ConScientiae Saúde ISSN: 1677-1028 conscientiaesaude@uninove.br Universidade Nove de Julho Brasil



Documentos relacionados
Uso de drogas entre adolescentes estudantes de escola da rede privada em São Paulo

I Jornada de Saúde Mental do Vale do Taquari: Crack e outras drogas: perspectivas na abordagem psicossocial

CORRELAÇÃO ENTRE CONSUMIDORES DE DROGAS LICITAS E ILICITAS EM UM CAPS II

LEVANTAMENTO DO USO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS ENTRE ESTUDANTES DE GRADUAÇÃO DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR

USO DE DROGAS POR CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Perfil do usuário de crack no Brasil

CONSUMO DE ÁLCOOL E TABACO ENTRE ESTUDANTES DE ODONTOLOGIA E FISIOTERAPIA DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR

ALCOOLISMO ENTRE ACADÊMICOS DE ENFERMAGEM: UM ESTUDO TRANSVERSAL

VIOLÊNCIA CONTRA A CRIANÇA ou ADOLESCENTE

Consumo de álcool por adolescentes e gênero. Tatiane Vilela Coelho Raínne Costa Sousa

ABUSO DO CONSUMO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS, UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA. Senhor Presidente,

PNAD - Segurança Alimentar Insegurança alimentar diminui, mas ainda atinge 30,2% dos domicílios brasileiros

Estudo sobre o Uso de Drogas entre estudantes do Ensino Médio e EJA na Escola Estadual Silveira Martins/Bagé-RS

CONSUMO DE ÁLCOOL E ALCOOLISMO ENTRE ADOLESCENTES

PRÁTICAS EDUCATIVAS PARENTAIS E O USO DE DROGAS ENTRE OS ADOLESCENTES ESCOLARES.

Maconha. Alessandro Alves. Conhecendo a planta

Equipe: Ronaldo Laranjeira Helena Sakiyama Maria de Fátima Rato Padin Sandro Mitsuhiro Clarice Sandi Madruga

Família. Escola. Trabalho e vida econômica. Vida Comunitária e Religião

PREVALÊNCIA DO USO DE DROGAS PSICOTRÓPICAS POR ESTUDANTES DE MEDICINA NA REGIÃO CENTRAL DO ESTADO DO TOCANTINS

CARACTERÍSTICAS SOCIOECONÔMICAS DOS NEONATOS PREMATUROS NASCIDOS NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DO OESTE DO PARANÁ H.U.O.P.

Vídeo Institucional Casa da Esperança

ISSN ÁREA TEMÁTICA: (marque uma das opções)

Faculdade de Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Educação RESUMO EXPANDIDO DO PROJETO DE PESQUISA

EPIDEMIOLOGIA DO USO DE MEDICAMENTOS NO BAIRRO SANTA FELICIDADE, CASCAVEL PR.

Material e Método. Resultados

Estudo epidemiológico realizado de 4 em 4 anos, em colaboração com a Organização Mundial de Saúde.

CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS DE IDOSAS. UM OLHAR PARA VIÇOSA, MINAS GERAIS, BRASIL

POSSÍVEIS NEXOS ENTRE O ALCOOLISMO E O ESTRESSE RELACIONADO AO TRABALHO DO PSICÓLOGO CLÍNICO

O USO DO ÁLCOOL ENTRE OS JOVENS: HISTÓRIA, POLÍTICAS GOVERNAMENTAIS, CONSEQÜÊNCIAS SOCIAIS E TRATAMENTO.

AIDS E ENVELHECIMENTO: UMA REFLEXÃO ACERCA DOS CASOS DE AIDS NA TERCEIRA IDADE.

Avaliação sobre o consumo de drogas por adolescentes nas escolas do município de Iporá-GO

MÓDULO 2. Neste módulo você conhecerá a epidemiologia do consumo de substâncias psicoativas e os padrões de consumo do álcool e crack.

Pisa 2012: O que os dados dizem sobre o Brasil

AVALIAÇÃO ECONÔMICA DO PROGRAMA ESCOLAS EM TEMPO INTEGRAL RIO DE JANEIRO Junho de 2015

COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS DO SENADO FEDERAL. Brasília maio 2010

Como Prevenir e Tratar as Dependências Químicas nas Empresas?

