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Transcrição:

UNIJUI- UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. ANDRESSA SCHIAVO ENDIVIDAMENTO AGRÍCOLA DAS FAMÍLIAS DO MUNICÍPIO DE CATUÍPE ENTRE OS ANOS DE 2006-2016 IJUÍ 2016

UNIJUI- UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. DACEC- DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS, CONTÁBEIS, ECONÔMICAS E DA COMUNICAÇÃO SOCIAL. CURSO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS. ANDRESSA SCHIAVO ENDIVIDAMENTO AGRÍCOLA DAS FAMÍLIAS DO MUNICÍPIO DE CATUÍPE ENTRE OS ANOS DE 2006-2016 Monografia apresentada ao Curso de Ciências Econômicas, Departamento de Ciências Administrativas, Econômicas e da Comunicação (DACEC), da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ), requisito parcial para conclusão de curso. Orientador (a): Prof. Argemiro Luís Brum IJUÍ 2016

A comissão examinadora, abaixo assinada, aprova a monografia. ENDIVIDAMENTO AGRÍCOLA DAS FAMÍLIAS DO MUNICÍPIO DE CATUÍPE ENTRE OS ANOS DE 2006-2016 Realizada por: ANDRESSA SCHIAVO Como requisito parcial para conclusão de curso de Ciências Econômicas, de Ciências Administrativas, Econômicas e da Comunicação (DACEC), da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ), requisito parcial para conclusão de curso. Aprovada em 19 de Dezembro de 2016. BANCA EXAMINADORA Jose Dalmo da Silva de Souza Prof. Argemiro Luís Brum Prof. Argemiro Luís Brum Prof. Orientador(a)

AGRADECIMENTOS Nestes cinco anos de caminhada estudantil, muitas pessoas passaram por mim, deixando cada uma um legado diferente. Aqui expresso minha profunda gratidão a todos, pelo termino dessa caminhada. O sentimento que mais prevalece no momento é a gratidão a todos que acompanharam essa fase de minha vida. Primeiramente, agradeço a Deus, por iluminar meu caminho, sempre me dar força em minhas orações, e me conceder a serenidade, a paciência, e força para sempre seguir em frente. Aos meus pais, Maria Luiza Schiavo e Edson Luis Schiavo por acreditarem sempre no meu potencial, e me apoiarem em todos os momentos, me indicando o caminho certo a seguir. Muito obrigada por sempre estarem ao meu lado. A minha querida irmã Janine Schiavo, por sempre me auxiliar quando eu precisei, mesmo muitas vezes não sabendo o que deveria procurar para mim, sempre me ajudou. Obrigado por fazer das minhas noites de estudos mais alegres. Ao professor orientador, professor Argemiro Luís Brum, pela paciência, por auxiliarme nos momentos de dúvida, e por sempre me indicar o caminho melhor a seguir. A todos os demais, amigos e familiares que de uma forma indireta, sempre estavam ali e deram força para que este sonho se tornasse realidade. Meu sincero muito Obrigado a todos!

A persistência é o caminho para o êxito. (Charles Chaplin).

Lista de Figuras Figura 1- Linhas de crédito Pronaf dos anos de 2012\2013...17

Lista de quadros Quadro 1- Número de estabelecimentos que adquiriram o Pronaf em Catuípe RS...20 Quadro 2- Área total dos produtores do município de Catuípe (em hectares)...22 Quadro 3- Área correspondente ao plantio de Grãos (em%)...23 Quadro 4- Área semeada com milho e trigo (em%)...24 Quadro 5- Área ocupada com soja (em%)...25 Quadro 6- Área financiada pelo sistema financeiro no período (2006 a 2016)...26 Quadro 7- Área financiada na última safra 2015\16 (em%)...27 Quadro 8- Inadimplência média dos produtores de Catuípe em relação ao total financiado entre 2006 a 2016 (em%)...28 Quadro 9- Inadimplência em 2015\16 em relação ao total financiado (em%)...29 Quadro 10- Valor aproximado da inadimplência dos produtores de Catuípe no acumulado de 2006 até outubro 2016...30 Quadro 11- Inadimplência sobre o faturamento anual (em%)...31 Quadro 12- Volume de crédito para investimentos captados pelos produtores de Catuípe (em R$)...32

SUMÁRIO RESUMO...9 INTRODUÇÃO...10 CAPITULO 1...12 CONTEXTUALIZAÇAO DE CRÉDITO AGRÍCOLA E AGRICULTURA FAMILIAR...12 1.1 Agricultura Familiar...13 1.2 Crédito Agrícola e sua Utilização na Propriedade...15 1.1.2 Crédito Pronaf...16 CAPITULO 2...22 EVOLUÇÃO DO ENDIVIDAMENTO DAS FAMÍLIAS DE AGRICULOTORES DO MUNICÍPIO DE CATUIPE...22 2.1 Os agricultores de Catuípe e o Sistema Financeiro...26 CAPITULO 3...33 ANÁLISE DOS FATORES: UM BREVE DIAGNÓSTICO SOBRE O QUE OCORREU ENTRE 2006 E 2016...33 CONSIDERAÇÕES FINAIS...36 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...38 ANEXO...40

