CARACTERIZAÇÃO TEMPORAL DA PRECIPITAÇÃO PLUVIOMÉTRICA PARA A LOCALIDADE DE PONTA GROSSA (PR), NO PERÍODO DE 1954 A 2001 Patrícia Alves Adacheski, Universidade Estadual de Ponta Grossa, patricia2as@yahoo.com.br Maysa de Lima Leite, Universidade Estadual de Ponta Grossa, mleite@uepg.br Palavras-chave: chuva, precipitação pluvial, análise frequencial. INTRODUÇÃO A precipitação pluvial é um dos elementos meteorológicos que mais exerce influência sobre as condições ambientais e é de grande importância por estar diretamente relacionada aos mais diversos setores da sociedade, já que o regime pluviométrico afeta a economia, o meio ambiente e a sociedade (SILVA et al., 2007). A distribuição espaço-temporal das chuvas é uma característica regional muito importante, tanto para a sociedade como para a economia. O conhecimento dessa característica pode orientar decisões quanto às medidas necessárias para minimizar os danos decorrentes da irregularidade das chuvas (PICCININI, 1993 apud MINUZZI et al., 2007). Segundo Nery et al. (2002 apud NERY et al., 2004), informações sobre o número de dias com precipitação pluvial são úteis tanto no planejamento agrícola em curto prazo (práticas agronômicas cuja umidade do solo e/ou ar são condicionantes) como em longo prazo (definições das regiões e épocas mais adequadas para a semeadura de culturas). Para Assis (1991 apud RIBEIRO; LUNARDI, 1997), a freqüência, ou seja, o número de dias dentro de um mês ou estação em que ocorra precipitação, talvez seja o aspecto mais importante em relação à chuva para a agricultura em geral, além de quantidade e variabilidade. Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar o comportamento frequencial e de intensidade da precipitação pluvial na localidade de Ponta Grossa (PR), no período de 1954 a 2001. MATERIAL E MÉTODOS Foram analisados dados diários de precipitação (mm), obtidos junto à Estação Meteorológica (latitude: 25 13 S, longitude: 50 01 W, altitude: 880 m) do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) localizada na cidade de Ponta Grossa, no Estado do Paraná. Tais dados foram coletados no intervalo de janeiro de 1954 a dezembro de 2001, totalizando uma série de 48 anos. Após uma triagem inicial e avaliação de consistência das séries temporais, onde foram avaliadas falhas nos dados, os mesmos receberam um tratamento estatístico descritivo, através de planilhas no software Microsoft Office Excel. Em seguida, procedeu-se com a análise da frequência de dias com chuva em cada mês da série. Os dias com estiagem climatológica (dias em que a precipitação foi menor que 0,1 mm) foram excluídos e os dados restantes foram separados em classes de intervalo de precipitação, a cada 5 mm. A partir desses intervalos, os dados foram classificados em relação à intensidade da precipitação, como mostra a tabela a seguir (SORIANO; GALDINO, 2002):
Intervalo de precipitação (mm) Entre 0,1 e 5 Entre 5 e 10 Entre 10 e 15 Entre 15 e 20 Entre 20 e 25 Entre 25 e 30 Mais de 30 Classificação da intensidade de precipitação Muito fraco Fraco Moderadamente fraco Moderado Moderadamente forte Forte Muito forte Efetuando-se as distribuições de frequência, encontraram-se as frequências absoluta e relativa de cada classe de intervalo de precipitação para o mês analisado e, então, descobriu-se o intervalo mais frequente na localidade estudada. Para melhor representação dos dados, foram construídos histogramas para cada mês a partir dessa análise frequencial, também utilizando-se o Microsoft Office Excel. Os dados foram ainda estudados anualmente, encontrando-se os totais anuais de precipitação e os totais anuais de dias com chuva e com estiagem climatológica, sendo que os totais de dias com e sem chuva também foram analisados trimestralmente, a partir dos dados mensais. RESULTADOS E DISCUSSÃO A série estudada continha 17.441 dias no total, sendo que 6.056 dias apresentaram precipitação igual ou maior que 0,1 mm, perfazendo 34,72% do total. A partir de um gráfico dos totais anuais de precipitação (mm) para Ponta Grossa (PR) de 1954 a 2001, observou-se que o ano com maior total de precipitação foi 1998, com 2.494 mm, e que o ano com menor total foi 1985, com 910,3 mm. Para a série estudada, obteve-se uma altura média anual de 1.546,2 mm, sendo que o estudo revelou que os totais anuais demonstraram uma tendência a aumentar com o passar dos anos, o que pode ser corroborado se a média encontrada neste estudo for comparada com a obtida por Maack (1981), que chegou a uma média anual de 1.422,8 mm para uma série