Guilherme Xavier. A Experiência Gamerama metodologia e design de jogos eletrônicos para futuros produtores nacionais ANEXO DE TESE DE DOUTORADO



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Transcrição:

Guilherme Xavier A Experiência Gamerama metodologia e design de jogos eletrônicos para futuros produtores nacionais ANEXO DE TESE DE DOUTORADO Departamento de Artes e Design Programa de Pós-Graduação em Design Rio de Janeiro, abril de 2013

Guilherme Xavier A Experiência Gamerama metodologia e design de jogos eletrônicos para futuros produtores nacionais Tese de Doutorado Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Design da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em Design. Orientadora: Prof. Jackeline Lima Farbiarz Rio de Janeiro Abril de 2013

3 IV - Conteúdo Programático do Gamerama Workplay Conforme publicado por agendamento durante o Gamerama Workplay. Primeira Exposição: Introdução e Composição Basilar Se o último ser humano precisasse escrever uma breve história sobre os jogos, sucinta e objetiva o suficiente para resumir a função social dos jogos ao longo dos milênios, podería dizer que jogos foram o ápice da tecnologia humana com o intuito de permitir a humanidade escapar de sua própria realidade. Além do escapismo que lhe é característico, jogos lidam obrigatoriamente com noções do que existe e do que pode vir a ser, e por isso, podem ser encontrados em todas as sociedades, das milenares às virtuais. No entanto, devido a sua presença histórica misturada com ritos e valores culturais, é comum que falte aos jogos uma nitidez maior em termos de definição. E como não vamos entrar na discussão filosófica sobre o que DEFINE um jogo, vamos simplesmente ampliar nossos horizontes com conjuntos de aspectos para poder vislumbrar o que o jogo SIGNIFICA para nossos interesses. Assim, é mais simples acomodar o jogo como atividade ou dispositivo em condições de recepção do que ficar sapateando em volta de reduções determinísticas. A única certeza é a tautologia que JOGOS SÃO JOGOS e que algumas coisas que normalmente são tidas como identidades de jogos não passam de complementos ou suplementos para que eles sejam percebidos socialmente como tal. O pintor surrealista René Magrite brincou com a expectativa do público sobre a essência e a aparência com um cachimbo no quadro A traição da imagem de 1928, e de modo semelhante, nós podemos contradizer a ideia que se faz

4 do jogo alertando para que suas partes constituintes não são o dito cujo. Para atingir sua essência enquanto atividade, devemos reconhecer sua presentificação, mas não impor ao jogo limitações conceituais: pois no fundo ele não ocorre no plano da realidade, mas somente no plano da recepção e da cognição. O jogo, seja qual for, só existe mesmo nas nossas mentes. Figura 1 - Isso não é um jogo Conforme a imposição de compreender o jogo se torna necessária, devemos dar conta de situar o mesmo em perspectivas funcionais e técnicas. Para uma composição que possa ser compreendida, assim como o público compreendia que na tela de Magrite havia um cachimbo (embora a legenda afirmasse com razão o contrário), nosso reconhecimento do jogo passa pelo cumprimento de alguns pontos, que elencados, consideram uma composição basilar: Experiência Interativa: Embora possam ser simplesmente percebidos por quem não joga como uma atividade a qual se reage, jogos só existem quando participados por agentes os quais chamamos jogadores, que do evento, conseguem relatar uma experiência que só é válida se interativa. Jogos lidam com expectativas de uso e agenciamentos. Possibilidade Narrativa: Embora possam ser experimentados pela construção de uma história narrada (anterior, simultânea ou posteriormente ao ato de jogar), jogos não dependem sine qua non de história para serem percebidos como tal. Portanto, ainda que auxiliem na recepção da obra, narrativas elaboradas são dispensáveis ao ato de jogar, servindo como possibilidade. Jogos lidam com eventos encadeados.