9 RESUMO Este trabalho tem como objetivo central destacar alguns motivos pelo qual as famílias agricultoras do município de Catuípe (RS) vêm sofrendo grandes impactos em suas rendas familiares em função de fortes endividamentos e consequentes inadimplências. Tomou-se como referência o período de 2006 a 2016 e adotou-se como metodologia o método de entrevista com uma amostra de 50 produtores rurais do município. Buscou-se desenvolver uma análise que possa explicar as situações que levam tais agricultores a aumentarem seu endividamento, especialmente levando-se em conta o atual contexto de recessão econômica por que passa o país. Conclui-se que o endividamento e a inadimplência são importantes na região estudada, situação motivada não só por questões climáticas, mas igualmente por desconhecimento dos produtores quanto as características dos contratos de crédito assumidos. Palavras-chaves: Endividamento agrícola, agricultores rurais, crédito agrícola, município de Catuípe.

10 INTRODUÇÃO O Brasil tem no setor primário uma de suas forças econômicas. E no setor primário a agricultura assume um papel preponderante. O Rio Grande do Sul, onde a modernização desta agricultura nasceu, ainda nos anos de 1950, é um dos berços nacionais da produção de grãos, particularmente trigo e soja. E o Noroeste gaúcho se notabilizou um pioneiro nestas duas produções. Essa região é formada por municípios relativamente pequenos em área, os quais são compostos, em sua maioria, por pequenos e médios produtores rurais. É o caso de Catuípe, objeto do presente estudo. Sua base produtiva, além de trigo e soja, se concentra igualmente no milho, no leite e na suinocultura. Sua produção, além do abastecimento local e regional, igualmente é vendida para o restante do país assim como, no caso da soja, exportada para o resto do mundo. Em os produtores rurais sendo pequenos e médios, sua renda média igualmente acaba não sendo expressiva, tendo na diversificação de atividades um elemento importante de sobrevivência. Mesmo assim, a produção de grãos, e particularmente da soja, se mantém como das mais importantes. Essas atividades contam com crédito público subsidiado, fato que estimula sua produção. Todavia, tais facilidades não impedem que os produtores locais enfrentem seguidos momentos de crise, potencializados por altos endividamentos e uma inadimplência importante, especialmente nos últimos anos. A recessão econômica vivida pelo Brasil em 2015 e 2016 apenas aumenta o problema, gerando uma crise muito grande entre estas famílias rurais, as quais já não estão mais conseguindo se manter em suas propriedades. Além da crise econômica geral, o setor primário local convive com recorrentes problemas climáticos que reduzem o volume das safras e aumentam o endividamento das propriedades rurais. Não é preciso destacar que tais situações atingem também o conjunto dos municípios já que a atividade primária ainda é, na maioria dos casos, a principal fonte de renda e emprego regional. Catuípe, portanto, não foge à regra. O presente trabalho captou que nos últimos anos as famílias de agricultores do município de Catuípe (RS) apresentam um crescimento no seu endividamento. Duas hipóteses poderiam explicar esta realidade. Em primeiro lugar, o movimento de endividamento acompanha o processo que ocorre no conjunto da sociedade brasileira, não havendo uma estratégia diferenciada, por parte dos produtores rurais, em compreender e enfrentar a crise instaurada no país. Em segundo lugar, os produtores rurais, mesmo percebendo a crise chegar,

11 enfrentam um problema clássico de forte aumento nos seus custos de produção, acompanhado de uma redução relativa dos preços recebidos pelos seus produtos, o que ocasiona uma redução de renda bruta, a qual não é acompanhada por cortes relativos nas despesas da família. Estas famílias recorrem a bancos locais para manterem seu ritmo de vida, muitas vezes rolando as dívidas agrícolas. O problema do endividamento e da inadimplência dos prod1utores rurais tomou-se o município de Catuípe (RS) como referência para este estudo. Além de uma recuperação teórica sobre o crédito rural e o endividamento, buscou-se conhecer a realidade concreta destes produtores tomando-se como base o período de 2006 a 2016. Para tanto, igualmente se realizou uma pesquisa de campo, com entrevistas diretas junto a uma amostra de 50 produtores rurais atuantes no município. Portanto, a metodologia utilizada está composta de pesquisas bibliográficas, a partir de dados secundários, complementada com dados primários obtidos a partir de pesquisa de campo junto aos produtores rurais do município de Catuípe (RS). Esta pesquisa define-se como exploratória, constituindo-se em pesquisa de amostragem para levantamento de dados primários, realizada com famílias agricultoras do município; e em pesquisa bibliográfica nos livros e notícias para descrever conceitos que contemplem o atual cenário econômico em que vivemos. Os dados primários foram buscados a partir dos produtores rurais, via suas organizações sindicais. Buscou-se uma parcela representativa de agricultores de diferentes tamanhos de propriedade, definidas em Agricultura Empresarial e Agricultura Familiar segundo a Sociedade Rural Brasileira. O presente trabalho está dividido, além desta introdução e das considerações finais, em três capítulos. O primeiro recupera a bibliografia existente em torno crédito agrícola, as linhas que determinam estes créditos, e a agricultura familiar do município de Catuípe. O capítulo dois apresenta o resultado da pesquisa de campo, com dados estatísticos e análise dos mesmos. O terceiro capítulo trata de apresentar, mesmo que de forma sucinta, os fatores que levaram os agricultores de Catuípe a se endividarem e gerarem uma inadimplência relativamente importante nos 10 anos analisados.

