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Transcrição:

WORLD HEALTH ORGANIZATION REGIONAL OFFICE FOR AFRICA ORGANISATON MONDIALE DE LA SANTE BUREAU REGIONAL DE L AFRIQUE ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE ESCRITÓRIO REGIONAL AFRICANO COMITÉ REGIONAL AFRICANO Quinquagésima-terceira sessão Joanesburgo, África do Sul, 1-5 de Setembro de 2003 AFR/RC53/10 Rev.1 19 de Junho de 2003 ORIGINAL: INGLÊS Ponto 8.3 da ordem do dia provisória PREVENÇÃO E LUTA CONTRA OS TRAUMATISMOS NA REGIÃO AFRICANA: SITUAÇÃO ACTUAL E PROGRAMA DE ACÇÃO Relatório do Director Regional RESUMO 1. Até recentemente, os traumatismos acidentais e intencionais não recebiam a merecida atenção como problemas de saúde graves. Esta falta de atenção devia-se principalmente à falta de informação fidedigna resultante de investigação e consciencialização pública sobre a magnitude do problema, bem como à insuficiência de dados de confiança regularmente recolhidos. Frequentemente, os óbitos devidos aos traumatismos e à violência são notificados de forma inadequada, ou não o são de todo. 2. Os traumatismos são problemas sociais com graves implicações a nível da saúde pública, tanto nos países desenvolvidos como em desenvolvimento. Representam 11% da taxa de mortalidade global e 13% dos anos de vida perdidos ajustados às incapacidades. No ano 2000, estima-se que, só na Região Africana, tenham morrido 725.000 pessoas devido aos traumatismos, representando 7% do total de óbitos em África e 15% do total de óbitos no mundo relacionados com traumatismos. 3. O impacto dos traumatismos e da violência sobre a saúde, a economia e a sociedade são mais significativos nos países pobres e nas populações mais pobres. Os traumatismos podem levar à pobreza e esta constitui um factor de risco para os traumatismos e a violência. Na Região Africana, os acidentes de trânsito, conflitos e violência interpessoal constituem as principais causas de mortalidade e incapacidade relacionadas com os traumatismos. 4. O sector da saúde é o denominador comum final de todos os traumatismos. A informação, educação, comunicação, vigilância dos dados, cuidados pré-hospitalares (incluindo serviços de urgência e de ambulância) e reabilitação envolvem os indivíduos e as instituições do sector dos cuidados de saúde. 5. Assim, o sector da saúde é fulcral para a consciencialização, mobilização de outros sectores e intervenientes, advocacia e contribuição para a formulação, adopção e implementação de políticas, estratégias e programas abrangentes com base em dados factuais, para prevenir e tratar os traumatismos e a violência, assim como as suas consequências. 6. Convida-se o Comité Regional a analisar o presente documento e a aprovar o programa de acção nele proposto.