Atividade de Aprendizagem 1 Aquífero Guarani Eixo(s) temático(s) Tema Conteúdos Usos / objetivos Voltadas para procedimentos e atitudes Competências

I Seminário. Estadual de enfrentamento ao CRACK. O papel da família no contexto da prevenção e do enfrentamento aos problemas decorrentes do CRACK

Especificidades das mortes violentas no Brasil e suas lições. Maria Cecília de Souza Minayo

TÍTULO: EQUIPE INSTITUIÇÃO: ÁREA TEMÁTICA 1 INTRODUÇÃO ,

GUIA PRÁTICO APOIOS SOCIAIS FAMÍLIA E COMUNIDADE EM GERAL

Aula 1 - Avaliação Econômica de Projetos Sociais Aspectos Gerais

ADOLESCÊNCIA E DROGAS

O Dep. Pastor Frankembergem pronuncia o seguinte discurso: Drogas. Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,

OBJETIVO. Palavras-chave: Saúde pública, perda auditiva e linguagem

Pesquisa. Há 40 anos atrás nos encontrávamos discutindo mecanismos e. A mulher no setor privado de ensino em Caxias do Sul.

Consumo de substâncias psicoativas em estudantes do ensino médio

Solventes. Proporção de indivíduos que consumiram alguma vez na vida solventes, por faixa etária e sexo. (Brasil)

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação-Porto\Portugal. Uma perspectiva comportamental em Adolescentes Obesos: Brasil x Portugal

Mostra de Projetos 2011

Eduardo J. A. e SILVA 2 Camilla P. BRASILEIRO 3 Claudomilson F. BRAGA 4 Universidade Federal de Goiás, Goiânia, GO

COMO SE TORNAR UM VOLUNTÁRIO?

Área: ,8km População

01 REGIÃO METROPOLITANA 03 ENDEREÇO

RETRATOS DA SOCIEDADE BRASILEIRA: SAÚDE PÚBLICA JANEIRO/2012

O Crack na Cidade de Salvador

I Congresso Baiano de Engenharia Sanitária e Ambiental I COBESA

OS PRINCIPAIS FATORES QUE CONTRIBUEM PARA A PERMANÊNCIA DE DEPENDENTES QUÍMICOS EM TRATAMENTO

QUEIXAS E SINTOMAS VOCAIS PRÉ FONOTERAPIA EM GRUPO

TÍTULO: A ENFERMAGEM E OS USUÁRIOS DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS NO CAPS: RELATO DE VIVÊNCIAS.

SAÚDE E EDUCAÇÃO INFANTIL Uma análise sobre as práticas pedagógicas nas escolas.

Cristina Almeida. Psicóloga escolar

Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar 2012

Sumário PNAD/SIMPOC 2001 Pontos importantes

Curso de Capacitação em Bullying

Você conhece a Medicina de Família e Comunidade?

Novo Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil

VESTIBULAR: Uma escolha profissional que interliga a família e a escola

TRAÇOS DA EDUCAÇÃO BÁSICA EM SÃO LUÍS- MA: UM DIAGNÓSTICO DO PERFIL SOCIOCULTURAL E EDUCACIONAL DE ALUNOS DAS ESCOLAS PARCEIRAS DO PIBID.

De volta para vida: a inserção social e qualidade de vida de usuários de um Centro de Atenção Psicossocial

na região metropolitana do Rio de Janeiro

Trabalho apresentado no III Congresso Ibero-americano de Psicogerontologia, sendo de total responsabilidade de seu(s) autor(es).

substâncias psicoativas entre estudantes da rede pública e particular das 26 capitais e Distrito Federal

MITOS E REALIDADES A QUESTÃO DA VIOLÊNCIA

A MULHER EMPREENDEDORA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ

Criminalidade. Luciano Nakabashi Juliano Condi

A participação feminina no mercado de trabalho: observações sobre as docentes no ensino privado brasileiro 2013

PERFIL DO CONSUMO DE ÀLCOOL EM MULHERES DE UM NÚCLEO DE SAÚDE DA FAMÍLIA

Apoio. Patrocínio Institucional

O USO DE DROGAS LÍCITAS E ILÍCITAS POR ALUNOS DO ENSINO MÉDIO (UM ESTUDO DE CASO)

