AS MEDIDAS DE AUTO-PROTECÇÃO E A REGULAMENTAÇÃO PORTUGUESA DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO

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Transcrição:

AS MEDIDAS DE AUTO-PROTECÇÃO E A REGULAMENTAÇÃO PORTUGUESA DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO João E. Almeida 1, A. Leça Coelho 2 e João Paulo C. Rodrigues 3 1 AVANTEC Tecnologias Avançadas, Porto, Portugal jea@avantec.net 2 Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Lisboa, Portugal alcoelho @lnec.pt 3 FCTUC Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, Portugal jpaulocr @dec.uc.pt Resumo A Segurança Contra Incêndio em Edifícios (SCIE) depende, para além das medidas passivas e activas definidas em projecto e implementadas na construção, de uma correcta exploração e gestão das instalações. Esta é conseguida, na maior parte dos casos, à custa da implementação de medidas de autoprotecção aos edifícios, previstas na regulamentação em vigor. A legislação Portuguesa na área da SCIE, até ao final de 2008, era escassa e pouco clara, em relação a medidas de autoprotecção a prever nos edifícios. Assim surgiu um novo regulamento de SCIE que veio consubstanciar num único documento, as medidas de SCI para os diferentes tipos de ocupação, incluindo as medidas de autoprotecção. As novas medidas passam a ser mais completas e exigentes, sendo de aplicação obrigatória para todos os edifícios, mesmo os existentes à data da sua publicação. Nesta comunicação faz-se uma análise crítica da evolução da regulamentação Portuguesa, no que diz respeito às medidas de autoprotecção, focando as que entraram em vigor com o novo Regulamento de SCIE. Pretende-se alertar os gestores e técnicos de SCIE para as alterações introduzidas nesta área e quais os impactos que possam via a ter no edificado existente e a construir. Palavras-chave: incêndio; organização; gestão; segurança; equipe

1 Introdução A protecção contra incêndios em edifícios vai para além das medidas passivas e activas definidas na fase de projecto e depois implementadas durante a construção. É necessário que continue durante a exploração normal do edifício. Muitas vezes, as preocupações terminam após a vistoria das entidades competentes e a atribuição da licença de utilização. Os equipamentos e sistemas de segurança contra incêndio acabam por ficar sem manutenção, ao abandono, deixando de funcionar. Por outro lado, os utentes, sem formação adequada, não sabem como actuar em caso de incêndio, Almeida et al (2007). A legislação, fruto da complexidade e lentidão própria da sua natureza, nem sempre se encontra actualizada. Muitas vezes apresenta soluções inexequíveis ou desenquadradas da realidade. Por outro lado, nem sempre acompanha a evolução tecnológica e os novos riscos que surgem constantemente. É usual (não apenas em Portugal) acontecimentos trágicos, como os do Chiado em Lisboa, em 1988, induzirem um aumento da produção de diplomas legais. Vários diplomas foram criados na década de 90 para os diferentes tipos de edifícios. Estes propunham medidas para a gestão da segurança contra incêndios que, apesar de escassas, na maior parte das situações não eram aplicadas. A regulamentação da Segurança Contra Incêndio em Edifícios (SCIE) foi recentemente alterada com a publicação do DL 220 de 12 de Novembro de 2008 e a Portaria n.º 1532 de 29 de Dezembro 2008. Esta nova legislação veio colmatar uma lacuna existente, ao exigir medidas de autoprotecção mais eficazes para todos os edifícios incluindo os existentes Almeida et al (2009). 2 A OGS em Portugal A segurança contra incêndio em Portugal, quer relativamente à organização das entidades ligadas ao combate, quer a legislação de segurança contra incêndios a implementar nas edificações, tem conhecido uma evolução permanente. Para fazer um breve resenha histórica da evolução da protecção contra incêndio em Portugal, é preciso recuar até ao reinado de D. José I. Na sequência dos trágicos acontecimentos de 1755, (numerosos incêndios originados pelo Terramoto que atingiu com proporções bíblicas a cidade de Lisboa e outras localidades em Portugal), foram introduzidas algumas

