AGRENER GD º Congresso sobre Geração Distribuída e Energia no Meio Rural 11 a 13 de novembro de 2015 Universidade de São Paulo USP São Paulo

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Transcrição:

ANÁLISE DA DISTRIBUICAO ESPACIAL DA MALHA DUTOVIÁRIA PARA GÁS NATURAL E DO BIOGÁS E DO BIOMETANO COMO ALTERNATIVAS ENERGÉTICAS PARA AGRONEGÓCIO DO BRASIL Leidiane Mariani 1,2, Carla Kazue Nakao Cavaliero 1, Rodrigo Regis de Almeida Resumo Galvão 2, Jéssica Yuki Lima Mito 2 1 Departamento de Energia, Faculdade de Engenharia Mecânica, Universidade Estadual de Campinas 2 Centro Internacional de Energias Renováveis - Biogás (leidiane.mariani@gmail.com) Apesar das vantagens tecnológicas e ambientais do gás natural, sua oferta está concentrada em regiões próximas ao litoral, consequência das fontes para produção, da concentração urbana e industrial e da localização da rede dutoviária brasileira, os gasodutos. Ao mesmo tempo, no interior do Brasil, com o crescimento do agronegócio, a demanda por energia térmica e combustíveis veiculares vêm aumentando. Para a geração de energia térmica, esse setor utiliza lenha, cavaco, briquete ou GLP, opções que demandam mais mão de obra e logística para sua utilização. No caso de combustíveis veiculares, a logística de entrega de insumos e de transporte da produção para beneficiamento depende de combustíveis fósseis trazidos das regiões litorâneas. Porém, segundo estudos da EPE, o interior do Brasil possui grande potencial de produção de biogás e biometano, a partir da biodigestão de resíduos das atividades agropecuárias. O biometano é similar ao gás natural e poderia ser uma opção de combustível produzido no interior do país para atender a demanda local, agregando valor à agropecuária brasileira. Nesse estudo, será analisada de forma conjunta distribuição espacial da rede dutoviária para gás natural, do agronegócio e do potencial de produção de biogás e biometano no Brasil. Com isso, pretende-se demonstrar a importância e o potencial dessa fonte energética para o setor agropecuário brasileiro. Palavras-chave: gás natural, biometano, malha dutoviária, agropecuária. Abstract Despite the technological and environmental advantages of natural gas, its offer is concentrated in areas near the coast, as consequence of the sources for production, the urban

and industrial concentration and the Brazilian pipeline location. At the same time, in the countryside of Brazil, with the growth of agribusiness, the demand for thermal energy and vehicle fuel are increasing. For generating thermal energy, the agribusiness uses wood, chips, briquettes or LPG, options that require more manpower and logistics to use. In the case of vehicle fuels, input delivery logistics and transport from production to processing depends on fossil fuels brought from the coastal regions. However, according to studies of EPE, the countryside of Brazil has great potential for biogas and biomethane produced by the digestion of waste from agricultural activities. The biomethane is similar to natural gas and could be a fuel option produced within the country to meet local demand, adding value to Brazilian agriculture. In this study, will be analyzed jointly spatial distribution of the natural gas pipeline, agribusiness and biogas and biomethane potential production in Brazil. The aim is to demonstrate the importance and potential of this energy source for the Brazilian agricultural. Keywords: natural gas, biomethane; pipeline; agribusiness. 1. GÁS NATURAL E A MALHA DUTOVIÁRIA DO BRASIL Apesar das vantagens energéticas, ambientais e econômicas do uso do gás natural frente ao uso de combustíveis fósseis como gasolina, diesel e óleo combustível, nem todas as regiões do Brasil tem esse gás disponível. Os gasodutos estão em sua maioria na região litorânea, sendo exceção o gasoduto que transporta o gás natural importado da Bolívia, que passa por cidades dos estados de Mato Grosso e São Paulo. A localização dos gasodutos de transporte do país pode ser vista na Figura 1. Segundo o Plano Nacional de Expansão da Malha Dutoviária do Brasil 2022 - PEMAT da Empresa de Pesquisa Energética - EPE (2014a), a indústria de gás natural se caracteriza fortemente como uma indústria de rede, na qual ofertas e demandas devem ser conectadas por uma rede física no caso, a malha de gasodutos. Por isso, o investimento na expansão da rede depende da comprovação da viabilidade por uma análise do volume a ser movimentado e dos possíveis usuários, além de uma comparação com o preço dos combustíveis substitutos. Nesse sentido, segundo o PEMAT (EPE, 2014a), o crescimento da malha brasileira nos últimos anos vem sendo quase nulo (Figura 2), havendo a previsão de ampliação de apenas 11 km até 2022 referente ao Gasoduto Itaboraí/RJ Guapimirim/RJ. Isso mostra que não há previsão para que o GN canalizado chegue ao interior do país.