12 CAPITULO 1 CONTEXTUALIZAÇÃO DE CRÉDITO AGRÍCOLA E AGRICULTURA FAMILIAR O setor primário brasileiro tem uma participação importante no Produto Interno Bruto (PIB) do país. Em 2015, enquanto o PIB nacional acusava um resultado negativo de 3,8%, o setor primário crescia positivamente 1,8%. O sucesso do setor se deu particularmente em função da boa performance da agricultura. Paralelamente, a indústria registrava queda de 6,2% e o setor de serviços recuo de 2,7%, segundo o IBGE. Por sua vez, as exportações do país são muito importantes. Em 2015 o país era considerado o terceiro maior exportador agropecuário do mundo, tendo como seus principais produtos a soja em grão, com 54,32 milhões de toneladas, o milho com 28,9 milhões de toneladas, o farelo de soja com 14,8 milhões de toneladas, a celulose com 11,97 milhões de toneladas, a carne de frango in natura com 3,89 milhões de toneladas e o café com 2,09 milhões de toneladas. Esse desempenho traz maior geração de emprego e renda. Segundo Cadastro Geral de Empregos e Desempregos (CAGED), no ano de 2015 o Brasil gerou 9.821 empregos no setor agropecuário, em um momento em que os demais setores desempregavam fortemente. Especificamente no Rio Grande de Sul, aproximadamente 8 milhões de hectares são semeados anualmente com soja, milho e trigo. A produção gaúcha de soja gira ao redor de 16 milhões de toneladas, a de milho 5,8 milhões, a de arroz 8 milhões e a de trigo 2,2 milhões de toneladas (safra 2015/16). A produção de soja, entre 2000 e 2015, incentivada pela demanda externa e pela alta dos preços recebidos pelos agricultores, avançou significativamente. Somente entre 2006 e 2014, segundo a Fundação de Economia e Estatística (FEE), a soja foi responsável por cerca de 40% do crescimento do valor da produção agropecuária gaúcha. Nesse contexto, a agricultura familiar abrange cerca de 30% de área ocupada, com aproximadamente 378.000 unidades familiares, e cerca de 6 milhões hectares de plantio. 1.1 Agricultura Familiar A agricultura familiar em suma é uma agricultura de gestão familiar como já diz o próprio nome, para melhor conceituar, segundo ABRAMOVAY,

13 A agricultura familiar é aquela em que a gestão, a propriedade e a maior parte do trabalho, vêm de indivíduos que mantêm entre si laços de sangue ou de casamento. Que esta definição não seja unânime e muitas vezes tampouco operacional. É perfeitamente compreensível, já que os diferentes setores sociais e suas representações constroem categorias científicas que servirão a certas finalidades práticas: a definição de agricultura familiar, para fins de atribuição de crédito, pode não ser exatamente a mesma daquela estabelecida com finalidades de quantificação estatística num estudo acadêmico. O importante é que estes três atributos básicos (gestão, propriedade e trabalho familiar) estão presentes em todas elas. (ABRAMOVAY, 1997, p.3). A agricultura familiar ainda pode ter vários membros numa única unidade familiar, como por exemplo, constituída por cunhados, pais e filhos, primos em fim, familiares. A renda obtida tanto pode servir como complemento que reforça e garante a reprodução da exploração agrícola como pode indicar uma estratégia de segunda opção da atividade agrícola na reprodução social. Ainda temos que levar em conta, que uma unidade de produção familiar, não pode ser restrita uma unidade cooperativista. Os fatores econômicos são dados como sociais, ou seja, a produção não se resume a uma atividade isolada. Podemos ainda dividir a agricultura familiar em três esferas, a Família Agrícola de Caráter Empresarial, a Família Camponesa e a Família Agrícola Urbana. A Familiar Agrícola de caráter Empresarial, ou os chamados verdadeiros agricultores, tem sua produção ligada a produção para o mercado, obedecendo a satisfação de índices e a rentabilidade e produtividades crescentes. Caracteriza-se em si por uma conjunção de fatores econômicos que são favoráveis a exportação de produtos. A Familiar camponesa, esta não visa o aumento da rentabilidade e da produtividades crescente e generalizada, mas sim, em manter a família em determinadas condições sociais e culturais. Nesta o trabalho em família é considerado mais importante, do que a rentabilidade da produção das terras. A Familiar Agrícola Urbana está é bem parecida com os propósitos da familiar camponesa, porém se distingue por expressar um grande vínculo com a localidade particular. Esse modelo está estabelecido sobre um sistema de valores próprios que orienta a produção agrícola, não em função do lucro e da produtividade crescentes, mas para a melhoria da qualidade de vida, sem deixar de considerar a realidade do mercado e obviamente a capacidade de retorno com termos de rendimento. O universo da agricultura familiar no Brasil é bem diferenciada, pois vai desde famílias muito pobres, com um pedaço de terra que dificilmente pode servir para a produção sustentável, até