técnicas construtivas, tendo por objectivo dificultar a propagação do fogo entre edifícios. Quase duzentos anos depois, o Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), publicado em 1951, continha algumas disposições sobre protecção contra o risco de incêndio, embora não aludisse à questão da organização e gestão do risco de incêndio na exploração dos edifícios. Até 25 de Agosto de 1988 dia no qual Lisboa acordou com a Baixa Pombalina a ser consumida por um grandioso incêndio não existiu nenhuma legislação específica que reflectisse as preocupações emergentes desta área de risco. Contudo, o impacto que este evento teve na comunicação social, através da transmissão de imagens em directo, foi enorme, despoletando a necessidade de dotar o País de regulamentação adequada sobre segurança contra incêndios em edifícios. Contudo, o mesmo não se passa no domínio da OGS, cuja legislação específica é muito recente, sendo a sua aplicação altamente deficitária. 2.1 A anterior Regulamentação de Segurança Contra Incêndio Foi apenas em 2002 que o País conheceu a primeira legislação específica sobre esta matéria com a publicação das Portarias 1275/2002, 1276/2002 e 1444/2002, aplicáveis aos edifícios do tipo hospitalar, tipo administrativo e escolares, respectivamente, em que é especificamente referida a necessidade de elaborar planos de emergência e de segurança, com vista à manutenção das condições de segurança, que permitam circunscrever sinistros e sistematizar a evacuação enquadrada dos ocupantes, através da implementação de planos de manutenção. Para os edifícios que obrigam à existência de um Serviço de Segurança Contra Incêndio (SSI), também era solicitada a realização de acções de formação e treino do plano de emergência, sendo que os delegados de segurança deveriam ser instruídos das tarefas específicas na concretização dos planos de actuação e evacuação Infelizmente estas portarias raramente foram aplicadas e passado o período de adaptação, após publicação dos diplomas, foi mínimo o impacto que tiveram nos gestores de edifícios. Algumas escolas e hospitais dotaram-se de planos de emergência e realizavam simulacros periódicos, no entanto esta prática infelizmente não estava generalizada (fig. 1).

Figura 1. Simulacro realizado na Casa da Música, Porto, 2007 Em relação à OGS, em geral, o panorama nacional é até agora desolador, sendo poucas as entidades que têm este tipo de instrumentos e menos ainda as que o usam no dia-a-dia, para a gestão corrente dos edifícios. Os diplomas da anterior regulamentação de SCIE que faziam referência clara a aspectos da OGS eram: Resolução do Conselho de Ministros nº 31/89 Serviços Públicos; Decreto-Lei nº 426/89 Centros Urbanos Antigos; Decreto-Lei nº 64/90 Edifícios de Habitação; Decreto-Lei nº 66/95 Parques de Estacionamento Cobertos; Decreto-Regulamentar nº 34/95 Edifícios de Espectáculos; Portaria nº 1063/97 Empreendimentos Turísticos, Restauração e Bebidas; Decreto-Lei nº 368/99 Estabelecimentos Comerciais com mais de 300 m 2. Neste ponto é feita uma comparação entre a legislação existente, para cada um dos vários tipos de edifício e utilização, no que à OGS diz respeito. O Quadro 1 resume para cada tipo de edifício e correspondente legislação, quais as medidas de auto-protecção que se encontravam referidas nos anteriores diplomas. Para cada um dos parâmetros do quadro, sempre que o diploma correspondente referia a medida de auto-protecção em apreço, sinalizava-se o facto. Notar que a indicação referida não implicava necessariamente que a medida considerada estivesse completamente descrita e bem explanada, apenas que se encontrava referenciada. A Resolução do Conselho de Ministros, nº 31/89, relativo aos Serviços Públicos, apesar de abordar a OGS de forma ligeira e pouco detalhada, focava os principais pontos, faltando apenas referir os registos de segurança ou livros de ocorrências. O mesmo acontecia com o DL 426/89 referente aos Centros Urbanos Antigos (CUA).

Medidas de auto-protecção Tipo de Edifício Legislação aplicável Particularidades Procedimentos de prevenção Registos de segurança Plano de Prevenção Procedimentos em caso de emergência Plano de emergência Acções de sensibilização Formação em segurança contra incêndio Serviços Públicos Resolução do Conselho de Ministros, 31/89 Abordagem ligeira, pouco detalhada da OGS Centros Urbanos DL 426/89 Idem Antigos Baixa altura e unifamiliar Habitação DL 64/90 Média altura (9m < h < 28m) Grande altura (h > 28m) Estacionamento DL 66/95 Espectáculos DR 34/95 Hotelaria e Portaria Restauração 1063/97 Portaria Comerciais 1299/2001 < 300 m 2 DL 368/99 300 m 2 Hospitalares Portaria 1275/2002 Administrativos Portaria 1276/2002 Escolares Portaria 1444/2002 Quadro 1 Medidas de Auto-protecção Curiosamente, os restantes diplomas legais não eram tão abrangentes, embora nos pontos focados fossem mais pormenorizados e detalhados. Apenas as Portarias nº 1275, nº 1276 e nº 1444, é que referiam todos os pontos com algum detalhe, mesmo assim com lacunas, em particular nas questões da formação e no dimensionamento das brigadas de incêndio e equipas de segurança.

