A Abordagem Temática Freireana sob o olhar da Teoria da Atividade

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Transcrição:

A Abordagem Temática Freireana sob o olhar da Teoria da Atividade A Freirean Thematic Approach in the look of the Activity Theory Roger Magalhães da Silva 1 Universidade de São Paulo roger_silva@usp.br Simoni Tormöhlen Gehlen 2 Universidade Estadual de Santa Cruz stgehlen@gmail.com Cristiano Rodrigues de Mattos 3 Universidade de São Paulo mattos@if.usp.br Resumo Com referência em pesquisas voltadas a processos de reconfiguração curricular no Ensino de Ciências, desenvolvemos um constructo teórico baseado na perspectiva histórico-cultural da Teoria da Atividade (Leontiev, 1978; Engeström, 1987) para analisar o que chamamos de Atividade Educacional da proposta de reorientação curricular pautada em Temas Geradores. Para tanto, utilizamos a atividade humana como unidade de análise para identificar os elementos que compõem a Atividade Educacional na perspectiva da Abordagem Temática Freireana (ATF). A análise resultou na constatação de que a Atividade Educacional da ATF emerge da coordenação de cada etapa do processo de obtenção e desenvolvimento de Temas Geradores, assim identificamos que a Investigação Temática na ATF é a própria Atividade Educacional. Palavras chave: Abordagem Temática Freireana, Teoria da Atividade, Reorientação Curricular, Atividade Educacional, Ensino de Ciências Abstract Based on investigations about Science Education curricular reorganization, we have developed a theoretical construct based on the historical-cultural perspective of the activity theory (Leontiev, 1978; Engeström, 1987) to analyze what we call the Educational Activity based on Generator Themes. We use human activity as a unit of analysis to identify the elements that make up the Educational Activity from the perspective of the Freirean Thematic Approach (FTA). The analysis resulted in the finding that the Educational Activity of FTA emerges from the coordination of each stage of the process of obtaining and developing Generating Themes, so we identify that the Thematic Research in the ATF as the Educational Activity itself. Currículos e Educação em Ciências 1

Key words: Freirean Thematic Approach, Activity Theory, Reorientation Curriculum, Educational Activity, Science Education Introdução Pesquisas voltadas à compreensão de processos de reorientação curricular têm sinalizado a importância de algumas propostas para a promoção de um ensino mais dialógico e problematizador. Dentre elas, destacamos a proposta de estruturação do currículo por meio de Temas Geradores, a Abordagem Temática Freireana (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011). No contexto dos estudos pautados na perspectiva freireana, há aqueles que analisam alguns aspectos teóricos e metodológicos que fundamentam a ATF (GEHLEN, 2009; SOLINO; GEHLEN, 2014; SOUSA et al., 2014). Partindo da perspectiva sistematizada por Delizoicov (1991), desenvolvemos um estudo teórico para analisar o processo de obtenção e desenvolvimento de Temas Geradores. Para isto, buscamos aporte teórico-metodológico na abordagem histórico-cultural que fundamenta a Teoria da Atividade para identificar a estrutura e natureza da Atividade Educacional proposta pela Abordagem Temática Freireana. A Abordagem Temática Freireana A Abordagem Temática Freireana (ATF) propõe uma reorientação curricular pautada em Temas Geradores, com base nos quais serão selecionados os conteúdos de ensino e estruturado o conteúdo programático. A dinâmica do processo educativo proposto pela ATF está voltada para a obtenção de Temas Geradores, que se tornarão os eixos para a estruturação do conteúdo programático e seu posterior desenvolvimento em sala de aula. Este processo foi chamado por Freire (1987) de Investigação Temática, o qual foi sistematizado por Delizoicov (1991) para o contexto da educação formal em cinco etapas: i) Levantamento Preliminar; ii) Codificação; iii) Diálogos descodificadores; iv) Redução Temática e v) Sala de aula. A obtenção do Tema Gerador efetiva-se por meio da legitimação de Situações-limite, que são caracterizadas pela compreensão superficial e acrítica dos sujeitos referidos à realidade problemática que vivenciam. Neste sentido, ao passo que o Tema Gerador constitui-se do reconhecimento que os sujeitos possuem acerca da realidade, é por meio dele que os conteúdos escolares são selecionados para serem abordados em sala de aula. Assim, podemos considerar o Tema Gerador como o Objeto de Conhecimento da ATF. Estudos nessa perspectiva vêm sendo desenvolvidos em distintos contextos e níveis de ensino (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011; TORRES et al., 2008; SOUSA et al., 2014; STUANI, 2010), assim como há pesquisas que apresentam complementaridades entre a ATF e os pressupostos teórico-metodológicos de outras perspectivas de ensino, como as baseadas nas ideias de Vygotsky (GEHLEN et al., 2012) e no Ensino de Ciências por Investigação (SOLINO; GEHLEN, 2014). Alguns destes autores, sinalizam a importância de se desenvolver estudos que analisem teoricamente os objetivos educacionais e a prática educativa proposta pela ATF, considerando os distintos aspectos do contexto histórico e cultural das escolas e dos sujeitos que nela interagem. Seguindo esta linha de pensamento, utilizamos a abordagem histórico-cultural fundamentada na Teoria da Atividade para analisar o conjunto coordenado de ações que compõem a prática educativa proposta pela ATF para o ensino de ciências, determinando com mais refinamento a estrutura de sua atividade educacional. Currículos e Educação em Ciências 2

