A Segurança contra Incêndios nos Centros Históricos de Portugal e Brasil Semelhanças e Dificuldades

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Transcrição:

A Segurança contra Incêndios nos Centros Históricos de Portugal e Brasil Semelhanças e Dificuldades Maira Leal A. Santana a, João Paulo C. Rodrigues a *, A. Leça Coelho b a Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, Polo II, 3030-290 Coimbra, Portugal. * autor de contacto: telef.: + 351 239797237, fax: + 351 239797242, e-mail: jpaulocr@dec.uc.pt b Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Av. do Brasil, 1700-066 Lisboa, Portugal. RESUMO As construções históricas diferem das actuais pela concepção antiga das aglomerações populacionais e também pelos materiais, pela concepção dos espaços e pelos métodos construtivos adoptados. Estas são justamente as características que agravam o risco de incêndio das zonas históricas e dificultam a adopção de medidas de segurança contra incêndios. Como reflexo da necessidade de preservar os centros urbanos antigos diversos estudos têm sido realizados no Brasil e em Portugal. Em ambos os Países, tais estudos, quando voltados para a segurança contra incêndios, têm comprovado a vulnerabilidade destes centros históricos e a possibilidade de ocorrência e desenvolvimento de incêndios que podem afectar um grande número de edificações. Neste artigo far-se-á uma apresentação das características das zonas históricas de Portugal e Brasil, sendo apontadas as principais características que tornam estes locais, como zonas de risco de incêndio agravado. Serão também descritos alguns casos de incêndios que levaram à adopção de medidas concretas de segurança contra incêndios para ambos os Países. Estas medidas na maior parte dos casos não têm sido de fácil aplicação. Tais dificuldades são reflectidas na obtenção de parâmetros para uma análise de risco de incêndio adequada que contribua para uma correcta implementação das medidas de segurança contra incêndios. Palavras-chave: Segurança, Incêndio, Risco, Prevenção, Centro Histórico INTRODUÇÃO Os centros históricos urbanos podem ser definidos como locais inseridos nas malhas urbanas actuais constituídos por edificações que apresentam algum interesse histórico-cultural, pelo estilo arquitectónico adoptado, pelos materiais contidos no seu interior ou pela história dos moradores, e também por edificações de menor interesse, ou mesmo construções mais recentes, mas que fazem parte do contexto do local. A diferente concepção das construções actuais em relação às antigas em termos das aglomerações populacionais e dos próprios métodos construtivos adoptados, introduz dificuldades quanto à segurança que oferecem em situação de incêndio [1]. Neste aspeto, os centros históricos podem ser caracterizados por [1], [2], [3], [4], [5], [6]: 1. Ruas estreitas, sinuosas e / ou com grande declive, dificultando o acesso de veículos de grande porte por parte do Corpo de Bombeiros em caso de sinistro e também permitindo a fácil propagação do incêndio por radiação e convecção entre as edificações (figura 1); 2. Edificações sem espaçamento entre elas e da mesma altura exterior, o que aumenta a facilidade de propagação do incêndio (figura 2); 3. Uso das edificações essencialmente residencial ou com pequenos comércios familiares, com casos de mudanças de uso sem as devidas adaptações (figura 2); 4. Presença de edifícios devolutos e deteriorados, com materiais combustíveis presentes e sem horizonte de recuperação ou ocupação (figura 1);

5. Estrutura resistente e de fachada constituída de material bastante resistente ao fogo, mas com divisórias verticais e horizontais combustíveis. Deste modo, em caso de incêndio toda a edificação estará exposta ao fogo, sem a possibilidade de confiná-lo para facilitar o combate ou mesmo a evacuação das pessoas presentes; Figura 1: Exemplos de Vias com Dificuldades de Acesso e Edificações Deterioradas no Centro Histórico de Montemor-o-Velho, Portugal (Fotos Pessoais) 6. Existência de caves e sótãos de acesso restrito ou dificultado; 7. Aberturas grandes em relação ao pé-direito do pavimento, o que facilita a propagação do incêndio através destas em caso de grandes labaredas (figura 2); 8. Ligações de energia eléctrica e de gás mal feitas e sem manutenção adequada e periódica; 9. Hidrantes e bocas de incêndio insuficientes, inexistentes ou com pouca pressão de água disponível; 10. Ausência de sistemas de detecção e alarme; 11. Parcela considerável da população residente idosa e destreinada para tomar as decisões acertadas em situação de sinistro; 12. Em cidades maiores, constituem sua área degradada e