No Quadro 2 é apresentado um comparativo entre os vários diplomas legais referentes à anterior legislação, indicando o número mínimo de elementos de segurança necessários e quantos simulacros deveriam ser realizados. Tipo de Edifício Serviços Públicos Centros Urbanos Antigos Legislação aplicável Resolução do Conselho de Ministros, 31/89 DL 426/89 Habitação DL 64/90 Estacionamento DL 66/95 Espectáculos DR 34/95 Hotelaria e Restauração Comerciais Hospitalares Administrativos Escolares Portaria 1063/97 Particularida des Baixa altura e unifamiliar Média altura (9 m < h < 28 m) Grande altura (h > 28 m) lotação > 1000 pessoas Lotação entre 500 e 1000 pessoas lotação < 500 pessoas Nº mínimo de Elementos de Segurança Resp. serviço + encarregado segurança e agentes considerados necessários CM devem promover brigadas constituídas por residentes Nº de Simulacros mínimo 2 vezes por ano Exercícios para testar PPI s/ periodicidade definida - - - - 1 - Fica a cargo da entidade responsável pela exploração 3 Não especifica 2 Não especifica 1 Não especifica - mínimo 2 vezes por ano Portaria 1299/2001 < 300 m 2 - - DL 368/99 300 m 2 Portaria Lotação > 500 1275/2002 pessoas Anual Portaria Lotação > 500 1276/2002 pessoas SSI 2 elementos Anual Portaria Lotação > 500 1444/2002 pessoas Anual Quadro 2 Número mínimo de elementos de segurança e de simulacros

2.2 A nova Regulamentação de Segurança Contra Incêndio A portaria n.º 1532/2008, de 29 de Dezembro, propõe um conjunto de medidas, no que se refere à OGS, das quais se destacam: Definição da atribuição de responsabilidades ao RS (Responsável de Segurança); Normas a observar durante a execução de trabalhos de reparação, conservação, manutenção, beneficiação, modificação ou alteração. Medidas de auto-protecção; Configuração das equipas de segurança, em função do tipo de utilização do edifício e da categoria de risco; Maior detalhe dos pontos que devem ser abordados no Plano de Emergência; Formação a que deverão ser submetidos os diversos intervenientes no Plano de Emergência; Periodicidade de realização dos exercícios de simulação. Trata-se de um importante passo, pois a OGS é contemplada, pela primeira vez, na legislação não apenas para os novos edifícios mas também para os já existentes. Outro aspecto importante e inovador é a recomendação da avaliação do seu impacto na efectiva redução do número de ocorrências, de vítimas mortais e feridos, assim como dos prejuízos materiais, danos patrimoniais e ambientais. Ou seja, fica implícito que deverão ser criados mecanismos de controlo e verificação estatística para permitir aferir a eficácia das medidas propostas pela nova regulamentação. Por último, é referida a necessidade de fiscalização para verificação da efectiva implementação das medidas preconizadas. 2.2.1 Equipas de Segurança O dimensionamento das equipas de segurança é outro dos aspectos considerados de forma a assegurar uma correcta distribuição de funções aos elementos componentes. Assim, é de primordial importância conhecer o número de indivíduos presentes em cada uma, para essa eficaz atribuição de tarefas. O Quadro 3 sintetiza o número de elementos por UT e classe de