5 Resolução de Conflitos: Embora não dependam de histórias, jogos só funcionam na tentativa de se resolver um desequilíbrio harmônico, o que deve ser conquistado pela ação intelectual e motriz do jogador. Por isso o jogador se sente empoderado: cabe a ele dar fim à situação inadequada agindo contra outros interesses de outros jogadores ou contra o sistema do jogo. Jogos lidam com contrastes. Desafios e Recompensas: Embora apresentem conflitos a serem solucionados para manutenção de uma ordem esperada, jogos providenciam cenários que salientam a vitória ou a derrota conforme a competência do jogador em perceber os desafios e objetivar-lhes as recompensas. Jogos lidam com incentivos gerais e específicos. Ilusão Sensorial: Embora façam uso prioritário de relações de ganho e perda do plano da realidade, jogos apresentam suas considerações por meio de artifícios de engodo dos sentidos, normalmente da audição e da visão. Sem a supressão da descrença o jogo se estabelece impraticável. Jogos lidam com a imitação distorcida, com o faz de conta. Linguagem Visual e Simbólica: Embora a ilusão sensorial não seja característica exclusiva dos jogos, pois também está presente em outras obras para que as mesmas possam ser fruídas, nos jogos a atração se dá pelo reconhecimento de uma gramática visual comum a amostras do universo lúdico, as quais indicam como o sistema será apreendido. Quando comparados com seus referenciais, observa-se dos símbolos uma excessiva funcionalidade, ou seja, seu comportamento e aspectos no jogo dizem mais sobre a mecânica de uso esperado do que de uma realidade esperada. Jogos lidam com a operação de signos, denotações e conotações. Relações Perceptivas: Embora o estabelecimento cultural dos jogos em nossa sociedade constitua expectativas de uso comuns entre diversos tipos de entretenimento, jogos dependem que seus jogadores assumam um contrato de compreensão e uso das relações de causa e efeito de suas tomadas decisórias. Para isso, as diversas relações perceptivas encontradas nos momentos de jogo servem como dinâmicas que impelem o jogador ao cumprimento de objetivos previamente informados seguindo estratégias e táticas. Jogos lidam com forma, função, tempo e espaço. Comunhão e Socialização: Embora a participação do jogador no jogo possa se estabelecer solitariamente em certas amostras, é corriqueiro que jogos façam pleno uso de comunicação entre os jogadores encolvidos para que as demandas sejam solucionadas e para que os resultados possam ser quantificáveis. Ainda que seja percebido como demérito devido a sua associação com o ócio, jogos ganham notoriedade quando permitem a comunhão e a socialização de seus participantes em torno de assuntos comuns, sejam do jogo, sejam da vida. Jogos lidam com diálogos mediados e relações interpessoais. Difusão Tecnológica: Embora por tradição jogos se aproximem de artefatos cotidianos e vernaculares para providenciar trocas simbólicas, podem também receber incentivos intelectuais para assumirem, em seus projetos, conformação com as últimas novidades técnicas que a sociedade pode oferece. Onde quer que se estabeleça em termos de resultado para questões tecnológicas, jogos expandem usos e providenciam a entrada sutil de neófitos na plenitude de outros usos, normalmente voltados para a comunicação e o trabalho. Tomando como exemplo os jogos eletrônicos, amostras últimas da tradição humana de jogar, os resultados comerciais dinamizaram investigações científicas acerca da representação visual, do processamento de dados e da comunicação por redes telemáticas. Não fossem jogos como fundamental objetivo comercial, dificilmente teríamos monitores coloridos, som com qualidade e definição ou mesmos leitores de

6 mídias ópticas e acesso a redes de troca de informação internacionais... Jogos lidam com a evolução humana. Segunda Exposição: Do Homo Faber, aquele que faz Olhando bem a nossa volta perceberemos que tudo que existe é fruto da intenção de alguma pessoa inserida no modo de produção de uma sociedade. Mas nem sempre foi assim: há duas centenas de anos, se quiséssemos nos sentar, deveríamos dispor de dinheiro suficiente para adquirir uma cadeira produzida completamente (do talho da madeira ao último prego) por um artesão. Eram caras, não porque o material usado fosse nobre, mas porque os artesãos não eram ágeis e nem eram muitos o suficiente para dar conta do suprimento universal de cadeiras e de muitas outras facilidades providenciados pela inteligência humana. Algumas coisas simplesmente não poderiam ser consideradas em grandes quantidades. Para nossa satisfação, com a Revolução Industrial, a máquina tomou a maior parte da responsabilidade de talhar a madeira e bater os pregos, deixando aos humanos, duas oportunidades: lidar com a criação intelectual do objeto e pensar assim nos resultados de suas intenções previamente; e principalmente, tomar conta das máquinas para que elas dessem conta do recado. Para não desaparecer da sociedade, os artesãos foram absorvidos pela indústria e alguns deles se ocuparam justamente de pensar a técnica da operação das ideias diante de progressivas evoluções científicas. Esses indivíduos fantásticos, com um olhar no presente e outro no futuro, se tornaram aqueles que hoje chamamos designers. Do contrário do que se pensa, design não é uma equivalência de desenho, mas um conceito amplo que se

