A FORMAÇÃO DE CONHECIMENTOS MATEMÁTICOS DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL À LUZ DO RCNEI E DIRETRIZES CURRICULARES



Documentos relacionados
MATRIZES CURRICULARES MUNICIPAIS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA - MATEMÁTICA: UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA EM MOGI DAS CRUZES

O ENSINO FUNDAMENTAL DE 9 ANOS: CONTRIBUIÇÕES PARA UM DEBATE

Centro de Estudos Avançados em Pós Graduação e Pesquisa

Estado da Arte: Diálogos entre a Educação Física e a Psicologia

POLÍTICAS PÚBLICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

O Ensino a Distância nas diferentes Modalidades da Educação Básica

INSTITUTO SINGULARIDADES CURSO PEDAGOGIA MATRIZ CURRICULAR POR ANO E SEMESTRE DE CURSO

Educação Infantil: Fundamentos. Teleaula 1. Apresentação do Professor. Ementa. Organização da Disciplina. Pedagogia

EDUCAÇÃO INFANTIL E LEGISLAÇÃO: UM CONVITE AO DIÁLOGO

UMA ABORDAGEM QUANTITATIVA DE VARIÁVEIS RELACIONADAS A CURSOS DE MATEMÁTICA NO ESTADO DE SÃO PAULO

RELATO DE EXPERIÊNCIA: PROJETO DE EXTENSÃO PRÁTICA DE ENSINO E FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

PROCESSO N. 515/08 PROTOCOLO N.º PARECER N.º 883/08 APROVADO EM 05/12/08 INTERESSADA: SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, CULTURA E ESPORTES

Fórum Nacional de Diretores de Faculdades/Centros/Departamentos de Educação das Universidades Públicas Brasileiras (FORUMDIR)

A IMPORTÂNCIA DAS DISCIPLINAS DE MATEMÁTICA E FÍSICA NO ENEM: PERCEPÇÃO DOS ALUNOS DO CURSO PRÉ- UNIVERSITÁRIO DA UFPB LITORAL NORTE

BRINCAR E APRENDER: A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Palavras-chave: Currículo. Educação Infantil. Proposta Curricular. Políticas Curriculares.

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: REALIDADE OU ILUSÃO?

No final desse período, o discurso por uma sociedade moderna leva a elite a simpatizar com os movimentos da escola nova.

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO ELEMENTOS PARA O NOVO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

PLANO DE ENSINO PROJETO PEDAGÓCIO: 2010

Curso de Especialização em POLÍTICAS PÚBLICAS, GESTÃO E SERVIÇOS SOCIAIS

DEMOCRÁTICA NO ENSINO PÚBLICO

PRÓ-MATATEMÁTICA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS DE ANÁPOLIS

FUNDAMENTOS LEGAIS, PRINCÍPIOS E ORIENTAÇÕES GERAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL

CURSO: LICENCIATURA DA MATEMÁTICA DISCIPLINA: PRÁTICA DE ENSINO 4

RETIFICAÇÃO DO EDITAL DE ABERTURA DAS INSCRIÇÕES

Curso de Especialização Educação Infantil 2ª Edição EMENTA DAS DISCIPLINAS

********** É uma instituição destinada ao atendimento de crianças de 0 a 3 anos e faz parte da Educação Infantil. Integra as funções de cuidar e

Aprendizagem da Matemática: um estudo sobre Representações Sociais no curso de Administração

ORGANIZAÇÃO DE ESPAÇO FÍSICO NA CRECHE ( os cantinhos ), que possibilitou entender o espaço como aliado do trabalho pedagógico, ou seja, aquele que

PERGUNTAS FREQUENTES SOBRE ENSINO FUNDAMENTAL DE 9 ANOS

A IMPORTÂNCIA DOS FUNCIONÁRIOS NO PROCESSO EDUCATIVO NAS ESCOLAS

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Orientações para a elaboração do projeto escolar

Curso de Especialização em ENSINO DE QUIMICA

Anexo II CARGOS DE DCA

A EDUCAÇÃO FÍSICA NAS ESCOLAS MUNICIPAIS DE PONTA GROSSA/PR: ANÁLISE DO ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO DAS AULAS

ATUAÇÃO DO MACROCAMPO PARTICIPAÇÃO ESTUDANTIL EM SOCIOLOGIA NO SEVERINO CABRAL

Faculdade de Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Educação RESUMO EXPANDIDO DO PROJETO DE PESQUISA

CASTILHO, Grazielle (Acadêmica); Curso de graduação da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás (FEF/UFG).

