MULTICULTURALISMO: UM DESAFIO PARA O EDUCADOR 1



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Transcrição:

1 MULTICULTURALISMO: UM DESAFIO PARA O EDUCADOR 1 Lucinete Ornagui de Oliveira 2 Francisca de Assis Silva 3 RESUMO: No presente artigo, pretendemos fazer uma discussão acerca do multiculturalismo e suas implicações no contexto educacional, buscando mostrar que não são as leis que rompem o racismo, mas as práticas pedagógicas do professor como mediador do processo ensino afro-brasileiro como formador do futuro de nossos alunos e cidadãos negros. Busca analisar se a ação pedagógica do professor que leciona em uma sociedade racista, excludente e desigual possibilita o combate ao racismo e a construção de identidade. Palavras-chave: Educação. Multiculturalismo. Prática Pedagógica MULTICULTURALISM: A CHALLENGE FOR THE EDUCATED ABSTRACT: In this paper, we make a discussion of multiculturalism and their implications in the educational context, seeking to show that there are laws that disrupt racism, but the pedagogical practices of the teacher as facilitator of the teaching african-brazilian as trainer of the future of our students and black citizens. It aims to analyze whether the pedagogical action of the teacher who teaches in a racist society, enables the exclusionary and unequal combat racism and identity construction. Word key: Education. Multiculturalism. Pedagogical Practice 1 Texto elaborado inicialmente como parte da Monografia submetida a aprovação da Coordenação de Pós-graduação, pesquisa e Extensão para obtenção de grau de Especialização em Relações Raciais em Educação em 2006. 2 Pedagoga, Especialista em Metodologia e Didática de Ensino Superior pela Universidade de Cuiabá e Especialista em Educação Racial em Educação pela UFMT. Docente da rede Estadual de Educação do Estado de Rondônia e do Centro de Universidade de Várzea Grande. 3 Psicóloga, Especialista em Relações Raciais em educação. Docente e Coordenadora de Estágio do Centro Universitário de Várzea Grande.

2 Durante muito tempo acreditava-se que o Brasil, conhecido pela sua diversidade étnica e cultural, era um país de igualdade, onde brancos e negros conviviam harmoniosamente sem preconceito ou discriminação. Acreditava-se que a democracia racial era a base das relações no contexto social brasileiro, com igualdade de oportunidade para brancos, pretos e mestiços. Apoiado pelo argumento de que a ascensão social se dava por critérios de classes e não por discriminação racial, de cor, e que não havia violência entre brancos e negros. No entanto, no decorrer da história fica claro que a desigualdade, o preconceito, a discriminação e a exclusão social permeiam ainda hoje nossa sociedade. Ao estudarmos história, descobrimos que a diversidade cultural é responsável pelo desenvolvimento material e cultural da humanidade. No entanto, falar em multiculturalismo no âmbito escolar, ainda hoje, gera uma discussão entre a teoria e a prática. Segundo Assis (2003) o multiculturalismo é a valorização da diversidade cultural eliminando preconceitos e estereótipos construídos historicamente, buscando formar uma sociedade alicerçada no respeito e dignidade do outro com suas diferenças. Portanto, é preciso pensar nas diferenças dentro de suas diferenças e o multiculturalismo abre espaço para refletir a complexidade e as divergências classificatórias da atualidade. Ancorada na abordagem crítica, o multiculturalismo favorecerá um repensar da prática pedagógica para romper com os mecanismos sutis de ordem real e imaginário, propiciando a práxis reflexiva e interventiva.

3 Assim, valorizar as diferenças étnicas e culturais não significa aderir aos valores do outro, mas respeitá-los em suas diferenças, eliminando preconceito e estereótipos. Vivenciar esta diferença faz parte do nosso contexto, e é através da diversidade que devemos construir nossa identidade. Assim, a questão da diversidade vem suscitando intenso debate no contexto político, social e acadêmico, objetivando uma práxis pedagógica de valorização a pluralidade cultural. Diante disto, os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), traz como um dos temas Transversais a Pluralidade Cultural, pois acredita que é a valorização do ser integral com suas raízes culturais que possibilitaremos uma educação baseada na justiça e igualdade. [...] respeitar e valorizar as diferenças étnicas e culturais não significa aderir aos valores do outro, mas sim repeitá-los como expressão da diversidade, respeito que é, em si, devido a todo ser humano, por sua dignidade intrínseca, sem qualquer discriminação. ( PCNs, 2001:20) É na escola que a criança convive com um número maior de diversidade, podendo assim, compreender e aprender com as diferenças, porém é também na escola que ela muitas vezes aprende a discriminar e disseminar o preconceito. Mudar mentalidades, superar o preconceito e atitudes discriminatórias são finalidades que envolvem lidar com valores de reconhecimento e respeito mútuo, o que é tarefa para a sociedade como um todo. A escola tem papel crucial a desempenhar. ( Id ibem, 2001:23) Assim, trabalhar a Pluralidade Cultural ou Multiculturalismo no contexto escolar é rever todas as práticas educacionais e atitudes, é oferecer aos alunos oportunidades para que possam buscar as origens de sua identidade, valorizando as culturas, promovendo a auto-estima. É pensar na inclusão de temáticas sócio-culturais e

