AVALIAÇÃO DE ELEMENTOS POTENCIALMENTE TÓXICOS NOS SEDIMENTOS DO RIO GRAVATAÍ (RS) NOS ANOS DE 2000 E 2013

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Transcrição:

CIÊNCIAS BIOLÓGICAS AVALIAÇÃO DE ELEMENTOS POTENCIALMENTE TÓXICOS NOS SEDIMENTOS DO RIO GRAVATAÍ (RS) NOS ANOS DE 2000 E 2013 Níkolas Bitello Winck 1 Nathalia Chaves Cardoso 2 Celso Troian de Carvalho 3 Maria Lucia Kolowski Rodrigues 4 RESUMO No RS, um dos ambientes fluviais mais sujeitos à contaminação por elementos potencialmente tóxicos é a bacia hidrográfica do rio Gravataí, região densamente urbanizada, com um importante pólo industrial e significativa atividade agrícola. Neste estudo, comparou-se o teor de Cd, Hg, Cu e Zn nos sedimentos do rio Gravataí em 2000 e 2013, visando identificar variações espaciais e temporais em sua qualidade ambiental. Na análise dos dados, usou-se o índice de geoacumulação. Os dados revelaram decaimento na qualidade ambiental do rio, no aspecto espacial e temporal, havendo a necessidade de tomadas de ação para minimizar os riscos locais de exposição humana e ecológica aos efeitos prejudiciais dos elementos avaliados. Palavras-chave: Sedimento, rio Gravataí, elementos potencialmente tóxicos, índice de geoacumulação. ABSTRACT The Gravataí river basin is one of the fluvial environments most subject to contamination by potentially toxic elements in RS State, Brazil. This region comprises a densely populated area, an important industrial complex and significant agricultural activities. In this study we compared the content of Cd, Hg, Cu and Zn in Gravataí river sediments collected in 2000 and 2013, in order to identify spatial and temporal environmental quality variations. Data analysis was performed using the geoaccumulation index. The results revealed a decrease in the environmental quality of Gravataí river, both in spatial and temporal aspects. Actions are necessary in order to minimize risks of local human and ecological exposure to the harmful effects of the evaluated elements. Keywords: Sediment, Gravataí river, pottencially toxic elements, geoaccumulation index. 1 Acadêmico do curso de Engenharia Ambiental/UFRGS Bolsista PROBIC/FAPERGS/FEPAM 2 Acadêmica do curso de Engenharia Ambiental/UFRGS Bolsista PIBIC/CNPq/FEPAM 3 Químico do Serviço de Amostragem da FEPAM 4 Engenheira Química da Divisão de Química e do Programa de Pesquisas Ambientais da FEPAM Orientadora Revista de Iniciação Científica da ULBRA Canoas n.12 p.27-37 2014 Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014 27

INTRODUÇÃO Os elementos potencialmente tóxicos, uma vez introduzidos no ambiente fluvial, estão sujeitos a processos que podem favorecer sua dispersão ou acúmulo no sedimento de fundo. Os sedimentos atuam como um reservatório destes elementos, constituindo um importante arquivo de contaminações passadas. Atividades microbianas e alterações nas condições físico-químicas da água, como ph, força iônica, temperatura e potencial de oxidaçãoredução, podem disponibilizá-los ao ambiente e causar sérios problemas aos organismos e aos ecossistemas em geral (FÖRSTNER; WITTMANN, 1981; ESTEVES, 1988). No Rio Grande do Sul, um dos ambientes fluviais mais sujeitos à contaminação por elementos potencialmente tóxicos é a bacia hidrográfica do rio Gravataí (Figura 1), uma região densamente urbanizada, que abrange principalmente municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre e que possui um importante pólo industrial e significativa atividade agrícola (especialmente orizicultura). A bacia hidrográfica do rio Gravataí está localizada na região nordeste do Estado, onde ocupa uma área de aproximadamente 2.000 km 2. Por ser um rio de planície, seu trecho inferior possui uma baixa velocidade da água e seu manancial é utilizado principalmente para abastecimento público, irrigação e recepção de grande carga de despejos domésticos e industriais (FEPAM, 2011). Com o objetivo de identificar variações espaciais e temporais na qualidade ambiental dos sedimentos do rio Gravataí, neste estudo foram comparados os teores de elementos potencialmente tóxicos (Cd, Cu, Hg e Zn) em amostras coletadas ao longo do curso d água, nos anos de 2000 e 2013. Figura 1: Localização da área de estudo e dos três pontos de amostragem (GR 034, GR 008 e GR 006). 28 Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014