Educação a Distância na UFMG: iniciativas na área da saúde. André Santos, Matheus Machado e Pollyanna Moreira

INDICAÇÃO CEE Nº : 53/ CES - Aprovada em PROCESSO CEE Nº : 398/2000 Reautuado em 28/01/05

CURSO: Matemática. Missão

XXV ENCONTRO NACIONAL DA UNCME

ANEXO 8 RESOLUÇÃO CNE/CP 1, DE 18 DE FEVEREIRO DE (*)

CURSOS PRECISAM PREPARAR PARA A DOCÊNCIA

Documento orientador de um curso que traduz as políticas acadêmicas institucionais

PLANO DE ENSINO PROJETO PEDAGÓGICO 2010

2.5 AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

UNCME RS FALANDO DE PME 2015

DIVISÃO DE ASSUNTOS ACADÊMICOS Secretaria Geral de Cursos PROGRAMA DE DISCIPLINA

PRÁTICA PROFISSIONAL INTEGRADA: Uma estratégia de integração curricular

DIRETRIZES CURRICULARES PARA OS CURSOS DE GRADUAÇÃO DA UTFPR

O olhar do professor das séries iniciais sobre o trabalho com situações problemas em sala de aula

EDUCAÇÃO INFANTIL. COORDENADORA Ângela Maria Soares Ferreira

Apresentação do Professor. Educação Infantil: Procedimentos. Teleaula 1. Ementa. Organização da Disciplina. Contextualização.

Ementário do Curso de Pedagogia, habilitações: Educação Infantil e Séries Iniciais

AS NOVAS DIRETRIZES PARA O ENSINO MÉDIO E SUA RELAÇÃO COM O CURRÍCULO E COM O ENEM

crítica na resolução de questões, a rejeitar simplificações e buscar efetivamente informações novas por meio da pesquisa, desde o primeiro período do

Curso de Especialização em DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO INFANTIL E ANOS INICIAIS

METODOLOGIA DO ENSINO DA ARTE. Número de aulas semanais 4ª 2. Apresentação da Disciplina

ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO OBRIGATÓRIO

JUSTIFICATIVA OBJETIVOS GERAIS DO CURSO

difusão de idéias EDUCAÇÃO INFANTIL SEGMENTO QUE DEVE SER VALORIZADO

EDUCAÇÃO INCLUSIVA: ALUNO COM DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA NO ENSINO REGULAR

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO RESOLUÇÃO CNE/CP 1, DE 18 DE FEVEREIRO DE 2002 (*)

Ministério da Educação Secretaria de Educação Básica SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL TERMO DE REFERÊNCIA

EDUCAÇÃO E CIDADANIA: OFICINAS DE DIREITOS HUMANOS COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA ESCOLA

SÍNTESE DA 5ª REUNIÃO DE REESTRUTURAÇÃO DO PROJETO POLITICO PEDAGÓGICO DO CURSO DE PEDAGOGIA DA FCT/PRESIDENTE PRUDENTE. 16\10\14 das 8h30 às 11h30

Organização Curricular e o ensino do currículo: um processo consensuado

NÚCLEO DE APOIO DIDÁTICO E METODOLÓGICO (NADIME)

TUTORIA DE ESTÁGIO: CONTRIBUIÇÕES À FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES/AS

ESCLARECIMENTOS SOBRE OS CURSOS DE BACHARELADO E LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA

CUIDAR, EDUCAR E BRINCAR: REFLETINDO SOBRE A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

DA UNIVERSIDADE AO TRABALHO DOCENTE OU DO MUNDO FICCIONAL AO REAL: EXPECTATIVAS DE FUTUROS PROFISSIONAIS DOCENTES

A construção da. Base Nacional Comum. para garantir. Direitos e Objetivos de Aprendizagem e Desenvolvimento

UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE UNIPLAC PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, EXTENSÃO E PÓS-GRADUAÇÃO COORDENAÇÃO DE EXTENSÃO E APOIO COMUNITÁRIO

FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DE DOCENTES NO ENSINO SUPERIOR

Ementas aprovadas nos Departamentos (as disciplinas obrigatórias semestrais estão indicadas; as demais são anuais)

PROJETO BRINQUEDOTECA: BRINCANDO E APRENDENDO

Art. 3º Os detentores de cargo de Educador Infantil atuarão exclusivamente na educação infantil.