4 suas implicações para a prática pedagógica. É o olhar do professor que deverá ser revisto para aumentar a possibilidade de uma reflexão e uma praticidade. Ao abordar a temática racial em educação, propostas pedagógicas ou curriculares o professor deve ter clareza de sua finalidade e a que se propõe. Segundo Assis (2003) não são os conteúdos ou as informações que carregam as relações sociais que vão gerar a reprodução social ou cultural, mas formas de transmissão com seus isolamentos e controles. Nesse sentido, o propósito do multiculturalismo não é restringir o ensino afro-brasileiro à simples discussão folclórica e comemoração cívica, mas à desconstrução do processo discriminatório da identidade negra. Por isso, Assis adverte que ao buscar um referencial teórico para mudança o professor deve ser criterioso na seleção do conteúdo e na apresentação deste para não acarretar desvio do real intenção do multiculturalismo, que é o combate a discriminação racial. Nesse sentido, compreender a pluralidade cultural significa compreender a pluralidade de identidades, elas próprias construídas sobre marcadores identitários plurais (Grant, 2003), constituídos de raça, etnia, gênero, classe social, cultura, linguagem e outros determinantes, em interação dinâmica. Isto significa que cada identidade seria constituída na hibridização, isto é, no movimento de articulação e síntese dinâmica entre estes determinantes (ASSIS, 2004:712). Desse modo, o negro para ser reconhecido e valorizado na sociedade brasileira não precisa usar cabelo negro ou roupas africanas para se auto-afirmarem, e sim, construir uma identidade respaldada na origem africana. Segundo Assis & Canen (2004) é na africanidade, com seus derivados religiosos, lingüísticos e culturais, que o professor deve buscar referencial para construir a identidade negra no contexto escolar.

5 Para Assis ( 2003) trabalhar com o conceito de hibridização é compreender que o negro não é puro essencialista, mas a construção da resignificação dos fenômenos, ou seja embora o fenômeno não sofra modificações, as pessoas sofrem modificações. O desafio maior para a educação antiracista e antidiscriminatória, na perspectiva do multiculturalismo crítico, é o de trabalhar no horizonte das identidades híbridas sem, no entanto, diluir os marcadores identitários que as constituem e que são objeto de preconceitos e discriminações a serem ativamente problematizados (OLIVEIRA, 2001: 71). Os PCNs (1997) nos chama a atenção para o seguinte conceito cultura não é algo fixo e cristalizado que o sujeito carrega por toda a sua vida como um peso que o estigmatiza, mas é elemento que o auxilia a compor sua identidade. Isso significa que cada cultura tem sua história, sua características e que nenhuma deve prevalecer em detrimento da outra. Segundo Oliveira (2001), não se pode continuar construindo currículos sobre a base da universalidade, partindo de contexto simbólicos de valores raciais e culturais dominantes. E que os maiores desafios é pensar em políticas e práticas que valorizem a pluralidade cultural e desafiadora dos estereótipos e preconceitos. multiculturalismo não é uma doação: trata-se do resultado de lutas históricas por reconhecimento identitário em espaços públicos, travado por movimento social. Uma proposta curricular que norteia os trabalhos pedagógicos em todos os contextos escolares, não deve ser visto como algo pronto e acabado mas sim, como alternativa ampla, dinâmica e flexível com base teórica que tem como propósito orientar a práxis educacional. Para Kramer (l999) uma proposta pedagógica expressa os valores da realidade a qual está ligado, seu objetivo e problema construído com a participação de todos os elementos envolvidos no contexto escolar, levando em consideração, suas

6 necessidades, especificidades e sua realidade. Isso significa a impossibilidade de uma proposta única. Pensar uma proposta pedagógica única pressupõe pensar em conceito uniformizado de criança, de jovem, de adulto, de professor, de educação e de sociedade, um conceito que por generalizar, desrespeita as diferenças de etnias, sexo, classe social ou cultura (KRAMER apud MOREIRA 1999:171). Nesse sentido, pensar numa proposta única num país como o Brasil é não levar em consideração as contradições e as especificidades das regiões brasileiras e suas diversidades culturais. Trabalhar as diversidades culturais é promover o conhecimento e a valorização cultural e étnico, fortalecendo a igualdade a justiça combatendo o preconceito e discriminações raciais. Mas, como propor uma educação de combate ao preconceito e discriminação raciais num contexto, onde a formação dos profissionais que atuam na educação não fornece subsídios para repensar sua prática e atuar como sujeito ativo na produção de conhecimento? Diante desta realidade, o profissional precisa ser um leitor capaz de questionar, avaliar e reinventar a proposta curricular a qual se propõe. Verificando se o texto proposto respeita a diversidade de valores do contexto a que se destina. E se sua práxis educacional favorece a igualdade e o respeito mútuo das diferenças. Propor uma educação em que as crianças, os jovens e os adultos aprendam, construam/adquiram conhecimento e se tornem autônomas e cooperativos implica pensar, ainda, a formação permanente dos profissionais que com eles atuam (Op.cit 1999:172). Pensar numa proposta curricular que vem ao encontro dos novos anseios do séculos XXI, é também avaliar a forma como a pedagogia cultural esta repassando as informações para essa geração atual.