Os dados de 2000 foram compilados em relatório da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luís Roessler (FEPAM) para o Projeto Pró-Guaíba (RODRIGUES, 2002) e os dados de 2013 foram gerados no âmbito do projeto de pesquisa Avaliação Integrada da Qualidade Ambiental dos Sedimentos do Rio Gravataí, RS (Projeto FAPERGS n o. 12/2316-5). Entre as ferramentas utilizadas para avaliar a contaminação por elementos potencialmente tóxicos em sedimentos fluviais, o Índice de Geoacumulação (Igeo) proposto por MÜLLER (1979, apud FÖRSTNER, 1989) é referido na literatura por alguns autores (LAYBAUER, 1995; RODRIGUES; FORMOSO, 2006; SEPÚLVEDA et al., 2009; dentre outros). Além de indicar a intensidade da contaminação dos sedimentos em relação a um valor de referência, o Igeo facilita a comparação de dados de estudos realizados em diferentes locais (FÖRSTNER; WITTMANN, 1981). MATERIAIS E MÉTODOS Com base nas características observadas na região, nos dados da série histórica da FEPAM de monitoramento da qualidade da água do rio Gravataí (FEPAM, 2011) e nos dados de qualidade dos sedimentos do mesmo rio obtidos no Projeto Pró-Guaíba (RODRIGUES, 2002), foram selecionados três pontos para a realização do estudo (Tabela 1). A numeração das amostras refere-se à distância em quilômetros do local de coleta até a foz do rio Gravataí. Tabela 1. Pontos de amostragem selecionados no rio Gravataí (GR). Ponto de amostragem Trecho do rio Gravataí Local de amostragem Município GR 034 Médio Passo dos Negros, a montante de Gravataí Gravataí GR 008 Inferior A jusante de Cachoeirinha Cachoeirinha GR 006 Inferior A jusante do arroio da Areia Canoas/Porto Alegre As amostragens ocorreram em períodos de verão (janeiro de 2000 e janeiro de 2013), caracterizados pela baixa disponibilidade hídrica e pela maior estabilidade dos depósitos de fundo. A coleta dos sedimentos foi realizada pelo Serviço de Amostragem da FEPAM, conforme procedimentos padronizados (MOZETO, 2006; RODRIGUES, 1997; 2007). As amostras foram peneiradas em malha de nylon com abertura de 63 μm, secas em estufa a uma temperatura <37 C e maceradas em gral de ágata. As análises de Cd, Cu e Zn foram realizadas por espectrometria de emissão ótica com plasma acoplado indutivamente (ICP/OES), após tratamento das amostras com ácido nítrico, clorídrico e fluorídrico, em sistema de digestão por micro-ondas (USEPA, 1996). As análises de mercúrio envolveram digestão em meio ácido fortemente oxidante (USEPA, 1995), com leitura por espectrometria de absorção atômica com geração de vapor a frio (AAS/CV). Todos os resultados foram expressos para a fração silte-argila (<63 μm), em base seca (Figura 2). Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014 29

