Novos formatos familiares em habitações de interesse social: o caso do conjunto habitacional Jardim Sucupira em Uberlândia

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Transcrição:

Novos formatos familiares em habitações de interesse social: o caso do conjunto habitacional Jardim Sucupira em Uberlândia New family profiles in social housing: the case of the housing Jardim Sucupira in Uberlândia ARAUJO, Débora Cristina 1. e-mail: dca.arquiteta@gmail.com CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2753814704798069 VILLA, Simone Barbosa 2. Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design (FAUeD) Av. João Naves Ávila, 2121, Santa Mônica, Uberlândia, M.G, cep. 38411174 e-mail: simonevilla@yahoo.com CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/5972522149974965 Resumo: Inúmeras são as transformações ocorridas na sociedade no final do século XX e início do século XXI, que influenciaram nas alterações dos arranjos familiares, tornando-os mais diversos e complexos, contrapondo-se ao conceito de família tradicional patriarcal. Este artigo trata de um estudo acerca destas transformações e seus rebatimentos no espaço doméstico como parte integrante de uma pesquisa maior de mestrado intitulada A qualidade de vida na Habitação de Interesse Social Verticalizada em Uberlândia-MG a partir da avaliação pósocupação: o caso do Conjunto Habitacional Cidade Verde em desenvolvimento no PPGAU- FAUeD-UFU. Metodologicamente este artigo estrutura-se em duas partes: (i) fundamentação teórica sobre o assunto e (ii) pesquisa aplicada em domicílios do conjunto habitacional Jardim Sucupira, localizado em Uberlândia-MG. Pesquisa esta que foi desenvolvida em parceria com a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Design FAUeD da Universidade Federal de Uberlândia-MG e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, objetivando traçar os perfis familiares de um empreendimento habitacional de interesse social na cidade de Uberlândia- M.G. Os resultados indicam que apesar do empreendimento ainda refletir de forma majoritária o perfil familiar nuclear tradicional, formado por famílias de 3 a 4 pessoas, com até 2 filhos, 1 Arquitetura e Urbanista, coordenadora de Aprovação e Parcelamento do Solo, da Secretaria de Planejamento Urbano, da Prefeitura Municipal de Uberlândia MG. Mestranda em Arquitetura e Urbanismo, no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, da Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design, da Universidade Federal de Uberlândia (PPGAU- FAUeD-UFU/MG). 2 Arquiteta e Urbanista, professor adjunto da Universidade Federal de Uberlândia (UFU/MG) na Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design (FAUeD). Doutora pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) na subárea Tecnologia da Arquitetura (2008). Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo EESC - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo na subárea Tecnologia do Ambiente Construído (2002). 1

chefiadas por homens, variados perfis familiares foram identificados. Embora ainda haja predominância do padrão familiar tradicional em empreendimentos de interesse social, é imprescindível que a arquitetura habitacional, seja inclusiva, de maneira que atenda às diferentes necessidades de arranjos familiares diversos. Palavras-chave: avaliação pós-ocupação; habitação de interesse social; novos perfis familiares; arquitetura inclusiva. Abstract: There are countless transformations in society in the late twentieth century and early twenty-first century, which influenced the changes in family structures, making them more diverse and complex, as opposed to the concept of patriarchal traditional family. This article deals with a study on these transformations and their repercussions in the home as part of a larger research master's entitled "The quality of life in the upright Social Housing in Uberlândia- MG from post-occupancy evaluation: the case Undertaking of Cidade Verde" developing in PPGAU-FAUeD-UFU. Methodologically this article is structured in two parts: (i) theoretical foundation of the matter and (ii) applied research in households in the housing Jardim Sucupira, located in Uberlândia- MG. Search this which was developed in partnership with the Faculty of Architecture and Urbanism and Design - FAUeD the Federal University of Uberlândia-MG and the Applied Economic Research Institute - IPEA, aiming at developing the family profiles of a housing development of social interest in the city of Uberlândia-MG. The results indicate that although the project still reflect a majority manner the traditional nuclear family profile, formed by families 3 to 4 persons, with up to 2 children, headed by men, assorted family profiles were identified. Although there is still a predominance of traditional family pattern on developments of social interest, it is essential that the housing architecture, is inclusive, so that meets the different needs of different family arrangements. Key-words: post-occupancy evaluation; social housing; new family profiles; inclusive architecture. 2

