ADUBAÇÃO DO ALGODOEIRO NO CERRADO: RESULTADOS DE PESQUISA EM GOIÁS E BAHIA 1 Gilvan Barbosa Ferreira 2 Maria Conceição Santana de Carvalho 3 RESUMO A correção do solo e a adubação mineral feitas racionalmente são passos fundamentais para obtenção de boas produtividades na Região do Cerrado brasileiro. Altas produtividades são alcançadas (> 300@/ha), porém tem sido aplicadas grandes quantidades de corretivos e fertilizantes na cultura, elevando seu custo de produção anual, que já atinge 25% do custeio total (US$ 1559,19/ha) da lavoura. As pesquisas feitas em Goiás (período 2002-2004) e Bahia (2003/2004) têm mostrado que: 1) a calagem dever ser feita para alcançar 60% da CTC a ph 7,0 e não se deve deixar que essa saturação fique menor que 50%; sua aplicação não provoca deficiência de Cu, Fe e Zn, mas pode provocar deficiência de Mn em solos arenosos; 2) a gessagem é essencial para o aprofundamento radicular e tolerância aos veranicos, melhora a absorção dos micronutrientes, mas pode provocar lixiviação excessiva de cátions em solos arenosos; 3) a adubação com NPK deve ser feita em solo previamente corrigido para os níveis adequados ou altos, aplicando-se as quantidades de nutrientes exportada da área pelas colheitas anteriores, sempre trabalhando com o alvo de melhor produtividade média obtida na região ou na propriedade; 4) São exportadas 150, 55, 99, 18, 63 e 15 kg/ha de N, P 2O 5, K 2O, CaO, MgO e S, respectivamente, para produção de 300 @/ha/ano; 5) os teores foliares adequados são coerentes com os existentes na literatura; 6) as doses de N, P 2O 5 e K 2O suficientes para alcançar as melhores rentabilidades estão situadas entre 120-170, 80-140 e 80-170, respectivamente; além dessas doses somente são rentáveis em locais com produtividades superiores a 300@ ou em condições de correção da fertilidade do solo para alcançar os níveis adequados dos nutrientes, como investimento; 7) 4 kg/ha/ano a lanço e o uso das recomendações tradicionais de adubação corretivas com micronutrientes catiônicos a lanço ou parcelada no sulco de plantio devem suprir as necessidades do algodoeiro por períodos mínimo de 4 anos. A análise do solo e da folha, o histórico da área (ex.: produtividade), o conhecimento da 1 Palestra apresentada no V Congresso Brasileiro de Algodão, Salvador-BA, 29 de julho a 1 de agosto de 2005. 2 Eng. Agrônomo, D.Sc., Pesquisador da Embrapa Algodão, R. Osvaldo Cruz, 1143, Centenário, 58107-720, Campina Grande-PB. E-mail: gilvanbf@cnpa.embrapa.br. 3 Eng. Agr., D. Sc., Pesquisadora da Embrapa Algodão, Núcleo de Goiás. Caixa Postal 714, 74001-970 Goiânia, GO. E-mail: mcscarva@cnpa.embrapa.br
resposta diferencial das variedades e do potencial produtivo local, além da conjuntura econômica, são fundamentais na definição das melhores doses a serem aplicadas. 1 INTRODUÇÃO O algodoeiro tem sido cultivado com sucesso nos cerrados de Goiás e Bahia, especialmente em sucessão com a soja. O padrão tecnológico de exploração do algodoeiro é baseado em grandes propriedades, forte mecanização das etapas da produção e alto uso de insumos e demais tecnologias. Os custos de produção são elevados, mas se obtêm produtividades altas que compensam o investimento. São gastos US$ 344,22/ha com corretivos e fertilizantes para as condições do cerrado de MS, GO, MT e BA, cerca de 23% do custo de produção (US$ 1559,91/ha) e com tendência de elevação. Nesse contexto, o uso eficiente da adubação associado a correta racionalização de todo o processo produtivo são essenciais para obtenção de altas produtividades, redução de custo por arroba de algodão produzido e viabilização dos sistemas de produção existentes no Cerrado. O estudo sistemático da adubação e calagem do algodoeiro em Goiás vem sendo realizado intensivamente a partir de 2002, tendo sido acumulado resultados de três safras consecutivas. As pesquisas feitas na Bahia, por outro lado, vem sendo realizada de forma mais ampla a partir da safra 2003/2004, apesar de alguns trabalhos iniciais terem sido feitos desde a safra 1999/2000. Neste trabalho serão mostrados os resultados mais significativos obtidos até o momento. 2 PRINCÍPIOS Dada a tentação sempre presente em se aumentar a produtividade com o uso de quantidades crescentes de fertilizantes e corretivos, em detrimento da rentabilidade da área, convém lembrar que existem alguns princípios que regem as práticas de correção da fertilidade e adubação das culturas. Primeiro, a adubação é apenas um fator de produção que permite alcançar ou maximizar o potencial produtivo, porém apenas o clima local e a variedade cultivada definem esse potencial. Adubações com expectativas de produtividades irrealistas é prejuízo na certa. Segundo, as leis biológicas precisam ser atendidas para otimizar a resposta, diminuir os riscos financeiros e ambientais. Terceiro, há uma racionalidade no fluxo de nutriente no sistema solo-planta, sendo a adubação a diferença entre o requerimento de
