CAPÍTULO 9 A VEGETAÇÃO FLORESTAL NOS CAMPOS GERAIS

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Transcrição:

CAPÍTULO 9 A VEGETAÇÃO FLORESTAL NOS CAMPOS GERAIS Marta Regina Barrotto do Carmo Rosemeri Segecin Moro Melissa Koch Fernandes de Souza Nogueira Introdução ombrófila, de origem grega, significa amigo A vegetação florestal ocupa cerca de 22% das chuvas, enquanto mista se refere à mistura da área dos Campos Gerais (ver capítulo 7 deste de floras tropical e temperada. livro), incluindo diferentes tipologias e estágios Das quatro subformações florestais sucessionais. Tais florestas apresentam-se distintas descritas na região por Veloso et al. naturalmente fragmentadas, formando capões (1991), principalmente ligadas à altitude, duas isolados de várias dimensões e extensões, ocorrem na região dos Campos Gerais: a Floresta localizados em encostas, pequenas depressões ou Ombrófila Mista Montana (FOMM) e a Floresta ainda em faixas que acompanham rios, arroios e Ombrófila Mista Aluvial (FOMA). nascentes. Nesses ambientes, normalmente o solo é mais profundo quando comparado com as áreas Floresta Ombrófila Mista Montana (FOMM) campestres, apresentando maior drenagem e É uma formação florestal adaptada a acúmulo de detritos orgânicos (Klein e Hatschbach condições de clima temperado úmido de altitude, 1971). Moro et al. (1996) relacionaram capões e onde a árvore emergente é Araucaria angustifolia floresta de galeria a cambissolos álicos, de textura (araucária), com cerca de 30m de altura nas arenosa a média, profundos ou não, às vezes associações maduras (Figura 9.1). No dossel, os associados a neossolos litólicos húmicos álicos. elementos predominantes são das famílias Nas florestas dos Campos Gerais, a Lauraceae, Aquifoliaceae e Sapindaceae, enquan- Araucaria angustifolia (araucária ou pinheiro-do- to no sub-bosque (arvoretas com até 15m de paraná) é o elemento principal. Tal espécie altura), há dominância de Myrtaceae, apresenta sementes que podem germinar à sombra, Flacourtiaceae e Euphorbiaceae. mas o recrutamento de plântulas e jovens só ocorre As florestas em estágios iniciais apresenem locais com boa disponibilidade de luz. tam apenas um estrato arbóreo, de até 15m de altu- Portanto, condições microclimáticas e pedológi- ra, com indivíduos de diâmetro do tronco reduzido. cas podem explicar as diferentes fisionomias dos Apenas araucárias jovens se fazem presentes, capões, sendo possível encontrá-los em diferentes emergindo do dossel. De acordo com o grau de estágios sucessionais, nos quais as espécies de desenvolvimento do fragmento, podem predomicada associação são substituídas, propiciando a nar Mimosa scabrella (bracatinga), Clethra scabra formação de sub-bosques de composição hetero- (guaperê), Lithraea brasiliensis (falso-bugreiro), gênea (Klein 1984). Piptocarpha axillaris (vassourão-branco), Vernonia discolor (vassourão-preto), Schinus As fisionomias florestais terebinthifolius (aroeira), Ilex theazans (congo- As chamadas florestas com araucária nha), Rhamnus sphaerosperma (canjica), ocupam as porções planálticas do Estado do Campomanesia xanthocarpa (guabiroba), Myrcia Paraná (em média entre 700 e 1200m de altitude), obtecta (guamirim-branco) e Syagrus romanzofficom sua composição florística sendo fortemente ana (jerivá). Nas florestas mais abertas e bordas de influenciada pelas baixas temperaturas e ocorrên- capões são expressivas Gochnatia polymorpha cia regular de geadas (Roderjan et al. 2002). (cambará), Zanthoxyllum rhoifolium (mamica-de- Seguindo o sistema de classificação de porca), Casearia sylvestris (café-de-bugre), Veloso et al. (1991), essas florestas são classifica- Xylosma pseudosalzmanii (sucará), Roupala bradas como Floresta Ombrófila Mista. A palavra siliensis (carvalho), Jacaranda (carobas) e

