Sobre a aplicação do georadar em pontes

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Transcrição:

Sobre a aplicação do georadar em pontes Francisco M. Fernandes Tecnowave Unipessoal Lda., Avepark, Caldas das Taipas Universidade do Minho, Departamento de Engenharia Civil, Guimarães Paulo B. Lourenço Universidade do Minho, Departamento de Engenharia Civil, Guimarães RESUMO A reabilitação de pontes vem crescendo com a deterioração das pontes existentes e a sua necessária conservação mas, igualmente, a sua adaptação a novas cargas e aumento de tráfego. Este tipo de trabalhos requer técnicas e ensaios específicos, que permitam obter informação sobre e para o projecto, frequentemente inexistente ou incorrecto, de maneira totalmente não destrutiva e sem necessidade de impedir o trânsito. O georadar adapta-se perfeitamente a esses requisitos, sendo uma ferramenta essencial para o diagnóstico e a recolha de informações em pontes de betão armado e alvenaria. Este permite obter informação sobre a geometria e a armadura em pontes de maneira rápida e eficiente. PALAVRAS-CHAVE Geometria, pré-esforço, armadura, georadar, ensaios não destrutivos 1. INTRODUÇÃO As pontes são elementos chave duma infra-estrutura de transporte, pelo que a sua regular manutenção e o seu reforço atempado para fazer face a aumentos de carga e/ou volume de trânsito são fundamentais. A grande maioria das pontes portuguesas, essencialmente rodoviárias, foi construída recorrendo ao betão armado e pré-esforçado e datam dos anos 70 e 80. Actualmente, essas pontes encontram-se em estado de degradação devido, essencialmente, à falta de manutenção regular (pois imaginava-se que o betão armado durava para sempre), construção deficiente (betão de fraca qualidade, poroso; recobrimento da armadura muito baixo ou inexistente) e aumento exponencial das cargas, o que acelerou a deterioração e deformação dessas infra-estruturas. Adicionalmente, existem em Portugal numerosas pontes em alvenaria que, pelo período de construção, não foram preparadas ou projectadas para as cargas que neste momento suportam, pelo que estas apresentam numerosas anomalias, tais como deformação dos tímpanos, fendas nos arcos, etc., tendo sofrido deterioração por falta de manutenção regular. O acidente de Entre-os-Rios levantou a questão da durabilidade e do estado de conservação das pontes nacionais, pelo que foram levadas a cabo um grande número de inspecções, tendo sido avaliadas milhares de pontes e do que resultou que grande parte apresentavam deficiências estruturais e necessitavam duma intervenção. Para a realização dos projectos de reforço/conservação, é necessária uma descrição rigorosa do estado de conservação, assim como das características geométricas e estruturais da ponte. No entanto,