dominada pela marginalidade da população, que pode vir a ocupar as edificações abandonadas. Sem noção do perigo, drogados e sem abrigo podem iniciar incêndios acidentalmente, ou ainda serem alvos ou autores de incêndios criminosos; 13. Estacionamento indiscriminado de carros particulares ao longo das vias já estreitas para a passagem de viaturas do Corpo de Bombeiros por vezes inclusive obstruindo ou dificultando o acesso às bocas de incêndio; 14. Coexistência de edificações construídas em diferentes épocas históricas e, portanto, diferentes métodos construtivos e diversas concepções arquitectónicas e urbanísticas; 15. Falta de consciencialização da população quanto ao risco de armazenagem de materiais combustíveis em locais de pouco acesso e limpeza constituindo um potencializador de propagação em caso de incêndio. Figura 2 Grandes Vãos em Relação ao Pé-direito e Edificações de Mesma Altura sem Espaçamento entre elas. Cidades Esquerda: Sabará MG. Centro: Salvador BA. Direita: São Paulo. (www1.caixa.gov.br/gov/gov_social/municipal/programa_des_urbano/infra_estrutura_setor_publico/prsh)

HISTÓRIA DA SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO NOS CENTROS URBANOS ANTIGOS DO BRASIL E DE PORTUGAL Proteger um centro histórico, em qualquer país implica proteger as edificações em si, que representam um interesse cultural e arquitectónico para a região, as pessoas que ali vivem ou trabalham, e devem ser evacuadas do local a tempo em caso de qualquer sinistro, e eventualmente também os bens contidos nas edificações, como no caso de museus e igrejas que contenham peças únicas e de grande valor cultural. O que tem sido observado não só no Brasil e em Portugal, mas também noutras localidades, é que preservar os centros históricos só se torna realidade após algum incêndio que provoque perdas materiais e de vidas que poderiam ter sido evitadas com a aplicação de algumas medidas simples de prevenção, protecção e extinção. Em Portugal, a Segurança contra Incêndios ganhou força após o grande incêndio do Chiado no centro histórico de Lisboa (figura 3), em 1988, que começou no edifício Grandela e, por suas particularidades de centro histórico, inclusive a ausência de medidas de detecção e combate a incêndios, atingiu outros 17 edifícios, causando grande impacto social e desencadeando diversos estudos que levaram à tomada de medidas preventivas não só na região como em todo o país. A aprovação das Medidas Cautelares de Segurança contra Incêndio em Áreas Urbanas Antigas [7] e a exigência da elaboração de Planos Municipais de Emergência para todas as Câmaras Municipais são as acções mais visíveis neste sentido. Com estas medidas legislativas estimula-se a preocupação com a Segurança contra Incêndios nestas zonas, inclusive o desenvolvimento de estudos na área e a aplicação de análises mais cuidadosas de risco de incêndio. No Brasil, embora sempre tenham ocorrido diversos incêndios em centros históricos do país, foi uma sequência de três incêndios em três diferentes cidades históricas de Minas Gerais evidenciou a gravidade do problema e a necessidade de realizar acções preventivas: o da igreja Nossa Senhora do Carmo em Mariana em 1999 (figura 3), o incêndio do Hotel Pilão de Ouro Preto em 2002 e o da Igreja das Mercês em Sabará em 2003 [8][9]. Ainda não existem no país normas específicas para a situação de incêndio, embora estejam a caminho de aprovação. Existem decretos estaduais e instruções técnicas do Corpo de Bombeiro local de medidas necessárias para protecção contra incêndio das edificações, mas Minas Gerais ainda é o único Estado da Federação com medidas específicas para centros históricos. Nos últimos anos, a Caixa Económica Federal, com parceria de diversas instituições nacionais e internacionais, através do Plano de Revitalização de Sítios Históricos - PRSH, tem investido na recuperação e urbanização dos edifícios dos centros históricos como meio de diminuir a marginalidade geralmente presente nestes locais, promover a reocupação organizada e assim, ainda melhorar a questão do défice habitacional no país. Figura 3: Incêndios Notáveis em Centros Históricos. Esquerda: Igreja de Nossa Senhora do Carmo em Mariana Minas Gerais Brasil. [Foto de] Paulo Filgueiras/Estado de Minas. Direita: Grande Incêndio do Chiado em Lisboa Portugal (www.firetech.be). Nos dois países é possível notar que este interesse é associado ao interesse do Poder Público local em revitalizar estas regiões e voltar a atrair população e turistas, o que deve ser aproveitado para incentivar os estudos e as medidas inicialmente necessários e também a manutenção e fiscalização ao longo do tempo.