Figura 2: Coleta e preparação das amostras de sedimento. Na análise dos dados de elementos potencialmente tóxicos, na forma total, empregou-se o índice de geoacumulação (Igeo). Este índice avalia a intensidade da contaminação dos sedimentos, estabelecendo uma relação entre o teor do elemento considerado no ponto de interesse e um valor de referência (nível basal ou background geoquímico estimado para a região). O Igeo pode ser calculado com emprego da Equação 1 (FÖRSTNER; WITTMANN, 1981): Igeo = log 2 C n 1,5 x C b (Equação 1) Onde: C n = teor do elemento n na fração <63 μm do sedimento a ser classificado; 1,5 = fator de correção para possíveis variações do valor de background; C b = teor médio de background do elemento n nos sedimentos da região. A classificação dos sedimentos conforme a determinação do Igeo é apresentada na Tabela 2. Tabela 2. Classificação dos sedimentos de acordo com o Igeo. Valor do Igeo Classe do Igeo Classificação do sedimento >5 >4 a 5 >3 a 4 > 2 a 3 >1 a 2 >0 a 1 <0 6 5 4 3 2 1 0 Extremamente poluído Fortemente poluído a muito fortemente poluído Fortemente poluído Moderadamente poluído a fortemente poluído Moderadamente poluído Não poluído a moderadamente poluído Praticamente não poluído Neste estudo, foi considerado como nível basal o valor médio das concentrações encontradas em janeiro de 2000 em sedimentos da Área de Preservação Ambiental (APA) do Banhado Grande. Os valores de referência foram os seguintes: 16,1 mg kg -1 para cobre Cu; 56,7 mg kg -1 para Zn e 72,7 μg kg -1 para Hg. Quanto a Cd, o valor obtido no Banhado Grande foi inferior ao limite de detecção do método analítico (LD = 0,4 mg Cd 30 Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014

kg -1 ). Assim, no cálculo do Igeo de cádmio, arbitrou-se como valor de referência uma concentração equivalente à metade do limite de detecção (1/2 LD = 0,2 mg Cd kg -1 ). RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados das duas campanhas de amostragem indicaram um aumento gradual do teor de Cd, Cu, Hg e Zn nos sedimentos, de montante para jusante no curso do rio. Esta tendência espacial é indicada pelos valores de Igeo, conforme as Figuras 3, 4, 5 e 6, respectivamente. Considerando o conjunto dos elementos avaliados, o Igeo variou de 0 a 3 em 2000, classificando os sedimentos ao longo do rio como praticamente não poluídos até moderadamente poluídos a fortemente poluídos. Em 2013, o Igeo apresentou uma variação entre 1 e 4, o que correspondeu a uma classificação dos sedimentos de não poluídos a moderadamente poluídos até fortemente poluídos. Figura 3: Índice de geoacumulação (Igeo) de Hg nos locais amostrados em jan/2000 e jan/2013. Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014 31

Figura 4: Índice de geoacumulação (Igeo) de Cd nos locais amostrados em jan/2000 e jan/2013. Figura 5: Índice de geoacumulação (Igeo) de Cu nos locais amostrados em jan/2000 e jan/2013. 32 Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014

Figura 6: Índice de geoacumulação (Igeo) de Zn nos locais amostrados em jan/2000 e jan/2013. A classificação dos sedimentos do rio Gravataí de acordo com o Igeo revelou um expressivo aumento da contaminação por elementos potencialmente tóxicos no ano de 2013 em comparação ao ano de 2000 (Tabela 3), indicado pelos aumentos de classe. O ponto GR006 (Figura 7) destacou-se em ambos os períodos, por apresentar os maiores teores de todos os elementos analisados. Uma possível causa para a contaminação observada neste local seria a contribuição de despejos urbanos e industriais, principalmente provenientes da zona norte de Porto Alegre e de Cachoeirinha. Tabela 3. Aumento nas classes de Igeo de janeiro de 2000 para janeiro de 2013, nos pontos avaliados. Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014 33