numerosas vezes o projectista defronta-se com a inexistência do projecto original, ou com uma construção deficiente que não respeita o projecto, muitas vezes só equacionadas ou encontradas na altura da execução da obra. Para essas situações, a execução de ensaios não destrutivos com georadar permite, minimizando a execução de carotes ou abertura de roços, determinar com rigor a estrutura interna dos diversos elementos constituintes das pontes, e que são fundamentais para a elaboração do projecto e a sua execução em obra. O Georadar (ou GPR, Ground Penetrating Radar, em inglês) tem sido habitualmente utilizado na última década na investigação e diagnóstico, de maneira totalmente não destrutiva, de elementos estruturais em vários sectores da construção civil [1, 2, 3]. É uma técnica não destrutiva que utiliza ondas electromagnéticas e particularmente útil para sondar a composição de materiais não condutores, tais como o betão e a alvenaria, e detecta objectos metálicos e não metálicos. É um ensaio rápido que permite, inclusive, obter informação directamente in situ. O funcionamento do georadar baseia-se na emissão de ondas electromagnéticas através duma antena emissora, da sua propagação através dum determinado material e da leitura das ondas reflectidas pelas descontinuidades na impedância, ou características dieléctricas, entre os materiais que se encontram na área investigada. O georadar é muito eficiente na detecção de elementos metálicos já que as ondas emitidas são integralmente reflectidas por estes, sendo o método mais indicado para a detecção de armaduras em estruturas de betão armado. O equipamento típico está ilustrado na Figura 1. A antena é o componente mais importante e a sua escolha depende do tipo de investigação, do material, e do rácio alcance/resolução pretendido pelo utilizador. Normalmente, altas frequências são utilizadas para uma inspecção muito precisa mas não possuem um alcance muito elevado, enquanto para atingir uma maior profundidade devem ser utilizadas antenas de frequência baixa, tendo como contrapartida uma resolução e precisão menores. Em geral, devido às dimensões dos elementos constituintes das pontes em alvenaria, em média à volta dos 0.4-0.6 m, uma inspecção com georadar necessita de uma frequência média (a partir de 500 MHz para cima). No caso de pontes de betão armado, onde o objectivo é resolver espessuras que variam dos 0.03 m (betão de recobrimento) aos 0.5 m (espessura de vigas e tabuleiros) e espaçamentos entre varões entre 0.05 e 0.3 m, são necessárias antenas com frequências superiores a 1 GHz. Figura 1. Exemplo de equipamento típico (a partir da esquerda): unidade de controlo, antena de alta frequência (1.6 GHz) e unidade de visualização. 2. O GEORADAR NA INSPECÇÃO DE PONTES Actualmente, muitas das pontes em Portugal precisam ou estão a ser intervencionadas. Os objectivos podem ser de diversa natureza, como por exemplo: reabilitação/reparação da totalidade ou de parte da estrutura devido ao mau estado dos materiais ou à

observação de deformações acentuadas, fenda e aumento do tabuleiro para fazer face ao aumento do trânsito e reforço deste face ao consecutivo aumento das cargas a suportar. Uma intervenção numa ponte requer a descrição rigorosa das características geométricas, materiais e estruturais, assim como o conhecimento do estado de conservação actual da estrutura. Informação sobre a espessura e deterioração dos materiais, densidade de armaduras, existência e localização do pré-esforço são parâmetros fundamentais para o projectista, assim como para o construtor que, na altura da execução do projecto, deverá sempre verificar a situação de hipótese do projecto. Isto é particularmente útil nos casos de pontes onde não existe projecto e a qualidade de construção é muito baixa e sempre que haja dúvidas sobre determinada situação. O georadar permite obter informação sobre diversos parâmetros relevantes para o projecto de pontes, assim como para a verificação da sua boa aplicação em obra, especialmente em casos de obras novas. Nomeadamente, o georadar é utilizado em pontes para a detecção da armadura ordinária, a determinação do betão de recobrimento, da espessura de elementos estruturais e de pavimentos rodoviários, a localização de cabos e bainhas de pré-esforço, para a avaliação do estado e/ou composição do enchimento de pontes de alvenaria, entre outros, só para citar os mais frequentes. Em geral, a cada tipo de ponte correspondem determinados parâmetros que são passíveis de determinar com o georadar, assim como existem informações comuns a pontes de alvenaria e pontes de betão armado, e que serão aqui apresentados. Cada situação será ilustrada com exemplos oriundos da experiência do Departamento de Engenharia Civil da Universidade do Minho. 2.1 Pontes em alvenaria Nas pontes em alvenaria, os parâmetros mais solicitados são relativos às dimensões dos vários elementos estruturais, material de enchimento e a espessura das camadas dos revestimentos dos pavimentos para determinação das cargas a que essas pontes estão sujeitas. Geralmente, os parâmetros mais frequentes dizem respeito à espessura da pedra dos arcos e das paredes nos tímpanos. O exemplo ilustrado na Figura 2 exemplifica o resultado duma leitura longitudinal com uma antena de 800 MHz por cima do tabuleiro na ponte Nova de Porto de Mós. Como se pode verificar, o extradorso é detectado numa grande extensão enquanto o intradorso só é detectado numa pequeno troço, localizado no centro do arco. Isto é em parte devido ao facto de que grande parte da energia emitida é perdida na reflexão com o extradorso, derivado do facto de que o contraste (da constante dieléctrica) entre a pedra e o enchimento é elevado, e devido à orientação da superfície do arco relativamente à superfície, que faz com que uma grande parte da onda seja reflectida fora do alcance da antena receptora. De igual modo, devido ao maior tempo de propagação necessário, o sinal pode ter sofrido maior atenuação. Só na zona de menor distância entre o arco e o pavimento é que se consegue distinguir a espessura do arco. Figura 2. Exemplo dum radargrama do arco de maior dimensão, exibindo a interface entre o enchimento e o arco de pedra. Fotografias do arco e do pavimento da ponte.

