Desaparecimento de crianças e adolescentes em Belo Horizonte



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Transcrição:

Desaparecimento de crianças e adolescentes em Belo Horizonte Cristiane Silva Lacerda Erica Cristina Silva Yuska Lima Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Este artigo é resultado de uma pesquisa sobre a rede de atenção ao desaparecimento de crianças e adolescentes no Brasil, focalizando Belo Horizonte e região metropolitana. Embora não se possua dados consolidados que traduzam a exata dimensão do fenômeno, estima-se, segundo a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República, que aproximadamente 40.000 ocorrências de desaparecimento de crianças e adolescentes sejam registradas anualmente nas delegacias de polícia de todo o País. Ainda que a grande maioria desses casos seja solucionada rapidamente, existe um percentual significativo de15%, em que crianças e adolescentes permanecem desaparecidos por longos períodos de tempo e, às vezes, jamais são reencontrados. Em Minas Gerais a situação do desaparecimento de crianças e adolescentes alcançou grande visibilidade a partir da Campanha Volta em 2006, que possibilitou, com o apoio da mídia, a circulação do tema em várias esferas da sociedade. Dessa forma entendemos que o desaparecimento de crianças e adolescentes é um fenômeno psicossocial importante, que deve ser estudado e compreendido por olhares do campo social. O aumento do número de registro de casos de desaparecimento de crianças e adolescentes demonstra a necessidade de se conhecer a questão para criar ações mais efetivas de prevenção e solução dos casos. Nosso objetivo foi conhecer a rede de atenção ao desaparecimento existente em Belo Horizonte, seu funcionamento e suas ações. Para este estudo nos referendamos às principais leis de proteção a criança e ao adolescente, defendidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA); à luta pelos Direitos Humanos e aos movimentos sociais. Para que se assegure os direitos fundamentais às crianças e aos adolescentes, o ECA institui princípios de proteção integral e de prioridade absoluta à criança e ao adolescente, colocando-os como preocupação central da sociedade e orientando a criação de políticas públicas em todas as esferas do governo. Diante das exigências do ECA foram criados órgãos especiais de execução para a efetivação das leis de proteção à criança e ao adolescente. Dentre os principais estão o Conselho Tutelar, as Delegacias de Proteção a Criança e ao Adolescente (DPCA) e a Secretaria de Proteção à Criança e ao Adolescente (SPCA). Assim, o ECA aponta os equipamentos sociais garantidos na lei que deveriam compor a rede de proteção à criança e ao adolescente. Na situação específica do desaparecimento, o ECA estabelece como uma das linhas de ação, políticas de atendimento à criança e ao adolescente desaparecido que engloba o serviço de identificação e localização de pais e responsáveis dos mesmos (ART.87). No Brasil, a luta pelos direitos humanos ganhou mais