PROGRAMA CRIANÇA ESPERANÇA PROCESSO SELETIVO 2011

INSTITUTOS SUPERIORES DE ENSINO DO CENSA PROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA PROVIC PROGRAMA VOLUNTÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA

AÇÕES EDUCATIVAS COM UNIVERSITÁRIOS SOBRE FATORES DE RISCO PARA SÍNDROME METABÓLICA

Área: ,8km População

Analfabetismo no Brasil

Apoio às políticas públicas já existentes;

69% dos pais afirmam conversar com os filhos sobre dinheiro, mostra pesquisa do SPC Brasil

Pesquisa Semesp. A Força do Ensino Superior no Mercado de Trabalho

Projeto Diga Sim a Vida e Não as Drogas

HELOISA MARIA LESSA MARA REGINA PALANDI COMPREENDENDO A AIDS: DÚVIDAS E CERTEZAS PROVISÓRIAS. Orientadora: Fernanda Bertoldo

Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNAD 2011

Como vai a vida no Brasil?

Sumário Executivo. Amanda Reis. Luiz Augusto Carneiro Superintendente Executivo

PERFIL DE IDOSOS USUÁRIOS DE ÁLCOOL ACOMPANHADOS EM UMA UNIDADE DA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA

PROJETO DE LEI N o, DE 2012

Transcrição:

ConScientiae Saúde ISSN: 1677-1028 conscientiaesaude@uninove.br Universidade Nove de Julho Brasil Rocha Dezontine, Fabiane; Leandro Nascimento, Jorge Willian; Gatti de Menezes, Fabiana; Pimentel Godoy, Míriam; Melo Silva Antonialli, Michele Uso de drogas entre adolescentes estudantes de escola da rede privada em São Paulo ConScientiae Saúde, vol. 6, núm. 2, 2007, pp. 323-328 Universidade Nove de Julho São Paulo, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=92960215 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe, Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

Uso de drogas entre adolescentes estudantes de escola da rede privada em São Paulo Fabiane Rocha Dezontine Graduada em Farmácia Bioquímica Uninove. rochadezontine@yahoo.com.br Jorge Willian Leandro Nascimento Mestre em Ciências Farmacêuticas Universidade de Minas Gerais; Doutor em Fármacos e medicamentos USP; Graduado em Farmácia-Bioquímica UFJF; Professor de Farmacologia Uninove. jorgewilian@uninove.br Fabiana Gatti de Menezes Mestre em Farmacologia Universidade Estadual de Campinas Doutor em Farmacologia e Graduado em Farmácia USP; Professor de Farmacologia Uninove. fabiana.gatti@uol.com.br Míriam Pimentel Godoy Mestre de Toxicologia USP; Graduada em Farmácia Universidade Estadual de Alfenas; Professor de Toxicologia e Farmacologia Uninove. mpgodoi@uninove.br Michele Melo Silva Antonialli Mestre e Doutora em Farmacologia USP; Especialista em Farmácia Hospitalar e Farmácia Clínica HCFMUSP; Graduada em Farmácia Universidade Federal de Goiás; Professora de Farmácia Hospitalar e Farmacologia Uninove. miantonialli@uninove.br O consumo de drogas entre adolescentes tem crescido de maneira alarmante, o que pode contribuir para o atraso educacional, além de aumentar a criminalidade. O objetivo deste estudo foi avaliar o padrão de consumo de drogas entre estudantes de escolas particulares da cidade de São Paulo. Para tanto, foram feitas pesquisas descritiva e observacional e aplicado um questionário anônimo coletivamente em sala de aula. Do total de participantes, 46,2% eram do sexo masculino e 53,8% do sexo feminino, com idades de 15 a 21 anos. O maior índice de consumo foi observado para o álcool (78,8%) e o tabaco (65,8%). Das drogas de abuso, as mais usadas foram os solventes (32,2%) e a maconha (30,5%). Editorial Ponto de vista Artigos Instruções para os autores Palavras-chave: Adolescentes. Álcool. Drogas de abuso. Solventes. ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 323-328, 2007. 323

