As Construções Denominativas na Diacronia do Português: entre o ativo, o passivo e o estativo Doutoranda: Gilcélia de Menezes da Silva Orientadora: Maria Clara Paixão de Sousa Universidade de São Paulo Goiânia, julho de 2013
1. Introdução As construções denominativas na história da língua portuguesa Objetivo central: fazer um levantamento histórico e descritivo das construções denominativas ao longo da história do português. Analisar a estrutura argumental dessas construções e sua evolução nos vários etapas da língua. Além disso: Analisar quais estruturas denominativas chegaram ao Português Brasileiro no período de sua formação.
2. Chamar e chamar-se Século 14: (a) Em aquella sazom, avya em Castella e em Allava hum mancebo dos mais nobres do reyno e dezianlhe per nome Vella. {CGE} (b) E assy se tornou com hum escud(ey)ro que avia nome Lopo Vazq(ue)z. {CGE} Século 15: (c) E foy ally logo morto hum escud(ey)ro de dom Samcho que se chamava Joham G(omça)ll(ve)z ( ) {ZPM} Século 16: (d) A êstes homens se deve a glória deste descubrimento, posto que Marco Polo Veneto tinha dado a conhecer estas Ilhas muito primeiro, chamando-lhes Zipango ( ) {Couto}
3. As construções com chamar-se Questão que se coloca no momento é: Como se deu a reanálise de chamar transitivo para o chamar estativo? Y X chama Z > Y chama Z(estativa PB) 1) Entender as construções com chamar-se no Português Médio. Que tipo de estruturas são essas? 2) Saber qual o estatuto do se nas construções com chamar-se no PM? Sepassivo? Se-indefinido? E no PB, em sentenças do tipo: Ela se chama Maria / Ela chama Maria?
4. A Gramática do Português Médio Características da Gramática do Português Médio: Alta incidência de sujeitos nulos; Uma posição imediata de proeminência à esquerda do verbo, que podia ser ocupada por qualquer constituinte discursivamente mais importante; Sujeitos fortemente associados ao papel temático agente e pós-verbal; Ordem padrão (X)VS;
5. O chamar transitivo no Português Médio X chama (a) Y Z, onde, X: Agente; Y: Designando; Z: Denominação (Perini, 2008) Padrão: Y (X)chama Z com X nulo (a) [Os Índios da terra]-x [lhe]-y chamam em sua língua [Hipupiára]-Z, que quer dizer demônio d'água. {Gandavo} O Designando (Y) podia ser topicalizado: (b) e [este atabaque]-y [chamaõ]-v [elles]-x [picha]-z (...) {CRB}. (c) [A esta fruta]-y chamam [_]-X [Ananázes]-Z {Gandavo}
6. O se-passivo Em geral os trabalhos com base no modelo gerativo de análise fazem as seguinte s considerações para as construções com se: Vendem-se salsichas construção passiva O se é um morfema de passiva que absorve o caso acusativo do verbo; assemelham-se às construções inacusativas. O DP argumento interno recebe o Caso Nominativo. Concordância entre o verbo e DP argumento interno; O DP argumento interno ocupa uma posição de sujeito [Spec, T] ou está associada a ela através de um expletivo nulo com qual forma uma cadeia;
7. O se-nominativo Vende-se salsichas construção ativa O se é o argumento externo do verbo de referência arbitrária, podendo ser substituído por alguém ; O verbo distribui normalmente os seus papéis temáticos. O se recebe o Caso Nominativo; A concordância se dá entre o pronome se e o verbo, não entre o DP argumento interno e o verbo; DP argumento interno recebe o caso Acusativo.
8. Outras análises: Raposo e Uriagereka (1996), Martins (2003) e Cavalcante (2011) Raposo e Uriagereka (1996): construções com do tipo Vendem-se salsichas / Salsichas vendem-se (com concordância) Não são construções passivas e sim construções ativas com se-indefinido; O DP argumento interno não está na posição sujeito [Spec, T]; Nem está ligado a uma categoria vazia (expletivo nulo); E construções do tipo Vende-se salsichas (sem concordância) construções ativas com se-genérico;
O DP argumento interno quando movido de sua posição de objeto ocupa uma posição na periferia esquerda da sentença, uma posição de tópico [Spec, F] especificador do núcleo F(orce), não a posição de [Spec, T], e se comporta como um tópico; Temos ambiguidade em: (a) Os especialistas consultaram-se durante a operação. Possui o traço [+humano]; Tem duas posições possíveis para o DP. Recíproco: [TP Os especialistas consultaramse durante a operação]. Indefinido: [FP Os especialistas][tp SE consultaram durante a operação].
(b)em que momento da operação os especialistas se consultaram? Não temos ambiguidade, somente a leitura recíproca: [FP Em que momento da operação] [TP os especialistas se consultaram? Pois o PP em que momento está ocupando a posição mais à esquerda;
Raposo e Uriagereka (1996) Como se dá concordância entre verbo e seu argumento interno plural? SE é um DP mínimo, possui traços semânticos reduzidos [humano], [indefinido]; SE checa o traço D de T, e recebe Caso nulo (como PRO); PE existem duas posições disponíveis para checar o nominativo, [Spec, T] e [Spec, F]. É em [Spec, F] que DP argumento interno checa o Caso Nominativo. O elemento que ocupa a posição [Spec, T] é o SE, como o SE-genérico das construções sem concordância.