visibilidade com os movimentos sociais em que ex-presos políticos, familiares de mortos e de desaparecidos políticos, cidadãos que se indignavam com a prática cotidiana e banalizada da tortura, lutavam por melhores condições de vida e por outras maneiras de construir a política dos direitos humanos (COIMBRA, 2002). Em Belo Horizonte a sociedade civil tem se organizado em defesa e garantia dos direitos da criança e do adolescente, como se observa no movimento social Onde estão nossas crianças e outros equipamentos públicos e sociais. Diante dessa questão, interessados em conhecer a rede de atenção ao desaparecimento, realizamos uma pesquisa qualitativa, utilizando como coleta de dados entrevista estruturada com o Jornal do ônibus; uma breve pesquisa de documentos sobre o Conselho Tutelar e Promotoria da Infância e da Juventude, e ainda, entrevistas semi-dirigidas com a Divisão de Referência à Pessoa Desaparecida e com o movimento social Onde estão nossas crianças, além da observação participante desse movimento. Este tem como objetivo, ampliar a divulgação das fotos de crianças e adolescentes desaparecidos de forma permanente, alcançar condições de uma busca mais efetiva e dar suporte às famílias durante as buscas e após o desfecho do caso. O movimento apresenta como conquistas de suas reivindicações a criação da Divisão de Referência a Pessoa Desaparecida e o funcionamento 24 horas da Divisão e do serviço de informação e denúncia (0800), além da instauração da CPI dos desaparecidos na Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Segundo a delegada da Divisão de desaparecidos, a delegacia tem como função encontrar o paradeiro de pessoas desaparecidas e a identificação de cadáveres. O disque denúncia é exclusivo da delegacia e funciona desde a Campanha Volta. Para a delegada o disque denúncia é essencial, pois, a sociedade está mais próxima do desaparecido do que a própria delegacia, contribuindo para o aumento do número de localizações. A delegacia estabelece, como previsto na lei 15.432, um sistema de comunicação entre diversos órgãos para agilizar e facilitar o encontro do desaparecido. O Jornal do ônibus é também um importante instrumento na localização de crianças desaparecidas, através da divulgação das fotos demandada pela própria sociedade que solicita o serviço. Atualmente o Jornal do ônibus circula, com produção quinzenal, para 1,5 milhões de usuários do transporte coletivo da capital e região metropolitana, mantendo uma coluna fixa para a divulgação das fotos de pessoas desaparecidas. Já a Promotoria da Infância e da Juventude tem como função institucional assegurar os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, exercendo atuação judicial e extrajudicial à busca da efetivação dos instrumentos e normas traçadas pelo ECA. Semelhante à Promotoria, o Conselho Tutelar é um órgão responsável em fiscalizar se os direitos previstos pelo ECA estão sendo cumpridos. Entre as principais contribuições do Conselho Tutelar estão: o atendimento de crianças e adolescentes e a aplicação de medidas de proteção, aconselhar pais e aplicar medidas previstas no estatuto, promover a execução de suas decisões podendo para isso requisitar serviços públicos. É importante lembrar que embora tenhamos descrito esses equipamentos separadamente, é

preciso compreender a rede e seu fluxo de funcionamento de forma integrada. Verificamos a partir desse estudo as dificuldades em relação ao funcionamento dessa rede devido ao desconhecimento de todos os equipamentos que a compõe e suas respectivas funções. Os órgãos não funcionam de forma integrada como é a proposto na lei 15.432, que apesar de ser conhecida pelos profissionais da delegacia, depende também da informação e responsabilização dos outros órgãos para ser cumprida. A fragmentação da rede pode ser justificada pelo fato de serem recentes os órgãos que lidam com o desaparecimento de crianças e adolescentes e com as novas leis que estão surgindo a esse respeito, além disso, os órgãos não são específicos para a atenção ao desaparecimento, e sim para atender crianças e adolescentes em todas as suas necessidades. Os registros são precários e as informações estatísticas disponíveis geram dúvidas por não haver padronização do significado dos tipos de desaparecimentos existentes. Sendo assim, pensar em ações que solucionem e previnam os casos de desaparecimento de crianças e adolescentes torna-se mais difícil, considerando que a interpretação dos diversos tipos é diferente por parte de cada ponta da rede. Essa ausência de padronização também pode explicar a falta de consenso entre os órgãos públicos e a sociedade civil organizada quanto às causas do desaparecimento. A delegacia acredita que a maioria das ocorrências de desaparecimento são causadas por conflitos familiares, já o movimento atribui o desaparecimento à carência de segurança pública (seqüestro, pedofilia, trafico para fins sexuais e para transplante de órgãos). Dessa forma é necessário que os órgãos trabalhem com maior clareza na compreensão, coleta e registro dos dados, organizando-os de forma sistematizada, difundindo melhor as causas do desaparecimento de crianças e de adolescentes, para, a partir disso, direcionar ações investigativas, punitivas e preventivas. Outro ponto é que o trabalho desenvolvido pela psicologia na Divisão da pessoa desaparecida é de caráter investigativo e preventivo apenas, não havendo um serviço de apoio psicológico aos familiares de crianças e de adolescentes desaparecidos. Esse serviço pode ser oferecido dentro de algum órgão da rede de proteção de crianças e de adolescentes oferecendo suporte familiar. A psicologia também pode oferecer leituras psicossociais e pesquisas para compreender esta temática que envolve conflitos familiares, negligências, abusos, violências, seqüestro e comércio sexual e de órgãos na tentativa de contribuir com o combate a prevenção destes casos. Palavras-chaves: Movimentos sociais, crianças e adolescentes, desaparecimento, rede de atenção. Eixo Temático: Política Introdução