1 Introdução Consumir drogas é uma prática humana, milenar e universal. A maioria dos grupos sociais tem convivido com diversas substâncias psicoativas ao longo do tempo (BUCHER, 1992). O consumo de drogas tornou-se motivo de preocupação a partir dos anos 1960, a ponto de ser considerado um problema de saúde pública, devido ao crescente consumo, principalmente entre os jovens, pelos riscos que oferecem à saúde do usuário, além dos problemas sociais associados ao uso dessas substâncias. As primeiras experiências com drogas ocorrem freqüentemente na adolescência. Nessa fase, o indivíduo é vulnerável, do ponto de vista psicológico e social (BUCHER, 1992). Um levantamento do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), que comparou o consumo de drogas em várias capitais brasileiras, entre 1987 e 1997, demonstrou crescimento alarmante do uso de drogas entre adolescentes escolares (GALDURÓZ et al., 1997).Vários grupos de pesquisa também têm relatado alto índice de consumo de droga de abuso entre adolescentes (MUZA et al., 1997; SOUZA; MARTINS, 1998; BAUS et al., 2002; SOLDERA et al., 2004; TAVARES et al., 2004). O uso de drogas está associado com o atraso educacional (TAVARES et al., 2001), ausências no emprego e nas salas de aula (SANCHES; NAPPO, 2002), além de ser um dos fatores que influenciam nos casos de violência e criminalidade (MINAYO; DESLANDES, 1998; GALDURÓZ; CAETANO, 2004). Ressalte-se, também, que a maioria das drogas de abuso causa danos físicos aos usuários. Entre os fatores associados à utilização de drogas pelos adolescentes, estão a falta de estrutura familiar, a violência doméstica, o relacionamento ruim com os familiares, amigos e as condições socioeconômicas (sexo, idade e classe social) (TAVARES et al., 2004; SOLDERA et al., 2004; PRATTA, 2007). Alguns estudos demonstraram que o bom relacionamento familiar, a prática religiosa e de esportes, além do acesso às informações sobre drogas, afastam os jovens do uso das drogas (ROBBINS; BRYAN, 2004; SANCHES et al., 2005). O problema do consumo de drogas entre adolescentes tem mobilizado profissionais de diversas áreas e de vários segmentos da sociedade, na tentativa de identificar padrões de seu uso, assim como os fatores associados a esse consumo para encontrar medidas que o reduzam entre os adolescentes. Este trabalho teve como objetivo avaliar o padrão de consumo de drogas de uma população de adolescentes estudantes de ensino médio de escolas particulares da cidade de São Paulo. 2 Materiais e método Esta pesquisa descritiva feita entre estudantes do ensino médio de escolas particulares. Inicialmente, realizou-se uma visita à escola, na qual foi apresentado o projeto com a entrega de uma cópia da pesquisa aos gestores. Aproveitou-se o momento para levantar o número de turmas do ensino médio, indicações do turno em que funcionavam e o número de estudantes em cada uma delas. Para a coleta de dados, aplicou-se um questionário padronizado, anônimo e de autopreenchimento. O questionário foi composto de questões fechadas, abordando dados demográficos sobre o participante e sua organização familiar (nível de escolaridade, situação econômica etc.), além de questões a respeito do uso de drogas ilíticas (maconha, cocaína, solventes) e do padrão de consumo de substâncias psicoativas (álcool e tabaco). Esses dados foram coletados de julho a dezembro de 2003. Foram incluídos no estudo adolescentes entre 15 e 21 anos, alunos do ensino médio de escolas particulares da cidade de São Paulo. Os questionários aplicados em sala de aula e na ausência do professor, após serem pre- 324 ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 323-328, 2007.