100 Figura 9.1: Capões de floresta com araucária (FOMM). (Fotos: Herbário UEPG) Rapanea (capororocas). Já os capoeirões podem profundos à oeste e com maior disponibilidade de apresentar Merostachys (taquaras), Miconia (pixi- água. ricas) e Solanum (cuvitingas). No estrato arbustivo, Rubiaceae (Coussa- Florestas desenvolvidas exibem rea, Psychotria, Rudgea) é a família mais repre- Capsicodendron dinisii (pimenteira), Cedrela sentativa. São freqüentes ainda Piper gaudichaufissilis (cedro-rosa), Drymis brasiliensis (cataia), dianum (joelho-de-frango), enquanto Poaceae Casearia decandra (guaçatonga), C. obliqua (Ichnanthus, Panicum, Olyra) domina o estrato (cambroé), Eugenia uniflora (pitanga), Psidium herbáceo. cattleianum (araçá), Rollinia (ariticum), Sapium glandulatum (pau-leiteiro), Machaerium minuti- Floresta Ombrófila Mista Aluvial (FOMA) florum (sapuva), Matayba elaeagnoides (miguel- A Floresta Ombrófila Mista Aluvial (Figura pintado), Prunus (pessegueiro-bravo), Nectandra 9.2), popularmente conhecida como mata ciliar, grandiflora (canela-amarela), N. megapotamica floresta de galeria ou vegetação ripária, ocupa as (canela-preta), N. lanceolata (canela-branca), margens dos rios e normalmente está vinculada a Ocotea porosa (imbuia), O. odorifera (sassafrás), neossolos flúvicos, a gleissolos e com menor Myrcia ciliata e M. racemosa. No sub-bosque freqüência a neossolo litólico, cambissolo e encontra-se Actinostemon concolor (laranjeira-do- argissolo (Souza 2001, Moro et al. 2001, Oliveira mato), Sorocea bonplandi (cincho), Mollinedia et al. 2003) (ver capítulo 6 deste livro). Em locais clavigera (capixim), Allophyllus edulis (vacum), com maior saturação hídrica, a espécie arbórea Solanum (quina), Trichilia claussenii (catiguá), mais característica é Sebastiania commersoniana Myrcia multiflora (cambuí), M. rostrata (guami- (branquilho ou branquinho). Já em locais com rim-chorão) e Myrciaria tenella (cambuízinho). menor grau de hidromorfia ocorrem associações Árvores importantes da FOMM, como mais complexas com Araucaria angustifolia Podocarpus lambertii (pinheiro-bravo) e Ilex (araucária) a qual tem participação expressiva na paraguariensis (erva-mate), não são freqüentes fisionomia desta floresta (Roderjan et al. 2002). nos neossolos litólicos e cambissolos junto da Destacam-se também nos estratos superiores Escarpa Devoniana, preferindo solos mais Lithraea molleoides (bugreiro), Ocotea porosa