Este artigo é resultado de uma pesquisa sobre a rede de desaparecimento de crianças e adolescentes em todo o Brasil, focalizando o Estado de Minas Gerais e sua capital. A situação do desaparecimento de crianças e adolescentes apresenta-se como um retrato da realidade social do país. As crescentes estatísticas demonstram que as discussões sobre os direitos da criança e do adolescente tem sido insuficientes para garantir a proteção e a manutenção dos direitos dos mesmos. O Brasil atualmente é o país que possui o estatuto mais avançado de legislação de proteção à criança e ao adolescente. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) define criança como um ser em desenvolvimento, tendo dessa forma, primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; precedência de atendimento nos serviços públicos ou relevância pública; preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude 1. Assim, o Estado deve priorizar a criação e o cumprimento de políticas públicas que efetivem as leis defendidas pelo ECA, partindo da necessidade específica de cada Estado. Embora não se possua dado consolidado que traduzam a exata dimensão do fenômeno, estima-se, segundo a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República, que aproximadamente 40.000 ocorrências de desaparecimento de crianças e adolescentes sejam registradas anualmente nas delegacias de polícia de todo o País. Ainda que a grande maioria desses casos seja solucionada rapidamente, existe um percentual significativo de15%, em que crianças e adolescentes permanecem desaparecidos por longos períodos de tempo e, às vezes, jamais são reencontrados. Em Minas Gerais a situação do desaparecimento de crianças e adolescentes alcançou grande visibilidade a partir da Campanha Volta 2, que possibilitou, com o apoio da mídia, a circulação do tema em várias esferas da sociedade. De acordo com os dados da SEDH os casos de desaparecimento de crianças e adolescentes somam-se 988 em todo o país desde o ano de 2000 até 05 de setembro de 2006. Ao analisarmos os dados fornecidos pela SEDH, chegamos à soma de 995 desaparecidos, o que demonstra uma incoerência de dados. Os casos de desaparecimento de crianças e adolescentes estão em maior número, localizados na região centro-oeste, destacando-se o Distrito Federal com 19,3% e Goiás com 7,7% de casos. Em segundo lugar, encontramos a região sudeste onde se sobressaem os Estados do Rio de Janeiro com 13,4%, São Paulo com 7,7% e Minas Gerais com 6,2% dos casos. Na região Nordeste, Sergipe apresenta 3,6% de casos e o Maranhão 2,0%. O Pará representa a região Norte com 14,3% de 1 ECA art.4. 2 Campanha do governo do Estado de Minas Gerais, iniciada em Junho de 2006.