7 Nessa nova realidade, onde a criança tem acesso a cultura infantil comercial e popular, pais e professores enfrentam um dilema complexo que é lidar com autoridade sem autoritarismo. E é nesse contexto que a proposta curricular deve estar inserida. Não estamos lidando com crianças e jovens que estão acostumados a pensar e agir como crianças e jovens, mas com crianças e jovens que vê o mundo da forma como é descrito pelos produtores de informações corporativas. E é também nesse mundo de informações que se construiu uma cultura infantil racial. Segundo Steinbeg & Kincheloe (2001) o currículo da TV para criança, no último esgar do século XX, não é elaborado pela fidelidade dos grandes da mídia aos princípios da democracia. Interesses comerciais ditam a cultura infantil da mídia, a margem de lucro é muito importante para que se importem com o que concerne ao bem-estar das crianças (STEINBERG & KINCHELOE, 2001:24). Portanto, conhecer a cultura infantil da atualidade deve ser fundamental para o profissional que deseja repensar sua práxis e a proposta curricular que permeia os princípios educacionais. Mediante as transformações mundiais, observa-se, nas últimas décadas, uma série de reformas educacionais que objetivam o desenvolvimento de novas práxis. No entanto, como repensar uma práxis pedagógica no contexto atual, se o professor continua com uma visão homogeneizadora e linear. Atualmente, com a promulgação da lei 10639/2003 a temática multiculturalismo torna foco das discussões no contexto escolar. Pois, a obrigatoriedade do ensino da História da África e da cultura afro-brasileiro, por si só não garante a desconstrução da desigualdade racial em nossa sociedade. Isso significa que não são os

8 conteúdos que transforma a realidade posta, mas a forma como são transmitidas que faz o diferencial. Acreditamos que, a lei 10.639/2003 é extraordinariamente relevante para a discussão sobre o negro e a sua cultura, bem como para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Todavia, o maior desafio multiculturais para a mudança desse contexto é a formação docente, pois parte deles ainda não reconhece a diversidade e a diferença, por conseguinte não possui a capacidade de análise para transformar a sua prática. Diante disto, o professor poderá ser um mediador do processo ensino afrobrasileiro, utilizando instrumento pedagógicos que possibilita a desconstrução de mitos, paradigmas e preconceitos historicamente disseminado no segmento escolar, ou poderá ser um mediador dos estereótipos construído na historicidade. Nesse sentido o papel do docente é determinante para a implementação e articulação da lei em âmbito escolar. O sucesso das políticas públicas de Estado, institucionais e pedagógicas, visando a reparações, reconhecimento e valorização da identidade, da cultura e da história dos negros brasileiros depende necessariamente de condições físicas, materiais, intelectuais e afetivas favoráveis para o ensino e para aprendizagens; em outras palavras, todos os alunos negros e não negros, bem como seus professores, precisam sentir-se valorizados e apoiados. Depende também, de maneira decisiva, da reeducação das relações entre negros e brancos, o que aqui estamos designando como relações étnico-raciais. Depende, ainda, de trabalho conjunto, de articulação entre processos educativos escolares, políticas públicas, movimentos sociais, visto que as mudanças éticas, culturais, pedagógicas e políticas nas relações étnico-raciais não se limitam á escola (DCNS para a educação das relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e africana, 2004:13). O grande desafio da educação ainda é formar professores que dominem o conteúdo, mas, para possibilitar uma aprendizagem de qualidade e de respeito ao outro é a metodologia o referencial da prática pedagógica.

