PRÁTICA PROCESSUAL PENAL EXERCÍCIO PRÁTICO N. 05 RECURSO Como advogado do réu, elabore o recurso cabível contra a sentença abaixo proferida. Processo n. 1234/2008 Ação penal pública Autor: MPF Réu: TÍCIO MANUELINO S E N T E N Ç A DIREITO PENAL. ESTELIONATO CONTRA A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CP, 171, 3º). Entidade de economia popular. Precedentes do STJ. Autoria e materialidade comprovadas. Confissão espontânea. Impossível atenuação da pena abaixo do mínimo legal. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e multa indeferida. Procedência da pretensão punitiva. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO PENAL PÚBLICA promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra TÍCIO MANUELINO, já devidamente qualificado nos presentes autos, dando-o a peça denunciativa como incurso no art. 171, 3º, do Código Penal brasileiro. Consta da denúncia (f. 03-8) que MÉVIA LILICA havia promovido, juntamente com outros servidores, a reclamação trabalhista n. 432/93 perante a vara única do trabalho de MONTEIRO/PB, com o objetivo de auferir repercussão financeira de 26,05% decorrente de planos econômicos do governo federal, tendo a demanda sido julgada procedente e expedido o respectivo precatório. No que dizia respeito à sua cota-parte, o valor de R$ 20 mil fora devidamente resgatado. Ocorre que, em meados de junho de 2005, aquela senhora tomou conhecimento de que seu sindicato havia movido como substituto processual dos
servidores (inclusive ela), uma outra reclamação com objeto idêntico. Uma vez que fora procedente a demanda, os valores devidos a cada substituído lhes estariam disponíveis na conta n. 999-9, agência n. 99, da CAIXA. A referida senhora informou, contudo, que não receberia esse dinheiro por já havê-lo recebido em decorrência da ação por si ajuizada individualmente. Ocorre que, no exercício de 2007, fora incluída na malha fina da Receita Federal por não ter declarado o recebimento dos valores referidos no parágrafo anterior. Ao procurar informações junto à CAIXA, descobriu que o acusado TÍCIO MANUELINO, funcionário do sindicato, sacou, em 23/01/2006, a importância de R$ 20 mil que estava creditada em nome da Sra. MÉVIA LILICA em decorrência da ação coletiva. Para tanto, diz a denúncia que o acusado utilizou-se de um instrumento procuratório grosseiramente falsificado, inclusive com um selo do cartório Álvares de Azevedo referente a registro de títulos ou registro de pessoas, datado de 09/01/2006. O MPF pediu, assim, a condenação do acusado como incurso no art. 171, 3º, do CP. Denúncia recebida em 10/07/2009 (f. 10). TÍCIO MANUELINO apresentou sua defesa (f. 16-30), sustentando que fora dependente químico de crack, o que lhe teria causado imensos prejuízos de ordem familiar e social. Após alguns meses em uma clínica de reabilitação na cidade de Campina Grande/PB, retornou ao convívio da sociedade e hoje é uma pessoa religiosa, voltada para a família, desenvolvendo atividades de colaboração social na comunidade em que vive. Pugnou pela concessão da suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9099/95). Salientou seus bons antecedentes e sua boa conduta social. Indicou quatro testemunhas e juntou documentos. Em audiência, foram ouvidas testemunhas, bem como interrogado o acusado TÍCIO MANUELINO (f. 77-81). As partes, ainda em audiência, registraram nada haver a requerer como diligências complementares e apresentaram suas alegações finais oralmente, para registro no termo. O MPF sustentou ter ficado provada a materialidade e a autoria do fato, pedindo a condenação do acusado, levando-se em conta as atenuantes que menciona e que entende faria jus o réu. A defesa, de sua parte, salientou a confissão do acusado e pediu a substituição de eventual pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, considerando-se também as atenuantes previstas nos arts. 66 e 65 do CP. Autos conclusos para julgamento. Brevemente relatados. DECIDO.