Figura 7: Ponto de amostragem GR006, a jusante do Arroio da Areia. Como os valores de Igeo relacionam os teores de elementos potencialmente tóxicos nos sedimentos a um valor de referência local, é possível estabelecer comparações entre resultados obtidos em diferentes estudos (FÖRSTNER; WITTMANN, 1981). Laybauer (1995), por exemplo, aplicou o Igeo para avaliar os níveis de contaminação por estes elementos em sedimentos fluviais da região das Minas do Camaquã, RS, sob influência da explotação de jazidas de Cu. O autor obteve valores de Igeo entre 4 e 5 (classe 5) para Cu, classificando os sedimentos como fortemente a muito fortemente poluídos, na área sob maior influência da mineração. Quanto a Cd e Zn, os valores de Igeo foram inferiores a zero, indicando sedimentos praticamente não poluídos por estes elementos. No rio Gravataí, o Igeo apontou sedimentos, em geral, moderadamente poluídos por Cu (classe 2). Em 2013, contudo, o ponto GR006 atingiu a classe 3, correspondente a sedimentos moderadamente poluídos a fortemente poluídos por este metal. Em estudo realizado entre 1997 e 1998 com os sedimentos do estuário de Santos- Cubatão (SP), Luíz-Silva et al. (2002) obtiveram um Igeo médio igual a 3 para Hg no rio Cubatão (n=12), com um Igeo máximo de 5. Este rio recebe a influência da cidade de Cubatão, que abriga um dos mais importantes pólos industriais do Brasil, e os autores referem que os sedimentos locais por si só podem constituir uma fonte potencial de contaminação por Hg. Comparando os anos de 2000 e 2013, observou-se no rio Gravataí um aumento de classe do Igeo, no período mais recente, para os três locais avaliados. No ponto GR006 as condições foram similares às observadas no rio Cubatão, ou seja, sedimentos moderadamente a fortemente poluídos por Hg. Sepúlveda et al. (2009) empregaram o Igeo para avaliar o enriquecimento de alguns metais em sedimentos de lagoas urbanas situadas em Concepción, Chile. Os resultados mostraram um grau de contaminação ausente a moderado para Cd, moderado a alto para Zn e alto para Cu. Os autores associaram a contaminação por estes elementos a 34 Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014

contribuições difusas da área urbano-industrial adjacente. Em geral, no rio Gravataí, os níveis de Cu foram comparativamente mais reduzidos e os níveis de Zn foram similares. Contudo, foi constatada uma maior contaminação por Cd, classificando os sedimentos do Gravataí como moderadamente a fortemente poluídos por este metal. Cesar et al. (2011) selecionaram alguns metais para investigar a contaminação ambiental dos sedimentos da bacia do rio Piabanha, impactada simultaneamente por despejos domésticos e industriais, como é o caso do rio Gravataí. Com a aplicação do Igeo, verificaram uma poluição ausente a moderada dos sedimentos por Cu e Zn. Quanto a Hg, predominaram valores de Igeo entre 2 e 3, atingindo um máximo de 4, que corresponde a uma forte poluição dos sedimentos. Em comparação ao rio Piabanha, foi constatada uma maior contaminação por Zn e similar por Cu no rio Gravataí. Os níveis de Hg neste rio foram mais reduzidos, predominando valores de Igeo entre 1 e 2, com um máximo igual a 3. Cd e Hg são metais altamente tóxicos e amplamente conhecidos por sua capacidade de causar sérios danos à saúde humana e ao meio ambiente. A contaminação por Cd é frequente em sedimentos de regiões industrializadas e, muitas vezes, está associada à contaminação por Zn (Förstner e Wittmann, 1981; Jordão et al., 1990). Além disso, o lixo urbano pode conter Cd proveniente de várias fontes (ATSDR, 2008). Quanto ao Hg, Marins et al. (2004) referem que, depois das fontes industriais, as fontes difusas são as atividades antrópicas que mais necessitam de controle para adequação dos níveis de Hg no meio ambiente. Dentre estas fontes podem ser destacados os lixões, as atividades hospitalares e os efluentes domésticos e urbanos. Cu e Zn são considerados micronutrientes essenciais e desempenham importante papel no metabolismo de vários organismos. Porém, quando presentes em elevadas concentrações, podem causar efeitos adversos à saúde humana e à biota. As principais fontes de contaminação por Cu e Zn estão associadas a rejeitos industriais, bem como à aplicação de pesticidas, herbicidas e fertilizantes, que comumente contêm elevadas concentrações de sais destes elementos (CESAR et al., 2011). Desta forma, possíveis fontes de Cu e Zn estão relacionadas à gestão inadequada de rejeitos domésticos e industriais, além da aplicação de agroquímicos. CONCLUSÃO O estudo de comparação do teor de elementos potencialmente tóxicos nos sedimentos do rio Gravataí nos anos de 2000 e 2013, com emprego do Igeo, permitiu a observação de variações tanto espaciais quanto temporais. Verificou-se um expressivo aumento do grau de contaminação por Cd, Hg, Cu e Zn nos sedimentos do trecho de rio avaliado nos dois períodos, no sentido de montante para jusante. Houve também um expressivo aumento do grau de contaminação dos sedimentos no período mais recente. Ressalta-se, portanto, a necessidade de intensificar a tomada de ações para reduzir os riscos de exposição local aos efeitos nocivos da ocorrência de Cd, Hg, Cu e Zn nos sedimentos do rio Gravataí. Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014 35

