Análise espacial da distribuição do dengue no município do Rio de Janeiro e os fatores associados à ocorrência do Aedes aegypti.

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Transcrição:

Análise espacial da distribuição do dengue no município do Rio de Janeiro e os fatores associados à ocorrência do Aedes aegypti. Izabel Cristina dos Reis Resumo O objetivo desse trabalho é identificar os fatores que contribuem para o aumento ou diminuição do mosquito Ae. aegypti nas áreas urbanas do município do Rio de Janeiro. Para isso foram adquiridos casos notificados de dengue de todo o município entre os períodos de janeiro/07 a março/2008 e dados entomológicos (número de ovos e mosquito adulto) restrito a três áreas do município (Higienópolis, Palmares e Tubiacanga) entre os períodos jan-mar/07 (verão 1), jun-setembro/07 (inverno) e jan-mar/08 (verão 2). Os dados entomológicos foram oriundos da implantação de armadilhas de oviposição (ovitrampas e mosquitraps) em 80 domicilios sorteados em Higienópolis, Tubiacanga e Palmares. Os casos de dengue foram geocodificados e espacializados e logo após foram gerados mapas de incidência da dengue no software R 2.8.0 utilizando o interpolador Kernel com correção de borda, raio de 250m e função quártica. Os dados entomológicos foram tratados para serem usados no modelo multinível da regressão. Foram testados a normalidade pelo teste de Kolmogorov-smirnov e a correlação entre o número de ovos/mosquitos nas armadilhas de oviposição e as variáveis explicativas escolhidas através do inquérito aplicado aos domicílios onde se localizava as armadilhas. Como resultado os bairros mais afetados pela doença estão localizados no centro e na zona sul (maioria dos bairros são classe médiaalta), norte e oeste do município, indicando que a dispersão da doença não apresenta barreiras socioeconômicas atingindo bairros considerados de classe média-alta, como os bairros de Copacabana e Urca e também bairros de classe baixa como Cidade de Deus e Gardênia. E as variáveis explicativas escolhidas para o modelo não apresentaram correlação com a variável resposta, impossibilitando a aplicação do modelo multinível. Palavras-chaves: Dengue, Aedes aegypti, Modelo multinível, interpolador Kernel

Introdução O dengue é considerado a mais importante arbovirose transmitida por mosquitos ao homem, tendo-se em conta a sua morbidade e mortalidade 1. Os agentes etiológicos são quatros sorotipos virais antigenicamente distintos (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV- 4) 2. No Brasil o principal vetor dos agentes, o mosquito Aedes aegypti, acha-se disseminado em todos os estados brasileiros 3. Dentre as regiões do Brasil, o estado do Rio de Janeiro tem sido um dos maiores responsável pelo elevado número de casos de dengue registrados no país. Desde 1986, o Rio de Janeiro tem sido marcado por várias epidemias de dengue, começando com DENV- 1, seguida por DENV-2 e DENV-3 4,5. Recentemente, entre os meses de janeiro a outubro de 2008, o estado do Rio de Janeiro registrou 249.734 casos, sendo aproximadamente a metade desses (125.988) pertencentes ao município do Rio de Janeiro (Secretária de Saúde e Defesa Civil). Com este histórico o estado do Rio de Janeiro demonstra ser o mais receptivo para a introdução e disseminação de novos sorotipos do dengue 6,7. A dificuldade de controle da doença em áreas favoráveis a dispersão do vetor e da doença como o Rio de Janeiro está relacionado à limitação de recursos, à grande extensão e principalmente à heterogeneidade do espaço urbano 8. Entender a estrutura e a dinâmica espacial da doença ou do seu vetor permite caracterizar a situação em que ocorrem eventos de saúde 9. Segundo Halstead et al 10, o padrão de transmissão da dengue é influenciado por alguns fatores relacionados à ecologia e biologia do vetor; o nível de imunidade da população para a circulação do sorotipo; densidade, movimentação e distribuição de humanos; e o tempo requerido para o desenvolvimento do vírus no vetor. Além de outros fatores como o padrão sazonal, principalmente no verão com altos índices pluviométricos e altas temperaturas 11. Este trabalho tem como objetivo identificar os fatores que contribuem para o aumento ou diminuição do mosquito Ae. aegypti nas áreas urbanas do município do Rio de Janeiro.