9. E as construções com chamar-se no PM? São construções ativas com se-indefinido; [Y V se/se-v Z] ou [V-se Z], Y chama-se Z, onde Y tem o traço [-humano]. O Designando Y ocupa [Spec, F], de tópico; Checa o caso Nominativo; e o SE ocupa [Spec, T] e checa o Caso Nulo (a) [FP A segunda capitania que a diante se segue] [TP se chama Paranambuco]: a qual conquistou Duarte Coelho, e edificou sua principal povoação em um alto à vista do mar, que está cinco léguas desta ilha de Tamaracá, em altura de oito graus. (b) [FP A raiz] [TP se chama Mandioca], e a planta de que se gera é da altura de um homem pouco mais ou menos. (c) (Y) Chama-se Olinda, é uma das mais nobres e populosas vilas que há nestas partes. Y Tópico contrastivo está expresso na sentença anterior (a): [FP A principal povoação (...)] [TP se chama Olinda]
9. E as construções com chamar-se no PM? Casos de ambiguidade: se-indefinido ou serecíproco? Em sentenças do tipo Y chama-se Z, onde Y: Possui o traço [+humano]; Tem duas posições possíveis para esse DP: [Spec, T] leitura d o se-recíproco/ reflexivo [Spec, F] leitura do se-indefinido (c)e ela se chamasse Rainha; Recíproco: [TP ela se chamasse Rainha;]. Indefinido: [FP ela][tp SE chamasse Rainha;]. (d) porém ele nunca [TP se chamou Rei em sua vida] não é ambíguo
9.E as construções com chamar-se no PM? Quando a posição de tópico ([Spec, F]) na periferia esquerda da sentença está preenchida: Ou por um sintagma topicalizado que não seja o Designando Y; Ou por um complementalizador a ordem se altera. (c) ( ) esto porque [FP em grego] [se]-x chama [este planeta]-y [Cronõ ou Cronos]- Z {ZPM} (d)( ) e [FP assi]-z [se]-x chamava [esta dona Tareyja]-Y.
10. Martins (2003) As passivas com se são fósseis no PE atual; No PE não existe o SE-passivo; A construção com concordância possui uma estrutura ativa; Características das passivas (até o séc. XVI) Limita-se aos verbos transitivos; Concordância obrigatória entre o verbo e o seu argumento interno; Expressão opcional do agente da passiva
11. Cavalcante (2006;2011) Realizou uma análise quantitativa em textos do Corpus Tycho Brahe de autores nascidos entre os séculos XVI e XIX; Observou o comportamento dos DPs Sujeitos e comparou com o dos DPs argumentos internos das construções com se; Os DPs argumentos internos das construções com se se comportaram como objetos e não como sujeitos; A mudança que aconteceu com o sujeitos tanto das ativas como das passivas analíticas não afetou os DPs argumento internos da construções com se. A partir do séc. XVII a expressão do agente da passiva não era possível nas construções com se.
Evidências para tratar se chama como transitivo A dos Jodoxum: [êstes]-x adoram [um idolo]-y, a que chamam [Amida]-Z: e crem que tôdas as vezes que o nomeam, ficam absoltos de seus pecados; e tem [um templo]-y alevantado a êste ídolo, que [se]-x chama [o Paraiso de Amida]-Z, em que estam todos os ídolos de vulto que adoram; e afirmam, que tem mais de dous mil de diferentes feições, (assim como acima dissemos no Capítulo I do Livro V que Marco Polo escreve).
12. E as passivas no PM? São as passivas analíticas: (a) [CGE_S_11296] Em aquelle tempo era custume que todallas filhas dos reis eram chamadas raynhas e assi se chamava esta dona Tareyja.{CGE} (b) (...) a quall torre emtaõ hera chamada de Madraba &, pella muyta comtinuaçaõ que aquelle fidallgo ally cõtinuo, omde fez açaz homrrosos feitos em armas, chamarom aaquella torre d'allv(a)ro Memdez, como se ymda oje chama.
Próximos passos Vamos examinar os séculos seguintes para mostrar como chamar passa de: PARA: Y chama-se Z: Transitivo: Y X chama Z X chama Y Z Estativo (a) Eu chamo-me Maria. (PE) (b) Eu me chamo Maria (PB) Y chama Z - (c) Eu chamo Maria (PB)
Referências Bibliográficas Cavalcante, S. R. O. (2006) O uso de SE com infinitivo na história do Português: do Português Clássico ao Português Europeu e Brasileiro modernos. Tese de Doutorado. IEL/ Unicamp. Cavalcante, S. R. O. (2011) O se-passivo é passivo? Revisitando as construções com SE na história do Português. Mateus, M. H. M. et al.(2003) Gramática da Língua Portuguesa. Lisboa: Caminho. Martins, A. M. (2003) Construções com se: mudança e variação no português europeu. Em Razões e Emoções: Miscelânea de Estudos em Homenagem a Maria Helena Mateus, ed. Ivo Castro e Inês Duarte, volume 2, 163 178. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda. Menezes da Silva, G.. A Valência do Predicador Chamar na Diacronia do Português. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2010. Paixão de Sousa, M. C.; Menezes da Silva, G.. A diacronia do verbo Chamar e a proeminência à esquerda no português. 2009. (Apresentação d e Trabalho/Simpósio). Paixão de Sousa, M. C.. Tópicos, Sujeitos e Agentes no Português Médio e no Português Brasileiro: Hipóteses para uma Mudança Gramatical. In: II Congresso Internacional de Linguística Histórica - Castilho, 2012, São Paulo. Resumos, 2012. Perini, M. A. (2008). Estudos de Gramática Descritiva: As Valencias Verbais. São Paulo: Parabola. Ranchhod, Elisabete M. (1999), Construções com Nomes Predicativos na Crónica Geral de Espanha de 1344. In: Lindley Cintra. Homenagem ao Homem, ao Mestre e ao Cidadão, pp. 667-682, organização de Isabel Hub Faria, Lisboa: Cosmos. Raposo, E.; Uriagereka, J. (1996) Indefinite SE. Natural Language and Linguistic Theory :749 810.
Obrigada!!!