Lembrando Alexandre Fleming e a descoberta da penicilina

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Transcrição:

Lembrando Alexandre Fleming e a descoberta da penicilina João Rui Pita Professor da Faculdade de Farmácia e investigador do CEIS20 Universidade de Coimbra jrpita@ci.uc.pt Em 1928 foi descoberta a penicilina. Em 1929 foram publicados os primeiros resultados científicos da descoberta deste antibiótico. Em meados dos ano 40 a penicilina começou a ser produzida industrialmente. A partir de finais dos anos 40 a penicilina vulgarizou-se como medicamento. Em 11 de Março de 1955 faleceu o autor da famosa descoberta o médico e cientista escocês Alexandre Fleming. Entre 2003 e 2005 comemoraram-se os 75 anos da famosa descoberta e os 50 anos do falecimento do cientista responsável por uma das principais descobertas medicamentosas do século XX e que abriu portas à antibioterapia moderna. As origens de Alexandre Fleming? Alexandre Fleming foi um médico e cientista escocês. Nasceu na Quinta de Lochfield (1881), perto de Darvel, na Escócia, filho do segundo casamento de seu Pai. Tinha ao todo sete irmãos, sendo quatro deles do primeiro matrimónio. Alexandre Fleming ainda era criança quando ficou órfão de Pai mas isso não o impediu de prosseguir os estudos inicialmente perto de sua casa e depois, a partir dos 14 anos, em Londres (onde já se encontravam, alguns dos seus irmãos) onde frequentou com êxito a Escola Politécnica. Trabalhou como administrativo numa companhia de navegação e ainda antes de entrar no curso de medicina na Escola Médica afecta ao Hospital de St.Mary, alistou-se com seu irmão John no exército no London Scottish Regiment numa época em que a a Grã-

Bretanha tinha em braços a guerra com os Boers. Entretanto Fleming ficou herdeiro, juntamente com seus irmãos, de uma pequena fortuna do seu tio John, o que lhe proporcionou ir estudar medicina. Largou o emprego e ingressou em medicina em 1901 e concluiu o curso em 1906. O início da carreira científica Logo de seguida foi trabalhar para o serviço de inoculação do famoso bacteriologista britânico Almroth Wright, trabalho que o marcou para toda a vida. Teve oportunidade de exercer cirurgia mas o gosto pelo trabalho de investigação laboratorial bacteriológico gritou mais alto. Fleming, fascinado pelo problema da bacteriologia, das doenças provocadas pelas bactérias e a questão da imunização contra as doenças infecciosas, abraçou em definitivo a ciência bacteriológica. Fleming integrou durante a Primeira Guerra Mundial uma equipa de cientistas que foi enviada por Almroth Wright para Boulogne-sur-Mer para montar um laboratório de bacteriolgia. Naquela época o combate às infecções de guerra era uma prioridade no âmbito da medicina militar pois havia imensas mortes decorrentes de infecções. As decobertas microbianas de finais do século XIX e os investimentos científicos que estavam a ser feitos no sentido de fazer surgir um medicamento eficaz para tratar ou prevenir várias doenças infecciosas eram uma prioridade científica. Fleming rapidamente foi assumido como uma das maiores autoridades mundiais em ferimentos de guerra. Terminada a guerra e casado, entretanto, com uma enfermeira irlandesa Sara MacElroy (de quem teve um filho), Fleming regressou ao Serviço de Inoculação do Hospital de St. Mary onde prosseguiu os trabalhos