7 relaciona com a concepção e o desenvolvimento de projetos. E conforme os projetos das coisas objetivas se tornaram progressivamente complexos, também os designers buscaram especializações para suprir as demandas de uma sociedade que se voltou para o consumo de bens e serviços especializados. Conforme a tecnologia avança, novos pensamentos são requeridos para adequar soluções a demandas originais. Durante o século XX, o design chegou em sua plenitude, relacionando conteúdo, forma e função de modo a maximizar a produção, e como área estratégica, permitir o maior conforto social possível para o maior número de pessoas. E como o século da eletricidade substanciou o mundo com todo tipo de "coisas", atualmente muitos designers avançaram para cima de outras áreas, lidando também com as "não-coisas", considerando como projeto não somente objetos mas também as relações humanas estabelecidas por eles. Não somente os materiais consumidos no projeto, mas os valores agregados envolvidos. Pensar em projetos de jogos atenta exatamente para esse fato característico de uma profissão cujo foco encontra-se no outro e em suas necessidades. O jogar é uma necessidade humana e ao longo da história, o Homo Faber das cadeiras se aproximou do Homo Ludens dos tabuleiros para atender aos seus pedidos por sistemas industrializados de diversão. Como a evolução da indústria gráfica, surgem os primeiros profissionais cujos projetos visam o entretenimento, e com eles, novas formas de interagir por meio de regras amparadas por suportes de informação para satisfação do espírito. Figura 2 - O tempo não para... "Damas de Copas" de três épocas: da China milenar, da Revolução Francesa e das atuais impressões policromáticas de grandes tiragens O tempo não para... Na medida em que a virtualização dos objetos se faz cada vez mais presente, pensar a relações entre os seres humanos e seus dispositivos de divertimento de uso cotidiano torna-se um desafio que convida ao diálogo com diversas outras áreas de conhecimento. Os game designers foram seduzidos por automatismos sensuais promovidos pelos

8 computadores na metade do século passado e atualmente os jogos eletrônicos concentram a maior parte dos profissionais, domando bits, bytes e gigabytes objetivando a diversão de um público que aumenta e amadurece a cada dia. Como poucas atividades, quem joga, não deixa de jogar ao envelhecer. E jogadores, como representantes de uma população expansiva, deixam descendentes férteis que seguirão felizes na imitação de suas atividades favoritas, as analógicas e as digitais. Figura 3 - Tenha santa paciência... Um exemplo característico desse fenômeno de expansibilidade de público devido ao uso de computadores para jogar se observa no jogo de cartas para computador conhecido como Paciência (Solitaire, em inglês), criado por Wes Cherry em 1980 a partir de um jogo solitário de cartas chamado Klondike. Embutido em 1990 no Windows 3.00, tornou-se sucesso absoluto de público e um dos primeiros productivity killers antes das redes sociais. Por isso, foi um dos primeiros softwares a servir de justificativa para demissões por ociosidade comprovada e a ter clínicas especializadas no tratamento de jogadores compulsivos. Devido à facilidade de participação, quase natural, o jogo Paciência angariou adeptos que jamais o jogariam no plano da materialidade, e por consequência, fazendo o uso do mouse, como dispositivo de entrada, ser consagrado nos escritórios mundo afora. Embaralhar cartas rapidamente e corrigir as jogadas indevidas eram apontadas como grandes vantagens sobre jogos de carta convencionais, o que nos mostra que a evolução tecnológica dos jogos não deve ser encarada com melancolia, mas como curiosidade. Afinal, jogos lidam com projetos e projetos devem respeitar conceitos e contextos para o melhor dos mundos.