Figura 1. Infraestrutura de gasodutos de transporte no Brasil - 2012. Fonte: EPE (2014a) Figura 2. Histórico brasileiro da extensão de gasodutos de transporte. Fonte: EPE (2014a) 2. AGRONEGÓCIO DO BRASIL Segundo Barros et al. (2014), o setor do agronegócio inclui agricultura empresarial ou comercial, pequena agricultura, agricultura familiar, etc., e os demais agentes das cadeias produtivas onde se inserem. Assim, a agropecuária e a agroindústria estão incluídas no agronegócio quando se analisam indicadores econômicos, porém, em estudos do setor energético, a agropecuária é analisada separadamente da agroindústria. Dessa forma, nesse artigo, os dados macroeconômicos se referem ao agronegócio e os dados energéticos à agropecuária e à indústria de alimentos e bebidas. a. Distribuição do agronegócio no território Analisando o mapa de gasodutos no Brasil, observa-se que a maior parte das regiões não abastecidas por GN são as que o agronegócio prevalece como atividade econômica. Isso pode ser observado nos mapas da Figura 3 com a produção e industrialização de laticínios, aves e papel e da Figura 4 com a produção de milho, soja e mandioca. Figura 3. Concentração da produção e industrialização de leite, aves e papel. Fonte: IBGE (2009)

Figura 4. Produção brasileira total de milho, soja e mandioca Safra 2013. Fonte: CONAB (2013) b. Consumo de energia do setor O setor do agronegócio tem participação importante na economia brasileira e vem apresentando um crescimento considerável. Esse desempenho também se reflete no seu consumo de energia primária que, em 2014, foi de 3,6% na agropecuária e de 25,6% na indústria de alimentos. No caso do consumo total de energia do Brasil em 2014 os dois setores consumiram juntos 12,6%. A evolução do consumo total de energia da agropecuária e da indústria de alimentos por fonte é apresentada na Figura 5 e na Figura 6, respectivamente. No gráfico da agropecuária se observa que, partindo-se de um consumo de mais de 90% de lenha em 1970, ocorreu uma redução quase constante entre 1970 e 2000, e, após isso, um pequeno aumento do consumo chegando a 25% em 2014. Essa redução foi acompanhada pelo aumento do consumo de eletricidade e, principalmente, de óleo diesel, o que deve ter ocorrido pela melhoria de acesso e de custos dessas fontes de energia mais eficientes e práticas que a lenha. Segundo dados da EPE (2015), não há consumo de GN na agropecuária.