A Teoria da Atividade no contexto do ensino de Ciências A Teoria da Atividade emergiu do esforço da psicologia soviética de formular, por meio de bases filosóficas marxistas, um princípio explanatório para o estudo do surgimento e do desenvolvimento da consciência humana (LEONTIEV, 1978). Apesar de delimitar a atividade como um princípio para explicar a consciência humana, Vygotsky (2001) não analisou com profundidade as relações entre a estrutura da atividade humana e o surgimento da consciência do homem. Leontiev (1978) e Engeström (1987) desenvolveram avanços teóricometodológicos que se tornaram base do que hoje compreendemos como a Teoria da Atividade Histórico-Cultural. Leontiev (1978) delineou a estrutura da atividade humana em um sistema hierárquico e a considerou como menor unidade de análise capaz de fornecer informações necessárias para a compreensão dos processos de surgimento e desenvolvimento da consciência humana. Assim, a atividade humana emerge da coordenação de ações que tem fins próprios, não coincidentes com o motivo da atividade, e as ações, que são realizadas em determinadas condições, chamadas de operações, as quais contornam e delimitam a execução das ações. Desta forma, a atividade é composta por ações coordenadas entre si, enquanto que as ações correspondem à coordenação de um conjunto de operações. Engeström (1987), baseando-se na ideia de que a atividade deve ser mantida como menor e mais completa unidade de análise para compreender o desenvolvimento das potencialidades humanas, propôs a explicitação de alguns elementos da estrutura da atividade proposta por Leontiev. Engeström inclui explicitamente a comunidade como elemento indissociável da relação sujeito-objeto. Para tal, introduz dois outros campos mediadores: a divisão social do trabalho e as regras. O primeiro faz a mediação entre comunidade e objeto, enquanto o segundo faz a mediação entre sujeito e comunidade. A explicitação da estrutura da atividade, proposta por Engeström (1987), parte da premissa da importância da mediação na complexa relação social existente entre a atividade humana individual e a coletiva num determinado contexto histórico-cultural. O modelo sugere a possibilidade de analisar uma multiplicidade de relações dentro da estrutura triangular da atividade. No entanto, a tarefa essencial é sempre a de entender o todo sistêmico, e não apenas separar conexões (ENGESTRÖM, 1987, 101). Estudos na área do Ensino de Ciências têm se apropriado cada vez mais de alguns pressupostos teórico-metodológicos da Teoria da Atividade para analisar distintos aspectos de diferentes atividades educacionais desenvolvidas (e.g. Rodrigues, 2009; 2013; Camillo, 2011; 2015; Mattos, 2014). Por outro lado, Gehlen e Mattos (2009) estabeleceram articulações teóricas entre os pressupostos teóricos da Teoria da Atividade com os que balizam a ATF e afirmam que Freire apresenta alguns elementos necessários para modelar a atividade educacional. Neste sentido, sinaliza-se a possibilidade de utilização do aporte teórico-metodológico da abordagem histórico-cultural da Teoria da Atividade na análise de propostas educacionais baseadas na perspectiva freireana, a exemplo da ATF. A Atividade Educacional na Abordagem Conceitual A Abordagem Conceitual (AC) consiste numa perspectiva curricular cuja lógica de organização é estruturada pelos conceitos científicos, com base nos quais se selecionam os conteúdos de ensino (DELIZOICOV, ANGOTTI, PERNAMBUCO, 2011, p. 191). O ensino que esta perspectiva curricular propõe consiste na ênfase dada aos conceitos científicos, e por estarem cristalizados nas teorias dominantes, acabam por nortear a construção do conteúdo programático escolar. Currículos e Educação em Ciências 3