de 40 anos (de 1922 a 1961). Tal tendência de aumento poderia possivelmente ser justificada pelas mudanças climáticas causadas pelo aquecimento global, já que uma das conseqüências desse fenômeno para a região sul do Brasil é o aumento de chuvas (BATES et al., 2008). Entretanto, Nobre (2001) afirma que, com relação às precipitações pluviométricas, não há indicação clara de mudança e o que se observa é variabilidade climática nas escalas interanual e interdecadal para o sul da América do Sul; o referido autor afirma que o nível de incerteza é ainda muito grande. O mesmo gráfico possibilitou notar que houve uma alternância de altos e baixos de totais de precipitação, o que pode em parte ser explicado pelos eventos El Niño e La Niña. Uma das conseqüências do El Niño é o aumento da precipitação no sul da América do Sul, atingindo proporções catastróficas, como ocorreu em 1983 e em 1998. Justamente nesses anos observaram-se os dois maiores totais anuais de precipitação da série de Ponta Grossa (2.494 mm em 1998 e 2.217 mm em
1983), ou seja, o El Niño efetivamente implicou em alterações expressivas nos totais de precipitação nesses anos. Os outros três maiores totais anuais (2.080,1 mm em 1957; 2.071,1 mm em 1993 e 2.054,7 mm em 1990) também ocorreram em anos de El Niño, apesar de o evento não ter sido tão forte como nos dois anos anteriormente citados. Já o fenômeno La Niña, que causa diminuição considerável das chuvas na região sul da América do Sul, pode explicar a menor precipitação observada na série estudada (910,3 mm em 1985), mas não os totais de 1968 (924,9 mm) e 1959 (968,4 mm), pois não houve ocorrência do fenômeno nesses anos. A explicação, então, pode estar relacionada a alguma massa de ar quente e seco estacionada sobre a região durante algum tempo nesses anos, diminuindo as precipitações. Quanto ao número de dias com chuva, o ano de 1983 foi o ano com mais dias chuvosos (168 dias), enquanto 1968 foi o ano que teve o menor total de dias com chuva (apenas 73 dias). A média obtida para o período estudado foi de 126 dias com chuva por ano, sendo que uma tendência para o aumento dessa média também foi observada. Essa tendência anual é devida, provavelmente, ao 1º trimestre, sendo este um período em que o número de dias com chuva mostrou considerável tendência de aumento na série estudada. Os totais de dias com chuva e com estiagem climatológica foram também analisados trimestralmente, com a finalidade de se verificar a presença de comportamentos diferenciados em cada trimestre, o que foi confirmado. Os dias com chuva e os dias com estiagem climatológica comportaram-se da seguinte maneira: Média de dias Média de dias com chuva sem chuva Diferença 1º trimestre 42 47 05 2º trimestre 25 65 40 3º trimestre 24 68 44 4º trimestre 35 57 22 Observa-se que, no 1º trimestre, as duas médias têm valores próximos. Já no 2º trimestre, a média de dias com chuva é muito menor que a média de dias com estiagem climatológica, sendo que essa diferença é ainda maior no 3º trimestre, ou seja, ambos os trimestres são bastante secos. No 4º trimestre, a diferença entre a média de dias com chuva e a média de dias com estiagem climatológica não é tão grande, mas também não é tão pequena, isto é, esse trimestre é menos seco que os 2º e 3º trimestres, mas não é tão chuvoso como o 1º trimestre. Para entender melhor estas variações, torna-se importante ressaltar que o Estado do Paraná é atravessado pelo trópico de Capricórnio, apresentando, assim, climas tropical e subtropical. A região é caracterizada pela transição climática e apresenta duas estações bem definidas: verão quente e úmido e inverno com temperatura branda e baixa pluviosidade. Com relação aos sistemas atmosféricos que atuam nessa região, há predomínio de massas de ar de baixa pressão (receptoras de ventos, grande
instabilidade atmosférica caracterizada por grande nebulosidade e precipitação elevada) nos meses mais quentes; nos meses mais frios, prevalecem as massas de alta pressão (dispersoras de ventos, menores temperaturas, não apresentam nebulosidade e possuem estabilidade atmosférica) (BORSATO; SOUZA FILHO, 2008). Analisando-se os dados mensalmente, verificou-se que o mês com maior média de precipitação é janeiro (185,4 mm) e que o mês com menor média é agosto (78,9 mm). Maack (1981) também encontrou janeiro como sendo o mês mais rico em chuva (164,4 mm) e agosto como sendo o mais pobre (71,2 mm). Comparando o estudo do referido autor com o presente trabalho, em todos os meses houve aumento na precipitação