risco, prescrito no art.º 200º da Portaria 1532/2008. Fica a dúvida que qual foi o critério utilizado na definição destes valores; se houve algum estudo científico que fundamente estes números ou ainda referência à adopção de legislação equivalente existente noutros países. Mais, desconhece-se se foram levados a cabo estudos, mesmo que empíricos, sobre a adequação do número de elementos à realização das tarefas que lhes competem. Uma breve análise ao Quadro 3 permite justificar as dúvidas que aqui se levantam. Por exemplo, no caso das UT IV e V (correspondentes a edifícios escolares ou hospitalares / lares de idosos) é-nos indicado que a equipa de segurança deverá ter, na 3ª categoria de risco, 8 elementos e, na 4ª categoria de risco, 12 elementos. Conhecendo a realidade actual deste tipo de edifícios, justificam-se os receios aqui abordados anteriormente: como aplicar na prática estes requisitos? Porquê doze elementos e não dez, ou seis? São questões para as quais não se encontra resposta na legislação publicada. Outros exemplos de situações que levantam dúvidas: o dimensionamento sugerido para edifícios da UT IX (desportivos e lazer), ou UT XII (indústria e armazenamento) que rapidamente atingem a 4ª categoria de risco e, por conseguinte, a necessidade da equipa de segurança ser constituída por oito elementos, pode ver a sua aplicabilidade condicionada, uma vez que são muitos os casos onde as entidades referidas não têm, sequer, esse número de funcionários. Consideramos, assim, que os critérios de dimensionamento das equipas de segurança devem ser revistos. O facto de no RTSCIE se fazer depender o número de elementos da categoria de risco da utilização distorce, em alguns casos, as verdadeiras necessidades. Para que o dimensionamento dessas equipas seja adequado às necessidades da utilização importa, em primeiro lugar, definir com exactidão aquilo que se pede aos elementos dessa equipa e quais as situações com que podem ser confrontados. Há, indubitavelmente, factores que pesam no número de elementos que devem ser afectos à equipa de segurança. No caso da exploração normal do edifício é evidente que as necessidades são limitadas, pois as operações de manutenção dos equipamentos podem, mesmo em edifícios complexos e de grande dimensão, ser executadas por um número reduzido de elementos.

UT Descrição Categorias de Risco Nº mínimo de Elementos da Equipa I Habitação 3ª e 4ª 1 II III, VIII, X, XI e XII IV e V VI e IX VII Parques estacionamento 1ª e 2ª 1 Administrativos, Comerciais e gares de transporte, Museus e galerias de arte, Bibliotecas e arquivos, Industriais Escolares, Hospitalares e lares de idosos Espectáculos e reuniões públicas, Desportivos e de lazer Hoteleiros e restauração 3ª e 4ª 2 1ª 1 2ª 3 3ª 5 4ª 8 1ª (s/ locais risco D ou E) 2 1ª (c/ locais risco D ou E) 2ª (s/ locais risco D ou E) 2ª (c/ locais risco D ou E) 6 3ª 8 4ª 12 1ª 2 2ª 3 3ª 6 4ª 10 1ª (s/ locais risco D ou E) 1 1ª (c/ locais risco D ou E) 2ª (s/ locais risco D ou E) 2ª (c/ locais risco D ou E) 3ª 4ª 8 Quadro 3 Configuração das Equipas de Segurança por UT / Risco Contudo, os edifícios podem ser sujeitos a um incêndio e neste caso os elementos da equipa são confrontados com duas intervenções possíveis; uma relacionada com a verificação da veracidade do alerta e, eventualmente, a extinção de foco de incêndio, e a outra relacionada com a evacuação do edifício. Assim, será razoável dimensionar as equipas de segurança tendo em consideração factores que influenciam as necessidades referidas, destacandose os seguintes: efectivo da utilização, número de pisos, políticas de 3 3 5

evacuação em caso de incêndio (esta questão está relacionada com os critérios adoptados para o dimensionamento das vias de evacuação), entre outras. No entanto, verifica-se que para algumas das UT como, por exemplo, a XII não se faz intervir alguns desses factores o que pode conduzir a distorções significativas no dimensionamento das equipas em causa. 2.2.2 Responsabilidades e Fiscalização O Responsável de Segurança (RS) é definido no Artº 194º da portaria n.º 1532/2008, correspondendo «ao proprietário do edifício ou recinto, ou ao seu órgão máximo de administração». É também «responsável por zelar pela manutenção das condições de segurança contra incêndio, designadamente através da operacionalidade das instalações e dos equipamentos a ela afectos, bem como pela adopção das necessárias medidas de auto-protecção e de organização de segurança contra incêndio». Na fase de utilização e exploração do edifício ou recinto, o RS pode delegar competências no delegado de segurança contra incêndio. O Quadro 4 discrimina a quem corresponde essa responsabilidade consoante a UT. UT Ocupação Responsável de Segurança (RS) I (Habitação) II a XII Interior das habitações Espaços comuns Cada UT Espaços comuns a várias UT Proprietário Proprietário ou Administração do condomínio Entidade exploradora da UT Administração do edifício Quadro 4 Responsáveis de Segurança por UT 2.2.3 Medidas de Auto-protecção As medidas de auto-protecção a aplicar em cada UT, encontram-se resumidas no Quadro 5, podendo ser agrupadas da seguinte forma: Medidas Preventivas compreendem as atitudes, procedimentos e acções destinados a limitar os riscos de eclosão de incêndios, a garantir permanentemente as condições de segurança e a preparar os ocupantes para poderem reagir a uma situação de emergência;