1. Introdução O presente artigo pretende apresentar algumas reflexões, ainda preliminares, integrantes da Dissertação de Mestrado intitulada A qualidade de vida na Habitação de Interesse Social verticalizada em Uberlândia-MG a partir da avaliação pós-ocupação: o caso do Conjunto Habitacional Cidade Verde, em desenvolvimento no Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, Curso de Mestrado, junto à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Design da Universidade Federal de Uberlândia. Desta forma tem por objeto pesquisar e identificar a evolução dos perfis familiares após as transformações ocorridas nas cidades e na sociedade, no final do século XX e início do século XXI, bem como levantar qual é o papel da arquitetura de interesse social no atendimento às demandas dos novos arranjos familiares e como os projetos habitacionais tem atendido às diferentes necessidades dos grupos familiares. Para isso tomou-se como estudo de caso, e pré-teste para desenvolvimento da pesquisa de mestrado, o levantamento dos perfis familiares do conjunto habitacional Jardim Sucupira em Uberlândia. Tratou-se de um questionário aplicado em uma pesquisa desenvolvida entre a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Design FAUeD da Universidade Federal de Uberlândia-MG e o IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, abrangendo 60 domicílios do conjunto habitacional. Como metodologia, a construção do artigo se estrutura em: a) apontamentos acerca da produção habitacional de interesse social recente no Brasil; b) levantamento da evolução dos padrões familiares, desde a família nuclear patriarcal, até os novos arranjos familiares, objetivando identificar os padrões familiares atuais; c) apresentação dos dados consolidados da pesquisa aplicada no conjunto habitacional Jardim Sucupira, objetivando traçar os perfis familiares recorrentes no empreendimento e d) apresentar alguns apontamentos a respeito do papel da arquitetura habitacional no atendimento às demandas dos novos arranjos familiares na atualidade. 2. A produção da habitação de interesse social atual e o atendimento às demandas dos novos arranjos familiares É notável que a produção habitacional de interesse social brasileira tem seguido os 3

padrões das habitações do século passado, sem que sejam consideradas importantes transformações culturais e sociais, que influenciaram os modos de vida e os arranjos familiares, conforme serão discutidos adiante. Verifica-se, atualmente, uma repetição dos padrões de planta e fachada, e a diminuição cada vez maior da área das habitações, além da diminuição da qualidade dos materiais e de acabamento (Szücs et. al., 2007). Assim, é importante contextualizar as transformações que as famílias têm sofrido na sua estrutura e formação, especialmente no final do século XX e início do século XXI. A constituição de família considerada padrão ou normal era a família patriarcal, em que o homem ocupa a posição do provedor, superior sexual e socialmente, e a mulher o papel de cuidadora, da casa, da família e dos filhos. (Alfano, 2007). Entretanto, com o fortalecimento da industrialização, abriram-se as portas para novas formas de organização das tarefas domésticas e do papel da mulher no lar, e começou-se a refletir sobre como tornar o trabalho doméstico mais eficiente, a aplicar conceitos e sistemas da produção industrial à moradia: formas simples, usos flexíveis e linhas de montagem. (Montaner et. al., 2014, p. 69). Com isso, as residências diminuíram de tamanho e de número de empregados e houve a popularização dos eletrodomésticos, especialmente no período pósguerra. Atualmente, o modelo patriarcal de família vem sendo questionado e alterado, visto que as pessoas não se interessam mais em formar uma família somente para a procriação. A crise da família nuclear começou a ocorrer a partir dos anos 1970, em que se levantava a hipótese da morte da família tradicional. (Pereira et. al., 2012). Conforme as autoras, a família nuclear, ainda que renovada, surge como um modelo a ser seguido, como a família boa e estruturada : Alguns relatos e estudos 3 caracterizam que as famílias que não se enquadram nos moldes tradicionais e idealizados são consideradas famílias desorganizadas e ou desestruturadas, ou seja, as que são compostas de outras formas, como por exemplo mãe ou pai ou responsável e filhos. Isso aconteceu porque a família, com o passar dos tempos, foi se organizando e reorganizando de acordo com determinados momentos históricos, através de 3 As autoras referem-se a relatos e estudos na área de Psicologia. 4