de investigação científica cujo ponto mais alto da investigação pode ser simbolizado com a descoberta da penicilina. A descoberta da penicilina Não queremos dizer que Fleming tenha investido logo de início na pesquisa do famoso antibiótico. Por exemplo, em 1921 Fleming havia descoberto a lisozima; o seu interesse por uma galeria vasta de microorganismos aumentava. Um dia, após uma pausa de férias, Fleming regressou ao trabalho e verificou que umas caixas de Petri que havia deixado inoculados com estafilococos haviam desenvolvido um fungo. Por sua vez este fungo impedia em seu redor a proliferação das bactérias em causa. Fleming questionou-se se aquele fungo seria a razão do impedimento da reprodução das bactérias. E esta questão mostrou-se crucial. Anos mais tarde Fleming reconhecia que provavelmente outros cientistas já se teriam deparado com o mesmo facto mas não o questionaram, talvez tivessem pensado que o fungo lhes havia estragado o trabalho de laboratório. Fleming publicou os resultados da sua descoberta em 1929, na revista British Journal of Experimental Patology. Concluiu também que o Penicillium notatum inibia a proliferação de outras bactérias como, por exemplo, estreptococos, pneumococos, gonococos, meningococos, etc. Contudo, durante cerca de dez anos a penicilina não foi objecto de investimentos científicos embora o próprio Fleming tenha publicado alguns escritos científicos sobre a questão. Mas, a necessidade de encontrar uma medicação antibacteriana adequada foi um catalisador para os trabalhos que haviam de vir sobre a penicilina. Recorde-se que desde finais do século XIX, com o advento da microbiologia

científica, foi possível isolar e descobrir numerosos microorganismos responsáveis por muitas doenças infecciosas. Portanto, gradualmente, foi possível identificá-los, verificar as suas condições de propagação, suas agressividades para o organismo humano, condições do meio que proporcionavam a sua proliferação, etc. Não havia contudo uma terapêutica medicamentosa eficaz e isto constituía uma preocupação científica. E por isso vários cientistas investiam na terapêutica das doenças infecciosas para as quais não havia respostas medicamentosas eficazes embora já se conhecessem as entidades responsáveis embora com outras preocupações terapêuticas, como foi o caso de Paul Erlich e de Gerard Domagk, e suas escolas, que descobriram, respectivamente, o famoso salvarsan (em 1909) e as primeiras sulfamidas (em 1935). O problema da produção industrial de penicilina: o papel imprescindível de Florey e Chain Em 1939, mas sobretudo nos inícios dos anos 40 os investigadores da Universidade de Oxford Ernst Chain (de origem alemã, 1906-1979) e Howard Florey (australiano, 1898-1968) investiram no estudo das propriedades antibacterianas de produtos naturais e retomaram a penicilina como objecto de estudo. Começaram por reproduzir o trabalho de Fleming, depois purificaram a penicilina extraída. Finalmente, iniciaram um trabalho de experimentação animal. Em 1940 publicaram em The Lancet um trabalho de colaboração com outros cientistas em que demonstraram as propriedades quimioterápicas da penicilina. Logo de seguida demonstraram as propriedades terapêuticas da penicilina no homem, o que veio a acontecer em 1941. A partir do primeiro estudo realizado em 12 de

Fevereiro desse ano, realizaram-se outros estudos clínicos de aplicação da penicilina com uma margem significativa de êxito. Um outro passo a dar era o da produção de penicilina. Havia que ter penicilina em quantidade suficiente para ser administrada. A Europa em plena 2ª Guerra Mundial não dava condições para a realização de trabalhos continuados, tanto mais que as indústrias que a podiam produzir estavam agora mais vocacionadas para a indústria de guerra. Contudo, apesar de em Oxford se fazerem estudos continuados sobre a penicilina, dentro das limitações existentes, nos Estados Unidos da América os ensaios clínicos e a produção industrial da penicilina foi feita em larga escala e com resultados animadores fruto das negociações científicas desenvolvidas por Florey que se empenhou em tentar resolver a questão da produção industrial de medicamentos à base de penicilina. A Segunda Guerra Mundial veio a constituir um balão de ensaio para a penicilina se pensarmos que, por exemplo, no exército dos Estados Unidos da América ela foi utilizada em massa quando ainda a sua utilização como medicamento estava numa fase pioneira. Para além das infecções provenientes de ferimentos de guerra a penicilina começou a ser depois utilizada no combate à sífilis. Fleming: benfeitor da Humanidade Terminada a Segunda Guerra Mundial e verificados os resultados altamente benéficos da penicilina para a Humanidade, Fleming é tomado como um benfeitor, uma figura que tinha paralelo noutros cientistas ao serviço do bem como, por exemplo, a figura mítica de Pasteur.