enchidos, foram colocados em uma urna para garantir o anonimato. 3 Resultados e discussão Dos 320 questionários aplicados, 28 estavam incompletos; por isso, foram eliminados da pesquisa. Entre os alunos incluídos no estudo, 53% são do sexo feminino. A média de idade ficou em 18,5 anos, variando entre 15 e 21 anos. Tabela1: Características socioeconômicas da população estudada (n=292) Características Variáveis Número Porcentagem Gênero Ocupação Moradia Renda própria Fonte: Os autores. Masculino 135 46,2% Feminino 157 53,8% Sim 180 61,6% Não 112 38,4% Mora sozinho 8 2,7% Mora com os pais Mora com a mãe 120 41% 129 44,2% Mora com o pai 35 12% Nenhuma 110 37,7% Menos de 1 salário mínimo Mais de 1 salário Mínimo 127 43,5% 55 18,8% Dentre os entrevistados, 44,2% moram com a mãe; 41%, com os pais; 12% vivem com o pai e apenas 2,7% moram sozinhos (Tabela 1). O consumo de drogas tem sido associado à estrutura familiar. Apesar de este trabalho não ter avaliado a estrutura familiar dos entrevistados, pode-se observar que grande parte deles mora somente com a mãe ou o pai, ou ainda sozinho. Esse fato pode ter contribuído para a alta prevalência do uso de drogas sobre a população estudada. Adolescentes provenientes de famílias mais estruturadas, com bom relacionamento familiar, tendem a usar menos drogas do que aqueles provenientes de famílias desestruturadas. Brigas conjugais entre os pais e maus tratos levam à instabilidade emocional do adolescente, deixando-o mais suscetível ao mundo das drogas (BAUS et al., 2002; TAVARES et al., 2004). Um fator interessante observado neste trabalho é que, apesar de tratar-se de escola particular, a maioria dos estudantes pesquisados já apresenta alguma ocupação (61%), recebendo remuneração mensal em torno de um salário mínimo (dados não apresentados). Swadi (2004) observou maior consumo de drogas entre estudantes que trabalham, o que sugere uma associação entre disponibilidade de dinheiro e uso de drogas. Baus e colaboradores (2002) constataram elevado consumo de drogas entre adolescentes de classes socioeconômicas mais altas, o que também foi observado em estudo realizado em Cuiabá (SOUZA; MARTINS, 1998). Soldera e colaboradores (2004) observaram maior consumo de drogas entre alunos de escolas particulares do que entre os de rede pública. Muza e colaboradores (1997), em trabalho realizado em Ribeirão Preto, não notaram diferença no consumo de álcool e tabaco entre distintas classes sociais; no entanto, para drogas ilícitas, o uso foi maior nas classes socioeconômicas mais altas, provavelmente por seu custo elevado em relação ao álcool e tabaco. Na Região Metropolitana de São Paulo, verificou-se maior utilização de cigarro, álcool, solventes e maconha entre os alunos das escolas particulares do que entre os da rede estadual (CARLINI-COTRIM, 2000). Neste estudo, o álcool apareceu como substância mais consumida pelos adolescentes pesquisados (78,8%). Esses dados coincidem com os observados pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID) (GALDURÓZ et al., 1997) que aponta o álcool como a droga mais consumida entre os adolescentes. Outros trabalhos também demonstram que entre os adolescentes predomina o consumo de álcool (GODOI et al., 1991; CARLINI-COTRIM et al., 2000; TAVARES et al., 2001; BAÚS et al., 2002; SOLDERA et al., 2004). Por meio de estudo realizado em várias cidades brasileiras, observou-se que 68% da população pesquisada, incluindo indivíduos de várias Editorial Ponto de vista Artigos Instruções para os autores ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 323-328, 2007. 325