II. Atividades de Extensão

Curso: Pedagogia ( 1 ª Licenciatura) I Bloco. Fundamentos Epistemológicos de Pedagogia 60 horas

Desafios da EJA: flexibilidade, diversidade e profissionalização PNLD 2014

Tema: Educação do Campo

COORDENADORA: Profa. Herica Maria Castro dos Santos Paixão. Mestre em Letras (Literatura, Artes e Cultura Regional)

Instituto de Educação

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA AS ALTAS HABILIDADES / SUPERDOTAÇÃO. Secretaria de Educação Especial/ MEC

Audiência Pública Senado

A NECESSIDADE DA FORMAÇÃO ESPECÍFICA DOS PROFISSIONAIS QUE ATUAM NA EDUCAÇÃO INFANTIL. Resumo

Pedagogia Estácio FAMAP

UMA EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA NO CONTEXTO DE CRECHE

Coordenadoras: Enalva de Santana Santos e Márcia Soares Ramos Alves

PROCESSO DE TRABALHO GERENCIAL: ARTICULAÇÃO DA DIMENSÃO ASSISTENCIAL E GERENCIAL, ATRAVÉS DO INSTRUMENTO PROCESSO DE ENFERMAGEM.

PLANO DE TRABALHO Período: 2014/ CONTEXTO INSTITUCIONAL

Orientações para informação das turmas do Programa Mais Educação/Ensino Médio Inovador

DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL

Curso de Especialização em MATEMÁTICA FINANCEIRA E ESTATÍSTICA

Plano de Ensino Docente

Justificativa: Cláudia Queiroz Miranda (SEEDF 1 ) webclaudia33@gmail.com Raimunda de Oliveira (SEEDF) deoliveirarai@hotmail.com

Transcrição:

A FORMAÇÃO DE CONHECIMENTOS MATEMÁTICOS DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL À LUZ DO RCNEI E DIRETRIZES CURRICULARES Mirian Ferreira de Brito 1 Universidade do Estado da Bahia UNEB Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP mirianfbrito@gmail.com Resumo: Neste trabalho procuramos construir uma análise breve sobre a formação de conhecimentos matemáticos de professores da educação infantil à luz do Referencial Curricular (1998) e das Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil (2009). Para tanto, nos apoiamos numa pesquisa de abordagem qualitativa de caráter bibliográfico, com intuito de registrar os primeiros esboços de nossa pesquisa para o doutoramento em Educação Matemática. Como resultados iniciais podemos perceber que nestes documentos são indicados conteúdos matemáticos básicos para educação infantil e, a articulação entre eles e as atividades comuns da educação infantil, dentre outros. Nesta perspectiva, entendemos que os cursos de licenciatura ganharam na última década mais detalhamento e rigor com a complementação das leis, entretanto, a formação exigida pela legislação em vigor não especifica as características próprias para este período de educação e, desta maneira, não recomenda ou indica uma licenciatura que tenha todas as condições necessárias para atender os pequenos. Palavras-chave: Educação Infantil; Conhecimentos Matemáticos; Formação de Professores. 1. Introdução A formação do conceito de criança e infância é relativamente nova uma vez que data dos séculos XVI e XVII quanto aflorou o sentimento de família. Antes deste período a criança era visualizada como uma oposição ao adulto por sua precária idade ou maturidade. Este novo conceito pode ser compreendido pelo elevado e natural índice de mortalidade infantil existente até então. Inicialmente este sentimento ganhou duas vertentes distintas: ora a criança era considerada ingênua, inocente e graciosa e, portanto, precisava ser cuidada; ora a criança era considerada como um ser imperfeito e incompleto 1 Doutoranda do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SP, sob orientação da Professora Dra. Ana Lúcia Manrique. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 1