9 Terceira Exposição: Ao Homo Ludens, aquele que joga Nossos ancestrais começaram a se comunicar apropriadamente por meio de um sistema de linguagem entre 200 mil e 100 mil anos atrás, com o estabelecimento do Homo sapiens a partir do Homo heidelbergensis. Cientistas divergem nas estimativas de tempo envolvidas do binário uga buga ao polissêmico bla bla bla, na profundidade do vocabulário envolvido nos discursos e se havia uma única língua geral oriunda de uma sortuda mutação genética, ou várias línguas evoluídas progressivamente. Mas o cruzamento de diversas áreas de estudo, da biologia e da genética, passando pela paleontologia, arqueologia e antropologia, apontam que humanos da Metade da Idade da Pedra já fofocavam nas cavernas sobre novidades como um inverno desgraçado cobrindo o planeta, sobre novas danças rituais para aplacar a fúria do invisível, sobre planos infalíveis de caçar mamutes e sobre os perigos de se cutucar tigres-dente-desabre com vara curta. O subproduto da linguagem é a atribuição de valores abstratos a observações objetivas, o que deve ter recebido um implemento intelectual poderoso com a invenção e desenvolvimento da escrita, por volta de 5 mil e 200 anos atrás. Muito antes disso, uns 33 mil anos, sistemas simbólicos de preservação de experiências cotidianas já eram explorados pelos homens das cavernas franceses, mas somente em épocas simultâneas a escrita, os primeiros jogos apareceram por dispositivos característicos, no Egito e na Mesopotâmia, o que colocam os jogos como sistemas de atribuição simbólica monitorada no meio do caminho da evolução das primeiras cidades há 4 mil e 600 anos mais ou menos. Por essa época, o Homo Sapiens se torna o Homo Ludens, com seus tabuleiros, regras e questões filosóficas acerca da vida e da morte, dos

10 deuses e das guerras, das relações de causa e efeito e de tempo e espaço. Princípios a serem seguidos Os egípcios e os mesopotâmicos trouxeram consigo para as cidades, recém inauguradas, expectativas e simbolismos ancestrais e condensaram experiências típicas de sua época em modelos de participação mediada. Jogos de então não lidavam com nenhuma grande novidade de uso ou inovação de conteúdo, mas sim com a extrapolação de uma realidade mística e amparada em padrões recorrentes. Imagine que fôssemos transportados magicamente para época tão interessante, misteriosa e perigosa: em um primeiro momento, seríamos prejudicados pelo nosso pensamento excessivamente dependente de nosso conhecimento tecnológico, o que não valeria de muita coisa. Se quiséssemos alcançar uma mínima existência, teríamos de nos ater a certos princípios fundamentais que nos colocam em igualdade com os nativos de então. Apesar de distantes na história em milhares de anos, teríamos em comum o fato de todos sermos terráqueos e por isso termos atitudes a serem assumidas: Cinco princípios para um Manual de Existência para Terráqueos: 1. Sobreviva e deixe descendentes 2. Os desafios serão mentais e físicos 3. Todo conforto é limitado 4. As objeções serão naturais, individuais e coletivas 5. Acate o risco conforme a recompensa Figura 4 - Homens das Cavernas moravam em... cavernas. Sem nos aprofundar filosoficamente nas implicações da situação, no aceite desses cinco princípios fundamentais, estaríamos recorrendo a uma estratégia exemplar que nos