A perspectiva curricular, balizada por conceitos científicos, costuma se aproximar da educação bancária, dado que a ciência é tomada como um conhecimento abstrato e estático. Os pressupostos do ensino se baseiam no ato da transferência desse conhecimento daqueles que o possuem para os que não o possuem, ato apropriado por Freire (1987) na metáfora do depósito bancário. Apesar dos construtores do currículo na perspectiva AC contemplarem a historicidade dos conceitos científicos, os tomam como verdade mais relevante do que os conhecimentos dos alunos. Assim, nesta perspectiva, o currículo escolar proposto pela Abordagem Conceitual converge para uma educação bancária, na qual se perdem tanto a dialogicidade na construção da programação curricular como se aprofunda a contradição entre educador e educando (FREIRE, 1987). Na perspectiva da educação bancária, a contradição educador-educando relaciona-se com o caráter preponderantemente narrativo e doutrinário das aulas, que conformam os alunos numa situação de espectadores passivos. Desta forma, fica evidente quais são os papéis desempenhados por professores e alunos durante o desenvolvimento da Atividade Educacional promovida na educação bancária, a qual fundamenta a perspectiva curricular da Abordagem Conceitual: cabe ao professor narrar acerca dos conteúdos científicos e ao aluno apreender e aceitar incondicionalmente o conteúdo transmitido no discurso do professor. Em outras palavras, a Atividade Educacional do professor nesta perspectiva de ensino consiste em... encher os educandos de conteúdos. É o de fazer depósitos de comunicados falso saber que ele considera como verdadeiro saber (FREIRE, 1987, p.36). Caso o aluno desempenhe sua atividade com maestria, obterá uma nota satisfatória que lhe possibilitará a progressão às próximas etapas do sistema educacional. Por outro lado, terá seu processo humanizador ceifado da sua história, ao ser incluído nessa atividade alienante das suas possibilidades de produção. Analisando a Atividade Educacional bancária, sob a perspectiva da Teoria da Atividade, é possível identificar que alunos e professores desenvolvem diferentes ações enquanto os professores em sua atividade de ensino atuam de forma a transferir o conhecimento científico, os alunos agem para assimilar e apreender mecanicamente o que o professor procura transferir. Nesse sentido é que pode haver uma convergência quanto ao Objeto de Conhecimento na Atividade Educacional dos professores e dos alunos, pois apesar desses distintos sujeitos terem diferentes fins nas suas ações, identifica-se na posse do conteúdo o motivo da atividade. Entretanto, destaca-se que enquanto os professores podem estar motivados pela aprendizagem 1 dos alunos, durante o desenvolvimento da atividade os alunos podem deslocar o seu motivo da apreensão do conteúdo (aprendizagem nesta perspectiva) para a simples obtenção de notas com vistas à progressão das séries do sistema educacional. Neste caso, os fins das ações dos alunos se coordenam na direção de outro motivo, alterando a Atividade Educacional como um todo, porém sem a consciência do Professor, já que a ausência de um processo dialógico impede a explicitação da contradição que se instaura. Isto é, o deslocamento do motivo para a obtenção de notas implica que a atividade desenvolvida se torna uma ação específica que servirá de meio para conseguir alcançar o novo motivo pretendido. A Atividade Educacional na Abordagem Temática Freireana A proposta da Abordagem Temática Freireana sugere um ensino que possibilite a superação da aprendizagem baseada na apreensão e na memorização acrítica dos conhecimentos científicos. 1 Reitera-se que a perspectiva de aprendizagem considerada neste caso se aproxima do que Freire (1987) conceitua como depósitos de conhecimentos em alunos, que em muito se assemelham a vasilhas vazias que serão preenchidas com o conteúdo científico transmitido pelo professor. No que se refere aos motivos que incitam a Atividade Educacional dos professores e alunos, este estudo considera que, em contextos distintos, os motivos podem divergir e introduzir novas modificações à estrutura da Atividade Educacional dos sujeitos. Currículos e Educação em Ciências 4