14 famílias com ótimos recursos, onde possuem uma boa capacitação e terras com ótima produtividade. Ainda segundo ABRAMOVAY A agricultura familiar não é um fenômeno tão generalizado que não pode ser explicada pela herança histórica camponesa, de fato, em alguns casos existentes, na verdade, o Estado foi determinante na moldagem da atual estrutura social do capitalismo agrário das nações centrais. Uma agricultura familiar, altamente integrada ao mercado, capaz de incorporar os principais avanços técnicos e de responder às políticas governamentais não pode ser nem de longe caracterizada como camponesa. (1992, p. 19). Apesar desta colocação, de uma família não poder ser considerada camponesa, as raízes da agricultura familiar começou exatamente assim. Com algumas famílias, que possuíam pequenas quantidades de terras, que produziam para consumo próprio, e que no decorrer do desenvolvimento do país, foi crescendo e desenvolvendo qualidades para produzir produtos que hoje exportamos para o mundo todo. Ainda segundo o Organização das Nações Unidas (ONU), a agricultura familiar tem uma imensa capacidade de erradicar a fome em todo o mundo, pois é a única que tem a capacidade de produzir inúmeros produtos alimentares para todo o mundo, e além disso tem a capacidade de alcançar a segurança alimentar sustentável, produzindo para escolas, creches, entre outros. No Brasil a agricultura familiar abrange 84% de todas as propriedades rurais, e além disso, emprega mais de 5 milhões de famílias. Mas para que toda esta produção ocorra, precisa-se ter renda, ou seja, para que ocorra o plantio, ou até mesmo a produção leiteria, o produtor rural (proprietário da terra) precisa ter dinheiro para produzir, investir no seu negócio. Então acontece a busca por crédito, financiamentos, entre outros. 1.2 O Crédito Agrícola e sua Utilização na Propriedade Rural A agricultura familiar desempenha papel fundamental para o crescimento da economia do estado do Rio Grande do Sul e para a melhoria das condições de vida das populações urbanas e rurais. As políticas públicas para agricultura multiplicam e qualificam a produção primária e são as principais fontes de recursos para alavancar investimentos que visam aumentos e melhorias na qualidade da produção.

15 Como mencionado, para que um produtor rural (proprietário de terras) consiga alavancar seu negócio, primeiramente ele precisa ter algumas noções básicas, conhecimento, de qual investimento fazer, e como fazer. Para melhor explicar, crédito agrícola é...são formas de empréstimos financeiros, no caso, efetuados ao agropecuarista e destinado para operações de investimento, capital de giro e custeio e\ ou pecuário (Massilon, 2000). Segundo o Banco Central do Brasil o crédito agrícola foi criado mais ou menos no ano de 1576, mas somente em 1778 na Lisboa que este teve um programa destinado a famílias agricultoras, com o intuito de auxiliar as mesmas a aumentar a produtividade de suas terras. O crédito é dividido basicamente em crédito de custeio que ficam disponíveis quando os recursos se destinam a cobrir despesas habituais dos ciclos produtivos, da compra de insumos à fase de colheita; e o de investimento que são aplicados em bens ou serviços duráveis, cujos benefícios repercutem durante muitos anos. Tem como função garantir e auxiliar o produtor rural linhas de créditos que possam auxilia-lo a manter e melhor seu plantio, investimentos na lavoura, entre outros. Os produtores rurais do município de Catuípe recorrem a créditos que os bancos locais, cooperativas de créditos, ou até mesmo empresas privadas oferecem. Estes são de diferentes naturezas, mas o mais utilizado pela população Catuipana é o crédito do Pronaf. 1.1.2 Crédito Pronaf. O Pronaf é uma política pública, criada pelo governo federal em 1996, com a finalidade de promover o desenvolvimento sustentável do segmento rural constituído pelos agricultores familiares, de modo a propiciar-lhes o aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria de renda. Seus recursos são destinados aos agricultores familiares, os quais têm acesso a esses recursos via agentes financeiros autorizados. Estes por sua vez, fazem análise de crédito dos tomadores para avaliar a concessão ou não dos financiamentos. No entanto, como qualquer outra modalidade de crédito há o risco. Este crédito já abrange mais de 2,6 milhões de famílias agricultoras, hoje este já é considerado um exemplo de política pública que é um sucesso. No decorrer dos últimos 20