A sua figura e imagem foi sempre a do cientista que se encontrava ao serviço do bem, do cientista que descobriu um novo fármaco, o primeiro antibiótico, que salvou e continua a salvar milhões de vidas em cada ano que passava. Em 1945, justamente o ano em que finda a Segunda Guerra Mundial, foi atribuído a Fleming o Prémio Nobel de Medicina e Fisiologia, em conjunto com Chain e Florey. Isto é: ao descobridor da penicilina e aos cientistas que tornaram possível a sua utilização em humanos e a sua produção industrial. Contudo, a figura e a memória de Fleming sobrepoem-se à de Chain e Florey, cientistas fulcrais na problemática da penicilina e também cientistas de reputação internacional. A construção da sua imagem e o seu reflexo junto do público apagaram o trabalho, também notável, de Chain e Florey que devem ser, muito justamente lembrados e biografados. Em 1946 Fleming passou a assumir a liderança do Departamento de Inoculação do Hospital de St. Mary. Em 1949 faleceu a esposa de Fleming e em 1953 Fleming casou novamente com uma colaboradora que recebeu no seu laboratório, Amália Voureka, de origem grega, membro activo da resistência aos nazis no decurso da Segunda Guerra Mundial. A 11 de Março de 1955 faleceu vítima de ataque cardiaco, deixando para trás uma vida recheada de actividade científica, reconhecida a título individual e institucional através das inúmeras distinções que lhe foram atribuídas e cujo ponto mais alto foi atingido com o Prémio Nobel de Medicina e Fisiologia, em 1945, justamente no ano em que a Segunda Guerra Mundial terminava. E esta relação foi feita insistentemente na imprensa: alguns homens investiam no mundo bélico, mas Fleming investiu em algo (a penicilina) que não provoca a morte, antes, salvava vidas, isto é, era uma outra arma, uma

arma que não servia para matar vidas humanas, servia antes para destruir microorganismos, tratar a doença e restabelecer a saúde humana. A recepção da penicilina em Portugal Em Portugal, tal como acontecia noutros países, a penicilina foi recebida na segunda metade dos anos quarenta e reconhecida como um fármaco de enorme utilidade no combate a variadas infecções. Tanto em revistas científicas médicas e farmacêuticas, como na literatura de divulgação, a penicilina era insistentemente referida, sublinhandose, também, as prudências, limitações e consequências de uma deficiente utilização do antibiótico. Para além dos estudos médicos sobre o fármaco, sobretudo estudos clínicos, foram publicados alguns (não muitos) estudos de natureza farmacêutica que tinham a ver com as propriedades da penicilina, sua caracterização e com a problemática tecnológica farmacêutica. Alguns professores de farmácia, logo nos anos 40, divulgaram a penicilina em Portugal e realizaram investigações sobre o valor do fármaco. Foi o caso de Raúl de Carvalho, L. Silva Carvalho e Maria Serpa dos Santos, entre outros. Vários médicos divulgaram, também, nos anos 40 a penicilina em Portugal. Foi o caso de Pimentel Barata e José Garrett. A publicidade aos medicamentos contendo penicilina e derivados era, também, uma constante um muitas publicações periódicas. Também era objecto de discussão e interesse a questão da importação do produto e condições da sua comercialização em Portugal, sendo de sublinhar neste ponto o papel de relevo que a Cruz Vermelha Portuguesa teve no início da recepção da penicilina em Portugal. No Museu da Farmácia, em Lisboa, encontra-se exposta uma caixa de Petri do tempo e do próprio Fleming onde é possível ver a penicilina tal como o cientista a viu. Trata-se de

uma peça de enorme valor, tanto científico como simbólico, para a história da farmácia e da medicina. Recomendamos, por isso, a sua visita.