Como a propagação das ondas na pedra é desconhecida, geralmente, deve-se recorrer a um carote para calibração da velocidade de propagação. Para tal, foi realizado um perfil transversal (ver radargrama na Figura 3) sobre o pavimento ao longo do eixo do arco. O conhecimento do tempo de propagação entre o intradorso e o extradorso e a sua espessura num local sondado permitiu obter um valor mais correcto para a velocidade de propagação e, assim, determinar com maior rigor a espessura, a evolução da espessura, do arco de pedra. No entanto, em caso de impossibilidade de efectuar carotes para calibração, deve-se recorrer a tabelas presentes na literatura da especialidade e para diversos materiais [1, 4, 5]. Perfil transversal, incluindo os passeios Figura 3. Exemplo de radargrama e carote para calibração da velocidade de propagação. Nesta situação, a espessura do arco foi determinada por cima. No entanto, é mais eficiente determiná-la por baixo, pois a distância entre a superfície de inspecção e a interface que se quer detectar está mais próxima, além de sofrer menos perturbações por não ter de atravessar o material de enchimento, geralmente de natureza muito heterogénea. A Figura 4 ilustra uma situação em que a sondagem foi realizada por baixo do arco. Material de enchimento Espessura do arco Superfície do ensaio Figura 4. Exemplo de sondagem realizada directamente no intradorso do arco, através da construção de um andaime sob o arco, e respectivo radargrama (antena de 500 MHz). Relativamente ao material de enchimento, é possível verificar a heterogeneidade do material (exemplos anteriores) mas, de igual modo, a presença de humidade (Figura 2). Na Figura 5 é possível observar um exemplo de um radargrama realizado na ponte do Zameiro, em Vila do Conde, onde, para além da espessura do arco maior (mais próxima da superfície de sondagem) se pode observar uma zona num dos apoios com forte atenuação do sinal após alguns centímetros de penetração, o que indicia fortes infiltrações de humidade. Tal facto poderá indiciar uma falha na impermeabilização do pavimento da ponte já que a sua proximidade ao tabuleiro e a não observação deste fenómeno noutros apoios coloca de fora a humidade ascendente.