ÍNDICE Parágrafos INTRODUÇÃO...1-9 SITUAÇÃO ACTUAL... 10-27 PROGRAMA DE ACÇÃO... 28-30 PAPÉIS E RESPONSABILIDADES... 31-40 MONITORIZAÇÃO E AVALIAÇÃO...41 CONCLUSÃO... 42-43

Página 1 INTRODUÇÃO 1. No ano 2000, verificaram-se aproximadamente cinco milhões de óbitos em todo o mundo devido aos traumatismos. Para além das pessoas que morrem todos os anos, milhões de outras ficam temporária ou permanentemente incapacitadas, como consequência dos traumatismos não fatais. 2. Os traumatismos e a violência receberam atenção internacional numa resolução da Assembleia Mundial da Saúde de 1996. 1 Esta resolução reconheceu a crescente importância da violência como um grave problema de saúde pública em todo o mundo, instou os Estados- Membros a avaliar o problema ao nível dos países e solicitou ao Director-Geral para iniciar actividades de saúde pública pertinentes. 3. À semelhança das doenças, os traumatismos resultam da interacção (acidentes, tiros, queimaduras) de um agente (mecânico, de energia térmica); catástrofes naturais hospedeiro (humano) e de vectores (motociclos, fogo, armas). Com base nesta definição, os traumatismos não podem ser vistos como acidentes que resultam de acontecimentos aleatórios, mas sim como consequências previsíveis de acções num ambiente perigoso. Assim, a prevenção e o controlo dos traumatismos envolvem os mesmos princípios que qualquer outro problema de saúde. 4. Os traumatismos são classificados como acidentais e intencionais. Os primeiros são o resultado de acidentes de trânsito, envenenamento, quedas, fogos, afogamento e catástrofes naturais; os traumatismos intencionais podem surgir em consequência da violência interpessoal, colectiva 2 e auto-infligida. 5. Até recentemente, os traumatismos e a violência não recebiam a atenção merecida como problemas de saúde importantes. Esta falta de reconhecimento deveu-se principalmente à falta de consciencialização relativamente à magnitude do problema, agravada pela insuficiência de dados de confiança e recolhidos de forma sistemática. 6. Existem factores ambientais e comportamentais que estão na base das categorias específicas dos traumatismos e violência. Estes podem ser agrupados em factores de nível individual, comunitário e social. A prevenção envolve a redução destes factores de risco e pode diminuir significativamente o fardo social devido aos traumatismos. 7. Os traumatismos e a violência têm efeitos mais danosos nos países pobres e nas populações mais desfavorecidas. As taxas de letalidade decorrentes dos diferentes tipos de traumatismos são mais elevadas nos países em desenvolvimento. Muitas vezes, a violência é causada e agravada pela probreza e exclusão social. Por outro lado, os traumatismos e a violência e as suas consequências podem levar à pobreza ao nível individual, familiar e comunitário. Consequentemente, a prevenção dos traumatismos e da violência deve ser inserida no contexto de estratégias de longa duração para redução da pobreza. 1 Resolução WHA49.25, Prevenção da violência: Uma prioridade de saúde pública, 1996. 2 Violência colectiva é desencadeada por um grupo contra outro, ou por um conjunto de indivíduos e toma a forma de genocídio, repressão, violação dos direitos humanos, terrorismo ou crime violento organizado. OMS, Relatório Mundial sobre violência e saúde, Genebra, 2002.

Página 2 8. Os traumatismos são dispendiosos. O tratamento de emergência, a hospitalização e os cuidados de longa-duração frequentemente desviam os escassos recursos das outras prioridades de desenvolvimento. Os traumatismos podem causar incapacidades para toda a vida, resultando em outros problemas de saúde, com consequências graves para os indivíduos, famílias, comunidades e sistemas de cuidados de saúde. O investimento dos Estados-Membros em programas globais de prevenção e controlo dos traumatismos e da violência, 3 assim como em mecanismos de emergência terá, por conseguinte, benefícios económicos e sociais enormes. 9. Este documento apresenta uma visão geral da actual situação no que respeita aos traumatismos e à violência na Região Africana, bem como ao seu impacto geral no desenvolvimento económico e social. Propõe um programa de acção para implementação, de forma a fazer face ao agravamento da situação. SITUAÇÃO ACTUAL 10. Embora os traumatismos tenham graves consequências sociais e económicas, os dados respeitantes aos mesmos e ao seu consequente impacto raramente são recolhidos de forma sistemática e podem estar espalhados por muitas instituições e organizações. Assim, existem falhas graves nos dados relativos aos traumatismos em todo o mundo, situação que se agrava em África. 11. Existem diferenças regionais no perfil dos traumatismos e na violência, dependendo da economia prevalecente, bem como de factores políticos, sócio-culturais e históricos específicos de cada país ou região. Por exemplo, no ano 2000, na Região Africana, estima-se que 725.000 pessoas tenham morrido devido aos traumatismos, representando 7% de todos os óbitos na Região e 15% do total dos óbitos no mundo devido aos traumatismos. Destes, as causas principais foram os acidentes de trânsito, guerras e violência interpessoal, responsáveis por 59% do total (Figura 1). Figura 1: Causas de mortalidade relacionada com traumatismos, África, 2000 Incêndio 5% Auto-infligidos 4% Quedas 2% Acidentes rodoviários 22% Envenenamento 5% Afogamento 11% Outros (acidentais) 14% Violência Interpessoal 15% Guerras 22% Fonte: Adaptado de: M. Peden et al, The injury chartbook: a graphical overview of the global burden on injuries, Organização Mundial de Saúde, Genebra, 2002. 3 Relatório sobre a violência e a saúde no mundo, OMS, Genebra, 2002.