16 anos decorrentes, o programa já atingiu aproximadamente de 5.379 municípios. Qualquer agricultor com renda bruta de até R$360 mil pode participar do programa. Este crédito surgiu para melhorar e renovar as formas de financiamentos existentes. Está fortemente associada ao nível tecnológico e a produtividade agrícola. O crédito do Pronaf é constituído por 16 linhas de crédito, sendo as mais conhecidas as de custeio e de investimento. A linha de Pronaf custeio destina-se ao financiamento das atividades agropecuárias e não agropecuárias e de beneficiamento ou industrialização de produtos. Sua principal utilização é para aquisição de insumos, horas máquina para o plantio, limpeza da lavoura apara depois fazer colheita do que foi produzido. Já o Pronaf investimento é destinado ao financiamento da implantação, ampliação ou modernização da infraestrutura de produção e serviços, agropecuários ou não agropecuários, no estabelecimento rural ou em áreas comunitárias rurais próximas. Podemos observar na figura abaixo, as 16 linhas de créditos que o Pronaf possui, juntamente com a faixa salarial, que são: Pronaf Custeio; Pronaf Investimento (mais alimento); Microcrédito Rural; Pronaf Agroecologia; Pronaf Mulher; Pronaf Eco; Pronaf Eco Dendê; Pronaf Eco Seringueira; Pronaf Agroindústria; Pronaf Semiárido; Pronaf Jovem; Pronaf Floresta; Pronaf Custeio e Comercialização de Agroindústrias Familiares; Pronaf Cota-parte; Pronaf investimento para a Reforma Agraria; e o Pronaf custeio para a Reforma Agraria. Figura 1- Linhas de crédito Pronaf no ano de 2012/2013

17 Fonte: Contag O Pronaf custeio e o investimento são aqueles que financiam as atividades agropecuárias e não agropecuárias como já mencionado anteriormente. Os demais têm princípios parecidos, mas cada um com sua finalidade. Pronaf Agroindústria é um crédito de investimento que visa o beneficiamento, o processamento e a comercialização da produção agropecuária de produtos florestais. Pronaf Agroecologia é destinado a financiamentos de sistemas agroflorestais. Pronaf Eco linha de crédito destinada a investimento em energia renovável e sustentabilidade ambiental.

18 Pronaf Eco Dendê e Pronaf Eco Seringueira especificamente a projetos de investimento para as culturas do dendê ou da seringueira, com custeio associado para a manutenção da cultura até o quarto ano. Pronaf Semiárido destinado a projetos sustentáveis de convivência com o semiárido, servindo para implantação, ampliação, recuperação ou modernização da infraestrutura produtiva. Pronaf Jovem crédito de investimento para atendimento a propostas de crédito de jovens agricultores e agricultoras maiores de 16 (dezesseis) anos e com até 29 (vinte e nove) anos, integrantes de unidades familiares da agricultura familiar. Pronaf Floresta crédito para investir em sistemas agroflorestais. Pronaf Mulher crédito de investimento para atender propostas de crédito das mulheres agricultoras. Pronaf Custeio e Comercialização de Agroindústrias Familiares destinada aos agricultores e suas cooperativas ou associações para que financiem as necessidades de custeio do beneficiamento e industrialização da produção própria e/ou de terceiros. Pronaf Cota-parte destinado ao financiamento da integralização de cotas-partes dos agricultores familiares filiados a cooperativas de produção ou para aplicação em capital de giro, custeio, investimento ou saneamento financeiro. Pronaf investimento para a Reforma Agraria e Pronaf custeio para a Reforma Agraria crédito para a ampliação ou modernização da estrutura de produção, beneficiamento, industrialização e de serviços. Além destas linhas, ainda existe mais uma classificação, que é chamada de grupos, os mais conhecidos são o Grupo A, o Grupo B e o grupo A\C. o Grupo A, tem como público alvo, os agricultores assetados pelo programa Nacional de Reforma Agraria (PNRA), este está ligada a linha de investimentos, e possui um limite de aproximadamente R$ 25.000,00 com juros de 0,5% ao ano. O grupo A/C é uma linha voltada ao custeio da safra, e também e direcionado aos agricultores assetados pelo programa Nacional de Reforma Agraria, tem um limite de crédito de R$ 7.500,00 com juros de 1,5% ao ano. Já o grupo B, é direcionado a agricultores familiares com renda bruta anula familiar de R$ 20.000,00, além das mulheres de agricultores que enquadram os demais grupos citados, possui um limite de crédito de R$ 4.000,00 com juros de 0,5% ao ano.