Arco principal Arco secundário (mais abaixo) Material de enchimento muito heterogéneo (vazios, pedras) Reflexão da superfície da água Figura 5. Exemplo de sondagem realizada sobre o tabuleiro de ponte em alvenaria com uma antena de 500 MHz. 2.2 Pontes em betão armado Mancha de humidade localizada As pontes em betão armado, pela sua maior dimensão e complexidade, requerem um estudo muito aprofundado das suas características geométricas, matérias e estruturais. Em geral, a inspecção deste tipo de infra-estruturas passa pela obtenção de informação sobre a geometria e a composição dos seus elementos estruturais e do seu estado de conservação (fendas, humidade, corrosão, etc.), determinação da armadura (diâmetro, recobrimento, espaçamento, etc.), localização de elementos de pré-esforço e determinação da espessura dos pavimentos para efeitos de cálculo das cargas aplicadas. A determinação da geometria dos elementos duma ponte em betão armado geralmente só é necessária que só existe acesso por um dos lados do elemento a sondar, como no caso dos tabuleiros, paredes de contenção e nos encontros de pontes, visto que a grande maioria dos elementos (vigas, pilares, carlingas) está acessível por qualquer lado, o que possibilita a determinação da sua geometria sem recorrer ao georadar. Na Figura 6 está ilustrado um radargrama dum tabuleiro em betão armado que atravessava sobre um oleoduto na área industrial de Sines. A sondagem foi realizada com uma antena de 1.6 GHz, que permitiu determinar a espessura do tabuleiro e verificar que o enchimento não apresentava grandes heterogeneidades, o que permitiu que o sinal do georadar se propagasse bem e com poucas perdas. Devido à distância entre o tabuleiro e a superfície de sondagem, a antena não foi sensível à armadura, assistindo-se a um redução da sua resolução, tendo esta sido detectada com sondagens por baixo do respectivo tabuleiro. Na mesma figura pode observar-se a determinação da espessura do pavimento rodoviário. Figura 6. Exemplo dum radargrama longitudinal dum viaduto onde se pode observar a espessura da laje do tabuleiro e o enchimento (de saibro) entre o pavimento rodoviário e o tabuleiro. Foi possível determinar igualmente a espessura do pavimento betuminoso. No entanto, como já foi descrito anteriormente, a detecção da armadura e a localização de pré-esforço é uma das utilizações mais frequentes do georadar. A detecção da armadura

(número de varões e distribuição) e do pré-esforço é particularmente importante nos casos em que não existe projecto ou informação original para se proceder ao dimensionamento duma intervenção. Geralmente, uma frequência superior a 1 GHz permite detectar todo o tipo de armaduras embebidas no betão, quer em termos de diâmetro e profundidade. Os exemplos ilustrados a seguir mostram a sondagem dum viaduto em betão armado. Na ausência de qualquer projecto original, a estrutura foi sondada com georadar para a determinação da espessura do pavimento rodoviário e para a determinação da armadura nas situações onde outros métodos, nomeadamente detectores de armaduras tipo Ferroscan, não obtém resultados devido à profundidade a que estas estavam localizadas. Na Figura 7, detectou-se a armadura transversal nos apoios intermédios e nos vãos do viaduto, sendo que nos vãos, o espaçamento entre varões era metade da dos apoios. Já a Figura 8 ilustra a armadura longitudinal do mesmo viaduto, onde é possível verificar que na área correspondente à berma, a armadura encontra-se mais abaixo e os varões estão mais afastados do que na via de circulação. Estas sondagens permitiram estabelecer a distribuição da armadura positiva no viaduto, ilustrada na Figura 9. Figura 7. Radargrama ilustrando um perfil longitudinal para a detecção da espessura do pavimento e da armadura transversal ao longo do viaduto (entre as juntas nos encontros). Figura 8. Radargrama com perfil transversal, ilustrando as diferenças da armadura na berma e na via de circulação. A diferença de 1 ns corresponde a cerca de 6 cm. Junta 8 8 4 8 4 8 8 @0.2m @0.1m @0.2m @0.1m @0.2m @0.1m @0.2m Junta 2 @0.2m Figura 9. Distribuição da armadura superior no tabuleiro do viaduto, entre juntas de dilatação.