Página 3 12. Os acidentes rodoviários estão a tornar-se uma causa comum e cada vez maior de traumatismos acidentais em todo o mundo. Com mais de um milhão de pessoas mortas e mais de 20 milhões com traumatismos ou incapacidades por ano, os acidentes rodoviários constituem a nona maior causa de óbito e de anos de vida perdidos ajustados às incapacidades no mundo inteiro, calculando-se que, até 2020, se tornem na terceira maior causa de óbito. 13. Durante as três últimas décadas, a taxa de mortalidade por traumatismos causados por acidentes rodoviários transformou-se na mais elevada do mundo (Ver Figura 2). Os grupos mais afectados são os pedestres, passageiros e ciclistas. Alguns dos factores contributivos são a sinalização inadequada, consumo excessivo de álcool, excesso de velocidade, não utilização dos cintos de segurança (em adultos e crianças), falta de segurança dos veículos, má manutenção dos veículos e das estradas, formação insuficiente dos motoristas e não cumprimento do código da estrada. Estima-se que, na Região Africana, o custo financeiro dos traumatismos devido aos acidentes rodoviários seja 1% do PIB, ou seja, 3.700 milhões de dólares EUA 4. Figura 2: Mortes por acidentes rodoviários/10.000 veículos/ano, em países seleccionados, 1985-1986 Mortes/10.000 veículos 200 180 160 140 120 100 80 60 40 20 0 Gana Ruanda Lesoto Zimbabwe Chile Kuwait Fonte: Adaptado de: P. Brass et al, Injury prevention: An international perspective; epidemiology, surveillance and policy, New York, Oxford University Press, 1998. 14. Outros tipos de traumatismos acidentais na Região incluem afogamento, queimaduras, envenenamento e quedas. O afogamento é a segunda maior causa de morte acidental, com percentagens geralmente mais elevadas nas áreas rurais, logo após os traumatismos por acidentes rodoviários. A Região Africana tem também a taxa de mortalidade mais elevada por queimaduras pelo fogo, com a maior parte destas a ocorrerem em crianças dos 0 aos 14 anos. Os envenenamentos e as quedas resultam em morte e incapacidade, especialmente em crianças dos 0 aos 4 anos. 4 Jacobs GD et al, Estimating global road fatalities, London, Transport Research Laboratory, 2000.

Página 4 15. A violência foi responsável por cerca de 1,6 milhões de mortes no mundo inteiro, no ano 2000. Em África, 37% dos óbitos por traumatismos foram causados por violência, fazendo com que a taxa de mortalidade por violência em África (60,9 por 100.000 pessoas) fosse o dobro da taxa mundial, sendo substancialmente mais elevada do que na América Latina e na Europa de Leste. 16. Em África, no ano 2000, estimava-se em 116.000 o número de óbitos por violência interpessoal, 27.000 por violência auto-infligida (suicídio) e 167.000 por violência colectiva. Quase metade destes óbitos ocorreram entre jovens do sexo masculino no grupo etário economicamente activo dos 15 aos 44 anos. As consequências não mortais da violência colectiva são susceptíveis de serem substanciais, dado que o rácio de feridos/mortos entre o pessoal militar numa ampla gama de conflitos varia entre 1,9 e 13. 17. A violência conjugal ocorre em todas as sociedades e o continente africano não é excepção. As estatísticas das Nações Unidas demonstram que um terço de todas as mulheres são vítimas da violência do seu parceiro íntimo ao longo da sua vida. Este tipo de violência aumenta a ocorrência de traumatismos físicos, perturbações mentais, abuso de substâncias psicoactivas e tentativas de suicídio. As raparigas e mulheres estão também sujeitas a elevados níveis de violência sexual, incluindo violação, casamentos precoces e tráfico de crianças. Sabe-se que a mutilação genital feminina é prevalecente em 27 dos 46 Estados- Membros da Região. 18. A violência conjugal e os maus tratos das crianças ocorrem frequentemente nas mesmas famílias e estão associados a factores de risco individuais, relacionais, comunitários e sociais semelhantes. Mais ainda, as crianças que crescem no seio de famílias violentas são mais propensas a envolverem-se em violência durante a juventude. 