elementos culturais, políticos, econômicos e sociais. (Pereira et. al., 2012, p. 8). Tendo em vista a crise da família tradicional, Villa (2012) aponta algumas alterações de ordem demográfica, social e cultural, que podem ser verificadas nos padrões familiares: a) de ordem demográfica, são a diminuição da fecundidade e o envelhecimento da população; e b) de ordem social e cultural, são a diminuição do número de matrimônios, aumento do número de divórcios, atraso das uniões, bem como o ingresso e fortalecimento da mulher no mercado de trabalho. A autora, citando Lesthague (1995), aponta que ocorreram diversas revoluções na sociedade que afetam profundamente as estruturas familiares: [...] (i) revolução contraceptiva na qual ocorre dissociação da sexualidade da reprodução; (ii) revolução sexual, principalmente, para as mulheres que passam a distinguir a sexualidade do casamento e; (iii) revolução no papel social da mulher e nas relações de gênero tradicionais, onde a figura do homem provedor duela com o consolidado papel da mulher cuidadora. (Villa, 2012, p. 3) Pereira et. al. (2012) destacam ainda, como outro importante fator de mudança, o enfraquecimento da Igreja (principalmente Católica), a partir do momento em que a sociedade passou a questionar a finalidade do casamento apenas para a procriação, voltando-se para o prazer e a construção de uma vida em conjunto; consequentemente houve a separação entre sexualidade e reprodução, alavancada pela popularização dos métodos anticoncepcionais. Além disso, os avanços na medicina possibilitaram as inseminações artificiais e fertilizações in vitro, dissociando a gravidez da relação sexual, propiciando as chamadas produções independentes e a barriga de aluguel. Pode-se, portanto, atribuir como fatores que ocasionaram as mudanças nos padrões familiares na contemporaneidade: Casamentos tardios, maternidade após os 30 anos, redução do número de filhos, aumento da contracepção em idade precoce, socialização dos filhos transferida também para serviços públicos e privados, aumento da união estável, aumento significativo das famílias monoparentais (chefiadas por pai ou mãe), aumento de famílias recompostas (separação/divórcios), aumento da população mais velha, aumento de pessoas que vivem só [sic], união de homossexuais e acolhimento de agregados são outros fatores sócio-históricos 5

que acabam por influenciar na constituição dessas novas configurações familiares e quebram a concepção tradicional de família. (Pereira et. al, 2012, p. 9). Assim, os novos formatos familiares passaram a ter uma representação mais expressiva no total de grupos familiares, se contrapondo à família tradicional, nuclear. Verifica-se, atualmente, diversos arranjos familiares: (i) famílias monoparentais (somente uma pessoa cuida dos filhos, seja o pai ou a mãe); (ii) casais DINC (Duplo Ingresso e Nenhum Filho); (iii) uniões livres (sem casamento civil ou união estável), incluindo casais homossexuais ou transexuais; (iv) poliamor (grupos que se relacionam com mais de um parceiro, coabitando consensualmente, sem que haja monogamia); (v) grupos familiares coabitando sem laços conjugais ou de parentesco; (vi) as famílias unipessoais, formadas por pessoas morando sós; e a (vii) família nuclear, tradicional. Villa (2012) afirma que Ainda dominante nas estatísticas, esta família [nuclear] renovada começava, no entanto, a passar por transformações que levaram a uma maior autonomia de seus membros, e ao declínio da autoridade dos pais. (p. 3). Isso se deve, entre vários fatores, ao fato de os filhos permanecerem mais tempo na casa dos pais devido aos casamentos tardios, aumentando, portanto, sua autonomia e participação no incremento da renda familiar; esse fato pode ser verificado pelo aumento da geração canguru : Nos últimos anos o fenômeno do prolongamento da convivência familiar entre pais e filhos ganhou importância nos estudos sobre as famílias brasileiras, originando o termo geração canguru, que compreende as pessoas de 25 a 34 anos de idade que ainda vivem na casa dos pais. Entre 2004 a 2013, houve aumento da proporção dos indivíduos deste segmento etário na condição de filho nos arranjos familiares, que passou de 21,2% para 24,6% no País. Esta proporção foi de 26,8% no Sudeste e de 19,8% na Região Norte. (IBGE, 2014, p. 76). Conforme uma pesquisa feita pelo IBGE em 2013 4, essa permanência dos jovens na casa dos pais não está necessariamente ligada à falta de ocupação. Os dados levantados pelo instituto demonstram que esses jovens possuem escolaridade média maior, indicando que a possibilidade de prolongar a permanência na casa dos pais pode auxiliar a dedicação aos 4 Ver IBGE (2014). 6