nutriente para a produção esperada e a quantidade de nutriente ofertada pelo solo na condição atual de fertilidade, considerando as perdas normais do sistema. Quarto, o conhecimento do histórico da área é fundamental na definição das doses a serem usadas, diminuindo os riscos. E Quinto, o conhecimento da conjuntura econômica na qual será programada a safra deve definir o nível de risco financeiro da exploração e até que ponto o empresário está disposto a investir. O técnico deve ter conhecimento desse fatores para poder aproveitar todo o potencial da correção do solo e da adubação racional da cultura. 3 CORREÇÃO DA ACIDEZ SUPERFICIAL E SUBSUPERFICIAL DO SOLO Ensaios com calagem e gessagem vem sendo efetuado em Goiás desde a safra 2002/2003. Na Bahia, apenas o acompanhamento do efeito da calagem e da adubação em campo de produção foi efetuado até o momento. Os dados têm mostrados que não há resposta para elevação da saturação por bases além de 60% na camada 0-20 cm. Solos muito ácido somente devem ser cultivados com o algodoeiro após sua correção para os níveis estabelecidos, senão os patamares de produtividades serão baixos. A calagem diminui os teores de Mn na folha da planta, mas chegam até a aumentar os teores dos demais micronutrientes. Apenas em solos arenosos, com baixo teor de Mn total, deve-se esperar deficiência desse elemento com o aumento do ph para valores acima de 6,0, como ocorre comumente na Bahia. A aplicação do calcário deve ser feito com o máximo de antecedência possível do plantio. Deve-se preferir o uso de pequenas doses anuais (até 2 t/ha) a doses maiores em períodos de tempo maiores, assim a saturação em bases será mantida próximo de 60% no decorrer dos anos permitindo o alcance de maiores produtividades. O uso do gesso é disseminado em condições de cerrado, em especial sob cultivo do algodoeiro. Em Santa Helena e Turvelância, ambos no Estado de Goiás, foram montados dois ensaios para verificar o efeito do gesso nos anos agrícolas de 2002/2003 e 2003/2004. O gesso não interagiu com o calcário, porém não houve resposta a gessagem quando o volume de saturação foi superior a 60%. O gesso melhorou sensivelmente o desenvolvimento radicular abaixo da camada de 20 cm quando aplicado no solo ácido de Santa Helena. Seu uso quando na camada subsuperficial (20-40, 40-60 cm) a saturação por alumínio for superior a 20% ou o teor de cálcio for inferior a 5
mmol c/dm 3 tende a melhorar o aproveitamento dos nutrientes e água da subsuperfície. Ele provocou maior lixiviação de potássio. Na Bahia, solos supercalcareados tem sido observados. Nestes locais, a saturação supera 70% da CTC, o ph é maior do que 6,0, forte redução da matéria orgânica superficial é observada quando comparada com o cerrado nativo e forte lixiviação de bases ocorrem em apenas um ciclo de cultivo. 4 EXIGÊNCIA NUTRICIONAL O algodoeiro é exigente em adubação, necessitando de 69, 26, 73, 36, 27 e 6 kg/ha de N, P 2 O 5, K 2 O, CaO, MgO e S, respectivamente, para produzir uma tonelada de algodão em pluma. Sua exportação média, estimada na Bahia, é de cerca de 34, 12, 22, 4, 14 e 3 kg/ha/ano, respectivamente, por tonelada de algodão em pluma produzida. Os teores foliares recomendados por Silva (1999) têm se mostrado efetivo nas condições de produtividades adequadas. 5 ADUBAÇÃO COM NITROGÊNIO Os solos do cerrado têm potencial para fornecer naturalmente, pela mineralização de sua matéria orgânica, 113 a 225 kg/ha/ano na maioria das amostras. Nessas condições, as quantidades de N disponibilizadas pelo ambiente são insuficientes para cobrir a demanda média total de nitrogênio pela cultura do algodão (cerca de 312 kg/ha/ano, para uma produção de 300@/ha), sendo necessário a aplicação de adubos nitrogenados para complementar a oferta do sistema. Entretanto, os dados mostram que o sistema mantém estável no tempo uma quantidade de nutriente passível de ser manejada para uso do algodoeiro e complementação com adubação apenas para cobrir a exportação promovida pela colheita do algodão em caroço (algo em torno de 120 a 150 kg/ha/ano). Esse manejo permite superar a demanda total do algodoeiro por nitrogênio e fornecer as quantidades mínimas necessárias para obter altas produtividades. De fato, as doses de máxima eficiência econômica de nitrogênio tem se situado entre 120 e 175 kg/ha. Sua aplicação parcelada é essencial para aumentar a eficiência da adubação e diminuir a dose total necessária. A dose total pode ser parcelada pela aplicação de parte em pré-plantio (40 kg/ha), 15-20 kg/ha no sulco e o