19. A violência na juventude, que envolve principalmente os jovens do sexo masculino com idades compreendidas entre os 10 e os 29 anos, quer como vítimas quer como perpretadores, está na origem das elevadas taxas de homicídio na Região Africana. É ainda uma das principais causas de consumo dos recursos hospitalares; estudos do mundo inteiro revelam que, por cada homicídio, existem 20 a 40 vítimas de violência não-fatal que recebem tratamento hospitalar. Os homicídios devido à violência juvenil estão intimamente relacionados com as desigualdades económicas e a disponibilidade das armas de fogo; as causas subjacentes encontram-se enraizadas na exposição das crianças à violência familiar durante a infância e em cuidados parentais inadequados, bem como à companhia de outros jovens deliquentes e violentos durante a adolescência. 20. A negligência dos mais idosos era anteriormente vista como uma questão de bem-estar social e como um problema de envelhecimento; no entanto, é vista agora como uma forma de violência familiar e transformou-se numa preocupação de saúde pública. 21. Os traumatismos causados pela guerra são responsáveis pelo segundo maior número de óbitos por traumatismos em África. Em 1997, verificaram-se 25 novos conflitos na Região. Uma grande variedade de estudos indicam que a proporção de não combatentes mortos em

Página 5 resultado directo de conflitos, excederia os 50%. Muitos dos que sobrevivem aos traumatismos imediatos, ficam permanentemente incapacitados e sofrem de uma variedade de sequelas psicossociais. 22. A violência colectiva destrói as infra-estruturas e desorganiza os serviços vitais, tais como os cuidados médicos, o comércio e a produção de alimentos, minando assim as estratégias de subsistência e agravando as desigualdades sócio-económicas. As deslocações populacionais forçadas na sequência de conflitos têm consequências graves para os pobres, idosos, doentes e desfavorecidos. 23. A violência colectiva cria condições de insegurança que favorecem a crescente disponibilidade das armas de fogo. É provável que uma proporção substancial dos 262 milhões de armas de fogo que circulam ilegalmente no mundo inteiro se encontre em África. A disponibilidade de armas de fogo está intimamente relacionada com determinadas formas de violência e a consequente mortalidade. Para além disso, a facilidade no acesso a este tipo de armas exerce uma atracção racional sobre todos aqueles que sentem que o Estado não os pode proteger, ou aqueles que vêem nisso uma oportunidade para ganhar a vida de forma violenta. 24. Muitos países africanos têm um elevado número de vítimas devido às minas terrestres e outros tipos de munições não explodidas. A utilização deste tipo de armas num grande número de conflitos deixou como legado traumatismos permanentes, indiscriminados e morte. Por exemplo, em Angola, entre 1998 e 2001, foram notificadas mais de 2.000 pessoas vítimas de explosões de minas terrestres e outros tipos de munições, muitas das quais resultaram em morte ou incapacidades permanentes. As estatísticas recentes para Angola indicam um número constante de cerca de 55 novas vítimas todos os meses. 25. Os suicídios ou tentativas de suicídio são actos de violência contra a própria pessoa. No ano 2000, mais de 800.000 pessoas em todo o mundo cometeram suicídio. Na faixa etária dos 15 aos 44 anos, os traumatismos auto-infligidos são a quarta e a sexta principal causa de óbito e de incapacidade, respectivamente. Os estudos disponíveis mostram diferenças culturais e ambientais relacionadas com o suicídio, sugerindo que este aumenta de acordo com as alterações sociais e económicas. 26. Para todos os traumatismos, o número de mortes que ocorrem na sequência de cada incidente não-fatal é mais elevado em África e noutras regiões em desenvolvimento no mundo do que nas regiões desenvolvidas. Sistemas de cuidados pré-hospitalares e hospitalares pobres e subdesenvolvidos são factores importantes que contribuem para esta taxa de letalidade elevada. Na maioria dos países africanos, as vítimas têm poucas oportunidades de receberem cuidados de emergência no local, ou de serem transportadas de ambulância para um hospital. Muitas vezes os hospitais estão mal equipados (a nível da formação e dos recursos), para lidarem com as necessidades dos doentes traumatizados. 27. Uma das dimensões do problema da violência e dos traumatismos é o pesado e desproporcional fardo dos óbitos e incapacidades dos desfavorecidos na sociedade, bem como os custos para os indivíduos, o sistema de cuidados de saúde e a sociedade em geral. Os traumatismos e a violência são uma preocupação de saúde pública, não apenas porque têm