estudos. Outro fator que indica a autonomia dos membros do grupo familiar, é o fato de os idosos estarem, gradativamente, retornando ao mercado de trabalho, devido ao aumento da expectativa de vida, sendo que para muitas famílias o salário ou aposentadoria deles representam a principal renda, conforme será discutido adiante. Além dos fatores já mencionados que levaram ao declínio da família patriarcal, houve o aumento do número de famílias chefiadas por mulheres, seja pela troca de papéis com o homem que assume essa chefia tradicionalmente em uma família formada de uma união, seja na atitude feminina de construir uma família sem a presença masculina do parceiro. (Villa, 2012, p. 8). Isso pode ser constatado pelo fato de que 1992, 8% dos domicílios em áreas urbanas eram chefiados por mulheres, passando em 2009, para 35,8% dos domicílios, um aumento de mais de 4 vezes, em um período de 17 anos. (DIEESE, 2011). Vale destacar que, na década de 1970, o número de filhos era bastante alto: 5,8 filhos por mulher, caindo para 4,3 em 1980, uma diminuição de 25,9%. Em 1990, caiu para 3,5 filhos e em 2013, para 1,77 filhos por mulher, uma diminuição de quase 70% em 43 anos, estando pela primeira vez em um patamar que não atinge a reposição (Villa, 2012; IBGE, 2014). A autora ressalta que o número de filhos é menor em famílias que tem acesso aos serviços como saúde e educação, sejam públicos ou privados, com maior renda e escolaridade, girando em torno de 1 filho por mulher. Villa (2012), citando Berquó & Cavenachi (2006) destaca ainda que a queda mais acentuada [foi] entre as mulheres mais pobres, menos escolarizadas, negras, domiciliadas nas áreas rurais, e nas regiões Norte e Nordeste. (Villa, 2012, p. 4). Concomitantemente à queda da natalidade e do número de filhos, houve um envelhecimento da população, com o aumento da expectativa de vida, principalmente para as mulheres. Os idosos passam a novamente integrar o mercado de trabalho, seja para complementar a renda, ou como indicador de autonomia e integração social. Esta melhoria tanto na situação da renda, como na saúde dos idosos acarretou mudanças na sua posição familiar, principalmente na sua condição de dependência em relação aos filhos. Em 2009 representavam 13,8 milhões de chefes de família, da qual 57,3% eram homens. No mesmo período aproximadamente 6,2 milhões de famílias eram chefiadas por idosos na qual: havia filhos adultos residindo; em 2,3 milhões de famílias havia netos e os idosos contribuíam com 54,8% da renda familiar. (Villa, 2012, p. 11). 7

A proporção de idosos que estavam em arranjos familiares em que havia presença de algum familiar, seja cônjuge, filho, outro parente, ou agregado é de 84,9%; sendo que o restante, 15,1% dos idosos vivem sozinhos. Os arranjos familiares que tinham ao menos uma pessoa com 60 anos ou mais correspondiam a 29,0% do total. (IBGE, 2014). Portanto, para compatibilizar os dados apresentados, conforme o IBGE (2014), 44,8% das famílias eram formadas por casal com filhos (família nuclear); 25,74% eram monoparentais, sendo que 16,5% eram famílias monoparentais maternas; 17,73% eram formadas por casais sem filhos (DINC); e 11,65% unipessoais (apenas uma pessoa vivendo na residência), conforme pode ser identificado na Figura 1. Assim, verifica-se que atualmente no Brasil cerca de 55% dos domicílios são habitados pelos novos arranjos familiares. Arranjos familiares brasileiros - 2013 Monoparentais com agregados Monoparentais com outros parentes 0,24% 4,62% Monoparentais com filhos Casal sem filhos 20,88% 17,73% Casal com filhos 44,88% Unipessoal 11,65% 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% Figura 1. Arranjos familiares brasileiros - 2013. Fonte: Síntese de Indicadores Sociais SIS (IBGE, 2014). Embora a representatividade dos novos arranjos familiares seja bastante alta, constatase na produção habitacional atual, especialmente nas habitações de interesse social, conforme já mencionado, a não observância das demandas dos diferentes arranjos familiares na elaboração dos projetos habitacionais, como por exemplo: coabitação de diferentes gerações, utilização da casa como local de trabalho e/ou lazer, alteração dos papéis de autoridade e hierarquia, a emancipação feminina, necessidade de privacidade e independência dos membros, entre outros. (Villa et. al., 2010). 8

Para tanto, torna-se imprescindível uma revisão dimensional dos espaços da residência, conforme destaca Szücs et. al.(2007): O projeto arquitetônico enquanto instrumento de antecipação de conflitos na relação entre o homem e o espaço construído deve ser flexível, incorporando possibilidades de modificações que respondam aos diferentes modos de vida dos moradores além das modificações resultantes da dinâmica familiar. Esta flexibilidade é compreendida [...] como a capacidade do edifício de se adequar a um leque significativo e variado de necessidades. (p. 485). Montaner et. al. (2014), seguindo a mesma linha de pensamento, apresentam alguns apontamentos sobre essa questão. Os autores afirmam que a casa é o primeiro espaço de socialização do indivíduo, e a representação social dos agrupamentos familiares. Para os autores, os arquitetos não podem pensar o lar como uma réplica da casa dos pais: [...] a arquitetura não deveria continuar sendo a mesma, convencional e comercial; deveria atender às mudanças que se estão produzindo na sociedade [...]: mudanças na estrutura familiar, imigração, envelhecimento da população, aumento das desvalorizações, incremento das marginalizações de todo tipo, inclusão das atividades de estudo e trabalho nas moradias etc. (p. 178) Conforme os autores, a solução para atender a diversidade necessária de tipos de habitação também está em desenvolver mecanismos de flexibilidade. A primeira regra de flexibilidade, conforme os autores, é a existência de espaços com a mínima hierarquia possível, de tamanhos semelhantes, mas de maneira que cada grupo possa apropriar-se do espaço de maneira diferente. Além disso, é necessário que o projeto habitacional seja pensado de modo que o layout dos móveis possa ter diversas variações, atendendo às demandas dos diferentes perfis. (Montaner et. al, 2006). Villa et. al. (2010), destacam que a flexibilização, no caso da habitação de interesse social, encontra a barreira da área construída e a da redução de custos, em que pequenas edificações não permitem uma diversidade organizacional significativa. Assim, o arranjo inadequado da habitação aos novos modos de vida da sociedade geram problemas de ordem comportamental, como a sobreposição de funções dos cômodos e comprometimento da privacidade. 9