MEDIDAS DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIOS EM CENTROS HISTÓRICOS Segundo as características locais pode-se verificar a situação de algumas das medidas de segurança possíveis para aplicação nas regiões estudadas. Algumas medidas normais de segurança são de simples aplicação. Outras entram em conflito com a necessidade de preservação do património requerendo altos investimentos e estudos cuidadosos de custos e benefícios capazes de introduzir à edificação. Atingir níveis aceitáveis de protecção com custos mínimos, mais que desejável, é o modo mais eficiente de estimular a aplicação de tais medidas e garantir a continuidade das condições de segurança ao longo da vida útil da edificação através da manutenção periódica. Para ajudar na escolha das medidas de segurança contra incêndio adequadas para cada realidade, têm-se recorrido à utilização de métodos de análise de risco de incêndio. No entanto, para os centros históricos, estes ainda se apresentam muito deficientes. As decisões precisam ser apoiadas na experiência de especialistas e dados estatísticos particulares e o conhecimento da realidade do local. [9] Como a preocupação de preservação é ainda recente estes dados ainda não são devidamente conhecidos e a fiabilidade fica então comprometida. Garantir a segurança, mais que minimizar as consequências da ocorrência de um incêndio, é impedir que o sinistro ocorra. Qualquer medida preventiva, ainda que pareça inútil ou exagerada, é mais fácil, barata e segura que controlar um incêndio. Sendo assim, estas são as melhores medidas de segurança contra incêndio, com ou sem o auxílio das análises de risco. A solução que pode ser vista como a mais imediata e natural é a consciencialização e o treino da população envolvida nestas regiões. A partir desta medida, todas as demais se desenvolvem mais facilmente. A população devidamente consciencializada é mais capaz de entender as exigências feitas para a segurança contra incêndio e então atendê-las e cobrá-las do Poder Público, não só no primeiro momento, como também para a manutenção dos sistemas em perfeitas condições. Pode se referir, neste caso, não só às medidas internas às edificações, mas também aos sistemas da comunidade, por exemplo, ao impedir actos de vandalismo. O treino da população deve se dar de forma que ao menos parte dos moradores da região seja capaz de tomar decisões para alertar os bombeiros e realizar as primeiras intervenções, antes mesmo da chegada do Corpo de Bombeiros, e ajudar na retirada das pessoas menos capacitadas do local, como ocorre na formação das brigadas de incêndio de empresas, por exemplo. Como as edificações são essencialmente residenciais e de comércios familiares, há uma grande probabilidade da ocorrência de incêndios acidentais em instalações eléctricas, de gás ou de aquecimento que estão em geral mal feitas ou mal conservadas. Assim, uma primeira medida a ser exigida aos proprietários passa pela regularização e manutenção destas instalações.[10] Uma outra medida tão simples quanto as já apresentadas trata de solicitar que locais de acesso difícil e irregular, bem como coberturas, sejam limpos e não acumulem muitos materiais passíveis de ignição ou mesmo propagação do incêndio. Um factor marcante em todos os centros históricos é a falta de acessibilidade de certos edifícios pontuais. Como não é possível alterar a concepção das vias de acesso deve-se ao menos garantir as condições máximas que a via pode oferecer. Mantê-las com o acesso livre, trata-se não só do nível do solo, por estacionamentos indevidos, por exemplo, como também do espaço aéreo de acesso às edificações que pode ser obstruído pela presença indiscriminada de cabos eléctricos e telefónicos e até mesmo decorativos a atravessar a via. Quanto ao Corpo de Bombeiros e ao Poder Público local, ficam a seu cargo fiscalizar se as medidas estão sendo obedecidas, manter as instalações públicas da rede de combate a incêndios em funcionamento constante, fazendo testes periódicos e promover eventos e cursos de consciencialização e treino da população local. Uma tentativa da aplicação destas medidas foi a criação em 2003 do projecto Chama Consciência e Prevenção contra o Fogo, no Estado de Minas Gerais no Brasil, que conta com a participação da UNESCO do Brasil, do poder público local, de entidades privadas, dos