Neste sentido, opondo-se radicalmente ao ensino balizado pelos currículos tradicionais que, segundo Freire (1995), aproximam-se de uma educação do tipo bancária, a ATF propõe um ensino de ciências balizado por Temas Geradores com o intuito de promover a Curiosidade Epistemológica e a Conscientização dos alunos (FREIRE, 2013). Na ATF, o Objeto de Conhecimento é o Tema Gerador e a Atividade Educacional consiste no desenvolvimento da Investigação Temática (DELIZOICOV, 1991). O Motivo que a incita se divide entre a promoção da Curiosidade Epistemológica e da Conscientização dos educandos. A partir dessa premissa, esboçamos uma modelagem para a constituição da Atividade Educacional da ATF sob a luz da Teoria da Atividade relacionando: i) a Atividade de ensinoaprendizagem e os Motivos que a incita. Isto é, o processo da Investigação Temática relacionada à promoção da Curiosidade Epistemológica e da Conscientização dos alunos; ii) as Ações desenvolvidas e seus respectivos fins. Ou seja, cada etapa da Investigação Temática relacionada ao(s) seu(s) fim(ns) específico(s), o que permite identificar as etapas que compõem a Investigação Temática (DELIZOICOV, 1991) enquanto Ações coordenadas, que compõem a Atividade Educacional proposta pela ATF. Esta relação pode ser compreendida no diagrama explicitado no Quadro 1. Quadro 1: Estrutura da Abordagem Temática Freireana. A reorientação da Atividade Educacional proposta pela Abordagem Temática Freireana sob a luz da Teoria da Atividade. A fim de compreender a reorientação curricular proposta pela ATF, optamos por analisá-la sob dois aspectos que são complementares: i) a reorientação do Conteúdo Programático: que passa pela estruturação do rol de conteúdos e conceitos científicos por meio de Temas Geradores (FREIRE, 1987) e ii) reorientação da Prática Educativa: que sugere a promoção de uma pedagogia fundamentada na problematização dos conteúdos e no diálogo entre educandos e educadores com vistas à formação crítica de sujeitos epistemologicamente curiosos. Neste sentido, Freire (2013) estrutura alguns saberes que julga necessários para que o educador fundamente sua prática pedagógica numa educação dialógica e problematizadora. Esta relação pode ser evidenciada no Quadro 2. A ATF, enquanto proposta de reestruturação curricular, sugere a reorientação do Conteúdo Programático. Isto é, propõe que os conteúdos escolares sejam escolhidos por meio de Temas Geradores obtidos pela efetivação das quatro primeiras etapas do processo dialógico da Currículos e Educação em Ciências 5

Investigação Temática (DELIZOICOV, 1991). Uma vez delimitado o Conteúdo Programático a ser abordado via Tema Gerador, a prática educativa do professor em sala de aula necessita estar em sintonia com os pressupostos da educação problematizadora e dialógica. Neste sentido, Freire (2013) sugere uma reorientação da Prática Educativa dos educadores por meio do desenvolvimento de alguns saberes, tais como: a coerência entre o discurso ideológico e a prática educativa, a consciência da inconclusão do ser humano enquanto característica ontológica e a consciência de que ensinar não é transferir conhecimento. Quadro 2: A Reorientação Curricular proposta pela Abordagem Temática Freireana. Delizoicov (1991) explicita que o desenvolvimento dos Temas Geradores em sala de aula compõe a quinta etapa da Investigação Temática. Tendo em vista que esta prática pedagógica é complexa por seu caráter problematizador, Delizoicov sugere a utilização dos Momentos Pedagógicos para a promoção de aulas que estejam em conexão com a perspectiva educacional pautada nos saberes necessários à prática educativa dialógica (FREIRE, 2013). Neste sentido, destacamos a necessária sintonia entre os campos da reorientação curricular do Conteúdo Programático e da Prática Educativa proposta pela ATF, pois não basta estruturar o conteúdo programático via Tema Gerador e o fazer pedagógico, desenvolvido em sala de aula, não promover a problematização da realidade e dos conceitos científicos circunscritos ao tema. A necessidade de sintonia entre os dois campos destacados, se analisada sob a luz da Teoria da Atividade, justifica-se pelo fato de que na medida em que o Objeto se modifica todo o conjunto do sistema deve sofrer transformações para lidar com as novas questões trazidas, novas contradições que engendram o sistema como um todo (RODRIGUES, 2013, p.132). Daí que se sustenta a afirmação de que reorientar a elaboração do conteúdo programático adotando um novo Objeto de Conhecimento o Tema Gerador implica a necessidade da reorientação de toda a prática educativa dos professores. Esse movimento de reorientação curricular abarca questões muito complexas que, segundo Freire (1995), implicam em repensar e reavaliar os objetivos educacionais adotados pelas escolas e pelos professores. Significa também pensar em questões como: para quê ensinar (justificativa), porquê ensinar (objetivos), para quem ensinar (sujeitos da aprendizagem), muito além de apenas pensar o quê ensinar (conteúdos) e como ensinar (metodologia). Esta ideia de Freire (1995) está em sintonia com Engeström (2008) ao analisar mudanças sustentáveis e significativas no processo educativo. Currículos e Educação em Ciências 6

