ESTUDO DAS TEMPESTADES ELÉTRICAS DE GRANDE IMPACTO SOBRE O ESTADO DE SÃO PAULO: VERÃO DE 2001 Rosangela Barreto Biasi Gin ffergin@cci.fei.br Departamento de Física Centro Universitário_UNIFEI, Av. HumbertoC.ªBranco, 3972, São Bernardo do Campo, São Paulo CEP: 09.850-901 Tel (11) 4109.0200 R(225) FAX.: (11) 4109.5994 Cesar A. Assis Beneti beneti@simepar.br Instituto Tecnológico SIMEPAR SIMEPAR - Caixa Postal 19100 - Curitiba PR CEP 81531-990 Tel (41) 366.1133 (r. 2205) Fax (41) 366.2122 ABSTRACT During the summer of 2001, several convective storms had strong impacts on the population of Sao Paulo State. High density of lightning discharges (more than 0,03 strokes/km 2 /30minutes) and stroke intensity of more than 60kA were observed. This study used information from SIMEPAR s Lightning Positioning and Tracking System (LPATS). More than 81.000 lightning strokes with high rainfall rates were detected during this period. Space and time evolution of several convective systems were analysed using a spatial resolution of 30km x 30km and temporal resolution of 30 minutes. This article presents the results of the analysis made for the activity, density, polarity and mean current intensity of strokes with negative polarity. 1. INTRODUÇÃO O estudo da atividade de descargas elétricas atmosféricas associadas às condições meteorológicas têm sido de grande relevância para o setor elétrico, órgãos públicos e privados e a comunidade em geral. Estes estudos visam identificar parâmetros que possam ser utilizados no monitoramento estratégico de forma a otimizar o gerenciamento dos recursos hídricos, distribuição de energia elétrica entre outras atividades. A atividade e a localização das vítimas devido a ocorrência de descargas atmosféricas tem mudado substancialmente nos últimos cem anos. Cada vez mais pessoas são atingidas direta ou indiretamente por descargas atmosféricas. No passado o maior impacto das Descargas Atmosféricas era sobre as regiões rurais. Entretanto, recentes estudos mostram que estes impactos tem se tornado mais ativos em regiões urbanas, mais especificamente em áreas de recreação como parques, lagos e praia. Só nos Estados Unidos e na França cerca de 100 pessoas são atingidas por descargas atmosféricas por ano sendo 10% das vítimas fatais (Holle e Cooper, 2000; Gourbiere, 1999). Das vítimas atingidas cerca de 46% encontravam-se em locais descampados (Purvis et al., 1997). Somente em São Paulo, mais de 20 pessoas foram atingidas por Descargas Atmosféricas durante o verão de 2001. Entre os meses de Janeiro e Fevereiro houve registro de 10 mortes, 5 pessoas feridas além períodos com chuva intensa causando 2 mortes e 110 famílias desabrigadas (artigos da Folha de São Paulo). O clima quente e úmido observado neste período do ano favoreceu a ocorrência de pancadas de chuva no período da tarde e ao anoitecer, causando diversos transtornos, principalmente aos grandes centros urbanos. Em Janeiro sete frentes frias de fraca intensidade atingiram o Sudeste do País deslocando-se rapidamente para o oceano. Apenas um único episódio de Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) foi observado no início de Janeiro, organizando faixa de nebulosidade e chuvas isoladas. O presente estudo apresenta algumas características das descargas atmosféricas que ocorreram em dias de grande impacto para Estado de São Paulo durante o verão de 2001. Analisou-se a polaridade, densidade, atividade e intensidade de corrente média das descargas elétricas. Os dias 31 de Janeiro e 04 de Fevereiro de 2001 apresentaram características de densidade de descargas e intensidade de corrente bastante peculiares.