precisando da moralidade e educação do adulto (KRAMER, 1992; CASTRO, 1996). Este quadro, porém, muda com a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/1996 (LDB). Esta Lei reconhece a educação infantil [...] como primeira etapa da educação básica, determina a inclusão de creches e pré-escolas aos sistemas de ensino, evidenciando o seu caráter educativo, e a formação de nível superior (ou médio) para professoras/es desse nível. Essas mudanças, principalmente em relação à concepção assistencialista, abalaram todo um imaginário social, em relação à educação da criança pequena, construído historicamente e provocaram um intenso debate, e até mesmo embates, acerca das implicações políticas, econômicas e administrativas para a sua implementação (DIAS; PEQUENO, 2012, p. 198). Além disso, as transformações ocorridas tiveram como alicerce movimentos sociais, particularmente o [...] movimento feminista, que após a abertura política iniciada em meados dos anos 1980, trouxe para discussão as reivindicações pelos direitos constitucionais, à educação pública, gratuita e de qualidade e, principalmente o reconhecimento dos direitos à educação para crianças de 0 a 6 anos (FAVORETO, 2011, p. 16437). Estes direitos foram reconhecidos pela Constituição, sancionados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB e, concretizado por outras leis e documentos posteriores garantindo a inserção da educação infantil na educação básica do país. Dentre estes, dois deles foram merecedores de nossa análise: Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998) e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2009). O Referencial Curricular, de acordo com o Ministério da Educação - MEC (BRASIL, 1998, p. 14), teve por objetivo [...] fornecer o diálogo com propostas e currículos que se constroem no cotidiano das instituições, sejam creches, pré-escolas ou nos diversos grupos de formação existentes nos diferentes sistemas. Já as Diretrizes Curriculares Nacionais foram instituídas em dezembro de 2009 e apresentou como objetivo principal reunir [...] princípios, fundamentos e procedimentos definidos pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, para orientar as políticas públicas e a elaboração, planejamento, execução e avaliação de propostas pedagógicas e curriculares de Educação Infantil (BRASIL, 2010, p. 11). Para muitos estudiosos da área, Apesar do RCNEI não ser mandatório e apenas reforçar a função de assessoria e apoio exercida pelo MEC no objetivo de melhorar a qualidade no encaminhando Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 2

pedagógico dos educadores da Educação Infantil, ele se constituiu como um currículo de fato, no lugar de atuar apenas como um referencial para discussões e debates sobre a Educação Infantil (FAVORETO, 2011, p. 6). De acordo com Aquino e Vasconcellos (2005), o Referencial foi organizado por âmbito de Experiência e Eixos e não trouxe inovações, já que manteve os mesmos modelos tradicionais. Assim, o RCNEI foi constituído por três volumes. O primeiro de cunho introdutório registrou algumas considerações sobre creches, pré-escolas, criança, o ato de educar, o perfil profissional do professor de Educação Infantil e os objetivos para esta escolaridade. O segundo volume, intitulado Formação pessoal e social, traz a concepção de aprendizagem que norteia o documento e apresenta algumas reflexões sobre o desenvolvimento da identidade e da autonomia, colocando-as como mais um objetivo a ser alcançado com as crianças e salientando que ambas estão intimamente relacionadas com o processo de socialização (LUCAS, 2005, p. 86). O terceiro volume, com título Conhecimento de Mundo, foi dividido em seis eixos denominados: movimento; música; artes visuais; linguagem oral e escrita; natureza e sociedade; e matemática. Particularmente sobre este último eixo, o Referencial destaca que em relação à [...] matemática: as crianças vivenciam uma série de situações que envolvem números, quantidades, noções de tempo, de espaço como, por exemplo, conferir figurinhas, marcar os pontos em um jogo, mostrar com os dedos a idade, repartir balas, etc. [...] (LUCAS, 2005, p. 87). Este destaque sugere que o ensino de matemática precisa ser cuidadoso e arcar com certas características necessárias para garantir um aprendizado significativo de crianças neste período escolar. De acordo com as Diretrizes Curriculares (BRASIL, 2010, p. 25), As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira [...] e, por isso, especificamente sobre os conhecimentos matemáticos devem recriar [...] em contextos significativos para as crianças, relações quantitativas, medidas, formas e orientações espaço temporais [...]. Na versão das Diretrizes o professor da educação infantil precisa construir uma matemática abrangente e agregar o conteúdo as atividades próprias desta fase escolar. Deste modo, entendemos em observância a estes dois documentos que a formação de conhecimentos matemáticos do professor que ensina para a educação infantil deve ser precavida e incluir conteúdos específicos que vão da aritmética à geometria numa articulação com as atividades comuns a este contexto escolar. Além de educar, esta Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 3