A teoria da atividade sugere que mudanças sustentáveis e significativas na natureza da escolarização não podem ser alcançadas pela manipulação de nenhum componente sozinho ou grupo isolado de componentes do sistema de atividades. Mudança exige a construção de um novo objeto e o cultivo dos motivos correspondentes (ENGESTRÖM, 2008, 90). É neste sentido que ao propor um currículo balizado por Temas Geradores, que na modelagem da atividade proposta por Leontiev (1978) corresponde a mudanças inicialmente voltadas ao Objeto de Conhecimento e aos Motivos, constatou-se que a ATF propõe uma reestruturação global dos componentes da Atividade Educacional promovida na Abordagem Conceitual. Em outras palavras, a ATF, por transformar o Objeto de Conhecimento, acaba por sugerir um conjunto de mudanças globais nos componentes da estrutura da Atividade Educacional que é proposta pela Abordagem Conceitual. Considerações Finais Utilizando o ferramental teórico da Teoria da Atividade analisamos a Atividade Educacional proposta pela Abordagem Conceitual e pela ATF. Na Abordagem Conceitual, a Atividade Educacional dos professores pode consistir basicamente na transferência de conhecimento científico, sendo que o motivo da atividade relaciona-se ao acúmulo dos conhecimentos abordados. Considerou-se, então, que a Abordagem Conceitual em muito se aproxima da perspectiva educacional que Freire (1987) denomina de educação bancária, uma vez que o Objeto de Conhecimento e o Motivo da Atividade Educacional da Abordagem Conceitual coincidem com a perspectiva da educação bancária (FREIRE, 1987). Já no processo de reorganização curricular proposto pela ATF o Objeto de Conhecimento sofre modificações e passa a centrar-se no Tema Gerador. Isto implica a introdução de alterações em toda a estrutura da Atividade Educacional, que vai desde a delimitação de novos Motivos para a atividade promoção da Curiosidade Epistemológica e da Conscientização, até a introdução de novas Ações para a obtenção dos temas e sua posterior abordagem em sala de aula. Por esta razão que a Atividade Educacional na ATF passa a ser o processo de obtenção e desenvolvimento de Temas Geradores a Investigação Temática. Contudo, destacamos que considerar a Investigação Temática como a Atividade Educacional de um processo educativo remete a reflexões acerca da perspectiva de análise adotada e da natureza da própria atividade. Assim sendo, ao analisarmos a ATF por meio de uma visão macro, foi possível investigar a Atividade Educacional que, em sua totalidade, constitui-se do conjunto coordenado das cinco etapas do processo de Investigação Temática. Com isto, verificou-se que, na ATF, a Atividade Educacional possui uma dimensão epistemológica e axiológica que a difere da proposta da Abordagem Conceitual. Neste sentido, sinaliza-se a necessidade de desenvolver outros estudos a fim de investigar alguns aspectos relacionados à dimensão epistemológica e axiológica da Atividade Educacional da ATF. Agradecimentos e apoios Fundação de Amparo à Pesquisa do estado da Bahia FAPESB. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPES. Currículos e Educação em Ciências 7

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