A localização do pré-esforço é efectuada por desconhecimento da sua existência, ou para verificar a sua localização devido a uma construção menos cuidadosa [6], etc. Para além do evidente papel estrutural para o projecto, a determinação do pré-esforço pode igualmente surgir durante a execução da obra para verificar se as opções de reforço não coincidem com a localização efectiva das bainhas, e sempre que um estudo prévio para a sua detecção não tiver sido realizado. O exemplo ilustrado na Figura 10 mostra a detecção da armadura e do pré-esforço numa viga longitudinal do viaduto de Águas Santas, na A3, com uma antena de frequência de 1.6 GHz. O objectivo foi obter o traçado das bainhas existentes, ilustrado na Figura 11, para verificar se as perfurações necessárias ao reforço pudessem ser realizadas sem causar danos às bainhas existentes. Figura 10. Aquisição de perfis georadar numa viga longitudinal e radargrama resultante mostrando hipérboles referentes à armadura ordinária a às bainhas de pré-esforço. Figura 11. Posição dos cabos de pré-esforço em duas posições nas vigas perto dos encontros. Finalmente, o georadar é muito útil nas situações não estruturais, onde o objectivo é detectar os elementos pré-esforçados existentes para evitar que a intervenção não os danifique. Para além do mais, a aquisição é facilitada pois só é necessário determinar a posição dos elementos no plano. No caso seguinte (ver Figura 12), o objectivo passava por suspender uma tubagem de abastecimento de água através de barras fixas no tabuleiro. Os ensaios foram então realizados nos poços onde posteriormente seriam cravadas essas barras. O resultado dum ensaio de georadar está ilustrado na Figura 13, onde é possível verificar que foram detectados sinais de armadura de 6 mm muito próxima da superfície (hipérboles de intensidade fraca e próximas da superfície de ensaio) e as barras pré-esforçadas, situadas a uma maior profundidade e através duma hipérbole bastante mais larga e intensa, tendo as ondas sido mais sensíveis a este elemento. Poço de inspecção Antena de 1.6 GHz Figura 12. Inspecção para determinar a localização de barras pré-esforçadas embebidas no tabuleiro. Detalhe dos poços de inspecção realizadas uniformemente espaçados no passeio.

Armadura ordinária Barras pré-esforçadas Figura 13. Inspecção para determinar a localização de barras pré-esforçadas embebidas no tabuleiro. Exemplo de radargrama ilustrando a detecção de duas das barras pré-esforçadas. 3. CONCLUSÕES A aquisição de informação relevante para o projecto de reforço e conservação de pontes de maneira rápida, não destrutiva e repetível é absolutamente fundamental, e o georadar é uma metodologia adequada para obter parte dessa informação. Efectivamente, esta técnica não destrutiva permite detectar, e ajudar a compreender, a constituição estrutural das pontes em betão armado, determinando características geométricas, localizando a estimando a armadura ordinária e as bainhas de pré-esforço, e de alvenaria, estimando a espessura dos elementos de pedra e verificando a sua uniformidade. Pode igualmente ser alternativa a ensaios mais onerosos e delicados (ensaios de gamagrafia) quando usados para situações de resolução comuns. AGRADECIMENTOS O primeiro autor agradece o financiamento parcial deste trabalho pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, através da bolsa de investigação POCTI SFRH/BPD/26706/2005. REFERÊNCIAS [1] DANIELS, D.J. Ground Penetrating Radar. 2nd ed. London: IEE, Radar, sonar, navigation and avionics series, 2004, 726 p., ISBN 0-86341-360-9 [2] MAIERHOFER, C. Nondestructive evaluation of concrete infrastructure with ground penetrating radar. Journal of materials in civil engineering, 15(3), 2003, 287-297. [3] MENDES, M.T.V. Ponte Vasco da Gama, manutenção estrutural. Em Encontro 20 anos de Engenharia Civil 1986-2006, instituto Politécnico de Tomar, 2006, 7 p. [4] MARTINEZ, A.; BYRNES, A.P. Modeling Dielectric-constant values of Geologic Materials: An Aid to Ground-Penetrating Radar Data Collection and Interpretation. Current Research in Earth Sciences, Bulletin 247, part 1, 2001, 16 p. [5] REYNOLDS, J.M. An introduction to applied and environmental geophysics. John Wiley & Sons, Chichester, 2002, 806 p., ISBN 0-471-95555-8. [6] CRUZ, P.J.S. [et al.] Utilização do radar de prospecção geotécnica na localização das bainhas de pré-esforço nas pontes da Barra e de Lanheses. Em 4 as Jornadas Portuguesas de Engenharia de Estruturas (JPEE), LNEC, Lisboa, 2006, 385-394.