formação deve levar em consideração o outro item igualmente importante desta fase de escolaridade: o cuidar. 2. Professores da educação infantil: entre o cuidar e o educar Os movimentos, estudos e pesquisas relacionados à educação infantil garantiram nestas últimas décadas alguns avanços, entretanto, o processo para a formação do professor desta etapa de escolaridade parece não ter alcançado um progresso tão substancial. Ela ainda é basicamente a mesma destinada à educação dos primeiros anos do ensino fundamental e nos dois casos, não atende as reais necessidades das crianças envolvidas. Segundo a LDB 9.394/96, Artigo 62 (BRASIL, 1996): A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. A formação do professor para atuar na educação infantil, de acordo com Brito e Sodré (2011), ainda pode ganhar um direcionamento bem mais conturbado, se levarmos em conta que o Artigo 62 não especifica a licenciatura adequada, ou seja, para esta Lei qualquer uma delas pode garantir a formação deste profissional. Neste sentido, as autoras argumentam que a licenciatura em matemática, por exemplo, garante uma formação razoável de conhecimentos matemáticos, no entanto, não apresenta componentes curriculares voltados para este período da educação básica. A formação de professores numa licenciatura enfrenta outros problemas. De acordo com Gatti e Barreto (2009) a desvalorização salarial e as condições de trabalho são fatores que tornam a licenciatura como uma das formações profissionais de menor atratividade do país neste início de século. Nesta direção, Bonetti (2013, p. 2), argumenta que O reconhecimento de uma profissão implica a sua valorização quanto à remuneração, à carga horária de trabalho condizente com o título, o plano de carreira e quanto à garantia dos demais direitos trabalhistas, como férias e aposentadoria, entre outros. [...]. No geral, o professor da educação infantil, assim como o dos primeiros nos do ensino fundamental tem carga horária mais elevada do que o professor das séries Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 4

finais do ensino fundamental ou do ensino médio e, muitas vezes recebem salários menores que o outro grupo (SANTANA, 2008). Para Cerisara (2002, p. 334) há uma clara distinção entre os campos de trabalho. [...] Falar em professora de educação infantil é diferente de falar em professora de séries iniciais e isso precisa ser explicitado para que as especificidades do trabalho das professoras com as crianças de 0 a 6 anos em instituições coletivas públicas de educação e cuidado sejam respeitadas e garantidas. Outro problema constantemente apontado por especialistas esta numa certa indefinição dos profissionais que atuam neste período escolar. Em relação aos profissionais da escola, João Antonio Cabral de Monlevade (BRASIL, 2005), na publicação Funcionários de escolas: cidadãos, educadores, profissionais e gestores/elaboração: algumas indicações, afirma que o professor e também o funcionário precisam reunir no mínimo um conjunto de três competências para ensinar. Para o professor: especialidade em um campo de conhecimento; habilidade metodológica de ensino-aprendizagem; e, finalmente, a de educador escolar com preparo e comprometimento com a educação e proposta pedagógica da escola; para o funcionário: [...] a de especialista num [...] campo de conhecimento técnico [...]; a de habilitado na metodologia; a de educador escolar, [...] preparado e comprometido com a educação e com a proposta pedagógica da escola onde atua (BRASIL, 2005, p. 68). No entanto, o que verificamos na prática são dificuldades de formação tanto de funcionário quanto de professores. Particularmente em relação ao currículo para formação de professores, Silva (2011, p. 16) destaca a necessidade de um outro modelo de professor para enfrentar a atual realidade escolar que engloba [...] conceitos de sociedade, educação, conhecimento, professor e aluno, associados [...] aos conhecimentos práticos e teóricos fundamentais ao trabalho docente. Para a autora (2011, p. 16), A partir da constituição deste novo modelo de professor, há a necessidade de reordenar e reorganizar o trabalho docente nos cursos de formação inicial. Entretanto, melhorar a qualidade de prática pedagógica pode corresponder ou não corresponder à melhoria desta formação. Este novo modelo de professor começou a ser delineado com a instituição de algumas Leis, Referencial Curricular, Resoluções e Diretrizes. Neste sentido, o Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno CNE/CP, como ampliação destas condições, instituiu duas Resoluções estabelecendo modificações nos cursos de licenciaturas para Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 5