desaparecimentos de crianças e adolescentes, e o Paraná na região Sul, com 5,3 %. Os dados estão representados na tabela a seguir. TOTAL GERAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES DESAPARECIDOS NOS PRINCIPAIS ESTADOS BRASILEIROS Quantidade Encontrados Desaparecidos Estados Nº % Nº % Nº % Distrito Federal 192 19,29 152 79,16 40 20,84 Pará 143 14,37 127 88,81 16 11,19 Paraná 52 5,22 21 40,38 40 59,62 Minas Gerais 62 6,23 16 25,80 46 74,20 Goiás 77 7,73 58 75,32 20 24,68 São Paulo 77 7,73 65 84,41 39 15,59 Rio de janeiro 134 13,46 24 17,91 110 82,09 Sergipe 36 3,61 31 86,11 9 13,89 Maranhão 20 2,01 15 75,00 6 25,00 Outros 202 20,35 66 32,67 94 67,33 Total 995 100,00 575 57,78 420 42,22 Fonte: Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República.05/09/2006 Podemos perceber que o Distrito Federal possui o maior número de ocorrências de desaparecimento de crianças e adolescentes e é o Estado com maior número de resoluções. A SEDH divide os casos de desaparecimento de crianças e adolescentes em diversos tipos: fuga do lar por conflitos familiares; conflitos de guarda (subtração de incapaz); suspeita de homicídio e extermínio; transferência irregular de guarda; fuga de instituição; tráfico para fins de exploração sexual; seqüestro; perda por descuido, negligência e desorientação; situação de abandono (situações de rua); vítima de acidente, intempérie, calamidade; rapto consensual (fuga com o namorado); outros tipos e não identificados. Os dados apresentados pela Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República demonstram-se frágeis, imprecisos, gerando dúvidas e dupla interpretação. Não é encontrado nenhum tipo de explicação sobre como é feita a contagem dos registros. Há a necessidade da criação de uma legenda com o significado de cada tipo de desaparecimento, para que haja uma leitura adequada dos dados apresentados. Além da discussão sobre informações referentes ao desaparecimento de crianças e adolescentes, consideramos relevante discutir e conhecer questões acerca da prevenção e solução dos casos. O desaparecimento de crianças e adolescentes é um fenômeno psicossocial importante, que deve ser estudado e compreendido por olhares do campo social. Dessa forma, nosso objetivo foi conhecer a rede de atenção ao desaparecimento existente em Belo Horizonte, seu funcionamento e suas ações. Realizamos uma pesquisa qualitativa, utilizando como coleta de dados entrevista estruturada com o Jornal do ônibus; uma breve pesquisa documental sobre o Conselho Tutelar e Promotoria da Infância e da Juventude, e ainda, entrevistas semi-dirigidas com a Divisão de Referência à Pessoa Desaparecida e com o movimento social Onde estão nossas crianças, além da

buscas. 3 Já o Conselho tutelar é o órgão responsável em fiscalizar se os direitos previstos no ECA observação participante desse movimento. Para a realização das mesmas seguimos as orientações de HAGUETTE. Apresentação e análise de dados Para melhor compreensão da rede de atenção ao desaparecimento de crianças e adolescentes, apresentaremos os dados coletados em duas categorias: os equipamentos públicos e a sociedade civil organizada. Na categoria dos equipamentos públicos estão a Divisão de Referência à Pessoa Desaparecida; Promotoria da Infância e da Juventude e o Conselho Tutelar. Na categoria sociedade civil organizada estão o Jornal do ônibus e o movimento social Onde estão nossas crianças. Equipamentos públicos Diante das exigências do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foram criados órgãos especiais de execução para efetivação das leis de proteção a criança e ao adolescente. A Promotoria da Infância e da Juventude é um dos órgãos que compõe esta rede de atenção. Sua função institucional é assegurar os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, exercendo atuação judicial e extrajudicial à busca da efetivação dos instrumentos e normas traçadas pelo ECA e pela a Constituição Federal. Para tal adota diversas providências, como propor ações de destituição ou suspensão do poder familiar; pedidos de guarda; tutela ou adoção; nomeação de tutor, curador e guardião; investigação de paternidade e outros. A promotoria apesar de não ser um órgão específico da rede de atenção ao desaparecimento, desempenha na mesma um importante papel, considerando que, segundo a SEDH, existe um alto percentual de desaparecimento por conflitos de guarda e fuga do lar. Além disso, a promotoria tem, entre outros, poderes de fiscalização dos Conselhos tutelares, dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, das entidades de atendimento a crianças e adolescentes (abrigos, os programas de atendimento protetivos, casas de internação e outros). Nesse sentido existe um projeto de lei a ser aprovado que prevê a comunicação eficaz desses órgãos para agilizar os processos de busca de desaparecidos. O que se pode observar é que atualmente essa comunicação não existe a não ser entre os hospitais da rede pública e a delegacia, o que dificulta as estão sendo cumpridos. O Eca define que haja pelo menos um Conselho Tutelar em cada município e que este seja composto por cinco conselheiros, escolhidos pela comunidade, para um mandato de 3 anos. Estes serão os principais responsáveis em fazer valer os direitos e dar o encaminhamento necessário para a solução de problemas referente à infância e à adolescência. 3 Dados coletados durante a entrevista com a delegada da Divisão de referência a pessoa desaparecida em 26/03/2007.