Deste modo, o padrão mínimo de habitação de interesse social sequer é capaz de atender com eficácia as necessidades básicas de seus usuários. O sentir abrigado, o sentir seguro, o alimentar, o dormir, o higienizar-se, competem tragicamente com os espaços, com os mobiliários e equipamentos. (Villa et. al., 2010, p. 2). Outrossim, para as famílias que tem renda de até três salários mínimos, como é o caso dos moradores de conjuntos habitacionais de interesse social, há poucas ofertas de tipos de habitação, principalmente considerando-se que a maioria das construções são subsidiadas pelo Estado. Entretanto, no conjunto habitacional Jardim Sucupira, embora seja um exemplo de miniaturização da planta e de não observância das diferentes demandas familiares, em quase 60% dos domicílios entrevistados, os moradores declararam que preferem morar na moradia atual, em comparação com a anterior, e dentre eles, quase 80% preferem morar na moradia atual porque é uma casa própria. Em consonância com o conjunto habitacional Jardim Sucupira, o alto grau de satisfação dos usuários do Programa Minha Casa Minha Vida, pode ser confirmado por meio de uma pesquisa de satisfação publicada em 2014, desenvolvida pela Secretaria Nacional de Habitação, em parceria com o IPEA, que indicou que: Na média nacional, quando expostos à afirmação Estou muito satisfeito com a nova moradia, a reação de concordância plena com a afirmação prevaleceu, gerando uma pontuação de 8,77 5. De forma semelhante, quando expostos à afirmação Mudar para essa nova moradia fez minha vida melhorar, a concordância também foi alta, resultando numa avaliação de 8,62 pontos. (Brasil, 2014, p. 101). É importante ressaltar que, nessa pesquisa, cerca de 30% dos entrevistados declararam estarem alojados em áreas de risco na moradia anterior, tendo sido removidos para as novas moradias, o que pode influenciar no nível de satisfação dos usuários. (Brasil, 2014, p. 75). Além disso, a satisfação de terem uma casa própria também pode influenciar na avaliação. Por fim, Villa et. at., 2010, salienta que a Avaliação Pós-Ocupação APO, tem papel relevante na aproximação entre os idealizadores dos projetos e os futuros beneficiários, levantando-se as reais necessidades e demandas dos moradores, podendo contribuir com a 5 Em uma escala de 0 a 10. 10

criação de um banco de dados sobre os vários aspectos que englobam o morar, com espaços adequados aos hábitos e mudanças dos diferentes arranjos familiares. A seguir, são apresentados dados da pesquisa realizada no conjunto habitacional Jardim Sucupira, objetivando identificar os arranjos familiares em habitações de interesse social, bem como verificar se os projetos habitacionais atendem às demandas dos moradores. 3. Análise de dados dos perfis familiares no conjunto habitacional Jardim Sucupira O Loteamento Jardim Sucupira está localizado no Setor Leste da cidade, com acessos principais pela Rodovia BR-452 (Uberlândia-Araxá); tendo sido foi aprovado pela Prefeitura Municipal de Uberlândia em 2004. Parte da área do loteamento foi definida como Zona Especial de Interesse Social (conforme pode ser identificado na Figura 2), por meio da Lei Complementar nº. 525/2011 Lei Municipal de Zoneamento do Uso e Ocupação do Solo. Figura 2. Foto aérea do Loteamento Jardim Sucupira. Fonte: Google Earth, 2015. Organização: Autores. Na área definida como ZEIS, foram construídas 270 unidades residenciais unifamiliares6, com área de 38,02 m², com um investimento de R$ 9.990.000,00, financiadas pelo Programa Minha Casa Minha Vida, entregues em maio de 2011. As unidades, construídas em lotes de 6 A população estimada para o local é de 1000 pessoas, conforme dados da Diretoria de Pesquisas Integradas, da Secretaria de Planejamento Urbano da Prefeitura Municipal de Uberlândia. 11