19 Em 2013, o Crédito Pronaf destinou as 5.393 municípios do Brasil mais de R$ 18 bilhões para a agricultura famílias, sendo que R$ 12 bilhões são destinados apenas para agricultores que produzem produtos hortigranjeiros. Sendo que toda a produção familiar abrange 70% dos alimentos distribuídos em todo o Brasil. É nesse contexto que o estudo procura analisar a realidade do financiamento agrícola em geral e do Pronaf em particular no município gaúcho de Catuípe. Esse município é basicamente agrícola, com produção de soja, milho e trigo, sendo que o município abrange aproximadamente 34 mil Hectares de plantio da Soja, 12 mil hectares de Trigo e 2 mil hectares em milho (Dados levantados pelo IBGE, censo 2010). Está produção está dividida entre as famílias agricultoras, que segundo dados obtidos com o sindicato rural do município, o município possuí aproximadamente 750 famílias produzindo produtos para o município. Observam-se destes dados que o município possui maior produção no plantio da Soja, safra de verão, segundo os dados levantados do IBGE (último censo 2010) a produção é de aproximadamente 34 mil hectares sendo que está tem uma produção equivalente a 17.700 toneladas de Grãos da Soja, a safra de trigo correspondente a 12 mil hectares, produz aproximadamente 22.200 toneladas em grão e o milho com aproximadamente 2 mil hectares plantadas produz 12.600 toneladas em grão. Relacionando com o estado do Rio Grande do Sul, a produção do município é relativamente pequena, no estado, a produção de soja é equivalente a 59%%, a de trigo equivale a 49% e de milho a 44%. Além da Agricultura, o município de Catuípe possui produção Leiteira, sendo a maior produção, onde muitos produtores rurais além de realizarem o plantio de grãos, ainda possuem criação de gado de corte, suínos entre outros. Sendo que dessas 750 famílias em torno de 10 famílias produzem produtos hortifrutigranjeiros 1, abastecendo os supermercados locais do município. Os agentes financiadores de crédito no município em suma são os bancos, as cooperativas de créditos, fornecedores de insumos entres outros. Podemos observar na quadro abaixo constatam uma maior abrangência de credores nos bancos locais do município de Catuípe, onde estes possuem um valor aproximado de R$ 3.942.000,00, seguidos pelos Fornecedores R$74.000,00, Cooperativas de créditos R$ 17.000,00 e outros agentes R$ 15.000,00. Como os bancos possuem um maior número de financiamentos, acabam tendo um 1 Cf. entrevista junto ao Sindicato dos Trabalhares Rurais de Catuípe (RS) em setembro de 2016.

20 problema em retornar o crédito ao banco. Pois muitas famílias que adquirem a este financiamento, não conseguem ter uma boa produção para sanar esta dívida, e também recorrem a este para tentar aliviar outras dívidas. Quadro 1- Número de estabelecimentos que adquiriram o Pronaf em Catuípe-RS Agentes financiador Crédito PRONAF Valor do Financiamento R$ Bancos 616 394 Cooperativas de crédito 5 17 Fornecedores 27 74 Outros agentes 3 15 Fonte: IBGE. Ainda que, com prazos e juros acessíveis, há alguns problemas com o crédito, problemas estes que precisam de soluções. Em suma, temos que entender, qual é a diferença entre fazer um investimento, e se este pode ou não levar ao endividamento, que é o tema do presente trabalho estudado. Muitos agricultores do município de Catuípe entendem que adquirir um empréstimo em um banco significa investir na sua produção, porém, quando o mesmo é adquirido para sanar uma dívida feita em razão desta mesma produção não se trata de investimento e sim de uma rolagem de dívida. Entende-se por investimento, segundo o Novíssimo Dicionário de Economia, escrito por SANDRONI (13º edição, 2004, Pg. 308 e pg.309) são Aplicações de recursos (dinheiro ou títulos) em empreendimentos que renderão juros ou lucros, em geral a longo prazo. Num sentido amplo, o termo aplica-se tanto à compra de maquinas, equipamentos e imóveis para a instalação de unidades produtivas como à compra de títulos financeiros Exatamente, como citado acima as diferentes linhas de crédito, o Pronaf possui o linha de investimento, que é exatamente uma ajuda para aumentar a produção. Investir em si, é melhorar, qualificar, sua produção, então, compra de maquinários que vão ser utilizados na mesma, adquirir novas terras entre outras coisas relacionadas a produção é investir, ai entra a diferença entre investir e endividar-se.