Página 6 grande impacto nas sociedades, mas também porque a saúde pública pode oferecer soluções para os evitar. Através de uma variedade de medidas vocacionadas para os indivíduos, as famílias e as comunidades, o sector da saúde tem um papel vital a desempenhar nesta área. PROGRAMA DE ACÇÃO 28. O sector da saúde deve promover medidas preventivas com base em dados factuais, melhorar os cuidados pré-hospitalares, hospitalares e os programas de reabilitação, empreender actividades de vigilância. Deverá também mobilizar e apoiar outros sectores no que respeita à advocacia, elaboração de políticas e coordenação. 29. O sector da saúde tem um papel fundamental no aumento da consciencialização dos indivíduos, comunidades, serviços sociais, administrações locais e regionais e doadores, relativamente aos traumatismos e violência como problema de saúde pública e às oportunidades existentes para sua prevenção. 30. Para garantir uma prevenção eficaz dos traumatismos e da violência, é necessária a coordenação dos diversos grupos de indivíduos e organizações envolvidos. Tais esforços devem envolver os indivíduos, comunidades, governos e organizações não-governamentais, encorajar parcerias mais eficientes e de base mais alargada, bem como reforçar o papel da investigação preventiva. PAPÉIS E RESPONSABILIDADES Responsabilidades dos países 31. Entre outros pré-requisitos, a melhoria na saúde requer que a paz se encontre solidamente enraizada. A prevenção e a resolução pacífica dos conflitos é uma oportunidade para atingir os objectivos da saúde para todos e as Metas de Desenvolvimento do Milénio (MDG). Os países devem investir na manutenção da paz e na prevenção ou resolução dos conflitos. 32. Os países devem adoptar e implementar políticas, estratégias e programas que contribuam para esse efeito. 33. Devem ser dados passos concretos para uma maior consciencialização. Devem-se adoptar abordagens intersectoriais (medidas políticas, cumprimento da lei, alterações ambientais, educação) para a formulação e implementação de medidas preventivas e protectoras, incluindo a preparação para situações de emergência e catástrofes, e a utilização de estratégias de promoção da saúde. 34. A prevenção dos traumatismos e incapacidades deve ser a componente-chave da política nacional, devendo esta resultar de um processo de formação de consenso nacional. Esta política necessita de ser coerente e estar em conformidade com os acordos internacionais, tais como a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. A disponibilidade de documentos técnicos a nível mundial (como o Relatório sobre a violência e saúde no mundo), com recomendações claras, irá facilitar o processo. A política deve

Página 7 contemplar disposições com vista à adopção de legislação adequada e respectivo cumprimento. Deverá ser dada atenção especial à segurança rodoviária, relações interpessoais e prevenção de conflitos colectivos. 35. As consequências dos traumatismos podem ser minimizadas pela prestação de primeiros socorros e de cuidados adequados logo após a sua ocorrência. A maioria dos métodos imediatos de cuidados são fáceis de ensinar e não requerem medicamentos ou equipamento especializado. O transporte atempado e em segurança dos traumatizados para um posto de socorros é uma componente-chave na redução das consequências dos traumatismos. Consequentemente, o sistema de cuidados primários de saúde, incluindo os programas de prevenção e reabilitação de base comunitária, pode desempenhar um papel muito importante na prevenção e controlo dos traumatismos. 