250,00 m², são organizadas no modelo tripartido: área íntima (dois quartos), social (sala) e serviços (cozinha, banheiro e área de serviço externa), conforme pode ser verificado na Figura 3, contando ainda com aquecimento solar. Observa-se na planta dimensões reduzidas, que levam à sobreposição das funções dos cômodos e diminuição da privacidade dos moradores, comprometendo o conforto e bem-estar dos mesmos. Figura 3. Planta da unidade habitacional no Residencial Jardim Sucupira. Fonte: VILLA, 2015. Pode-se observar, em visita ao conjunto habitacional, diversas modificações nas fachadas e fechamentos das unidades habitacionais, principalmente pela construção de muros, que podem ter sido construídos para dar maior segurança e privacidade aos moradores. 12

Figura 4. Modificações nas unidades habitacionais: à esquerda, edificação com muro em construção e à direita, fachada modificada pela presença de muro e paisagismo. Fonte: VILLA, 2015. Os dados apresentados a seguir são integrantes de uma pesquisa feita pela Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design da Universidade Federal de Uberlândia - UFU, em parceria com o IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, aplicada no final de 2014. A aplicação dessa pesquisa e levantamento de dados dos perfis familiares mostrou-se relevante, nesse momento, como estudo de caso e pré-teste para aplicação dos questionários e levantamento das demandas dos perfis familiares do conjunto habitacional Cidade Verde, objeto da pesquisa de mestrado anteriormente mencionada. A primeira etapa da pesquisa consistiu na aplicação de questionários in loco, através de entrevistas com moradores do empreendimento que se encontravam dentro de suas residências7. Foram entrevistadas um total de 60 famílias8 de um universo de 270, totalizando 228 pessoas. O questionário objetivou traçar um perfil dos moradores de empreendimentos do Programa Minha Casa Minha Vida, relacionando questões relativas à moradia, o trabalho, o estudo, a mobilidade urbana, renda, entre outras, comparando os custos de vida, comprometimento de renda e nível de satisfação dos moradores com o empreendimento e o entorno. Entretanto, nesse artigo, serão abordadas somente as questões relativas à formação dos arranjos familiares. 7 A aplicação dos questionários ocorreu nos dias 06 e 07 de dezembro de 2014, e envolveu 5 estudantes de graduação em Arquitetura e Urbanismo. 8 Essa amostragem representa 22,22% do total de domicílios do conjunto habitacional, não podendo, portanto, ser utilizada para demonstrar dados de todo o empreendimento, mas apenas dos entrevistados. 13

Assim, conforme os dados levantados nos questionários, verifica-se que há predominância de mulheres no empreendimento, constituindo-se 53,51%, frente à 46,49% de homens. Em relação à faixa etária, a faixa predominante é de adultos (56,14%), com idade entre 18 e 60 anos, seguida de crianças (20,61%), com idade até 11 anos; adolescentes (19,30%), com idade entre 12 e 17 anos, e por fim, idosos (3,95%), com idade após 60 anos. Nesse caso, verifica-se que em 9 domicílios (15%), há idosos residindo. Em relação ao estado civil, observou-se que, entre os adultos (total de 145 pessoas), a maior representatividade é de pessoas casadas, sendo baixa a representatividade de uniões consensuais e pessoas divorciadas. Nesse caso, os dados não espelham a tendência nacional, de aumento do número de divórcios e uniões consensuais, e diminuição do número de casamentos, conforme anteriormente mencionado. Estado Civil -maiores de 18 anos união consensual 4,14% viúvo 4,83% divorciado 1,38% casado 55,17% solteiro 34,48% 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% Figura 5. Estado civil. Fonte: Pesquisa Jardim Sucupira dezembro 2014. Em relação ao número de moradores por domicílio, a média é de 3,82 pessoas por domicílio, sendo a predominância de famílias formadas por 3 a 4 pessoas, que representam mais da metade. Pode-se destacar ainda a pequena representatividade do número de domicílios unipessoais: somente 1 morador, idoso; com isso, verifica-se uma discrepância em relação ao padrão nacional, em que verifica-se que mais de 10% dos domicílios são formados por famílias unipessoais; além disso, é bastante expressivo o número de domicílios com 5 14

pessoas ou mais. Vale lembrar que a residência é composta de 2 quartos, com área de 38,02 m², nesses casos, tornando-se bastante desconfortável abrigar um número elevado de pessoas. Número de moradores por domicílio 7 pessoas 6 pessoas 5,00% 6,67% 5 pessoas 16,67% 4 pessoas 28,33% 3 pessoas 23,33% 2 pessoas 18,33% 1 pessoa 1,67% 0,00% 5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% Figura 6. Número de moradores por domicílio. Fonte: Pesquisa Jardim Sucupira dezembro 2014. Em relação à posição familiar, os entrevistados declarados na posição de filho(a) representam quase a metade. Vale destacar que dos 108 entrevistados declarados com a posição de filho(a), 23 moradores têm mais de 18 anos e ainda residirem com os pais, de um total de 14 domicílios, representando 21,29% dos entrevistados que ocupam a posição de filho(a); além disso, desse universo, 8 pessoas tem entre 25 e 34 anos e ainda residem com os pais (7,4%), são a chamada geração canguru, sendo 3 moradores de uma mesma família. Verifica-se ainda, 4 pessoas na faixa dos 15 aos 24 anos, que não estudam e nem trabalham; nesse caso, o percentual é pouco representativo, apenas 3,7% do total de entrevistados na posição de filho(a). Esses dados demonstram um dos fatores de alteração nos arranjos familiares, a permanência dos filhos morando com os pais por mais tempo; tendo em vista que não há diferenciação de planta no conjunto habitacional, essa tendência pode levar ao adensamento excessivo das habitações. 15