101 Figura 9.2: Floresta de Galeria do Rio Jaguariaíva. Em detalhe A-Roupala brasiliensis; B-Prunus (imbuia), Cinnamomum sellowianum (canela- Diversidade florística e estrutural raposa), Schinus terebinthifolius (aroeira), Allophyllus edulis (vacum) e Blepharocalyx Estratos arbóreo, arbustivo e herbáceo salicifolius (murta), sendo menos freqüentes Os estudos botânicos realizados na região Ocotea pulchella (canela-lajeana), Nectandra dos Campos Gerais têm dado ênfase às vegetações grandiflora (canela-amarela), Rapanea ferruginea florestais, principalmente aquelas que acompae R. umbellata (capororocas), Syagrus romanzoffi- nham rios e arroios, por sua grande importância na ana (coqueiro-jerivá), Lamanonia speciosa proteção do solo contra processos erosivos e (guaraperê), Jacaranda puberula (caroba), filtragem de poluentes e de sedimentos que Casearia obliqua (cabroé), Sloanea monosperma afetariam diretamente a quantidade e a qualidade da (sapopema), Matayba elaeagnoides (miguel- água. pintado) e Maytenus robusta (papagaieiro). Embora a composição florística das No estrato inferior pode-se observar a florestas na região dos Campos Gerais possa ocorrência de Calyptranthes concinna (guamirim- apresentar poucas variações, a abundância na de-facho), Myrcia rostrata (guamirim-chorão), M. ocorrência das espécies difere visivelmente. Ao multiflora (cambuí), M. breviramis (guamirim), analisar a Tabela 9.1, observa-se que o índice de M. arborescens (cambuí), Myrciaria delicatula, diversidade (H') é bastante variável e que o estrato M. tenella (cambuí-do-brejo), Ilex dumosa, I. arbóreo tem valor sempre superior quando theazans (congonhas) e Daphnopsis racemosa comparado ao estrato herbáceo-arbustivo, apontan- (embira). Eventuais exemplares de Dicksonia do a grande riqueza de árvores nessas formações. sellowiana (xaxim-bugio), Alsophila e Nephelea De acordo com o estágio sucessional, o estrato (xaxins-de-espinhos) podem ser encontrados arbóreo pode compor de 27 a 65% do número de (Oliveira et al. 2003, Souza 2001, Moro et al. 2001, espécies de uma floresta, enquanto arbustos variam Moro et al. 1996). As famílias botânicas entre 11 e 29%, e ervas de 14 a 50%. Myrtaceae, Euphorbiaceae, Lauraceae, Áreas localizadas mais ao norte dos Campos Sapindaceae e Fabaceae aparecem com destaque Gerais, nos municípios de Tibagi e Telêmaco nessa formação vegetacional. Borba, apresentam os maiores valores de diversidade (Tabela 9.1). Carmo (2006) atribuiu esta alta

102 Tabela 9.1: Valores de diversidade de Shannon (H') em florestas nos Campos Gerais. FOMM- Floresta Ombrófila Mista Montana; FOMA- Floresta Ombrófila Mista Aluvial Estrato estudado Formação florestal H Localidade Autor Arbóreo FOMM 3,89 P. E. do Guartelá capões Tibagi Carmo 2006 Arbóreo FOMA 3,62 P. E. do Guartelá - Rio Iapó Tibagi Carmo 2006 Arbóreo FOMA 3,67 Faz. Batavo Rio Iapó Tibagi Dias et al. 1998 Arbóreo FOMA 3,61 Faz. Monte Alegre -Telêmaco Borba Arbóreo FOMM 3,39 P. E. de Vila Velha Fortaleza - Ponta Nakajima et al. 1996 Ramos 2003 Arbóreo FOMA 2,97 Rio Cará Cará - Ponta Moro et al. 2001 Arbóreo Arbóreoarbustivo FOMA FOMA FOMM - plantio de araucária Entre 1,56 e 3,08 Entre 1,91 e 3,21 2,70 FOMM 2,54 Rio Quebra-perna - Ponta Oliveira et al. 2003 Rio Lajeado - Jaguariaíva Souza 2001 FOMA 2,30 Rio Quebra-Perna - Ponta FOMM -capoeira 2,26 FOMM -capoeira 2,10 FOMM 1,92 FOMM 1,86 P. E. de Vila Velha Fortaleza - Ponta P. E. de Vila Velha Arenitos - Ponta diversidade como conseqüência da influência da espaço, diminuindo seu crescimento, reprodução e Floresta Estacional Semidecidual (dominante no regeneração. norte do Paraná), assim a região estaria numa faixa Nas florestas dos Campos Gerais, lianas ecotonal, com mistura de duas formações florestais costumam ser freqüentes, principalmente em distintas. estágios iniciais de regeneração. Em geral compõem de 5 a 8% da flora local (Moro et al. 1996, Lianas e epífitas Takeda et al. 1998, Moro et al. 2001, Carmo 2006, Apesar das árvores apresentarem uma alta Moro et al. 2007), mas podem chegar a 12% em riqueza de espécies, sendo predominantes nas locais alterados (). São representativas formações florestais, outras formas de vida também as famílias Bignoniaceae, Sapindaceae, contribuem com boa parte para a sua diversidade, Malpighiaceae, Leguminosae, Apocynaceae, como as trepadeiras lenhosas (lianas) e as epífitas.- Convolvulaceae, Rubiaceae, Smilacaceae, Lianas são plantas que se apóiam e sobem em outras Asteraceae, Amaranthaceae, Rhamnaceae e ou em qualquer substrato, através de seu caule Menispermaceae. As espécies mais abundantes são lenhoso (cipó). Essas plantas germinam no solo e Acacia recurva (nhapindá), Serjania gracilis mantêm-se enraizadas durante toda a vida, mas ( t i m b ó ), A n e m o p a e g m a p ro s t r a t u m, necessitam de suporte físico para alcançarem as Pithecoctenium (pente-de-macaco), Pyrostegia copas das árvores. Elas são características das venusta (cipó-são-joão), Cuspidaria convoluta, florestas tropicais e dominam a vegetação princi- Paullinia carpopoda (cipó-ingá) e Smilax brasilipalmente em áreas perturbadas, sendo portanto ensis (japecanga). Em locais mais úmidos crescem indicadoras de impacto. Apesar de importantes espécies como Clitoria rubiginosa e Mikania ecologicamente, pois contribuem na diversidade (guaco). florística e fornecem alimento e hábitat para a Epífitas são plantas que crescem sobre fauna, competem com as árvores por recursos e outras plantas. Suas raízes não têm contato com o