1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 2009 2012 1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 2009 2012 AGRENER GD 2015 100% 100% 80% 60% 40% 20% 0% 0% LENHA ELETRICIDADE ÓLEO DIESEL OUTRAS GÁS NATURAL BAGAÇO DE CANA ELETRICIDADE LENHA ÓLEO COMBUSTÍVEL OUTRAS Figura 5. Consumo de energia da agropecuária Figura 6. Consumo de energia da indústria de em 2014. Fonte: EPE (2015) alimentos e bebidas, 2014. Fonte: EPE (2015) No caso da indústria de alimentos e bebidas, desconsiderando-se o bagaço de cana, a lenha é uma das fontes de energia mais importantes. Em 1970 representava 30% do consumo total do setor, tendo passado por altos e baixos, até chegar a uma participação de 9% em 2014. Nos últimos anos, o consumo de eletricidade quase se igualou ao de lenha e ocorreu um pequeno aumento do consumo de gás natural e de GLP nessa indústria. c. Importância da lenha no agronegócio A lenha tem um papel importante no suprimento energético do agronegócio no Brasil e, segundo Brito (2007), apesar da falta de dados, o maior uso é para secagem de grãos. Nesse sentido, analisando os dados históricos de consumo final de lenha do Brasil em valores absolutos presentes na Tabela 1, é possível observar que o consumo final total de lenha do Brasil teve um aumento pouco significativo em relação ao aumento do consumo final de energia, diferentemente da agropecuária e da indústria de alimentos e bebidas, que tiveram uma taxa de crescimento no consumo final de lenha muito próximo ao de energia. Com isso, pode-se aferir que como um todo, a taxa de crescimento do consumo de lenha total foi reduzida no Brasil, puxada por alguns setores que tiveram melhoria de acesso e redução de preços do GLP e da eletricidade, como o setor residencial. Ao mesmo tempo, setores como o agropecuário e a indústria de alimentos e bebidas mantiveram taxas de crescimento do consumo de lenha altas, refletindo a provável maior viabilidade e acessibilidade a essa fonte de energia. Da mesma forma, dados do estudo Demanda de Energia 2050 da EPE (2014b) da Figura 7, mostram que a lenha continuará tendo importância na indústria de alimentos e bebidas, mantendo uma participação próxima aos 9% até 2050.

Tabela 1. Evolução do consumo de lenha da agropecuária, indústria de alimentos e bebidas e indústria em tep (tonelada equivalente de petróleo). Fonte: EPE (2015). Ano Agropecuária Consumo final - Lenha Indústria de Industrial alimentos TOTAL Agropecuária e bebidas Consumo final de energia por setor Indústria de Industrial alimentos TOTAL 2005 2.178 1.813 5.633 16.119 8.361 17.926 72.806 195.491 2006 2.244 1.831 5.807 16.414 8.554 20.122 76.030 202.534 2007 2.356 1.885 6.065 16.310 9.067 21.262 81.133 215.197 2008 2.538 1.999 6.538 16.859 9.911 20.694 81.570 226.215 2009 2.411 2.039 6.563 16.583 9.553 21.547 76.189 220.732 2010 2.523 2.267 7.164 17.052 10.029 23.244 85.567 241.194 2011 2.446 2.312 7.358 16.403 9.999 22.992 88.716 245.860 2012 2.421 2.319 7.480 16.470 10.362 24.123 88.697 253.037 2013 2.639 2.273 7.706 16.182 10.632 23.338 88.294 260.218 2014 2.682 2.250 7.785 16.672 11.209 22.209 87.502 265.864 Taxa de crescimento 2,57%a.a. 2,68%a.a. 4,24%a.a. 0,38%a.a. 3,78%a.a. 2,65%a.a. 2,24%a.a. 4,00%a.a. Figura 7. Previsão do consumo final de energia da indústria de alimentos e bebidas, por fonte (%). Fonte: EPE (2014b) No entanto, alguns estudos apontam que os plantios florestais para fins energéticos não estão crescendo na mesma velocidade que a demanda por lenha no agronegócio no país. Para o Estado do Paraná, um estudo desenvolvido por Bell (2012) indica que a produção de florestas com fins energéticos caminha no limite para atender a demanda por lenha dos setores produtivos do estado, exigindo ações de planejamento para garantir que atendam a demanda dos próximos anos. No mapa da Figura 8. Distribuição regional das áreas de reflorestamento com eucalipto e das áreas agrícolas no Paraná. Fonte: Bell (2012)Figura 8, é possível observar os resultados do estudo de Bell (2012), que deixam claro que, além do déficit geral estadual, em 2012 havia regiões específicas no estado com déficit considerável entre oferta e demanda de lenha. Outro estudo realizado por Gonçalves et al. (2011), também estimou a oferta e a demanda de lenha de eucalipto para secagem de grãos no Paraná, chegando a resultados similares aos do estudo de Bell (2012). O mapa com esses resultados é apresentado na Figura 9, onde os municípios em vermelho possuíam déficit de lenha para secagem em 2011. Figura 8. Distribuição regional das áreas de reflorestamento com eucalipto e das áreas agrícolas no Paraná. Fonte: Bell (2012) Figura 9. Estimativa do potencial e/ou disponibilidade de área de eucalipto no Paraná para secagem de produtos agrícolas. Fonte: Gonçalves et al. (2011)