média mensal, exceto fevereiro. Outra observação obtida é a de que as cinco menores médias mensais ocorrem em meses dos 2º e 3º trimestres, ou seja, estes também registram as menores alturas de precipitação, além de apresentarem menos dias com chuva. Para cada mês, foi construído um histograma que mostra a freqüência de dias com precipitação no período estudado a partir dos intervalos de classe mencionados anteriormente. Como são muitos os gráficos, optou-se por não colocá-los aqui, mas, a partir deles, observou-se que, em todos os meses, o intervalo que vai de 0,1 mm a 5 mm, considerado como sendo de chuva muito fraca, foi o que registrou mais ocorrências, ou seja, são muitos dias com pequena altura de chuva. Também se observou nos histogramas que os outros intervalos de precipitação, da mesma forma que o de chuva muito fraca, apresentam maior frequência nos 1º e 4º trimestres. Com relação ao intervalo de precipitação moderada (entre 15 mm e 20 mm), o estudo mostrou que no 4º trimestre é quando mais ocorrem chuvas nesse intervalo. Já com relação ao intervalo de chuva muito forte (mais de 30 mm num dia), observou-se que o 2º trimestre apresenta os maiores percentuais. Foram observados eventos extremos diários dentro da série, como o do dia 19 de novembro de 1963, quando choveu 139,2 mm, sendo este o valor máximo de toda a série estudada. Outro extremo observado ocorreu em 28 de abril de 1965, quando choveu 121 mm. O terceiro maior extremo ocorrido na série aconteceu em 21 de janeiro de 1997, quando choveu 119,6 mm. CONCLUSÃO O principal resultado observado foi a tendência de aumento na média histórica anual de precipitação em Ponta Grossa (PR). Tal situação pode estar relacionada com a teoria do aquecimento global, que prevê aumento de chuvas para a localidade estudada. Ao mesmo tempo, o fenômeno El Niño pode influenciar no total anual de precipitação em Ponta Grossa, já que uma das consequências desse fenômeno para a região é o aumento da intensidade das chuvas. O verão (1º trimestre) é a estação em que mais chove em Ponta Grossa, tanto em quantidade total (mm) como em número de dias com chuva; isso influencia no aumento do número anual de dias
com chuva. Já o outono (2º trimestre) e o inverno (3º trimestre), além de apresentarem menos dias com chuva, também registram as menores alturas de precipitação. Em todos os meses, o intervalo de 0,1 mm a 5 mm, considerado como sendo de chuva muito fraca, foi o que registrou mais ocorrências. Apesar do menor número de registros, chuvas consideradas muito fortes (com intensidade superior a 30 mm) podem ser observadas principalmente no outono (2º trimestre). REFERÊNCIAS BATES, B. C.; KUNDZEWICZ, Z. W.; WU, S.; PALUTIKOF, J. P. (Eds.). Climate Change and Water. Technical Paper of the Intergovernmental Panel on Climate Change, IPCC Secretariat, Geneva, 2008. 210 p. BORSATO, V. A.; SOUZA FILHO, E. E. A dinâmica atmosférica na vertente oriental da bacia do alto rio Paraná e a gênese das chuvas. Acta Sci. Technol. Maringá, v. 30, n. 2, p. 221-229, 2008. MAACK, R. Geografia física do Estado do Paraná. 2. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio; Curitiba: Secretaria da Cultura e do Esporte do Governo do Estado do Paraná, 1981. 450 p. MINUZZI, R. B.; SEDIYAMA, G. C.; BARBOSA, E. M.; MELO JÚNIOR, J. C. F. Climatologia do comportamento do período chuvoso da Região Sudeste do Brasil. Revista Brasileira de Meteorologia, Rio de Janeiro, v. 22, n. 3, p. 338-344, 2007. NERY, J. T.; MARTINS, M. L. O. F.; ROSEGHINI, W. F. F.; ROSEGHINI, F. F. Variabilidade da precipitação pluvial e disponibilidade hídrica na Região Noroeste do Estado do Paraná. Revista Brasileira de Agrometeorologia, Santa Maria, v. 12, n. 2, p. 289-297, 2004. NOBRE, C. A. Mudanças climáticas globais: possíveis impactos nos ecossistemas do país. Parcerias Estratégicas, Brasília, n. 12, setembro 2001, p. 239-258. RIBEIRO, A. M. A.; LUNARDI, D. M. C. A precipitação mensal provável para Londrina PR, através da função Gama. Energia na Agricultura, Botucatu, v. 12, n. 4, p. 37-44, 1997. SILVA, J. C.; HELDWEIN, A. B.; MARTINS, F. B.; TRENTIN, G.; GRIMM, E. L. Análise de distribuição de chuva para Santa Maria, RS. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, Campina Grande, v. 11, n. 1, p. 67 72, 2007. SORIANO, B. M. A.; GALDINO, S. Análise da distribuição da freqüência mensal de precipitação para a sub-região da Nhecolândia, Pantanal, Mato Grosso do Sul, Brasil. Corumbá: Embrapa Pantanal, 2002. 22 p. (Embrapa Pantanal. Boletim de Pesquisa, 34).