103 solo e se estabelecem diretamente sobre o tronco, processo de regeneração há cerca de 50 anos, tendo galhos, ramos ou folhas das árvores, utilizando-os já alcançado, em função do solo e clima, um estágio apenas como suporte, sem causar danos, diferenci- de equilíbrio secundário (Moro 2001). ando-se desta maneira das plantas parasitas. Assim, a maioria dos capões mais desenvol- A importância ecológica do epifitismo nas vidos foi profundamente alterada e atualmente não comunidades florestais consiste na manutenção da se observam remanescentes representativos diversidade biológica e no equilíbrio interativo, intocados (Roderjan et al. 2002, Castella e Britez assim as epífitas proporcionam recursos alimenta- 2004). res (frutos, néctar, pólen, água) e microambientes A ocupação humana também reduziu especializados para a fauna constituída por uma drasticamente as florestas dos ambientes ripários, infinidade de organismos voadores e arborícolas. causando processos de erosão nos solos, danos à Também funcionam como bioindicadores do hidrologia regional e redução da biodiversidade. A estágio sucessional da floresta, uma vez que presença da floresta nesses ambientes constitui comunidades em fases iniciais apresentam menor condição básica para garantir a manutenção da diversidade epifítica do que comunidades avança- integridade dos processos ecológicos e hidrológidas. cos, sendo, assim, de fundamental importância para As famílias mais representativas são a estabilidade do ecossistema regional. Bromeliaceae, Orchidaceae, Piperaceae, Cactaceae Espécies arbóreas tipicamente nativas da e Araceae, além de pteridófitas, representadas região têm sido apontadas na Lista Oficial de principalmente pela família Polypodiaceae (Takeda Espécies da Flora Brasileira Ameaçadas de e Farago 2001, Tardivo e Cervi 2001, Carmo 2006). Extinção (IBAMA 1992). São incluídas na As bromélias se destacam em riqueza florística, categoria vulnerável Araucaria angustifolia sendo muito freqüente Tillandsia usneoides (barba- (pinheiro-do-paraná) e Ocotea porosa (imbuia) e na de-velho) que ocorre sobre árvores próximas a categoria em perigo Dicksonia sellowiana (xaximcursos d'água, onde a umidade relativa do ar é bugio) e Ocotea odorifera (sassafrás). sempre alta. Além dessas, na lista vermelha de plantas ameaçadas de extinção para o estado do Paraná Situação atual (Paraná 1995), constam ainda na categoria rara Historicamente, as florestas com araucária Aspidosperma polyneuron (peroba) e Calycoretes foram bastante exploradas, sendo que a maioria psidiiflorus, na categoria vulnerável Ocotea bicolor existente nos Campos Gerais hoje é secundária, e duas em perigo de extinção: Gochnatia argyrea e como conseqüência tanto do ciclo da erva-mate Dyospirus hispida. quanto do da madeira (ver capítulo 18 deste livro). Portanto, justificam-se medidas urgentes e Com o avanço tecnológico e a diminuição da específicas para o desenvolvimento de estratégias extração de material lenhoso, os capões estão em de conservação nessas áreas.

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