formação de professores CNE/CP 01 e 02 (BRASIL, 2002). Nas Resoluções o poder público brasileiro instituiu diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores da educação básica e, também a duração e carga horária mínima para os cursos de licenciaturas. Nas Resoluções podemos verificar dentre outras coisas, preocupação com seleção de conteúdos, articulação teoria e prática, assim como no Referencial e nas Diretrizes Curriculares. Especialmente em relação a estes itens, a participação do professor se mostra essencial e, seu processo formativo pode se tornar uma experiência bem sucedida ou não. A formação em licenciatura, contudo, não garante totalmente ou necessariamente uma qualificação ideal. A qualificação de qualquer profissional também depende de seu próprio interesse, das condições de aprendizagem e prática, continuidade de estudos, dentre outros. Deste modo, percebemos que a formação de professores instituída pela legislação não frisa exatamente a educação infantil. A normatização para o ensino desta etapa de escolaridade foi ampliada consideravelmente nas últimas décadas, porém, ainda carece de ampliação que inclua aspectos próprios da educação infantil. Deste modo, entendemos em observância a estes dois documentos que a formação de conhecimentos matemáticos do professor que ensina para a educação infantil deve ser minuciosamente planejada e incluir conteúdos específicos que vão da aritmética à geometria numa articulação com as atividades comuns a este contexto escolar. Além de educar, esta formação deve levar em consideração o outro item igualmente importante desta fase de escolaridade: o cuidar. 3. Considerações Finais Neste artigo procuramos por meio de uma abordagem qualitativa e de uma pesquisa bibliográfica construir os primeiros esboços da nossa pesquisa direcionada ao doutoramento em Educação Matemática. Nesta perspectiva, construímos uma análise breve acerca da formação de professores da educação infantil no que tange aos conhecimentos matemáticos. Para tanto, levamos em consideração especialmente dois documentos produzidos pelo governo brasileiro: o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. O RCNEI e as Diretrizes Curriculares apontam para um ensino de matemática voltado para a junção teoria e prática. Estes documentos indicam também conteúdos que devem ser trabalhados na educação infantil e, neste sentido, sinalizam a necessidade de Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 6

uma formação apropriada que considere os dois pilares essenciais desta fase de escolarização: o cuidar e o educar. Estes, contudo, não estão presentes em todos os cursos de licenciaturas, a exemplo do Curso de Matemática. Para atuação na educação infantil, a graduação mais adequada poderia ser a Licenciatura em Pedagogia, uma vez que inclui na sua matriz curricular, componentes direcionados para esta faixa etária. Estas licenciaturas, todavia, apresentam em geral, poucos componentes que discutem os conhecimentos matemáticos. E quando o fazem, muitas vezes enfatizam alguns dos conteúdos matemáticos considerados primordiais, sem levar em consideração reflexões mais gerais e específicas desta etapa de escolarização, bem como, considerações essenciais da própria matemática para estas crianças, como por exemplo, o conhecimento prévio, as situações reais que envolvem este público, a manipulação de materiais, e/ou a inclusão de outros conteúdos matemáticos ou fatores nas atividades e brincadeiras desta fase de escolaridade. Deste modo, entendemos que em relação aos conhecimentos matemáticos, uma formação mais razoável e adequada para o professor que atua na educação infantil deveria observar conteúdos matemáticos específicos, promover articulação entre eles e, entre as atividades e brincadeiras. Este ensino precisa considerar a criança como um todo, ou seja, deve considerar sua identidade, autonomia, necessidades e conhecimento prévio. O professor deve ainda, considerar que nesta fase a criança precisa de educação sim, mas também de cuidados que devem se estender além do seu lar ou família. 4. Referências AQUINO, L. M. L. de; VASCONCELLOS, V. M. R. de. Orientação curricular para a educação infantil: referencial curricular nacional e diretrizes curriculares nacionais. In: VASCONCELLOS, V. M. R de (Org.). Educação da infância: história e política. Rio de Janeiro: DP&A, 2005. p. 99-116. BONETTI, Nilva. O professor de educação infantil um profissional da educação básica: e sua especificidade? Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/gt07-1779-- Int.pdf?#zoom=81&statusbar=0&navpanes=0&messages=0>. Acesso em: 21 fev. 2013. BRASIL. Conselho Nacional de Educação Conselho Pleno. Resolução CNE/CP 1 e CP 2. Brasília: CNE, 2002. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 7