Metodologia Área de estudo. O município do Rio de Janeiro está situado na região sudeste do Brasil, ao sul do estado do Rio de Janeiro (Figura 1) e possui aproximadamente 6.093,472 habitantes, sendo a segunda maior aglomeração urbana do Brasil 12. Figura 1 Localização da área de estudo do Município do Rio de Janeiro. Fonte: Laboratório de Geoprocessamento ICICT-FIOCRUZ/RJ A cidade apresenta clima tropical com temperaturas médias anuais de 23,1ºC e volume pluviométrico acumulado anual de 1.086mm 13. Para este estudo foram escolhidas três áreas de aproximadamente 500 x 500m dentro dos bairros de Higienópolis, Galeão e Vargem Pequena para a implantação de armadilhas de oviposição (ovitrampas e mosquitraps). No bairro do Galeão a área compreende a comunidade de Tubiacanga (22º47 08 S 43º13 36 W), no bairro de Vargem Pequena a área engloba uma comunidade carente denominada Palmares (22º 59 26 S 43º 27 36 W). As áreas de estudo apresentam diferença na densidade populacional, no nível de saneamento e na cobertura vegetal. Aquisição dos dados. Nesse estudo foram utilizadas duas bases de dados: os casos notificados de dengue para todo município do Rio de Janeiro (jan/07 março/08) e os dados de infestação do vetor para Higienópolis, Palmares e Tubiacanga (jan07-março/08) fornecidos pela Secretária de Vigilância Epidemiológica do município do Rio de Janeiro e pelo Laboratório de Transmissores de Hematozoários do Instituto Oswaldo Cruz - FIOCRUZ/RJ, respectivamente.

Todos os casos da doença foram geocodificados através do endereço de residência utilizando o software TerraView 3.2.0. A base de arruamento utilizada no processo foi cedida pelo Laboratório de Geoprocessamento da Fiocruz. Após a espacialização das ocorrências foram gerados mapas de incidência de dengue no software R 2.8.0 utilizando o interpolador Kernel com correção de borda, raio de 250m e função quártica. Os dados entomológicos foram oriundos da implantação de armadilhas de oviposição em três áreas pertencentes ao município do Rio de Janeiro. As coletas foram realizadas, semanalmente durante um ano e três meses tendo início em outubro de 2006 e término em março de 2008. As informações foram agrupadas em três períodos do ano: (1) de janeiro a março de 2007, que corresponde ao verão1 e (2) de junho a setembro de 2007, inverno e (3) janeiro a março de 2008 ao verão 2, os outros períodos foram descartados nessa análise. Em cada área foram sorteados 80 domicílios, sendo que 40 casas receberam ovitrampas e as outras 40 mosquitraps, perfazendo um total de 240 armadilhas. As ovitrampas consistem em um recipiente plástico de cor preta contendo aproximadamente 270 ml de água e 30 ml de infusão de feno e uma paleta de eucatex utilizada para oviposição 14. Já as mosquitraps são constituídas de um vaso preto com uma abertura na parte superior, que permite a entrada do mosquito. A armadilha contém água, cartão adesivo e um atraente (AtrAedes TM Ecovec Ltda), que libera um odor que atrai o mosquito, substituindo a infusão de feno. Ao entrar nesta armadilha em busca de local para a oviposição, a fêmea do mosquito inseminada fica presa na cola do cartão 15. As paletas das ovitrampas e os cartões das mosquitraps foram transportados para o Laboratório de Transmissores de Hematozoários do Instituto Oswaldo Cruz. Nesse laboratório, os ovos das paletas foram contados e os adultos das mosquitraps foram contados e identificados através da chave dicotômica de Consoli & Lourenço-de Oliveira (1994) 16. Análise estatística. Na análise estatística dos dados foi utilizado o modelo multinivel da regressão que leva em consideração a dependência entre as observações dispostas numa estrutura hierárquica 17. A hierarquia tem como base que indivíduos dentro de um mesmo nível tendem a ser mais semelhante quando comparado a indivíduos aleatoriamente amostrados de todo a