Entre as principais contribuições do Conselho Tutelar estão: o atendimento de crianças e adolescentes e a aplicação de medidas de proteção, aconselhar pais e aplicar as medidas previstas no Estatuto, promover a execução de suas decisões podendo para isto requisitar serviços públicos, e assessorar o poder executivo local na elaboração de propostas orçamentárias para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente. A Divisão de Referência à Pessoa Desaparecida é um órgão específico em prestar serviços tanto às famílias de crianças e adolescentes quanto a adultos desaparecidos. Para entendermos o funcionamento desse órgão foram realizadas entrevistas com as psicólogas e a delegada do local 4. De acordo com a entrevista, a Campanha Volta intensificou ainda mais a procura pela delegacia porque a população. Com o aumento da demanda, viu-se a necessidade da criação de um departamento de psicologia e assistência social. De acordo com as psicólogas, a criação do departamento de desaparecidos não foi influência de reivindicações de movimentos sociais ou de ONGs. Essa declaração vai contra à que foi feita pela representante do Movimento social Onde estão nossas crianças, na qual apresenta como conquista de suas reivindicações a criação da Divisão de referência à pessoa desaparecidos. A função da Divisão é encontrar o paradeiro de pessoas desaparecidas e a identificação dos cadáveres. Para este trabalho, conta com agentes responsáveis pelas investigações, motoristas que auxiliam nesse serviço e o disque denúncia que funciona na própria divisão, em todos os turnos. Por meio do disque denúncia a Divisão recebe o contato da sociedade, que fornece dados sobre a localização e sobre o paradeiro do ausente. Para a delegada, isso facilita e agiliza a investigação, além de diminuir o sofrimento dos familiares de forma mais rápida. Podemos considerar o trabalho investigativo desempenhado pela Divisão, fruto de exigências feitas pelo ECA. Na situação específica do desaparecimento, o ECA- art. 87- estabelece como uma das linhas de ação, políticas de atendimento à criança e ao adolescente desaparecido que engloba o serviço de identificação e localização de pais e responsáveis dos mesmos. O setor de psicologia e assistência social possui como função, dentro da Divisão de Referência à Pessoa Desaparecida, acolher a família de desaparecidos no momento em que esta chega para fazer o pedido de providência.o trabalho das psicólogas é investigativo, porque as famílias tendem a registrar a queixa com os policiais e com as psicólogas se abrem mais, por possuírem uma escuta mais especializada, fornecendo dados como conflitos familiares, que podem ter motivado o desaparecimento. Essa informação pode ser confirmada pelos dados fornecidos pela SEDH, no qual o desaparecimento por fuga do lar tem o maior registro, com 372 casos somados em todo o Brasil. As psicólogas consideram que essa é uma questão que deve ser trabalhada para que a criança e adolescente encontre outras possibilidades de lidar com os conflitos, que não seja a fuga.

Após o retorno do desaparecido, o núcleo de psicologia o atende em uma sessão, objetivando entender o contexto psicológico e social desse sujeito, traçar o perfil do desaparecido e estabelecer estatísticas elaborando assim, um relatório exemplificando qual ou quais os motivos que estariam causando o desaparecimento. Se necessário, no caso de crianças e adolescentes, as psicólogas os encaminham para o Conselho Tutelar, Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, Promotoria da Infância e da Juventude, Juizado, etc. Observa-se que todos esses órgãos são apontados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) como equipamentos sociais garantidos na lei que devem compor a rede de proteção à criança e ao adolescente. O núcleo de psicologia e assistência social desenvolveu o Projeto conviver no primeiro semestre de 2007, como forma de prevenção ao desaparecimento de crianças e adolescentes. Este trabalha alguns temas que englobam quatro módulos, pretendendo formar multiplicadores desse projeto, pois preparando melhor o adulto ele terá melhor capacidade para proteger e trabalhar com as crianças temas interessantes sobre como se conhecer melhor e entender seus próprios sentimentos. Além destes projetos, está para ser implantado um outro, específico para crianças e adolescentes desaparecidos. Será construído um banco de dados, composto por cadastro de ossada não identificada de criança e adolescente e pelo cadastro de todos os DNAs de genitores que possuem entes desaparecidos. No momento a Divisão está colhendo o material para essa construção. Segundo a delegada os dados cadastrados neste projeto irão fazer parte da Rede Nacional de Identificação e Localização de Crianças e Adolescentes Desaparecidos (REDESAP), ligada ao Ministério da Justiça e coordenada pela SEDH em parceria com organismos públicos e organizações não governamentais. Com isto será possível o confronto de dados a nível estadual e nacional. As psicólogas entrevistadas consideram uma limitação não poderem atender às famílias das crianças e adolescentes desaparecidos em mais momentos, nem que fosse com uma psicoterapia breve. Consideram esse acompanhamento importante, porém não dentro da delegacia, pois a função própria da Divisão é investigar e encontrar aquele que desapareceu. 4 Entrevista realizada em 19/03/07 com as psicólogas e em 26/03/07 com a delegada.