11 garantiu sobreviver como Homo sapiens aos nossos competidores diretos neandertalenses na corrida evolutiva cerca de 500 mil anos atrás. Tornamo-nos melhores coletores, caçadores e pensadores, pois elaboramos formas de armazenar e distribuir conhecimento experiencial ao longo de gerações descendentes. E se hoje falamos, escrevemos e mandamos foguetes ao espaço, é porque nos tornamos exímios jogadores de um jogo cósmico pela distribuição de nossa genética pela superfície do planeta. Não é somente porque uma mutação rotacionou nosso polegar e mudanças climáticas nos fizeram descer das árvores, mas porque recentemente (alguns milhares de anos) conseguimos extrair dos cinco princípios fundamentais acima certos simbolismos que nos permitiram ensaiar nossa existência além da mera sobrevivência instintiva. Figura 5 - Mamute! O próprio ato de nos organizar socialmente para caçar criaturas muitas vezes maiores que nos reflete a noção estratégica envolvida nos itens 1, 2 e 3. Considerando que a falha representa a carência de alimento necessário para a manutenção do item 1, e mesmo sem tal carência, que o item 3 é inexorável, aprendemos na marra a nos organizar e prezar uns pelos outros em termos de famílias e posteriormente clãs, que vagando pela padrarias, vez ou outras, se estranhavam. Afinal, recursos serão sempre mais escassos que o ideal, e não bastando um mundo tão perigoso como o pleistoceno, com glaciações constantes e terríveis felinos gigantes rondando nossos filhotes, tínhamos que lidar com a construção de nossas próprias diferenças culturais.

12 Figura 6 - Fujam! Um Tigre-Dente-de-Sabre! Imagine o estresse de morar numa caverna insalubre, sair vez ou outra para caçar mamutes gigantes debaixo de neve e fugir de monstruosidades que tinham os mesmos objetivos que nós... Não é de admirar que a expectativa de vida de nossos ancestrais de então não ultrapassasse cerca de 40 anos. Violência, ossos quebrados e cicatrizes foram a norma, e somente a capacidade de abstrair da própria existência diante dos ritos e da fantasia garantiam a sanidade para levar o item 5 adiante, e no futuro, ter descendentes vendo surgir as primeiras cidades. Figura 7 - Senet, um dos jogos mais antigos já registrados. Esse era de Amenhotep III, que segundo consta na mitologia egípcia, deve estar jogando até hoje. As primeiras organizações humanas complexas exigiam mais do indivíduo do que uma primeira observação pode supor. Surge a ideia de trabalho como entendemos hoje. Com as famílias e clãs parando de correr de um lado para o outro com a invenção da

13 agricultura e da domesticação dos animais selvagens para corte e transporte, a organização das atividades de cerâmica e fiação dividiu as responsabilidades de homens de mulheres de modo sistemático. Com as atividades executadas para promoção de trocas de bens e valores entre indivíduos, há reconhecimento de um momento vago paralelo ao momento que ocorria entre as ações. As atividades inseridas nesses vazios entre importâncias, chamamos entretenimento. E o objetivo do entretenimento é divergir sua atenção do foco de demais atividades. Por isso dizemos que os jogos são (ou deveriam ser) divertidos. Jogos e consequências Os primeiros jogos dos quais se tem conhecimento oriundos do Egito e da Mesopotâmia (mais precisamente Ur, no atual Iraque) eram jogos de corrida baseados em sorte mas com características estratégicas. Os egípcios gostavam de sorte porque para eles o que era furtuito era da administração dos deuses e um bom jogador garantia o reconhecimento público de estar sob a proteção de um deles. Tanto que para a viagem ao pós-vida, egípcios eram enterrados munidos de bens pessoais entre os quais uma caixinha de Senet, seu mais antigo jogo, era comum. Do contrario dos Egípcios, que não deixaram regras escritas sobre o Senet, só as caixinhas, os babilônios deixaram recentemente (cerca de 2170 anos atrás), textos cuneifórmicos explicando como se deveria jogar o Jogo Real de Ur. O fato de um jogo não ter regras explicitas ainda assim ser percebido como tal, é uma das principais características dos jogos na nossa cultura: a recorrência representacional. A compreensão de que Senet seja um jogo se deve a sua configuração por meio de um conjunto de objetos, no quais figuram aspectos diferenciadores e recorrentes, e portanto, dos quais se subentende relacionamentos lógicos. Não fosse a similaridade com outros jogos da atualidade, por outro lado, talvez não fosse possível estabelecer para o jogo suas regras atuais. Afinal, como vimos anteriormente ser impossível chegar a uma definição única do que É um jogo, podemos fazer por aproximações tangenciais: Como definir o indefinível? jogo como produto jogo como processo Como produto, entendemos o jogo como coisa que será manipulada; e como processo, entendemos que a manipulação da coisa se dará como uma série de eventos correlatos e coerentes entre si. Para nós, considerar o jogo além da expectativa de objeto de consumo e resolver questões abstratas e relacionais, implica em pensar obrigatoriamente no