Com os devidos cuidados, é possível extrapolar o caso do Paraná para outros estados com destaque no agronegócio, que dependem bastante da lenha como fonte de energia, e que não possuem tradicionalmente grandes áreas de reflorestamentos, diferentemente do Paraná, caso do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás. d. Análise das fontes energéticas do agronegócio Assim, observa-se a pouca relevância do GN no agronegócio, apesar de suas vantagens técnicas, econômicas e ambientais. Em aplicações que o GN poderia ser utilizado, os consumidores que não o tem à disposição usam diesel, álcool e gasolina, no caso dos transportes; e biomassa florestal, GLP e óleo combustível para geração de energia térmica. Os combustíveis derivados do petróleo, como o diesel, o óleo combustível e a gasolina, não são renováveis e emitem gases de efeito estufa (GEE) e poluentes atmosféricos que causam impactos ambientais e na saúde da população. Além disso, a produção e refino desses combustíveis estão concentradas, semelhante aos gasodutos, nas regiões litorâneas do país, demandando o uso de combustíveis para seu transporte e distribuição no interior do Brasil, o que amplia os impactos dos combustíveis fósseis consumidos no interior do país. A biomassa florestal, outra alternativa ao GN, é uma fonte renovável de energia e, quando proveniente de reflorestamentos ou de resíduos da indústria madeireira, não geram desmatamento nas florestas nativas. Segundo Bell (2012), uma das vantagens desse combustível na secagem de grãos é o baixo custo, além da fácil combustão, baixo teor de cinzas, não exigência de mão de obra qualificada e o baixo teor de enxofre. Apesar desses benefícios, a produção desse combustível demanda que se reservem áreas para plantio e planejamento em relação ao tempo de crescimento das árvores, sendo utilizadas terras com menor custo para sua produção. Porém, muitas vezes as regiões onde a produção de biomassa florestal é viável não coincidem com as que a demandam, gerando necessidade de transporte, ou seja, consumo de combustível, aumento de emissões e aumento de preço. 3. BIOGÁS E BIOMETANO: FONTES DE ENERGIA PARA O AGRONEGÓCIO Uma alternativa complementar aos combustíveis consumidos no agronegócio é o biogás gerado a partir da decomposição anaeróbica de resíduos orgânicos. Por possuir cerca de 60% de metano, pode ser aplicado, em estado bruto, na substituição de lenha, ou como

biometano (gás similar ao GN) após processo de separação seguindo a Resolução 08/2015 da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis - ANP (2015). a. Distribuição espacial do potencial de biogás e biometano no Brasil Resíduos e efluentes gerados no agronegócio tem grande potencial de produção de biogás e biometano, por serem, em grande parte, orgânicos. Isso fica claro no Inventário energético de resíduos rurais publicado pela EPE em 2014, onde é apresentado um mapa com o potencial de produção de biogás dos resíduos da pecuária do Brasil (Figura 10). Apesar de ser um potencial teórico, os dados do mapa possibilitam observar as regiões com maior potencial e que teriam possibilidades de convertê-lo em plantas de produção viáveis. Essas regiões, que poderiam ofertar biogás e biometano, são as com atividades produtivas do agronegócio, que, como discutido anteriormente, demandam cada vez mais energia. Assim, o biogás e o biometano são fontes de energia distribuídas que poderiam ser produzidas e consumidas na mesma região. Ou seja, os gastos do agronegócio com energia seriam mantidos nessas regiões e revertidos para a própria cadeia produtiva. Figura 10. Potencial teórico de produção de biogás de resíduos da pecuária. Fonte: EPE (2014c) b. Vantagens do biogás e do biomentano O biogás e o biomentano são uma alternativa energética com mais benefícios ambientais e sociais que o próprio GN. O uso de resíduos e efluentes como matéria prima do processo reduz o risco de contaminação do solo e da água pelo seu tratamento e disposição incorretos. Além disso, o processo evita que esse material orgânico fique disposto ao ar livre