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para a educação infantil. v. 1, 2 e 3. Brasília: MEC/SEF, 1998. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes curriculares nacionais para a educação infantil. Brasília: MEC, SEB, 2010. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Funcionários de escolas: cidadãos, educadores, profissionais e gestores/elaboração: João Antônio Cabral de Monlevade. Brasília: Universidade de Brasília, Centro de Educação a Distância, 2005. BRITO, Mirian Ferreira de Brito; SODRÉ, Liana Gonçalves Pontes. Conhecimentos geométricos e educação infantil: imagens de alunos e alunas do curso de licenciatura em matemática. In: III SEMAT: A Interconexão da Resolução de Problemas com as demais tendências em Educação Matemática. Teixeira de Freitas: UNEB, 2011, p. 1-12. CERISARA, Ana Beatriz. O referencial curricular nacional para a educação infantil no contexto das reformas. Educação e Sociedade, Campinas, vol. 23, n. 80, setembro/2002, p. 326-345. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 04 dez. 2012. CASTRO, Lúcia Rabello de. O lugar da infância na modernidade. Psicologia Reflexão e Crítica, Porto Alegre, v. 9, n. 02, p. 307-335, 1996. DIAS, Adelaide Alves; PEQUENO, Maria Gorete Cavalcante. Formação docente e currículo: possíveis encontros entre educação infantil e educação ambiental. In: Espaço do Currículo, v.5, n.1, jun-dez. 2012, p. 197-206. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/rec>. Acesso em: 21 fev. 2013. FAVORETO, Elizabeth Dantas de Amorim. Diretrizes curriculares para educação infantil e currículo multicultural. In: X Congresso Nacional de Educação EDUCERE. I Seminário Internacional de Representações Sociais, Subjetividade e Educação. PUC-PR, 2011. Disponível em: <http://educere.bruc.com.br/cd2011/pdf/6374_4043.pdf>. Acesso em: 02 fev. 2013. GATTI, Bernadete Angelina; BARRETO, Elba Siqueira de Sá (Coord.). Professores do Brasil: Impasses e Desafios. Brasília: UNESCO, 2009. KRAMER, Sonia. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. 4. ed. São Paulo: Cortez, 1992. Coleção: biblioteca da educação. LUCAS, Maria Angélica Olivo Francisco. Educação infantil: algumas reflexões sobre seus fundamentos teóricos e metodológicos. In: Revista HISTEDBR On-line. Campinas, n.17, p. 79-90, mar. 2005. Disponível em: <http://www.histedbr.fae.unicamp.br/revista/revis/revis17/art08_17.pdf>. Acesso em: 23 mar. 2013. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 8

SANTANA, Mirian Brito de. Geometria e educação infantil: múltiplas imagens, distintos olhares. 2008. 118 f. Dissertação de Mestrado. (Mestrado em Educação e Contemporaneidade) Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2008. SILVA. Daniele Dutra. A prática docente reflexiva: o currículo na educação infantil. Monografia (Especialização Administração, Supervisão e Orientação Escolar) - Faculdade Redentor Departamento Nacional de Pós-Graduação e Atualização. Três Rios, 2011. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 9