COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO ANIMAL EM ASSENTAMENTOS DA REFORMA AGRÁRIA NO DISTRITO FEDERAL Marcelo Corrêa da Silva 1, Fernanda Paulini 1,2, Sumar Magalhães Ganem 3, Andreza Siani 1, José Robson Bezerra Sereno 1 ( 1 Embrapa Cerrados, BR 020, Km 18, Caixa Postal 08223, 73310-970 Planaltina, DF. e-mail: sereno@cpac.embrapa.br 2 Universidade de Brasília, Campus Universitário Darcy Ribeiro, 70910-900 Brasília, DF, 3 Emater-DF UAPE Cerrados, BR 020, km 18, 73310-970 Planaltina, DF.) Termos para indexação: Produção animal, assentamentos da reforma agrária, comercialização. Introdução Os sistemas de produção animal desenvolvidos em assentamentos do Distrito Federal apresentam diversas carências e dificuldades para a viabilização e inserção de seus produtos no mercado local. Muitas vezes pequenas atividades de produção declinam devido às essas dificuldades. Observa-se que a constante necessidade de venda para atravessadores impossibilita a obtenção de uma margem de lucro adequada, tornando a atividade insustentável. Apesar dos entraves, a agricultura familiar é responsável por 31% da área total dos estabelecimentos rurais, produzindo 38% do valor bruto de produção nacional, representando 77% das pessoas que trabalham na agricultura (SAF, 2006). Nesse contexto, é possível verificar a importância de uma política de estabilização de renda aos produtores, assim como a viabilidade do aumento na especialização da produção familiar e o grau de interação com o mercado, que é o indicativo da sustentabilidade econômica da atividade (Pontes et al., 2007). Segundo Wilkinson (1999) o futuro dos produtores agrícolas depende da capacidade de criar novas formas organizacionais para alcançar uma articulação dinâmica com os mercados.
Este trabalho teve como objetivo avaliar a interação da produção animal desenvolvida em dois assentamentos de reforma agrária do Distrito Federal com o mercado local. Material e métodos Para investigar o potencial de produção animal e sua a interação com o mercado para a comercialização dos produtos aplicaram-se questionários semi-estruturados a 32 famílias cadastradas na Emater DF, nos meses de março e abril de 2008. O assentamento Três Conquistas, localizado à margem direita da rodovia DF 130, próximo ao quilômetro 40, na região administrativa do Paranoá, criado em 1996 com a extensão 1002 hectares e 65 famílias residentes, sendo a maior parte delas proveniente do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) que se encontravam acampada em terras alheias. O outro núcleo visitado, denominado Fazenda Larga, está localizado na região administrativa do Pipiripau criado em 2003 com 225 hectares onde atualmente residem 85 famílias, inicialmente compostas por carroceiros transferidos após o local que residiam ser transformado em reserva ecológica. Os dados coletados foram processados em planilha eletrônica Excel, considerando apenas as entrevistas realizadas dentro das propriedades onde as instalações e animais foram visualizados. Ainda utilizando-se este software realizaram-se as análises estatísticas descritivas. Resultados e Discussão Durante o processo da modernização da agricultura houve uma desarticulação gradativa do pequeno produtor com o setor agrícola, tornando a geração de renda através da agricultura cada vez mais difícil. O processo acarretou a substituição das atividades praticadas de uma grande parcela do meio agrícola e contribuiu para o empobrecimento dos pequenos agricultores e o êxodo rural (Caporal, 2003). Isso justifica o fato das atividades agrícolas praticadas dentro dos assentamentos não serem suficientes, na maioria das vezes, para garantir renda digna aos moradores. Nesse contexto, os resultados apontaram que 47% dos entrevistados praticavam alguma
atividade laboral fora do assentamento para auxiliar na renda familiar, sendo que 44% vivem exclusivamente das atividades desenvolvidas na propriedade e apenas 9% dos entrevistados não sabiam responder essa questão. Observou-se que todos os entrevistados criavam alguma espécie animal, entre elas podese citar: bovinos, suínos, ovinos, patos, entre outros, sendo a produção de galinhas a principal delas. Durante o ciclo de produção, devido às baixas condições de capital e manejo inadequado, os produtores consomem e vendem os animais, entretanto, não conseguem número suficiente de animais para viabilizar a criação. 78% dos entrevistados adquirem animais para reposição fora dos assentamentos, destes, 59% efetuam a compra em propriedades vizinhas, sendo 16% no mercado (feiras agropecuárias, no mercado local e/ou em propriedades vizinhas) e 3% não souberam responder a esta questão. Apesar do exposto, a venda de animais é praticada apenas por 63% dos entrevistados, o que corresponde a 20 famílias. Os assentados não comercializam seus produtos para o mercado local, sendo esta praticada em suas próprias propriedades (Figura 1). 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Na Propriedade Em fazendas vizinhas Em sua propriedade e fazendas vizinhas No mercado ou para mercado Figura 1. Pontos de venda dos animais criados nos assentamentos Três Conquistas e Fazenda Larga.