emitindo metano, gás causador do efeito estufa, livremente para a atmosfera. Outro benefício é a redução de odor e insetos nas áreas de disposição dos resíduos e efluentes, melhorando a qualidade do ambiente do entorno. Há também a possibilidade de redução de custos da atividade produtiva no caso de uso do biogás ou do biometano na propriedade ou fazenda produtora, e redução de emissões de GEE pela substituição de combustíveis fósseis. c. Potencial atual e futuro da produção de biometano É importante destacar que o potencial do biogás no Brasil deve ser considerado em relação à quantidade, além da distribuição espacial. Segundo a EPE (2014c), a partir de dados do IBGE de 2006, o potencial técnico de geração de eletricidade a partir de resíduos da pecuária pela rota de biodigestão, ou seja, produzindo biogás, é de 3.478 MW de capacidade instalada e de produção de biometano de 14.274 mil m³/dia de CH 4. Além disso, mesmo considerando as dificuldades para viabilizar economicamente essa fonte de energia, uma previsão da EPE (2014b) indica que parte do potencial teórico total do país será realizado até 2050 (Figura 11). A perspectiva é que a penetração do biometano combustível em 2030 será de 4% (5,78 milhões m 3 /dia dos 140,81 milhões m 3 /dia de potencial teórico) e, em 2050, de quase 17% (36 milhões m 3 /dia dos 217,52 milhões m 3 /dia de potencial teórico). Figura 11. Projeção da penetração do biometano versus potencial teórico. Fonte: EPE (2014b) 4. CONCLUSÕES Assim, observa-se um potencial de uso do biogás e do biometano como fonte de energia para abastecer a demanda por gás natural no interior do país, principalmente para o agronegócio. Isso seria muito interessante para o setor energético e para o agronegócio, pois

traria segurança à oferta de energia. Além disso, a possibilidade de gerar e consumir a energia localmente traz vantagens ambientais e de desenvolvimento econômico e social, tornando o biogás e o biometano alternativas energéticas sustentáveis. É importante destacar que a lenha não deixará de ser um combustível essencial para o agronegócio nos próximos anos e, mesmo após a viabilização de outros combustíveis nesse setor, continuará sendo utilizada. Ou seja, será importante a integração entre as fontes de energia e o planejamento para serem utilizadas de forma sustentável e complementar. Além disso, serão necessários mecanismos de incentivo ao desenvolvimento e uso dessa fonte de energia, individualmente ou de forma integrada, garantindo que chegue aos consumidores. Nesse sentido, o projeto Florestas Energéticas em desenvolvimento pelo CIBiogas (2015), analisa a viabilidade de produção de florestas energéticas de eucalipto de forma integrada à produção de biogás a partir de dejetos de suínos. O biofertilizante produzido pelo biodigestor fertiliza o solo para plantio da floresta e a lenha produzida é utilizada complementarmente ao biogás nas propriedades rurais e agroindústrias. Propostas como essas serão muito importantes para garantir o atendimento da demanda energética do agronegócio brasileiro, ou seja, melhor planejamento da produção de lenha e busca por fontes alternativas e sustentáveis como o biogás e o biometano. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANP. Resolução ANP No 8, de 30.1.2015. Brasília: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 02 de fev., 2015. BARROS, G. S. DE C.; SILVA, A. F.; FACHINELLO, A. L. PIB DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO - Comentários metodológicos. CEPEA ESALQ/USP, 2014. BELL, R. A. DE O. Demanda de lenha para secagem de grãos no Estado do Paraná, 2012. Universidade Federal do Paraná. BRITO, J. O. Uso Energético Da Madeira. Estudos Avançados, v. 21, n. 59, p. 185 193, 2007. CIBIOGAS. Relatório anual de atividades 2014. Foz do Iguaçu/PR: CIBiogas, 2015. CONAB. Mapas da Produção Agrícola - PROJETO SIGABRASIL. Disponível em: <http://www.conab.gov.br/conteudos.php?a=1101&t=2>. Acesso em: 11/9/2015.

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