Medidas de Intervenção em caso de emergência, correspondem aos procedimentos e acções a desenvolver nessas condições. Medidas de Auto-protecção UT Descrição Categoria de risco Registos de segurança Procedimentos de prevenção Plano de prevenção Procedimentos em caso de emergência Plano de emergência Acções de sensibilização Simulacros I II III, VI, VIII, IX, X, XI e XII IV, V e VII Habitação Estacionamento Administrativos, Espectáculos, Comerciais e gares de transporte, Desportivos, Museus, Bibliotecas, Industriais Escolares, Hospitalares e lares de idosos, Hoteleiros e restauração 3ª Espaços comuns 4ª Espaços comuns 1ª 2ª 3ª e 4ª 1ª 2ª 3ª e 4ª 1ª (s/ locais risco D ou E) 1ª (c/ locais risco D ou E) 2ª (s/ locais risco D ou E) 2ª (c/ locais risco D ou E) 3ª e 4ª Quadro 5 Medidas de Auto-protecção exigíveis Os imóveis de manifesto interesse histórico ou cultural, e nos espaços que contenham documentos ou peças com interesse, as medidas de autoprotecção devem incluir os procedimentos de prevenção e de actuação adequados com o objectivo de os proteger. As medidas a implementar devem ser auditáveis a qualquer momento, pelo que o RS deve fornecer a documentação e facultar o acesso a todos os espaços do edifício ou edifícios e recintos, à entidade fiscalizadora. A única excepção refere-se a locais de habitação permanente.

2.2.4 Instruções de Segurança Os locais de risco C, D, E, e F, independentemente da classe de risco, devem ter afixadas as instruções de segurança, compreendendo os procedimentos de prevenção e de emergência correspondentes. As instruções de segurança devem ficar visíveis, designadamente na face interior das portas de acesso aos locais a que se referem. Nos locais de risco D e E, devem ter uma planta de emergência simplificada, onde constem as vias de evacuação que servem esses locais, bem como os meios de alarme e de primeira intervenção. Nas plantas de emergência devem também existir instruções gerais de segurança. 2.2.5 Registos de Segurança O RS deve garantir a existência de registos de segurança, destinados à inscrição de ocorrências relevantes e à guarda de relatórios relacionados com a segurança contra incêndio, devendo compreender, designadamente: Relatórios de vistorias, de inspecções ou fiscalização das condições de segurança realizadas por entidades externas, nomeadamente pelas autoridades competentes; Informação sobre anomalias observadas, incluindo a sua descrição, datas de detecção, medidas correctivas e reparações, duração das intervenções até à reposição das condições normais de funcionamento; Relação de todas as acções de manutenção efectuadas em instalações técnicas, dos sistemas e equipamentos de segurança, com indicação do elemento intervencionado, tipo de acção efectuada, data e responsável; Descrição sumária das modificações, alterações e trabalhos perigosos efectuados nos espaços da UT, com indicação das datas de início e finalização Relatórios de ocorrências, directa ou indirectamente relacionadas com a segurança contra incêndio, como alarmes intempestivos, princípios de incêndio ou actuação das equipas de intervenção Cópia dos relatórios de intervenção dos bombeiros, em incêndios ou outras emergências;

Relatórios sucintos das acções de formação e dos exercícios de simulação. Os registos de segurança devem ser arquivados pelo período mínimo de 10 anos. 2.2.6 Exercícios de Simulação Nas UT que possuam plano de emergência devem ser realizados exercícios com o objectivo de criação de rotinas de comportamento e actuação, bem como para aperfeiçoamento dos procedimentos definidos. A periodicidade que consta da portaria n.º 1532/2008, é a que se encontra no Quadro 6. UT Descrição Categoria de risco Período máximo entre exercícios (em anos) I Habitação 4ª 2 II Parques de estacionamento 3ª e 4ª 2 VI e IX Espectáculos / Desportivos e lazer 2ª e 3ª 2 VI e IX Espectáculos / Desportivos e lazer 4ª 1 III, VIII, X, Administrativos / Comerciais e gares / XI e XII Museus / Bibliotecas / Industriais 2ª e 3ª 2 III, VIII, X, Administrativos / Comerciais e gares / XI e XII Museus / Bibliotecas / Industriais 4ª 1 2ª (com locais de IV, V e VII Escolares / Hospitalares / Hoteleiros risco D ou E), 3ª e 4ª 1 Quadro 6 Periodicidade da Realização de Exercícios de Simulação Comparativamente com as exigências que constam nas normas NFPA, em que por exemplo, nas escolas o Life Safety Code NFPA 101 obriga a um exercício de evacuação por mês, a periodicidade sugerida encontra-se ainda a grande distância do que seria desejável. Trata-se, todavia, de uma melhoria comparativamente com a situação anterior. 3 Conclusões O principal esforço de investigação e legislação sobre a segurança contra incêndios urbanos tem-se centrado nas fases de concepção e construção. A exploração dos edifícios e as questões inerentes à Organização e Gestão da