Sociedade civil organizada Encontramos em Belo Horizonte o movimento social Onde estão nossas crianças, um movimento recente, criado por pais, familiares e amigos de crianças e adolescentes desaparecidos, que tem se constituído como uma importante ponta da rede de atenção ao desaparecimento. O movimento marca seu surgimento a partir do manifesto realizado no dia 30 de setembro de 2006, apesar de se mobilizarem de forma isoladas antes disso. O movimento onde estão nossas crianças tem como objetivo principal alcançar condições de uma busca mais efetiva, ampliando a divulgação das fotos dos desaparecidos, e chamado à atenção da sociedade e das autoridades sobre o que deve ser feito, sobretudo para o comprimento da lei em favor aos desaparecidos. Além disso, o movimento objetiva dar suporte às famílias durante as buscas e também após o desfecho do caso. O movimento apresenta como conquistas de suas reivindicações a criação da Divisão de Referência a Pessoa Desaparecida e o funcionamento 24 horas da Divisão e do serviço de informação e denúncia (0800), além da instauração da CPI dos desaparecidos na Assembléia Legislativa de Minas Gerais, o que tem demonstrado a importância do seu trabalho apesar do pouco tempo de existência. Em decorrência desse movimento, está sendo criada também uma ONG de apoio aos desaparecidos. Sob a idealização de uma das integrantes do movimento, tia de uma criança desaparecida. Segundo ela a ONG já se encontra registrada e com seu estatuto pronto. Como se observa tanto o surgimento do movimento, como as conquistas alcançadas por ele são muito recentes, o que nos remete a importantes questões. Antes disso não havia demanda? Ou os órgãos públicos eram suficientes para atendê-la? É sabido que os movimentos sociais e as ONGs surgem em sua maioria para contemplar uma demanda que deveria ser atendida pelos órgãos públicos, mas que por vários motivos não são. Segundo o relato das integrantes do movimento, o mesmo só ganhou força depois do desaparecimento de uma criança de classe média chamada Pedro Augusto Beltrão. Antes do desaparecimento do Pedro Augusto, já havia um alto percentual de ocorrências registradas em delegacias comuns, em sua maioria registradas por pessoas de classe social baixa. Esse relato se confirma na fala da delegada que acrescenta que muitas destas famílias preferem permanecer anônimas. Uma das justificativas apresentadas a este fato é que estas famílias não dispõem de recursos financeiros para a divulgação e nem de informações sobre seus direitos. Segundo COIMBRA (2002) os movimentos sociais e a luta pelos direitos humanos sempre caminharam juntos em defesa de melhores condições de vida, trabalho, moradia, pela democratização da sociedade, a favor dos pobres e miseráveis que historicamente ficaram à margem da sociedade. Segundo o movimento, a dor e o sentimento de solidão acabaram silenciando estas