faixas etárias, usou álcool em algum momento da vida ou freqüentemente (GALDURÓZ; CAETANO, 2004). Essa supremacia é preocupante e indica que devem ser tomadas medidas eficazes para conter sua utilização. O álcool, apesar de ser uma substância lícita, representa grave problema de saúde pública, uma vez que seu consumo exagerado é desastroso tanto para os indivíduos quanto para a sociedade. O consumo do álcool está associado com eventos de violência, sendo responsável por vários casos de agressão atendidos em hospitais, assim como acidentes de carro (MINAYA; DESLANDES, 1998; CARLINI-COTRIM et al., 2000; PECHANSKYA et al., 2004). Além disso, o consumo de álcool estimula a atividade sexual entre os adolescentes (CARLINI-COTRIM et al., 2000), uma vez que, logo após o uso do álcool, a libido aumenta e o desempenho sexual melhora, sendo esse um dos fatores que estimulam o uso dessa substância entre os jovens (SCIVOLETTO et al., 1999). Em relação ao tabaco, nossas conclusões demonstraram que 65,8% dos entrevistados o utilizam freqüentemente. Nossos resultados estão acima dos observados em outros trabalhos que apresentam 10 a 20% de prevalência o consumo de tabaco (CARLINI-COTRIM et al., 2000; TAVARES et al., 2001; SOLDERA et al., 2004) e muito acima dos dados do levantamento realizado pelo CEBRID que indica uso pesado de tabaco em 4,3% (GALDURÓZ et al., 1997). Segundo a maioria dos trabalhos, a primeira experiência com drogas concentra-se nas faixas de 13 a 16 anos, embora um percentual significativo de adolescentes tenha usado tabaco ou álcool, pela primeira vez, em idades mais precoces (GODOI et al., 1991; SANCHES; NAPPO, 2002). O principal problema do alto consumo dessas substâncias consideradas lícitas é sua associação, mais tarde, ao uso das drogas ilícitas. Um estudo demonstrou que o cigarro e o álcool são as drogas mais citadas como as primeiras consumidas pelos adolescentes, enquanto a maconha e os inalantes são as primeiras drogas ilícitas relatadas pela maioria deles (SANCHES; NAPPO, 2002). Quanto ao uso das consideradas de abuso, foi observado grande consumo de solventes e maconha entre os adolescentes pesquisados. Vários pesquisadores obtiveram resultados semelhantes aos nossos, registrando maior consumo de solventes em relação ao uso da maconha entre adolescentes (GODOI et al., 1991; GUIMARÃES et al., 2004). No levantamento do CEBRID de 1997, os solventes apareceram em primeiro lugar, em nove das dez capitais pesquisadas (GALDURÓZ et al., 1997). Diferentemente desses resultados, alguns estudos identificaram maior consumo da maconha do que de solventes entre estudantes de ensino médio (TAVARES et al., 2001; SOLDERA et al., 2004), sendo o uso de solventes ainda considerado alto por todos os pesquisadores. A maconha é geralmente considerada uma droga leve, que não vicia. Essa opinião, muitas vezes, é mantida até que o indivíduo passe a consumir outras mais potentes. Entretanto, a maconha pode provocar desordens psicóticas e até esquizofrenia em usuários crônicos (ARENDT et al., 2005). Anteriormente, o consumo de solventes estava associado aos meninos de rua ou mesmo aos adolescentes de classes sociais menos favorecidas que utilizam a cola de sapateiro (CARLINI-COTRIM et al., 1987). Em estudos mais recentes, semelhante ao que foi observado neste trabalho, não se observa diferença tão pronunciada no consumo de solventes entre as diferentes classes sociais (GODOI et al., 1991; TAVARES et al., 2001; SOLDERA et al., 2004). A disseminação do uso de solventes pelos adolescentes, assim como a alta prevalência de sua utilização, é conseqüência, principalmente, da facilidade de obtenção desse material. Os solventes mais usados, via de regra, por adolescentes de baixo poder aquisitivo são os provenientes da cola. Outros, como o lança-perfume e o cherinho da loló, também são largamente usados (PEDROZO; SIQUEIRA, 1989; SANCHES; NAPPO, 2002). Além desses solventes, vários 326 ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 323-328, 2007.

