue, ou, pelo menos, posta à disposição do credor. 2. OBRIGAÇÕES PECUNIÁRIAS 2.1 Definição: Obrigação pecuniária é obrigação de entregar dinheiro, ou seja, de solver dívida em dinheiro. Ex.: João empresta dinheiro para Maria com pagamento no mês seguinte. Assim, na data estipulada a devedora efetua o pagamento ao credor (entregando-lhe o dinheiro), extinguindo a obrigação (contrato de mútuo). Art. 315. As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subsequentes. O Código Civil adotou, assim, o Princípio do Nominalismo, pelo qual se considera como valor da moeda o valor nominal que lhe atribui o Estado, no ato da emissão ou cunhagem. Assim, o devedor de uma quantia em dinheiro libera-se entregando a

quantidade de moeda mencionada no contrato ou título da dívida, e em curso no lugar do pagamento, ainda que desvalorizada pela inflação. Entretanto, caso as partes não queiram os efeitos maléficos decorrentes da desvalorização monetária é a adoção da Cláusula de Escala Móvel, pela qual o valor da prestação deve variar segundo os índices de custo de vida (correção monetária). Vale ressaltar que a Lei n. 10.192, (de 14-2-2001), pretendendo desindexar a economia, declarou: Art. 2º, 1º, Lei 10.192\01: nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano. A Cláusula de Escala Móvel ou critério de atualização monetária, que decorre de prévia estipulação contratual, ou da lei, não se confunde com a Teoria da Imprevisão, que poderá ser aplicada pelo juiz quando fatos extraordinários e imprevisíveis tornarem excessivamente oneroso para um dos contratantes o cumprimento do contrato, e recomendarem sua revisão. 2.2. Diferença: Dívidas de Dinheiro e Dívidas de Valor Além das dívidas pecuniárias, existem as dívidas de valor, mas nesta segunda o dinheiro não constitui objeto da prestação, mas apenas representa seu valor. Ex.: Pensão Alimentícia: o devedor deve ao credor não determinada soma de dinheiro, mas a que for necessária à subsistência do credor dessa pensão, um valor determinado. 2.3. Diferença: Dívida em Dinheiro e Dívida Remuneratória Na dívida remuneratória os juros constituem, com efeito, remuneração pelo uso de capital alheio, que se expressa pelo pagamento, ao dono do capital, de quantia proporcional ao seu valor e ao tempo de sua utilização. A aplicação dessa cláusula serve também para afastar o vetusto princípio do nominalismo, segundo o qual a obrigação só poderá ser satisfeita levando-se em conta o seu valor nominal, o que em época de

inflação daria azo ao enriquecimento sem causa de uma das partes. Cumpre destacar que em regra a aplicação da taxa de juros legais é de 1% a.m. (um por cento ao mês). Vale ressaltar que as obrigações de solver dívida em dinheiro abrange as dívidas de valor (estabelecendo o valor a ser pago), as dívidas pecuniárias (que têm por objeto uma prestação em dinheiro) e, as dívidas remuneratórias (juros em caso de inadimplemento). Art. 316. É licito convencionar o aumento progressivo de prestações sucessivas. 2.4. Teoria da Imprevisão \ Rebus Sic Stantibus O dispositivo, invocando o direito anterior, adota a teoria da imprevisão, a fim de permitir que o valor da prestação seja corrigido por decisão judicial, sempre que houver desproporção entre o que foi ajustado durante a celebração do contrato e o valor da prestação na época da execução. Para tanto, é imprescindível que a causa da desproporção tenha sido realmente imprevisível e que tenha havido pedido expresso de urna das partes, sendo vedado ao juiz determinar a correção de ofício. Entretanto, na vigência do Código Civil de 1916, a ausência desse dispositivo foi compensada pela jurisprudência com a aplicação da Cláusula Rebus Sic Stantibus, do direito romano. Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.