pessoas. Assim o movimento se constituiu em um grito unificado, das famílias que antes sofriam em silêncio a falta de seus entes, para a comunidade e autoridades. O Jornal do ônibus é também um importante instrumento na localização de crianças desaparecidas, através da divulgação das fotos demandada pela própria sociedade que solicita o serviço. O jornal instituído há 12 anos para divulgar somente mensagens de interesse público iniciou, a partir de dezembro de 2001, a publicação de fotos de pessoas desaparecidas e isso ocorreram em função de demanda da própria sociedade. O serviço é procurado por todos, pela facilidade do contato, feito através do telefone da Central da BHTRANS ou contato direto. Com produção quinzenal, o Jornal do Ônibus circula as notícias para um público diário de 1,5 milhão de pessoas, usuários do transporte coletivo da capital e região metropolitana. As fotos podem ser vistas durante uma quinzena o que facilita a colaboração do usuário que é solidário a causa 5. De 2001 a maio de 2006, por exemplo, em 24 edições do Jornal, foram publicadas 39 fotos e mensagens de desaparecidos e seis deles foram encontrados. Há casos em que a localização ocorreu 24 horas depois da publicação da foto. Considerações finais É importante lembrar que embora tenhamos descrito esses equipamentos separadamente, é preciso compreender a rede e seu fluxo de funcionamento de forma integrada. Verificamos a partir desse estudo as dificuldades em relação ao funcionamento dessa rede devido ao desconhecimento de todos os equipamentos que a compõe e suas respectivas funções. Os órgãos não funcionam de forma integrada como é a proposto na lei 15.432, que apesar de ser conhecida pelos profissionais da delegacia, depende também da informação e responsabilização dos outros órgãos. A fragmentação da rede pode ser justificada pelo fato de serem recentes os órgãos que lidam com o desaparecimento de crianças e adolescentes e com as novas leis que estão surgindo a esse respeito.além disso, os órgãos não são específicos para a atenção ao desaparecimento, e sim para crianças e adolescentes, atendendo-os em todas as suas necessidades. Os registros são precários e as informações estatísticas disponíveis geram dúvidas por não haver padronização do significado dos tipos de desaparecimentos existentes. Sendo assim, pensar em ações que solucionem e previnam os casos de desaparecimento de crianças e adolescentes tornase mais difícil, considerando que a interpretação dos diversos tipos é diferente por parte de cada ponta da rede. Essa ausência de padronização também pode explicar a falta de consenso entre os 5 Dados obtidos durante a entrevista do Jornal do Ônibus em 20/04/2007

órgãos públicos e a sociedade civil organizada quanto às causas do desaparecimento. A delegacia acredita que a maioria das ocorrências de desaparecimento são causadas por conflitos familiares, já o movimento atribui o desaparecimento à carência de segurança pública (seqüestro, pedofilia, trafico para fins sexuais e para transplante de órgãos). Dessa forma é necessário que os órgãos trabalhem com maior clareza na compreensão, coleta e registro dos dados, organizando-os de forma sistematizada, difundindo melhor as causas do desaparecimento de crianças e de adolescentes, para, a partir disso, direcionar ações investigativas, punitivas e preventivas. Outro ponto é que o trabalho desenvolvido pela psicologia na Divisão da pessoa desaparecida é de caráter investigativo e preventivo apenas, não havendo um serviço de apoio psicológico aos familiares de crianças e de adolescentes desaparecidos. Esse serviço pode ser oferecido dentro de algum órgão da rede de proteção de crianças e de adolescentes oferecendo suporte familiar. A psicologia também pode oferecer leituras psicossociais e pesquisas para compreender esta temática que envolve conflitos familiares, negligências, abusos, violências, seqüestro e comércio sexual e de órgãos na tentativa de contribuir com o combate a prevenção destes casos.

Referências bibliográficas: CABRAL, Adilson. Movimentos sociais, as ONGs e a militância que pensa, logo existe. Disponível em: <http://www.comunicacao.pro.br/artcon/movsocong.htm>. Acesso em: 14 Out. 2006 COIMBRA, C.; PASSOS, E.; BARROS, R. B. Direitos Humanos no Brasil e o Grupo Tortura Nunca Mais/RJ. In: Cristina Mair Rauter; Eduardo Passos; Regina Benevides de Barros (Org.). Clínica e Política: subjetividade e violação dos direitos humanos. Rio de Janeiro, 2002, v. 1, p. 15-23. HAGUETTE, Tereza Maria Frota. Metodologia qualitativa na sociologia. 8 ed. Petrópolis: Vozes,pp.61-69,86-92. MELLO, Sylvia leses de. Estatuto da criança e do adolescente: É possível torná-lo uma realidade psicológica. Disponível em: >> www.scielo.br. Acesso 29/09/06.