Observou-se que a forma de comercialização se dá de maneira informal, nenhum produtor alegou vender animais ou produtos de origem animal com contrato ou destino certo da produção. É importante ressaltar que essas dificuldades existem por inúmeros motivos. Um fator crucial observado nas entrevistas é que a maioria das pesquisas e tecnologias está direcionada a um público diferente do setor de produção familiar. Caporal (2003) aponta que a pobreza e exclusão dos trabalhadores rurais é resultado parcial do processo de modernização da agricultura, no qual a tecnologia não se tornou acessível aos pequenos produtores. A maneira de estimar o preço dos produtos vendidos demonstra falta de articulação desses produtores com o mercado, inclusive conhecimento técnico para formação do preço com foco no mercado e outros. Do total de criadores que comercializam animais, 50% baseiam seu preço em vizinhos, amigos e nos compradores, 20% apenas nos compradores, 10% em vizinhos e amigos, 10% no preço praticado na cidade, 5% em criadores referência e 5% na oferta e preço da cidade. Quanto à forma de pagamento praticada pelos produtos provenientes dos assentados, 60% declarou receber sempre em dinheiro e 40% na troca por outros produtos. Caporal & Costabeber (2000) relatam a necessidade de novas práticas de comercialização que respeitem os diferentes estilos de vida. O modelo de produção familiar, ao adotar técnicas diferentes das convencionais, agrega valor ao seu produto e passa a ser reconhecido como um setor produtor de alimentos nobres. Portanto, alternativas que exploram a agregação de valor, diferente daquelas que visam quantidade da produção, podem ser estratégicas para a agricultura familiar. Wilkinson (1999) cita que o início do processamento das matérias primas dentro da propriedade representaria uma grande fase de transição para o agricultor familiar. Do total de entrevistados 88% não comercializam produtos processados de origem animal, embora 9,1% façam algum tipo de processamento. Meireles (2004) considera fundamental a formulação e execução de políticas públicas que apóiem e consolidem redes solidárias de produção e circulação dos produtos. Dos produtores que praticam a venda de animais, somente 15% comercializam produtos de origem animal.
Apesar das dificuldades com o escoamento dos produtos, 75% dos entrevistados declararam ser favorável à produção animal como alternativa de renda familiar e apenas 12,5% não concordam por acreditar que o risco econômico da atividade é elevado. Conclusão Observa-se que os criadores não estão articulados com o mercado local, vendendo seus produtos para atravessadores sem agregar valor aos produtos de origem animal. Apesar das dificuldades observadas, muitas famílias ainda persistem com essa prática acreditando na viabilidade da atividade em assentamentos de reforma agrária. Faz-se necessário realizar alguns ajustes nos sistemas de produção, especialmente na organização social com vistas à maior interação com o mercado. Isto pode ser um caminho para melhorar a qualidade de vida dos assentados e viabilizar economicamente os assentamentos. Referências bibliográficas CAPORAL, F. R. Superando a Revolução Verde: A transição agroecológica no estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Lavras, 2003. Disponível em: <http://www.agroecologia.uema.br/publicacoes/superando.pdf>. Acesso em 30 de maio de 2008. CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A. Agroecologia e desenvolvimento rural sustentável: perspectivas para uma nova Extensão Rural. Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável, v.1, p.06, 2000. MEIRELES, L. Soberania alimentar, agroecologia e mercados locais. Rio de Janeiro: Revista Agriculturas, v. 1, n. 0, set. 2004. p. 11-14 PONTES, F.S.T.; MARACAJÁ, P. B.; RODRIGUES, F. E.; PONTES FILHO, F. F.; PONTES, F. M. Tipificação da agricultura familiar no município de Icapuí-CE. Revista Caatinga, v.20, n.4, p123.-131, 2007.
SAF. Secretaria da Agricultura Familiar. Disponível em: <http://www.mda.gov.br/saf>. Acesso em 01 de junho de 2008. WILKINSON, J. Cadeias Produtivas para a Agricultura Familiar. Revista de Administração da UFLA, 1999.