Número de filhos por família 6 filhos 5 filhos 4 filhos 2,08% 4,17% 6,25% 3 filhos 25,00% 2 filhos 29,17% 1 filho 33,33% 0,00% 5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% 35,00% Figura 7. Número de filhos por família. Fonte: Pesquisa Jardim Sucupira dezembro 2014. Em relação às famílias que declararam coabitar com filhos (48 domicílios), famílias com até 3 filhos representam cerca de 85%; sendo a média de 2,25 filhos por grupo familiar. Portanto, os dados indicam um representativo número de filhos, bem acima da média nacional, de 1,77 filhos por mulher. Esse dado pode indicar, entre outros fatores, falta de acesso a serviços de saúde e falta de informação quanto a métodos contraceptivos. Além disso, pode-se destacar ainda que, novamente, o número elevado de filhos por domicílio pode gerar desconforto para os moradores da residência, especialmente em domicílios com três filhos ou mais. Posição familiar agregado outro parente irmã(o) sogro(a) pai/mãe neto(a) enteado(a) filho(a) cônjuge chefe 0,44% 1,32% 0,44% 0,88% 1,32% 3,51% 0,44% 17,54% 26,75% 47,37% 0,00% 5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% 35,00% 40,00% 45,00% 50,00% Figura 8. Posição familiar. Fonte: Pesquisa Jardim Sucupira dezembro 2014. 16

Dentre os que se declararam como chefe de família, a grande maioria, quase 75% são compostas por domicílios chefiados por homens. Sendo que do total de famílias chefiadas por mulheres (16 domicílios), 9 são compostas por famílias monoparentais (56,25%), formadas por mulheres que cuidam sozinhas dos filhos, netos, parentes ou agregados. Embora haja uma grande representatividade, ainda, de domicílios chefiados por homens, o número expressivo de famílias monoparentais chefiadas por mulheres espelha a tendência nacional, de domicílios chefiados por mulheres, o que pode ser influenciado pelo ingresso e fortalecimento da mulher no mercado de trabalho. Chefe de família por sexo Mulheres 26,67% Homens 73,33% 0,00% 20,00% 40,00% 60,00% 80,00% Figura 9. Posição familiar: chefe de família por sexo. Fonte: Pesquisa Jardim Sucupira dezembro 2014. Em relação aos perfis familiares dos domicílios levantados, verifica-se que a predominância é de famílias nucleares, representando 55% do total. É bastante representativo o número de famílias DINC - duplo ingresso e nenhuma criança (10,00%), entretanto, nesse caso, esse valor representa famílias que declararam que não havia ninguém na posição de filho(a) na residência, o que não quer dizer, necessariamente, que o casal não tenha tido filhos. Em relação às famílias monoparentais, formadas por mães que criam seus filhos sozinhas, representam mais de 11% do total, entretanto, esse número pode ser ainda maior, pois nos questionários verifica-se que, além de famílias monoparentais, ainda há outros arranjos familiares, como avós que criam netos, ou idosos que coabitam na residência. Em relação aos outros arranjos familiares (21,67%), representando 13 famílias, 3 são formadas por família 17

nuclear + sogro(a), 3 são formadas por monoparentais + neto(a), 2 são formadas por avós que criam neto(a) e 1 é formada por nuclear + neto(a). Verifica-se, ainda, que no caso de famílias que apresentam integrante na posição de neto(a), em sua maioria são monoparentais, chefiadas por mulheres, sejam mães ou avós. É importante destacar ainda que nesse caso não foi possível quantificar os arranjos familiares homossexuais ou transexuais, visto que esses dados não foram levantados na pesquisa. Perfis familiares Outros 21,67% Unipessoal 1,67% DINC 10,00% Monoparental 11,66% Nuclear 55,00% 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% Figura 10. Perfis familiares. Fonte: Pesquisa Jardim Sucupira dezembro 2014. Portanto, com base nos dados levantados, embora haja grande representatividade de novos arranjos familiares no conjunto habitacional Jardim Sucupira, pode-se identificar a predominância de famílias nucleares, chefiadas por homens, formadas por 3 a 4 pessoas, com até 2 filhos; assim, os dados referentes aos perfis familiares no local, reforçam a tendência nacional de transformações nos arranjos familiares. Torna-se imprescindível, nesse momento, não somente para o conjunto habitacional em estudo, mas em todos os outros que venham a ser projetados, a identificação das demandas desses diferentes perfis e a elaboração de projetos flexíveis que possam atender às diferentes necessidades dos moradores, de maneira que a arquitetura habitacional de interesse social se torne cada vez mais inclusiva. 18