14 jogador antes do comércio do objeto. Infelizmente, a cultura de consumo também fez do jogo um alvo predileto e os despropósitos são notórios. Basta ver a quantidade de revisitações licenciadas de jogos ditos tradicionais como se fossem coisas completamente diferentes entre si, quando são somente maquiagens estéticas. Evitar que se use o jogo como maquiagem de qualquer outra atividade de dedicação deve ser nossa principal bandeira como game designers. Jogos são importantes culturalmente por serem instigantes e as decorrências do seu discurso não devem se interpor ao objetivo da diversão que dele emerge, e nem às consequência por sua participação. Das consequências: Win-Lose: alguém vence se outro perder Win-Win: todos vencem Lose-Lose: todos perdem Figura 8 - Win-Lose Ganhar-Perder Figura 9 - Win-Win Ganhar-Ganhar Figura 10 - Lose-Lose Perder-Perder

Seja qual for o contexto político e social, jogos foram eleitos em diversos momentos históricos como objeto de estudo para resultados que pudessem ser replicado em outras situações. Na época moderna, partidas de xadrez podiam substituir a movimentação de tropas no campo de batalha, evitando-se assim conflitos tidos como concluídos antes mesmo que os tiros de canhão pudessem ser ouvidos pelos soldados. No século passado, matemáticos se debruçaram sobre as implicações de se compreender jogos como tomadas de decisões, dando origens a teorias elaboradas com aplicações que vão da sociologia ao mercado financeiro. Delas extraímos a noção de consequência de nossa participação nos jogos, que podem ser exemplificados nas ilustrações com os burrinhos amarrados acima. Todas são válidas e conforme nossas decisões, elas podem ou não ir de encontro a expectativas de resolução de conflitos por parte dos jogadores. Nos casos, Win-Lose (Ganhar-Perder), há apenas um vitorioso em detrimento de derrotados, normalmente devido a sua habilidade e competência exclusivas na resolução do conflito do jogo, sendo os tipos mais comuns de jogos competitivos que conhecemos. Nos casos Win-Win (Ganhar-Ganhar), todos estão envolvidos e se satisfazem da vitória pois não há derrotados, sendo os tipos de jogos cooperativos que privilegiam a colaboração entre os jogadores para ganhos comuns. Por fim, nos casos Lose-Lose (Perder-Perder), nenhum jogador envolvido obtém retorno da resolução do conflito, ou seja, qualquer resolução é pior do que nenhuma. Um exemplo dessa condição foi magistralmente apresentado no filme Jogos de Guerra (Wargames, no original de 1984) no qual um supercomputador militar é colocado para simular conflitos nucleares entre potências, para sempre concluir o jogo em um holocausto nuclear. E exclama: Um jogo estranho. O único movimento vencedor é não jogar. 15

16 Quarta Exposição: Círculo Mágico do Contexto Nossas investigações acerca dos jogos devem ter um ponto de partida circunstancial para que, além de compreendêlos como fenômenos, possamos criá-los e desenvolvê-los. Até aqui, compreendemos que jogos estão intrinsecamente relacionados com a evolução das sociedades humanas, mas pouco é dito do reconhecimento do jogo enquanto processo segundo seus limites dentro dos próprios grupos sociais. É corriqueiro vermos os jogos etiquetados com dois adesivos redutores: 1) jogos são X ou 2) tudo é jogo. Tais simplificações em nada nos ajudam, pois conferem aos jogos essências que não lhes caracterizam e pelo contrário, os colocam hierarquicamente ou abaixo de outras atividades ou pior, como uma ubiquidade banalizada da qual nenhuma profundidade pode ser obtida. Para nossa alegria, no século XX, os estudos sobre os jogos sob uma perspectiva cultural por Johan Huizinga e Roger Caillois consideraram o ato de jogar além da matemática e dos resultados de conflitos e conferiram aos mesmos uma relevância histórica singular. Jogos só ocorrem como contextos devidamente delimitados por seus participantes, observadores de sua interação no tempo e no espaço. Huizinga identificou no jogar um estabelecimento DA cultura e não um estabelecimento NA cultura, ou seja, promoveu certa controvérsia tentando esclarecer em seu livro Homo Ludens, de 1938 o que o jogo significa e quão suficiente é para explicar determinados comportamentos sociais. Além de expor as nuances na caracterização de atividades tidas como jogos a partir da polissêmica palavra play (ou Spiel, do original em alemão), o historiador holandês se dedicou a investigar o jogar nas mais variadas ocorrências: das manifestações na natureza, passando pelas relações com a lei, as guerras, o