produtos de uso doméstico apresentam substâncias que podem ser inaladas, tais como laquês, removedores, esmaltes, produtos de limpeza, thinner, acetona e benzina (PEDROZO; SIQUEIRA, 1989; CARLINI-COTRIM, 2000). Os estudantes entrevistados relataram inalar fluido de isqueiro ou benzina e chá de fitas cassete (dados não apresentados). Além da facilidade de acesso, o uso dessas substâncias pode passar despercebido pelos pais e até pela polícia (MONTEIRO et al., 1984). Os solventes apresentam grande potencial lesivo à saúde, sobretudo em razão de sua ação neurotóxica. Depois de inalá-los, o indivíduo apresenta euforia semelhante à provocada pelo álcool, seguida de confusão mental, desinibição e alucinações visuais e auditivas. Os solventes são, em geral, depressores do sistema nervoso central (SNC) e, de acordo com a intensidade da exposição, podem causar desde sonolência e confusão mental até depressão respiratória, coma e morte, além de ocasionar toxicidade renal e hepática e alterações hematológicas (PEDROZO; SIQUEIRA, 1989). Recente estudo usando análise de imagens em usuários de solventes demonstrou que a inalação do tolueno, que é o principal componente dos solventes industriais, pode causar desmielinização cerebelar (BORNE et al., 2005). Inclusive, observou-se que filhotes de ratas expostas ao tolueno durante a gestação apresentaram redução do peso ao nascer, malformação fetal e prejuízo no desenvolvimento comportamental (BOWEN et al., 2005). 4 Considerações finais Apesar de este trabalho tratar de uma população específica de adolescentes, é possível concluir que os jovens estão fazendo uso de drogas em grande quantidade, sejam lícitas como o álcool e tabaco, ou ilícitas como solventes e maconha. Esses resultados demonstram a necessidade de estabelecer medidas educativas, preventivas e terapêuticas nas escolas e em comunidades com grande quantidade de população jovem, dando ênfase aos solventes que, além de muito tóxicos e de fácil acesso, acabam servindo de porta de entrada para outras drogas. Drug use among adolescents of private school in São Paulo The objective in this study was to investigate drug consumption among students of a private school in the city of São Paulo. For all, a close anonymous self-administered questionnaire was held to collect sociodemographic data and identify the pattern of abusive use of drugs. There were 46,2% male participants and 53,8% females, aged 11-21 years. The largest consumption indexes were seen for alcohol (78,8%) and tobacco (65,8%). Most used drugs were solvents (32,2%) and marijuana (30,5%). The drug use seen in the study was similar to that described in CEBRID (Brazilian Data Institute on Psychoactive Drugs) studies. Key words: Adolescent. Alcohol. Drug abuse. Solvent. Referências ARENDT, M.; ROSENBERG, R.; FOLDAGER, L.; PERTO, G.; MUNK-JORGENSEN, P. Cannabis-induced psychosis and subsequent schizophrenia-spectrum disorders: follow-up study of 535 incident cases. Br J Psychiatry, v. 187, p. 510-515, 2005. BAUS, J.; KUPEK, E.; PIRES, M. Prevalência e fatores de risco relacionados ao uso de drogas entre escolares. Rev Saúde Pública, v. 36, n. 1, p. 40-46, 2002. BORNE, J.; RIASCOS, R.; CUELLER, H.; VARGAS, D.; ROJAS, R. Neuroimaging in drug and substance abuse. Part II: opioids and solvents. Top magn Reson Imaging, v. 16, n. 3, p. 239-245, 2005. BOWEN, S.E.; BATIS, J. C.; MOHAMMADI, M.H.; HANNIGAN, J.H. Abuse pattern of gestational toluene exposure and early postnatal development in rats. Neurotoxicol Teratol, v. 27, n. 1, p. 105-116, 2005. BUCHER, R. Drogas e drogadição no Brasil. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. Editorial Ponto de vista Artigos Instruções para os autores ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 323-328, 2007. 327