9 Muitos estudos têm comprovado a necessidade de reavaliar os livros, os materiais e a prática que durante muito tempo reforçou a discriminação do negro. Pinto aborda a necessidade de avaliar a formação do educador como mediador do processo ensino-aprendizagem. Para o autor os professores durante sua formação não recebem preparo, qualificação para lidar com situações de preconceito e discriminação, portanto, ficou inerte quando se depara com essas situações. Trata-se, portanto, de um cenário em que se torna crucial pensar na formação que o professor necessita para enfrentar esses desafios que estão sendo postos no campo da educação. Embora os Parâmetros Curriculares Nacionais elaborados pelo Ministério da Educação apresenta um referencial para trabalhar Ética e Pluralidade Cultural. Porém, os cursos de formação pouco ou nada têm oferecido para qualificar o professor pra formar cidadãos negros como protagonista da história. Portanto, não basta o professor ter consciência da importância do multiculturalismo ou pluralidade cultural, é preciso que os cursos de formação de professores preparem e qualifiquem teoricamente os educadores para uma práxis educacional que valorize e respeite o outro, em especial o negro, como protagonista desta história chamada Brasil. E é no contexto sala de aula que deverão ocorrer as transformações necessárias para uma educação que forme a identidade do cidadão enquanto integrante desta sociedade. O grande desafio dos educadores é construir práticas pedagógicas que combata o racismo e a discriminação em âmbito escolar. Mas para isso é preciso conhece-la, entende-la, aceitar as limitações e construir coletivamente ações pedagógicas que mude e transforme a realidade social. Não são as Leis e diretrizes bem elaboradas e bem intencionadas sobre relações raciais que irão transformar a realidade

10 existente os mitos criados sobre a cultura e a valorização do negro como ser essencial e importante da história. Acreditamos que a Lei 10.639/2003 por si só, não atingirá o objetivo proposto e, que o referencial para o combate ao racismo, preconceito e discriminação que auxiliará no sucesso da Lei em vigor, é a prática pedagógica do educador. Sabe-se que a imagem do ser influi na formação de identidade, portanto, contribuir para a transformação desta imagem seria sem dúvida, a função primordial do professores, pois o reconhecimento adequado da etnia e o respeito às diferenças fortalece a auto-estima. Porém, muitas vezes a escola silencia diante de situações de discriminação dentro do contexto disseminando a depreciação da imagem do negro. Isso só será possível quando os professores valorizarem a identidade negra e serem capacitados e munidos de material e formação sobre a temática racial na educação. Valorizar a cultura de origem africana é levar os negros a interiorizarem uma imagem positiva na formação de identidade e auto-estima, enquanto ser humano, libertando-se do estado de inferioridade a que foram relegados durante anos no decorrer da história. Nesse sentido, a escola precisa se transformar num lugar onde os alunos encontrem amplas oportunidades de interagirem, onde a dignidade e o respeito às diversidades culturais sejam valorizadas e o ser humano respeitado. Um espaço onde a criança negra aprenda a ver-se como negra, respeitando e valorizando a imagem que tem de si. Por tudo isso, entende que os cursos de capacitação para professores em conhecimento da história e cultura afro-brasileira são de fundamental importância nesse processo de implantação e aplicação da lei.

11 Como sensibilizar e reconstruir novos olhares sobre a questão do negro, se os professores que mediam o processo educativo não percebem o próprio racismo oculto nas ações e falas? Assim, procuramos demonstrar que a prática pedagógica é essencial para desmistificar o mito da democracia racial. Ainda insisto que o grande desafio dos educadores é, pois, desenvolver práticas que respeitem e estimulem a valorização da cultura africana reconhecendo a existência do racismo no Brasil buscando mecanismos que auxiliem na formação da identidade e auto-estima do negro. REFERÊNCIAS BILBIOGRÁFICAS ASSIS, Marta Diniz Paulo de. Os novos conteúdos, sinais de mudanças? Uma reflexão sobre a inserção dos conteúdos curriculares de história da África e cultura afrobrasileira a partir do multiculturalismo. In: Cadernos de Educação. V.3/2003, p.65 80. ASSIS, Marta Diniz Paulo de & CANEN, Ana. Identidade Negra e Espaço Educacional: Vozes, História e Contribuições do Multiculturalismo. In: Cadernos de Pesquisa, v. 34, p. 709 729, set/dez. 2004. DCNS para a educação das relações Ètnico-Raciais e para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e africana, 2004. OLIVEIRA, Yolanda (org). Cadernos PENESB, A produção de saberes e práticas pedagógicas. In: Relações Raciais e Currículos: Reflexões a partir do multiculturalismo.cadernos PENESB, v. 3. Niterói: EDUFF, 2001. Parâmetros Curriculares Nacionais: Pluralidade cultural: orientação sexual/ministério da Educação. Secretaria da educação Fundamental 3 ed Brasília: A Secretaria, 2001. STEINBERG, Shirley R. & KINCHELOE, Joe L. (orgs). Cultura Infatil: a construção corporativa da infância. In: Sem segredos: cultura infantil saturação de informação e Infância pós-moderna.rio de janeiro. Civilização Brasileira, 2001. SANTOS, Gevanilda. DA SILVA, Maria Palmira. Org. Racismo no Brasil: percepções da discriminação e do preconceito racial no século XXI. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2005.