Corpos de Bombeiros e da população para realizar acções de consciencialização preventiva do problema da segurança contra incêndios nos centros históricos das cidades mineiras.[2][9] Num estudo recente realizado em Guimarães, Portugal, soluções semelhantes foram apresentadas, além de outras condizentes com a realidade local, mas já a adopção de medidas simples como estas, em quaisquer das cidades que se estude, melhora e muito o desempenho do local quanto à segurança contra incêndios em centros urbanos antigos, preservando as pessoas, os bens e a cultura ali encerrada.[4][5] CONCLUSÕES Algumas características das zonas históricas das cidades se apresentem muito semelhantes, independentemente se localizadas em Portugal ou no Brasil, e são justamente as características que potencializam a adopção de medidas relativamente simples de protecção, mas que envolvem a consciencialização e participação constante da população e também o interesse e a fiscalização do Corpo de Bombeiros e do Poder Público locais. Por outro lado, estas mesmas características peculiares aos centros históricos dificultam a adopção de uma determinada medida de segurança contra incêndio que possa ser considerada fiável e infalível para diminuir o risco de incêndio destes locais. Métodos de avaliação de risco de incêndio são óptimos para ajudar na escolha das medidas, mas ainda não estão suficientemente desenvolvidos para a aplicação em centros históricos. Espera-se que aos poucos novos refinamentos dos métodos existentes surjam, para que estes se tornem mais próximos da realidade dos centros históricos. As medidas aqui apresentadas, se por um lado, podem não ser a solução definitiva para todos os núcleos históricos, por outro há de ser sempre um aditivo às questões de segurança. Devese sim, sempre respeitar as diferenças de cada núcleo e adoptar medidas específicas para tal, mas se medidas relativamente simples poderem ser adoptadas de modo a promover a segurança dos locais e das pessoas para que os incêndios não ocorram, ou se caso ocorram que causem o mínimo de danos possíveis, tanto melhor, ainda mais que de entre os bens possíveis de serem perdidos em centros históricas, estão bens culturais de difícil e cara recuperação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] SANTANA, M. L. A.; RODRIGUES, J. P.; COELHO, A. L.; CHARREAU, G. L. (2007) Fire Risk Assessment of Historical Areas The Case of Montemor-o-Velho. International Conference on the Art of Resisting Extreme Natural Forces. Wessex Institute of Technology. Southampton, UK. [2] ALVES, R. A. Risco de Incêndio em Edificações de Sítios Históricos [3] COELHO, A. L. (2000) Segurança contra Risco de Incêndio em Áreas Urbanas Antigas Princípios Gerais de Intervenção. Comunicação apresentada no Seminário Riscos e Vulnerabilidades em Centros Urbanos Antigos. Évora Portugal. LNEC. [4] CÂMARA MUNICIPAL DE GUIMARÃES (2005) Plano Municipal de Emergência. [5] CÂMARA MUNICIPAL DE GUIMARÃES (2005) Plano Piloto de Luta contra Incêndios e Segurança. Gabinete Técnico Local. [6] GONÇALVES, J. M. F. (1994) Incêndios em Núcleos Urbanos Antigos Verificação da Segurança contra Incêndios na Mouraria. Dissertação para obtenção do grau de mestre em construção. Universidade Técnica de Lisboa. Instituto Superior Técnico. [7][ PORTUGAL Leis, decretos, etc. Medidas Cautelares de Segurança contra Incêndios em Áreas Urbanas Antigas. Decreto-Lei nº 426/89 de 6 de Dezembro. [8] (2003) TC 006.149/2003-9. Relatório de Acompanhamento do IPHAN Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional, junto ao TCU Tribunal de Contas da União. Brasil [9] ARAÚJO, S. M. S.; GOUVÊIA, A. M. C.; SOUZA, V. C. M.(2001) Análise de Risco de Incêndio em Cidades Históricas Brasileiras A Metodologia Aplicada à Cidade de Ouro Preto. Revista Internationale de Desastres Naturales, Accidentes e Infraestructura Civil. Vol. 5. pág. 69 a 74. [10] AZEVEDO, L.; SIMÕES, S. Como Intervir no Centro Histórico de Coimbra