FUNDAMENTAÇÃO Não havendo preliminares a decidir, passo ao mérito. O MPF atribui ao acusado a prática do crime previsto no art. 171, 3º, do Código Penal, imputando-lhe a conduta de haver recebido a quantia de R$ 20 mil em nome de MÉVIA LILICA em data de 23/01/2006, utilizando-se para isso de um instrumento procuratório grosseiramente falsificado, fazendo incidir em erro a CAIXA, obtendo assim, em prejuízo dessa última, proveito patrimonial ilícito. O fato em si não foi negado pelo acusado, seja na fase inquisitorial, seja na fase judicial. Acrescentou apenas que assim agiu em razão de sua condição de dependente químico usuário de crack, de modo que praticou o fato para saciar seu vício em relação ao entorpecente. Após sua reabilitação, passou a ter boa conduta social, inclusive mediante a prestação de trabalho comunitário, atuando como educador social. Eu audiência, a testemunha CARLA CARLOTA JOAQUINA afirmou conhecer o acusado como uma boa pessoa, bom pai de família, profissional dedicado e de bom trato social. Sobre o fato denunciado, disse ter ouvido falar que o acusado recebeu um dinheiro indevidamente por motivo de drogas, salientando acreditar que, nessa época, o acusado ainda estava envolvido com drogas. A testemunha MARY MARICOTA FELISMINA afirmou ter conhecimento de que o acusado desenvolve um trabalho voltado aos meninos de rua. Tem conhecimento de que o acusado freqüenta um grupo destinado a recuperados da dependência química. Sobre o fato denunciado, disse nada ter conhecimento. Sendo assim, parece-me ter ficado suficientemente demonstrada a materialidade e a autoria do fato narrado na denúncia. Outrossim, a confissão espontânea do acusado não deve ser admitida, pois não me pareceu que tenha sido sincera, sugerindo que a confissão tem como objetivo exclusivamente a obtenção do benefício do CP, art. 65, III, d. Passo à fixação da pena. FIXAÇÃO DA PENA Examinando as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP e levando em conta os limites abstratos previstos para o art. 171, caput, do CP, fixo a pena-base em 2 (dois) ano de reclusão. Não encontro qualquer circunstância agravante aplicável ao caso, de modo que, nessa fase, não pode haver qualquer aumento. Embora reconheça que o
réu confessou espontaneamente, entendo que não se aplica a atenuante porque sua confissão não pareceu sincera. Em razão disso, mantenho a pena-base. Por fim, observo que se aplica ao caso em questão a causa especial de aumento de pena prevista no art. 171, 3º, do Código Penal brasileiro 1, motivo pelo qual aumento a pena em 1/2 (metade), fixando-a definitivamente em 3 (três) anos de reclusão, para cumprimento inicial em regime semi-aberto (CP, art. 33, 2º, c ). Considerando a fundamentação acima e atendendo aos limites previstos no art. 49 do CP, fixo a pena de multa cumulativa em 100 (cem) diasmulta. Consoante as provas sobre a situação financeira do réu constantes dos autos ( 1º), fixo o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato (janeiro/2006), reajustado até o pagamento ( 2º). Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos por entender que a culpabilidade do réu não indica que a medida seja suficiente para prevenir e reprimir a criminalidade. Deixo de lhe conceder o benefício da suspensão condicional da pena por ausência do elemento objetivo (CP, art. 77). Concedo ao réu, por outro lado, o direito de recorrer em liberdade. DISPOSITIVO Diante do exposto, com fundamento no art. 387 do Código de Processo Penal, julgo procedente a pretensão punitiva para condenar o acusado TÍCIO MANUELINO como incurso no art. 171, 3º, do Código Penal. Em razão disso, fixo-lhe as seguintes penas: a) Uma pena privativa de liberdade de 3 (três) anos de reclusão para cumprimento em regime inicial semi-aberto; b) Uma pena de multa de 100 (cem) dias-multa, ficando definido o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato (janeiro/2006), devidamente corrigido até o pagamento. Custas ex lege. 1 PENAL. ESTELIONATO EM DETRIMENTO DA CEF. CAUSA DE AUMENTO DE PENA DO ART. 171, 3º, DO CP. OCORRÊNCIA. 1 - Em face de a Caixa Econômica Federal - CEF haver suportado os ônus decorrentes da emissão de cheque sem suficiente provisão de fundos, o estelionato subsume-se à moldura do 3º, do art. 171, do CP e não naquela descrita no "caput" do dispositivo, porquanto, mais do que instituição financeira, a CEF qualifica-se como entidade de economia popular. 2 - Recurso especial conhecido e provido. (REsp 175.419/PR, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/1998, DJ 01/03/1999 p. 387).
Transitada em julgado a presente sentença, após a devida certificação, deverá a secretaria da vara: a) preencher e remeter ao IBGE o boletim individual do acusado; b) lançar-lhe o nome no rol dos culpados; c) oficiar ao TRE/PB para os fins do art. 15, III, da CF/88; d) remeter os autos ao juízo das execuções penais para o cumprimento das penas. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Notifique-se o MPF. João Pessoa, 10 de março de 2010. JUIZ FEDERAL