17 conhecimento, a poesia, a filosofia e a arte. Para Huizinga, cinco aspectos caracterizam o jogar (abaixo em inglês para evidenciar o problema da tradução do termo): 1. Play is free, is in fact freedom. 2. Play is not ordinary or real life. 3. Play is distinct from ordinary life both as to locality and duration. 4. Play creates order, is order. Play demands order absolute and supreme. 5. Play is connected with no material interest, and no profit can be gained from it. Embora atualmente possa sofrer críticas quanto aos fundamentos apresentados (pois jogos eletrônicos só iriam aparecer vinte anos depois) a lista acima sintetiza um pensamento sobre os jogos que os permite se manifestar em um locus distinto da realidade. Desse modo, nosso ponto de partida é na verdade um plano, circular, no qual o jogo transcorre e fora do qual estamos cientes de nossa condição humana, limitada e cotidiana. Chamamos esse espaço de potências simbólicas de Círculo Mágico e sobre ele iremos construir nossos jogos. Os autores Eric Zimmerman e Katie Salen expressam muito bem os fundamentos do termo em seu famoso livro Rules of Play, de 2003, no trecho que traduzo: (...) o termo é usado aqui como uma simplificação à idéia de um lugar especial no tempo e no espaço criado pelo jogo. O fato de que o círculo mágico é apenas isto um círculo é uma característica importante este conceito. Como um círculo fechado, o espaço que ele circunscreve é fechado e separado do mundo real. (SALEN & ZIMMERMAN, Rules of Play, 2003 p.95) Ao entrar no jogo, o jogador acata o contrato contextual de seguir as regras estabelecidas no Círculo Mágico sob a pena de ser preterido na brincadeira e assim se ver expulso dele. O círculo não existe propriamente como um desenho no chão: consolida-se na participação dos jogadores, que segundo o outro autor, Roger Caillois, ira perceber o jogo sob quatro diferentes categorizações: Agon, ou competição. Quando se estabelece vencedores e perdedores. Alea, ou sorte. Quando os resultados não podem ser previstos mas ditados pelo acaso. Mimicry, ou imitação. Quando se interpreta personagens e suas atitudes. Ilinx, ou vertigem. Quando se altera a percepção e os sentidos.

18 Desse modo, criticando a superstimada atenção que Huizinga deu a competitividade nos jogos, o sociólogo francês em seu livro Les jeux et les hommes, de 1958, amplia o sentido de jogar para uma atividade estruturada baseada em regras (o ludus do jogo) contrapondo uma atividade desestruturada baseada em diversão (a paideia do jogo). Ambos os conceitos estão presentes em muitas atividades humanas que não são jogos, mas nestes últimos se observa uma recorrente tentativa de alcançar a paideia por meio do ludus. Ou seja, de por meio de brincadeiras até então sem finalidade aparente além do brincar, se chegar a resultados quantificáveis cuja experiência possa ser compartilhada pelo contexto. Quinta Exposição: Triângulo das Ênfases na Criação: temática, regras e experiência Conforme nossa compreensão dos jogos avança geometricamente, podemos nos apropriar de formas também geométricas para exemplificar relações que precisam ser estabelecidas para que o jogo aconteça. Partindo do Círculo Mágico, que delimita as apropriações de tempo e espaço para o jogo, passaremos pela tríade das considerações prévias que orientam a ênfase do game designer no que tange as oportunidades de criação. Afinal, não basta ao game designer ter boas ideias e achar que elas serão suficientes para que o jogo milagrosamente divirta: é imprescindível considerar um encadeamento lógico que garanta ao jogo se estabelecer com profundidade na vida dos seus jogadores. O triângulo que resume as ênfases de criação deve antecipar a produção com algumas questões que resolvidas, irão caracterizar uma