Segurança Contra Incêndios Urbanos tem sido preterida e tratada como menor. Trata-se, todavia, de uma área que merece a maior das atenções, pois de pouco servem sistemas e equipamentos deixados ao abandono e negligenciados, e que, quando necessários, não funcionem ou pior, não haja quem os saiba operar. As questões da manutenção, formação e treino, são pois, da maior importância. É necessário e urgente que se invista nestas áreas, através da implementação de planos de manutenção e de emergência, que, por um lado, garantam a funcionalidade e operacionalidade dos equipamentos e sistemas de segurança, através de uma correcta política de manutenção, e por outro, seja garantida a formação contínua aos actores chamados a actuar em caso de emergência. A recente publicação de legislação que aborda de forma categórica as medidas de autoprotecção, extensíveis a todos os edifícios, e impondo sanções a quem não as cumprir, releva a crescente importância que esta temática começa a ter, sendo importante sensibilizar todos os actores intervenientes. A definição da atribuição de responsabilidades, as normas a observar durante a execução de trabalhos de reparação e manutenção, as medidas de autoprotecção, a configuração das equipas de segurança, a formação dos intervenientes no plano de emergência e a realização de exercícios de simulação, são algumas das medidas previstas na nova regulamentação de segurança contra incêndios que virão alterar o panorama na área da OGS. Porém, sabendo-se que a legislação anterior, em particular as Portarias 1275/2002, 1276/2002 e 1444/2002, já exigiam algumas medidas de OGS que não foram aplicadas em muitos casos, atendendo-se aos problemas existentes na gestão diária destes espaços, à falta de disponibilidade de meios humanos e materiais e ainda à falta de sensibilização dos responsáveis, é lícito que exista alguma desconfiança sobre a forma como serão aplicadas as medidas previstas pela nova legislação. Tanto mais, que o DL 220/2008, no seu Art.º 34º, refere que as medidas de auto-protecção deverão ser implementadas no prazo máximo de um ano, para os edifícios existentes à data da sua publicação, sem que até ao presente momento, a ANPC ou outra entidade, tenha realizado acções ou campanhas de divulgação no sentido de estimular quem de direito, a tomar as medidas.

Espera-se que num futuro próximo as preocupações aqui plasmadas deixem de fazer sentido com a implementação em Portugal de uma verdadeira cultura de segurança na organização e gestão dos edifícios. Referências: Almeida, João E. e Coelho, A. Leça (2007), A Organização e Gestão da Segurança em Incêndios Urbanos, SHO2007, Universidade do Minho, Guimarães, pp. 161-164. Almeida, João E. (2009), Organização e Gestão da Segurança em Incêndios Urbanos, Tese de Mestrado em Segurança contra Incêndios Urbanos, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Decreto-lei n.º 426 (1989), Medidas Cautelares de Segurança contra Riscos de Incêndio em Centros Urbanos Antigos. Portaria n.º 1275 (2002), Normas de Segurança Contra Incêndios a Observar na exploração de Estabelecimentos de Tipo Hospitalar. Portaria n.º 1276 (2002), Normas de Segurança Contra Incêndios a Observar na exploração de Estabelecimentos de Tipo Administrativo. Portaria n.º 1444 (2002) Normas de Segurança Contra Incêndios a Observar na exploração de Estabelecimentos Escolares. Decreto-Lei n.º 220 ( 2008) Regulamento Jurídico de Segurança Contra Incêndio em Edifícios. Portaria n.º 1532 (2008) Regulamento Técnico de Segurança Contra Incêndio em Edifícios. NFPA 101 (2006) NFPA 101 Life Safety Code, 2006 Edition, National Fire Protection Association, Boston, USA.