21 Na mesma linha, o endividamento é contrair dívidas, contrair obrigações, isto é, no momento em que a pessoa adquire um financiamento, ela precisa observar se há recursos suficientes para pagar a dívida e os juros que a mesma irá gerar durante o período. Empiricamente observam-se que em Catuípe a maioria dos agricultores não tem um conhecimento pleno das taxas de juros, do quanto estas aumentarão o valor final da sua dívida, ou até mesmo não conseguem observar que, às vezes, os recursos produzidos na sua propriedade rural não dão conta de pagar o primeiro financiamento, forçando a renegociações de dívida que podem gerar a chamada bola de neve do endividamento. Por outro lado, a renegociação das dívidas agrícolas é de suma importância para os agentes credores. Os mesmos organizam e delimitam os créditos que são utilizados pelas diferentes linhas e grupos citados anteriormente. Nesse sentido, a renegociação privada das dívidas se tornou um fator decisivo para muitos produtores de Catuípe, pois as quebras de safras ocorridas por diferentes fatores, em especial o climático, aumentam o risco das empresas agrícolas em geral e familiares em particular. Para melhor explicar o assunto, o próximo capitulo explanara um pouco mais sobre como desenvolveu-se o endividamento agrícola no município de Catuípe. Além disso, será ilustrado os dados coletados junto aos produtores rurais do município de Catuípe, que se sucedeu em outubro de 2016, pela autora do presente trabalho.

22 CAPITULO 2 EVOLUÇÃO DO ENDIVIDAMENTO DAS FAMÍLIAS DE AGRICULTORES DO MUNICÍPIO DE CATUÍPE A PARTIR DO CRÉDITO AGRÍCOLA. Como contextualizado no capítulo anterior, os agricultores do município de Catuípe utilizam o crédito agrícola como recurso para operar em suas propriedades, tanto o crédito de custeio quanto o de investimento. Para detectar a existência, ou não, de um processo de endividamento destes produtores, objeto deste estudo, realizou-se uma pesquisa com aproximadamente 50 agricultores do município, cujos resultados seguem nas tabelas e comentários a seguir. Quadro 2- Área total dos produtores do município de Catuípe (em hectares) Hectares Produtores Até 50 ha 14 Entre 51 e 100 ha 15 Entre 101 e 250 ha 12 Entre 251 e 400 há 9 Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Pode-se observar que dos 50 produtores entrevistados no município de Catuípe, a maior concentração de área em hectares foi na faixa de 51 a 100 hectares, com 15 produtores; em seguida, com 14 produtores, temos a faixa de até 50 ha; 12 produtores possuem entre 101 a 250 ha; e por fim, 9 dos mesmos, entre 251 a 400 ha. Vale destacar que esta é a área total que o produtor possui, incluindo a propriedade, área de floresta etc. A área apenas de plantio, ocupada por estas propriedades, é apresentada nos quadros a seguir, levando-se em conta apenas o plantio de soja, milho e trigo.

23 Quadro 3- Área correspondente ao plantio de grãos (em %) Produtores % da área 2 De 20% a 40% 10 De 41% a 60% 17 De 61% a 80% 21 De 81% a 95% Fonte: entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Nota-se que quase metade dos produtores entrevistados (21) ocupa entre 81% a 95% da área para semear os três grãos indicados. Outros 17 ocupam uma área de 61% a 80%; 10 ocupam uma área de 41% a 60%; e apenas 2 uma área de 20% a 40%. Assim, a maioria dos produtores do município ocupa acima de 60% de sua área para semear soja, milho e/ou trigo (38 produtores) sendo estas atividades as principais de sustento da propriedade. É bom lembrar que todas estas propriedades são de cunho familiar, ou seja, não empregam funcionários. Todavia, embora familiares, as propriedades atuam em caráter empresarial, pois produzem para responder aos interesses do mercado, na medida em que tais produtos são característicos de mercados tradicionais e importantes não só na região como em todo o país e mesmo mundo. Foram poucos os entrevistados em questão que possuem outra atividade, tipo a leiteira ou suinícola com o objetivo comercial.