4. Considerações finais Frente às considerações levantadas, pode-se inferir que embora ainda haja predominância de famílias nucleares tradicionais, elas não representam a totalidade do universo dos arranjos familiares, visto que o número de arranjos familiares não-nucleares tem crescido gradativamente nos últimos anos, como é o caso do conjunto habitacional Jardim Sucupira, em que verifica-se um representativo de número de arranjos familiares nãonucleares, entretanto não há diferenciação de tipologias de planta que possam atender às diferentes demandas dos mesmos. Infelizmente, no conjunto habitacional Jardim Sucupira, e no caso de muitos outros projetos habitacionais ofertados pela Prefeitura Municipal de Uberlândia, continuam sendo repetidos os modelos tradicionais miniaturizados de habitação, não utilizando novas técnicas de construção e redução de custos, e mantendo a convencional tripartição dos espaços, e a monofuncionalidade dos conjuntos habitacionais produzidos no século passado. Torna-se imprescindível, nesse momento, pensar a arquitetura considerando-se as necessidades dos novos arranjos familiares. É preciso entender que, em uma época na qual não existem estilos de vida iguais para todos, a alternativa é a diversidade, o pensamento complexo. (Montaner et. al., 2014, p. 217). Outrossim, de nada adianta pensar as habitações de maneira flexível e desierarquizada, sem que haja uma participação dos futuros moradores e usuários, que vão demonstrar as reais necessidades de cada grupo familiar, sendo que essas necessidades tem que ser levadas em consideração tanto na elaboração do projeto, quanto em avaliações pós-ocupação, objetivando identificar se as demandas levantadas na fase de projeto foram atendidas; com isso, a arquitetura, em especial a arquitetura habitacional de interesse social, poderá tornar-se inclusiva, atendendo aos anseios de todo e qualquer arranjo familiar. A necessidade de mudança de posturas em relação à produção habitacional de interesse social é grande, e o Programa Minha Casa Minha Vida, pela sua abrangência, poderia tornar-se um instrumento de aplicação de novas propostas e novas tecnologias para a habitação social, entretanto, apresenta-se somente com um modelo repetidor de antigas propostas. Ressalta-se, aqui, a importância da avaliação pós-ocupação nesse momento, com o 19

papel de aproximar as lideranças políticas e populares, no sentido de ofertar soluções urbanas e habitacionais de maior qualidade. 5. Referências ALFANO, Bianca. 2007. Homoparentalidades: gênero e reprodução na contemporaneidade. In: Anais do XIV Encontro Nacional da ABRAPSO Associação Brasileira de Psicologia Social. Rio de Janeiro, UERJ. Disponível em: http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/anexos/anaisxivena/ conteudo/pdf/trab_completo_199.pdf, acesso em 26/12/2014. Artigo técnico. BERQUÓ, E. et. al. 2006. Fecundidade em declínio: Breve nota sobre a redução no número médio de filhos por mulher no Brasil. NOVOS ESTUDOS. CEBRAP: São Paulo, nº 74, março 2006. Pp.11-15. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/nec/n74/29636.pdf. Acessado em 12/11/2011. Artigo técnico. BRASIL. Ministério das Cidades - Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. 2014. Pesquisa de satisfação dos beneficiários do Programa Minha Casa Minha Vida. Brasília, DF: MCIDADES; SNH; SAE-PR; IPEA. DIEESE. Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos. 2011. Anuário das Mulheres Brasileiras. São Paulo. Disponível em: www.dieese.org.br/anu/anuario MulheresBrasileiras2011.pdf, acesso em 18/02/2015. IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2014. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira. Rio de Janeiro: IBGE. LESTHAEGUE, R. 1995. The second demographic transition in western countries. In: Mason K.O. and Jerson, A-M (eds). Gender and family change in industrialized countries. Oxford: Clarendon Press. MONTANER, Josep Maria et. al. 2006. Habitar el presente: vivienda en España: sociedad, ciudad, tecnología y recursos. Ministerio de Vivienda. Madri, España. MONTANER, Josep Maria et. al. 2014. Arquitetura e Política: ensaios para mundos alternativos. São Paulo: Gustavo Gili. PEREIRA, Cláudia Morais et. al. 2012. A família homoparental: uma adaptação ou uma contraposição à norma? In: Anais do Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades. Niterói-RJ: ANINTER-SH/ PPGSD-UFF. Artigo técnico. 20

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