19 identidade para a obra, como produto e como processo. Cada elemento no triângulo evoca influência diretamente em outro elemento, garantindo a tríplice disposição uma importante dinâmica para a superfície do jogo: Temática: Requer de experiência e explica as regras. Temática corresponde ao conjunto de assuntos cobertos no jogo de modo a evidenciar como o jogo deve ser participado. Como jogos apresentam conteúdo diverso, as temáticas também deveriam ser variadas. No entanto, como jogos lidam com simplificações dos valores do cotidiano, as temáticas acabam sendo excessivamente recorrentes. O importante de se pensar em temáticas inovadoras é que como as regras são explicadas pelos assuntos, novas e interessantes situações de escolha podem ser evidenciadas. Regras: Definem a experiência e justificam a temática. Regras correspondem ao conjunto predeterminado de ações que podem ou não ser executadas nos jogos de modo a premiar ou castigar a conduta do jogador. De acordo com as regras, a percepção do jogo pelo jogador pode mudar, e assim, a experiência do jogador se torna particularíssima se comparada com a de outros jogadores. O importante de se pensar em regras coerentes é que as experiências são delimitadas pela profundidade das disposições lógicas apresentadas como instruções do jogar, logo, a atividade se apresenta instigante. Experiência: Satisfaz à temática e torna coerentes as regras. Experiência corresponde ao conjunto de sensações obtidas antes, durante e mesmo depois da participação no jogo, sendo a principal conquista do ato de jogar. Todos os projetos de jogos buscam estabelecer em seus jogadores experiências memoráveis, seja pela habilidade no entendimento e ação coerente com as as regras, seja pela inépcia em se alcançar os objetivos propostos aceitando uma derrota momentânea. É preciso que o jogar produza sensações positivas e negativas para valorizar as temáticas e que tenha protocolos de uso coerentes com os assuntos apresentados. O importante de se pensar em experiência como principal consequência da relação entre temática e regras é permitir ao jogador a oportunidade de refletir sobre suas próprias decisões e ações. Por se tratar de um triângulo, fica aparente a nossa incapacidade de se equilibrar o mesmo de modo a evidenciar mais de uma ênfase apontando para cima. Girando o triângulo para a direita ou para a esquerda, podemos estabelecer novas ênfases ao nosso jogo, orientado ao uso para evidenciar sua temática ou suas regras. No entanto, sendo uma ou outra ponta destacada como ápice do jogo, ela terá obrigatoriamente de contar com o suporte e influência das duas outras.

20 Sexta Exposição: Quadrado Fundamental no Desenvolvimento: estética, narrativa, mecânica e tecnologia Enquanto o Triângulo das Ênfases resume as três principais orientações do game designer em relação ao jogo quando criado, quatro fundamentos irão reger o desenvolvimento do mesmo. Para serem usufruidos como obras expressivas, os jogos apresentam ao jogador a apreciação de resultados de pensamento meticuloso em escolhas justificativas que lidam com o teor do conteúdo e de como esse conteúdo é conformado. Os fundamentos inferiores do quadrado, mecânica e tecnologia, sustentam os fundamentos superiores, estética e narrativa. O jogador é capaz de reconhecer todos os quatro fundamentos em seus jogos, mas no momento de emissão de uma crítica, depende mais das relações interfaciais dos elementos superiores (a superfície do jogo) do que da solidez dos elementos inferiores (o lastro do jogo). Observe doravante os diálogos entre os jogadores que constantemente remetem à representação audiovisual e às histórias construídas no ato de jogar e compare com os diálogos entre outros jogadores, que constantemente remetem ao uso de recursos técnicos e à qualidade das condições de uso. Perceberemos que as motivações dos primeiros jogadores irão de encontro ao conteúdo apresentado e as motivações dos segundos, irão de encontro à forma pela qual essa apresentação ocorre. Por isso, para estabelecer um Círculo Mágico enfático em termos de experiência, regras e temática é preciso substanciar as escolhas sobre quaisquer componentes que fundamentem a estética, a narrativa, a mecânica e a tecnologia presentes no projeto. Estética: A estética do jogo compreende a qualidade representacional dos seus elementos conteudísticos em termos de sedução dos sentidos. Quando