36. Os ministérios da saúde devem delinear, implementar e avaliar um sistema de informação para a prevenção dos traumatismos e da violência. Os dados gerados devem ser usados para a determinação de prioridades e programas de prevenção a todos os níveis. 37. O sector da saúde deve avaliar e reforçar a capacidade e infra-estruturas para lidar com os traumatismos e a violência, incluindo a vigilância, formação, cuidados hospitalares e préhospitalares, resposta comunitária às emergências e reabilitação. 38. A investigação é necessária para colmatar as lacunas existentes ao nível da informação, identificar as determinantes dos traumatismos e da violência em contextos específicos, bem como avaliar a eficácia das intervenções curativas e preventivas. 39. Os países devem reforçar ou estabelecer parcerias, envolvendo as agências governamentais, bem como as organizações de carácter bilateral e multilateral, sociedade civil e sector privado. Estas parcerias devem ser usadas com vista a aumentar a atenção para a natureza prioritária da prevenção da violência e dos traumatismos e a coordenar as actividades para sua prevenção e controlo. Responsabilidades da OMS e doutros parceiros de carácter multilateral e bilateral 40. Tais responsabilidades incluem o seguinte: a) elaborar orientações e instrumentos para advocacia, sistemas de informação, cuidados pré-hospitalares e hospitalares, sistemas de reabilitação, e preparação e gestão de situações de emergência. b) apoiar os países na mobilização de recursos para a prevenção primária dos traumatismos e da violência, e estabelecer parcerias e redes de ligação. c) apoiar a investigação nacional e regional sobre as causas, factores de risco e consequências dos traumatismos e da violência; utilizar os resultados da investigação para a promoção de estratégias de prevenção.

Página 8 d) documentar e divulgar exemplos das melhores práticas, ou seja, das intervenções cuja eficácia foi comprovada por meio de avaliação científica do seu impacto no problema visado. e) prestar apoio aos Estados-Membros na implementação e monitorização de sistemas de informação apropriados. MONITORIZAÇÃO E AVALIAÇÃO 41. O que se segue será utilizado para facilitar a monitorização dos progressos realizados na prevenção e controlo dos traumatismos e da violência: a) elaboração e aprovação de uma política abrangente pelos países e ministérios da saúde; b) aprovação de legislação e criação de regulamentação para melhorar a segurança e proteger os indivíduos e as comunidades contra os factores de risco evidentes dos traumatismos; c) estabelecimento de um sistema de vigilância para recolha, análise e difusão de dados; d) incorporação dos aspectos de prevenção e controlo dos traumatismos e violência, incluindo a preparação para situações de emergência, em todos os programas de desenvolvimento dos sistemas sanitários (recursos humanos, infra-estruturas, afectação de recursos, investigação); e) estabelecimento de mecanismos formais de coordenação e colaboração entre os diferentes intervenientes e parceiros, incluindo as comunidades. CONCLUSÃO 42. Apesar das diferenças existentes na informação e no conhecimento, a experiência adquirida até à data ensinou-nos algumas lições importantes sobre a prevenção dos traumatismos e da violência, bem como sobre como mitigar as suas consequências. Os traumatismos e a violência são frequentemente previsíveis e evitáveis. O compromisso político para fazer face aos traumatismos e à violência é vital em termos de saúde pública. Embora muito possa ser feito pelas organizações de base, indivíduos e instituições, o sucesso dos esforços de saúde pública dependem em última instância do compromisso político. Isto é tão fundamental ao nível nacional, onde são tomadas as decisões políticas, legislativas e de financiamento geral, como ao nível provincial, distrital e municipal, onde reside a responsabilidade quotidiana pela gestão das políticas e dos programas. 43. Convida-se o Comité Regional a analisar este documento e a aprovar o programa de acção nele proposto.