AGRADECIMENTOS Ao Serviço de Amostragem da FEPAM, especialmente ao técnico Cledion Aldo de Moura Peixoto. À Geógrafa Lílian Waquil Ferraro (GEO/FEPAM). À FAPERGS e ao CNPq, pela concessão de bolsas de Iniciação Científica a Níkolas Bitello Winck e a Nathalia Chaves Cardoso, respectivamente. REFERÊNCIAS AGENCY FOR TOXIC SUBSTANCES AND DISEASE REGISTRY. Toxicological profiles, 2014. Disponível em: <http://www.atsdr.cdc.gov/toxprofiles/index.asp> Acesso em: julho 2014. CESAR, R. et al. Distribuição de mercúrio, cobre, chumbo, zinco e níquel em sedimentos de corrente da bacia do rio Piabanha, Estado do Rio de janeiro. Geochimica Brasiliensis, v. 25, n. 1, p. 35-45, 2011. ESTEVES, F. de A. Fundamentos de Limnologia. Rio de Janeiro: Interciência/FINEP, 1988. 575 p. FÖRSTNER, U.; WITTMANN, G. T. W. Metal pollution in the aquatic environment. 2.ed. Berlin: Springer-Verlag, 1981. 486 p. FÖRSTNER, U. Contaminated Sediments. In: BHATTACHARJI, S. et al. Lecture notes in Earth Sciences. Berlin: Springer-Verlag, 1989. v. 21, p. 1-157.. FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO AMBIENTAL HENRIQUE LUIZ ROESSLER, Região hidrográfica do Guaíba. 2011. Disponível em: <http://www.fepam@ rs.gov.br>. Acesso em: 5 dez. 2013. JORDÃO, C. P. et al. Contaminação de sedimentos fluviais por metais pesados nas proximidades de uma indústria metalúrgica em Minas Gerais. Geochimica Brasiliensis, v. 4, n. 1, p. 9-15, 1990. LAYBAUER, L. Análise das transferências de metais pesados em águas e sedimentos fluviais na região das minas de Camaquã, RS. 1995. 164 f. Dissertação (Mestrado em Geociências) - Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 1995, LUIZ-SILVA, W.; MATOS, R. H. R.; KRISTOSCH, G. C. Geoquímica e índice de geoacumulação de mercúrio em sedimentos de superfície do estuário de Santos-Cubatão (SP). Química Nova, v. 25, n. 5, p. 753-756, 2002 MARINS, R. V. et al. Distribuição de mercúrio total como indicador de poluição urbana e industrial na costa brasileira. Química Nova, v. 27, n. 5, p. 763-770, 2004. MOZETO, A. M. Coleta de sedimentos de ambientes aquáticos continentais, extração de águas intersticiais e determinação granulométrica. In: MOZETO, A. M.; UMBUZEIRO, G. A; JARDIM, W. F. Métodos de coleta, análises físico-químicas e ensaios biológicos 36 Revista de Iniciação Científica da Ulbra N 12/2014

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