2. INSTRUMENTAÇÃO E METODOLOGIA UTILIZADA Os dados de descargas atmosféricas são obtidos de um sistema de detecção continua de descargas elétricas denominado Lightning Positioning and Tracking Systems (LPATS). O sistema detecta as descargas de retorno dos relâmpagos do tipo nuvem-solo e identifica a localização, o tempo de ocorrência, a polaridade e estima a intensidade de corrente. Utilizou-se neste estudo os dados do sistema LPATS do Sistema Meteorológico do Paraná (SIMEPAR). Neste período o sistema identificava as descargas obtidas através de 8 estações detectoras distribuídas pelo estado do Paraná e São Paulo apresentando eficiência de detecção em torno de 60-70% para a região em estudo. A Figura 1 ilustra a localização dos sensores do sistema LPATS, utilizados para monitoramento de descargas no sudeste do Brasil. Figura 1 Ilustração da região em estudo e a localização dos sensores utilizados para monitoramento no sudeste do Brasil. Os dados de descargas elétricas foram processados em intervalos de 30 minutos com resolução espacial de 30km x 30 km para os eventos ocorridos no Estado de São Paulo. As descargas elétricas foram classificadas segundo sua polaridade, atividade, densidade e intensidade de corrente média. Foram aplicados filtros aos dados de descargas elétricas de forma a minimizar possíveis contaminações de descargas intra-nuvem e distorções causadas por efeito de propagação da onda eletromagnética. 3. RESULTADOS E DISCUSSÕES Cerca de 450.000 descargas atmosféricas foram registradas no Estado de São Paulo durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 2001. Sete dias com aproximadamente 81.000 descargas geraram grandes danos a população. A Tabela 1 identifica os principais dias de grande impacto de descargas atmosféricas sobre a população do Estado de São Paulo durante o verão de 2001. Nesta tabela identifica-se os principais dias de descargas atmosféricas com eventos de pessoas atingidas, o número total de descargas atmosféricas registradas no Estado e o número de pessoas atingidas. Deve-se esclarecer que o número de pessoas atingidas nos eventos pode ser superior ao ilustrado na tabela abaixo, visto que este é o número mínimo registrado. A maior parte das vítimas apresentavam-se em locais descampados como parques, lagos e praia. Todas vítimas foram socorridas sendo que algumas não resistiram ao tratamento clínico. Dois dos principais dias apresentaram características diferenciadas dos demais. O dia 31 de Janeiro apresentou a maior atividade de descargas atmosféricas registradas sobre o Estado de São Paulo, cerca de 22.000 descargas, sendo as descargas predominantemente negativas (93%). A intensidade de corrente média das descargas negativas durante todo o dia é de aproximadamente 37kA entretanto, para o período do evento, as descargas atingiram intensidade de corrente média de descargas negativa de aproximadamente 60 ka. No dia 04 de Fevereiro foram registrados cerca de 6.500 descargas sendo também predominantemente negativa (95%) entretanto este dia apresentou o maior índice de acidentes causados por descargas atmosféricas em regiões diferenciadas. Na Região de Mauá 2 pessoas foram atingidas sendo 1 fatal. Em Ubatuba 1 pessoa foi atingida fatalmente e em Monteiro Lobato fortes chuvas causaram 2 vítimas fatais. A intensidade de corrente média das descargas negativas é de
aproximadamente 36 ka durante todo o dia sendo que para o período do evento a intensidade de corrente média atingiu cerca de 40kA. A Figura 2 mostra a distribuição temporal das descargas atmosféricas para os dois dias. A distribuição temporal do dia 31 de Janeiro e do dia 04 de Fevereiro apresenta máxima atividade de descargas em torno das 18:00 e 20:00 hora local, respectivamente. O pico de atividade das descargas elétricas foram de aproximadamente 4000 descargas/hora e 1200 descargas/hora respectivamente. TABELA 1 - Principais Dias de ocorrência de Descargas Atmosféricas com vítimas no Estado de São Paulo durante o Verão de 2001. Data No. Total de Descargas Atmosféricas pessoas feridas No. registrado de pessoas atingidas 14/01 6.000 1 2 25/01 16.700 1 0 27/01 15.600 2 0 31/01 22.000 1 1 04/02 6.500 2 1 14/02 7.600 2 0 24/02 6.500 1 1 Total 80.900 10 5 mortes Distribuição Temporal das Descargas Atmosféricas 31/01/01 04/02/01 No. de Descargas Atmosféricas 4000 3000 2000 1000 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 hora local Figura 2 Distribuição temporal das descargas atmosféricas registradas nos eventos 31 de Janeiro (curva azul) e 04 de Fevereiro(curva Rosa) de 2001. A Figura 3 mostra imagem do satélite GOES-8 que ilustra as condições sinóticas do período em estudo. Uma frente fria atingiu o sul do Pais no dia 28 de Janeiro deslocando-se para o sudeste até o dia 01 de fevereiro. No dia 03 de Fevereiro uma nova frente atingiu o interior do Rio Grande do Sul e intensificando-se no litoral de São Paulo. Com a ocorrência de uma ciclogênese o sistema permaneceu semi-estacionário entre os dias 4 e 5 deslocando-se no dia seguinte para o oceano. Os Sistemas convectivos ocorridos próximos ao local dos eventos dos dias 31 de Janeiro e 04 de Fevereiro foram analisados. O dia 31 de Janeiro apresentou um Sistema Convectivo de dimensão aproximada 80km x 100km próximo a região do evento. Neste local 2 pessoas foram atingidas por descargas atmosféricas sendo uma vítima fatal. O sistema apresenta-se estacionário durante 2 horas, provocando chuvas fortes na região e atividade média de 50 descargas/hora Este sistema apresentou alta densidade de descargas de 0,03 descargas/ km 2 /30 minutos e alta intensidade de corrente média de descargas negativas de aproximadamente 60 ka (Figura 4 ).