CARLINI-COTRIM, B.; CARLINI, E.A. O consumo de solventes e outras drogas em crianças e adolescentes de baixa renda na Grande São Paulo. Parte II: Meninos de rua e menores internados. Revista ABP-APAL, v. 9, n. 2, p. 69-77, 1987..; B.; CARVALHO, C. G.; GOUVEIA, N. Comportamentos de saúde entre jovens estudantes das redes pública e privada da área metropolitana do Estado de São Paulo, Rev Saúde Pública, v. 34, n. 6, p. 636-645, 2000. GALDURÓZ, J. C. F.; NOTO, A. R.; CARLINI, E. A. IV levantamento sobre o uso de drogas entre estudantes de 1 o e 2 o graus em 10 capitais brasileiras. São Paulo: CEBRID/ EPM; 1997..; CAETANO, R. Epidemiologia do uso de álcool no Brasil. Rev Bras Psiquiatr, v. 26 (Supl I), p. 3-6, 2004. GODOI, A. M. M.; MUZA, G. M.; COSTA, M. P.; GAMA, M. L. T. Consumo de substâncias psicoativas entre estudantes de rede privada. Rev Saúde Pública, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 150-156, 1991. GUIMARÃES, J. L.; GODINHO, P. H.; CRUZ, R.; KAPPANN, J. I.; JUNIOR, L. A. T. Consumo de drogas psicoativas por adolescentes escolares de Assis, SP. Rev Saúde Pública, v. 38, n. 1, p. 130-132, 2004. MINAYO, M. C. S.; DESLANDES, S. F. A complexidade das relações entre drogas, álcool e violência. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, v. 4, n. 1, p. 35-42, 1998. MONTEIRO, F.; FERRAZ, M. P.; MACHADO, N. R.; PINEHEIRO, E. M.; PINHEIRO, M. F.; RIBEIRO, M. C. Adolescentes cheiradores de cola. J Pediatr. Rio de Janeiro. v. 57, n. 4, p. 330-332, 1984. MUZA G. M.; BETTIOL, H.; MUCCILLO, G.; BARBIERI, M. A. Consumo de substâncias psicoativas por adolescentes escolares de Ribeirão Preto, SP (Brasil). I Prevalência do consumo por sexo, idade e tipo de substância. Rev Saúde Pública, v. 31, p. 21-29, 1997. PECHANSKYA, F.; SZOBOTA, C. M.; SCIVOLETTO, S. Uso de álcool entre adolescentes: conceitos, características epidemiológicas e fatores etiopatogênicos. Rev Brás Psiq, v. 26 (supl 1), p. 14-17, 2004. PEDROZO, M. F. M.; SIQUEIRA, M. E. P. B.; Solventes de cola: abuso e efeitos nocivos à saúde. Rev Saúde Publica, v. 23, n. 4, p. 336-340, 1989. PRATTA, E. M. M. Lazer e uso de substâncias psicoativas na adolescência: possíveis relações. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 23, n. 1, p. 43-52, 2007. ROBBINS, R. N.; BRYAN, A. Relationships between future orientation, impulsive sensation seeking, and risk behavior among adjudicated adolescents. J Adolesc Res, v. 19, n. 4, p. 428 445, 2004. SANCHEZ, Z. V. D. M; NAPPO, S. A. Seqüência de drogas consumidas por usuários de crack e fatores interferentes. Rev Saúde Pública, v. 36, n. 4, p. 420-430, 2002..; OLIVEIRA, L. G.; NAPPO, S. A. Razões para o não-uso de drogas ilícitas entre jovens em situação de risco. Rev Saúde Pública, v. 39. n. 4, p. 599-605, 2005. SCIVOLETTO, S.; TSUJI, R. K.; ABDO, C. H. N.; QUEIROZ, S.; ANDRADE, A. G. Relação entre consumo de drogas e comportamento sexual de estudantes de 2 O grau de São Paulo. Rev Bras Psiq, v. 21, n 2, p. 87-94, 1999. SOLDERA, M.; DALGALARRONDO, P.; CÔRREA-FILHO, H. R.; SILVA, C. A. M. Uso de drogas psicotrópicas por estudantes: prevalência e fatores sociais associados. Rev Saúde Pública, v. 38, n. 2, p. 277-283, 2004. SOUZA, D. P. O.; MARTINS, D. T. O. O perfil epidemiológico do uso de drogas entre estudantes de 1o e 2o graus da rede estadual de ensino de Cuiabá, Brasil, 1995. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 14, n. 2, p. 391-400, 1998. SWADI, H. Drug and substance use among 3.333 London adolescents. Br J Addict, v. 83, n. 8, p. 935, 1988. TAVARES, B. F.; BÉRIA, J. U.; LIMA, M. S. Fatores associados ao uso de drogas entre adolescentes escolares. Rev. Saúde Publica, v. 38, n. 6, p. 787-796, 2004.. Prevalência do uso de drogas e desempenho escolar entre adolescentes. Rev Saúde Publica, v. 35, n. 2, p. 150-158, 2001. Recebido em 13 mar. 2006 / aprovado em 18 jul. 2007 Para referenciar este texto DEZONTINE, F. R. et al. Uso de drogas entre adolescentes estudantes de escola da rede privada em São Paulo. ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 323-328, 2007. 328 ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 323-328, 2007.