população 18. Isso viola o pressuposto da regressão tradicional que tem como base a independência de observações 17. O modelo multinível considera a interação intra e entre grupos e a integração de variáveis do menor e maior nível, permitindo compreender como a variável dependente é afetada pelas características do indivíduo e a forma como esta relação diferencia-se entre os grupos (Oliveira, et al, dados não publicados). O modelo multinível da regressão é dado pela equação (1) abaixo: y = + β x + ( u + e ij α (1) 1 ij j ij Onde: Os termos em parênteses representam a parte aleatória do modelo e estão relacionados aos resíduos de maior e menor níveis, respectivamente. Os termos fora dos parênteses representam a parte fixa do modelo caracterizado por: α : intercepto - é a média da categoria de referência β1 : coeficiente variável de nível 1 (xij) As variáveis explicativas do nível domicilio (2) utilizadas no modelo foram: área externa, freqüência no abastecimento de água, freqüência na coleta de lixo, criadouro no quintal, grau de sombreamento e atividade do controle do vetor. Essas variáveis foram escolhidas com base na literatura. No nível 1 (armadilha), a variável explicativa foi a localização da armadilha no domicilio, exposto ao sol ou a sombra. A variável dependente foi o número de ovos e mosquitos nas armadilhas nos três períodos de tempo (verão1, inverno, verão 2). Foi testado a normalidade das variáveis respostas utilizando o teste de Kolmogorov- Smirnov e a correlação entre as variáveis respostas e explicativas. Os software utilizados foram o SPSS versão 14.0 e o MLwiN Trial 2.0. ) Resultados e discussão Análise espacial do padrão de pontos. Na geocodificação dos endereços dos casos notificados de dengue foram localizados 29.481 casos dos 38.199 analisados. Na figura 2, pode-se verificar o padrão de distribuição espacial dos casos de dengue no município do RJ durante os períodos endêmicos (2007) e epidêmicos (2008). Observou-se um aumento no

número de casos entre os meses de fevereiro a maio/07, uma redução no período de junho a setembro/07 e um novo aumento em novembro/07. Os períodos com elevado pico da doença coincidem com altos índices pluviométricos, como pode ser observado na figura 3. A dinâmica do dengue e a densidade do Ae. aegypti têm seguido um padrão sazonal, apresentando picos elevados durante o verão, quando ocorre altos índices pluviométricos e altas temperaturas são registrados 9 (Honório dados não publicados). Os bairros mais afetados são localizados no centro e na zona sul (maioria dos bairros são classe média-alta), norte e oeste do município, indicando que a dispersão da doença não apresenta barreiras socioeconômicas atingindo bairros considerados de classe média-alta, como os bairros de Copacabana e Urca e também bairros de classe baixa como Cidade de Deus e Gardênia.

Figura 2 Padrão de distribuição de casos notificados de dengue no município do Rio de Janeiro entre janeiro de 2007 a março de 2008.

250 200 Precipitação (mm) 150 100 50 0 jan fev Precipitação (mm) mar abr mai jun jul ago set out Mês nov dez jan/08 fev/08 mar/08 Figura 3 Média das estações pluviométricas do município do Rio de Janeiro. Fonte: Fundação Instituto de Geotécnica do Município do Rio de Janeiro. Análise do modelo multinível. As variáveis respostas apresentaram distribuição normal com p<0.05, porém testando a correlação entre as variáveis respostas e as variáveis explicativas escolhidas ao nível do domicílio e da armadilha pode-se observar que não houve correlação. Alguns fatores podem ser apontados. O primeiro deles é que as variáveis escolhidas para a análise não podem analisadas sozinhas, pois sozinhas elas não expressam importância para o problema estudado. Outro problema apresentado foi à escolha dos níveis. Uma das bases do modelo multinível é determinar os níveis hierárquicos relevantes para o estudo. Nesse estudo utilizou o nível armadilha e domicilio. Entretanto outros níveis devem ser determinados, pois a variável escolhida para o nível 1 não é suficiente e tão importante para o problema. Um dos motivos como em todos os domicílios amostrados havia a presença de uma única armadilha (ovitrampa ou mosquitrap), as características do maior nível (domicílio) foi atribuída ao menor nível (armadilha). Não respeitando a base do modelo, a dependência entre níveis 15. Nesse caso o nível 1 poderia ser o domicilio e o nível 2 o setor censitário onde estão inseridas essas três áreas de estudo. No trabalho realizado por Harrington et al (2008) 18 na Tailândia, no intuito de identificar a influência do tamanho, localização e tempo para a oviposição das fêmeas de Ae. aegypti, com o modelo multinivel foi possível determinar qual o fator que contribuía para o aumento da oviposição. As variáveis de mais importância estavam relacionadas ao menor nível (nível das armadilhas) sendo elas o volume, área de superfície da água e o diâmetro.

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