Figura 3 Imagens do satélite Goes-8 no Infravermelho dos dias 31/01/2001(esquerda) e 04/02/2001(direita) Estudos feitos em sistemas convectivos desta região mostram que a intensidade de corrente média para as descargas atmosféricas negativas é de aproximadamente 40kA (Gin et al., 1999, 2000). Já o Sistema ocorrido em 04 de fevereiro apresentou dimensão média de100 km x 50 km e duração de pelo menos 4 horas. Foram registradas cerca 630 descargas neste período. O sistema deslocou-se no sentido de noroeste para sudeste apresentando atividade de 30 descargas/hora. A densidade de descargas para este Sistema é de 0,02 descargas/ km 2 /30 minutos e intensidade de corrente média de 40kA (Figura 5). Ambos os Sistemas são predominantemente de descargas atmosféricas negativas e apresentam densidade e intensidade de corrente média negativa superiores aos valores encontrados em eventos de alta densidade de descargas observadas nos Estados Unidos. MacGorman e Morgenstern (1998) analisaram cerca de 25 MCS que apresentaram alta densidade de descargas com valores que são de 0,004 descargas negativas/ km 2 / 30 min e 30 ka, respectivamente. Os eventos acima descritos mostram um comportamento similar em relação a densidade de descarga atmosférica. Este fato sugere a densidade como um possível parâmetro de identificação de eventos de grande impacto. Entretanto, deve-se comparar estas características a de outros eventos que ocorram na mesma região de forma a identificar possíveis tendências de comportamento de descargas atmosféricas. AGRADECIMENTOS: Os autores agradecem ao Mcs Carlos Vasconcelos pela disponibilização dos dados, ao SIMEPAR pelos dados fornecidos e ao Centro Universitário UNIFEI por parte da infra-estrutura utilizada. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Gin, R.B.B., Beneti, C.A., Pereira Filho, A. Cloud-to-ground lightning flash density of South-Southeastern of Brazil. IN: INTERNATIONAL LIGHTNING DETECTION CONFERENCE, 2000, Tucson, Arizon. International Lightning Detection Conference, 2000 Gin, R.B.B., Pereira Filho, A.; Beneti, C.A.; Guedes, R.L. Estudo de descargas elétricas atmosféricas em sistemas convectivos organizados: estudo de casos. IN: XIII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, 1999, Minas Gerais. XIII Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 1999 Gourbiere,E. Lightning Injuries to humans in France. IN, INTERNATIONAL CONFERENCE ON ATMOSPHERIC ELECTRICITY, 1999, Guntersville, Alabama, International Conference on Atmospheric Electricity, 1999. Holle, R. L.; Cooper, M How to decrease today s lightning disabilities. IN, INTERNATIONAL CONFERENCE ON ATMOSPHERIC ELECTRICITY, 2000, Guntersville, Alabama, International Conference on Atmospheric Electricity, 2000. MacGorman, D.R. e Morgenstern, C. D. Some characteristics of cloud-to-ground lightning in mesoscale convective systems Journal of Geophysical Research 103(D12):14011-14023, June, 1998. Purvis, J.C.; Barthel, C.D.; Smith, D.J. Lightning in the Southeastern United State 1997
Figura 4. Distribuição espacial da densidade de descargas (esquerda) e intensidade de corrente média das descargas negativas (direita) para o evento do dia 31 de Janeiro de 2001. Figura 5. Distribuição espacial da densidade descargas (esquerda) e intensidade de corrente média das descargas negativas (direita) para o evento do dia 04 de Fevereiro de 2001.