restante em duas coberturas, no abotoamento e no florescimento da planta. Em condição de cultivo direto sobre palhada de alta relação C/N, deve-se antecipar a primeira cobertura para evitar deficiência na planta. 6. ADUBAÇÃO COM FÓSFORO O algodoeiro deve ser cultivado em solo de cerrado corrigido em sua fertilidade. Sob plantio convencional, é comum o uso de 120 a 150 kg/ha no primeiro ano de cultivo do algodoeiro, à lanço usando superfosfato simples, logo após a rotação com a soja no Estado da Bahia, em sua maior área sob plantio convencional. Em Goiás, grande parte do algodoeiro é manejado sob sistema de plantio direto ou semi-direto, sobre a palhada do milheto. Nesse sistema a adubação de pré-plantio é de uso constante. Em solo com teor de P disponível adequado, a aplicação de 80 a 140 kg/ha de P 2 O 5 a lanço ou no sulco de plantio tem permitido alcançar a máxima produtividade econômica. 7 ADUBAÇÃO COM POTÁSSIO Solos de cerrado com teores entre 31 e 40 mg/dm 3 e superior são considerados adequados e altos, respectivamente, se tiverem CTC a ph 7,0 menor que 40 mmol c /dm 3. Acima dessa CTC, os solos precisam alcançar os teores de 51 a 80 e acima disso para terem potássio adequados e altos, respectivamente, para o cultivo da maioria das culturas anuais. Nesses níveis de fertilidade, é recomendado a definição da dose de K 2O a ser aplicada baseada na exportação da área e na expectativa de produção. Produtividades máximas econômicas tem sido obtidas com o uso de doses entre 80 e 170 kg/ha. Não houve resposta significativa ao modo de aplicação de potássio em Goiás, podendo ser aplicado em pré-plantio toda a dose necessária. Na Bahia, entretanto, tem sido mostrado que o parcelamento tende a aumentar a taxa de recuperação do potássio pela planta e diminuir a dose para a mesma produtividade. Assim, a aplicação única de toda a dose de potássio nos primeiros 15 dias do plantio a lanço, como vem sendo feito atualmente, tem sido criticada por diminuir a efetividade da adubação potássica. Mais estudos são necessários para esclarecer a melhor forma de aplicação nos solos mais arenosos.
8 - ADUBAÇÃO COM MICRONUTRIENTES O algodoeiro é exigente em boro e tende a responder a adubação anual com esse nutriente. As fontes solúveis são mais adequadas e as doses superiores a 4 kg/ha, a lanço, não são recomendadas. O uso de doses menores (1 a 2 kg/ha) no sulco de plantio tem dado a mesma resposta em produção com menor custo. A aplicação de Cu, Mn e Zn no algodoeiro não provocou resposta significativa em produtividade, apesar de alterar os teores desses nutrientes no solo e na planta, mostrando que essas análises podem ser usadas no monitoramento nutricional. Entretanto, para obtenção de até 300@/ha a aplicação desses nutrientes como recomendado oficialmente tem se mostrado eficiente no suprimento de nutrientes para a cultura. 9 CONCLUSÕES A correção da acidez e da fertilidade para níveis adequados e o seu manejo subseqüente com a restituição dos nutrientes perdidos pela exportação dos nutrientes, dentro da expectativa local de produtividade, tem se mostrado mais efetivo no aumento e manutenção da produtividade com baixo custo. Calagem para saturar a CTC em 60% de bases trocáveis, gessagem anual ou bianual para preservar uma saturação de cálcio na CTC efetiva próximo a 60% na camada de 20 a 40 e 40 a 60 dão condições para alcançar os melhores patamares de produtividades com segurança e baixo custo. Doses anuais de N (120-175 kg/ha), P 2O 5 (80 140 kg/ha), K 2O (80 a 170 kg/ha) e B (1 e 4 kg/ha, respectivamente, no sulco de plantio e a lanço), conjuntamente com a aplicação de uma adubação corretiva periódica de Cu, Mn e Zn permitem o alcance de produtividades rentáveis com baixo risco econômico. Os resultados das pesquisas nas próximas safras tendem a melhorar a rentabilidade e diminuir as doses atualmente aplicadas na cultura do algodoeiro. Em um sistema produtivo moderno, tecnificado, a correção do solo e adubação correta da cultura permitem o crescimento de plantas robustas, altamente produtivas, resistentes a pragas e doenças e tolerantes ao estresse hídrico. Isso permite manutenção da produtividade no tempo, redução de custo de produção e rentabilidade compatível com a atividade. Essas condições são básicas para uma agricultura competitiva e sustentável no cerrado do Brasil.