24 Quadro 4- Área Semeada com Milho e Trigo (em %) % Milho Trigo Até 20% 18 3 Entre 21% e 50% 24 16 Entre 51% e 70% 6 19 Acima de 70% 2 12 Fonte: entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Dos 50 agricultores entrevistados, podemos notar que destes, 24 plantam entre 21% a 50% da sua área com milho, 18 destes plantam até 20% da área, 6 plantam entre 51% e 70% e apenas 2 acima de 70% da área de plantio. Já na produção de Trigo, 19 dos produtores rurais, plantam entre 51% e 70%, 16 destes plantam entre 21% e 50%, 12 plantam acima de 70%, e apenas 3 destes, plantam até 20%. Pode-se notar que a área de trigo é bem maior que a de milho, e isso não se explica pelo preço praticado e nem pelo custo de produção entre as duas culturas. A explicação pode ser encontrada em dois pontos. Em primeiro lugar, o milho concorre por área com a soja, por ser uma cultura de verão na região. Geralmente a soja, além de ser mais resistente às intempéries, possui um mercado com melhores preços proporcionais, assim como maior liquidez comercial. Em segundo lugar, é igualmente importante, os produtores rurais sempre semeiam uma parte de sua área com milho, pois o mesmo, além da necessária rotação de cultura, é um insumo decisivo para o alimento do gado leiteiro (via silagem) e da suinocultura, mesmo que estas não sejam atividades centrais das propriedades pesquisadas. Além disso, o milho serve igualmente como alimento direto para a família. No caso do trigo, a falta de boas opções alternativas para o inverno, em termos comerciais e de oferta de crédito, continua sendo a atividade principal nesta época do ano. Não se pode esquecer que o mesmo foi o embrião, ainda nos anos de 1950, do processo de modernização da agricultura do sul do Brasil. Nesse sentido, os produtores possuem estrutura física e material para manter o conhecido binômio trigo-soja até os dias de hoje. Além disso, o trigo também é usado para consumo próprio junto às famílias dos produtores, através de seu subproduto, a farinha.

25 Quadro 5- Área Ocupada com Soja (em %) % Produtores Até 40% 1 Entre 41% a 60% 20 Entre 61% a 80% 19 Acima de 80% 10 Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Já a soja possui um mercado diferente. Sua demanda é preferencialmente externa à propriedade, sendo em grande parte, através das cooperativas agrícolas, exportada para outros países. Portanto, sua liquidez é imensa e seu preço balizado muito mais por fatores como o câmbio e a Bolsa de Cereais de Chicago. Além disso, é o produto para o qual o crédito agrícola oficial mais direciona em volume anualmente. Pelo quadro anterior nota-se que 20 produtores entre 41% a 60% da área para o plantio da soja. Outros 19 ocupam entre 61% a 80% da área. Ou seja, 39 produtores ou 78% dos entrevistados ocupam entre 41% e 80% de sua área com soja. Outros 10 produtores ocupam acima de 80% desta área, e apenas 1 produtor rural afirmou usar 40% da sua área de plantio para a safra de soja. O município de Catuípe, como a maioria dos municípios do Noroeste gaúcho, assim como grande parte do Centro-Sul brasileiro, depende do setor primário em geral e da agricultura em particular como fonte de renda principal. Essa atividade, especificamente, é a fonte de renda principal da maioria das famílias, seja direta ou indiretamente. Portanto, o financiamento das lavouras agrícolas ganha uma proporção significativa no desempenho das propriedades rurais em particular, assim como implica em um processo de endividamento importante e constante a cada safra. Ora, problemas como estiagem ou doenças fitossanitárias que provocam quebras importantes na colheita colocam em xeque a adimplência destas propriedades.

26 2.1- Os Agricultores de Catuípe e o Sistema Financeiro Os agricultores brasileiros possuem uma forte dependência do crédito agrícola para financiarem as suas atividades. Os agricultores de Catuípe não fogem à regra. Conforme o quadro 6, a seguir, 88% dos produtores Catuipanos entrevistados (44 pessoas) financiam até 50% de sua área de plantio, sendo que a maioria deles (31 produtores) financiam entre 10% e 30% de sua área. Vale ainda destacar que apenas 3 produtores relataram que financiaram menos de 10% de sua área de plantio no período considerado e 4 produtores financiaram acima de 71%. Quadro 6- Área financiada pelo sistema financeiro no período (2006 a 2016) Produtores % 3 Menos de 10% 31 Entre 10% e 30% 10 Entre 31% e 50% 2 Entre 51% e 70% 3 Entre 71% e 90% 1 Acima de 90% Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Neste contexto, considerando que a maioria dos produtores pesquisados possui até 100 hectares de área total, pode-se inferir que cerca de 30% desta área é financiada e o restante depende de recursos próprios. Essa realidade está confirmada pelos dados referentes à última safra (2015/16). Conforme o quadro 7 a maioria dos produtores entrevistados (36) financiou até 30% de sua área.

27 Quadro 7- Área financiada na última safra 2015/16 (em %) Produtores % 19 Menos de 10% 17 Entre 10% e 30% 6 Entre 31% e 50% 5 Entre 51% e 70% 2 Entre 71% e 90% 1 Acima de 90% Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Observa-se no Quadro 7 que 19 dos 50 produtores entrevistados financiou menos de 10% de sua área de plantio, o que não significa dizer que não precisassem de mais recursos financiados. Outros 17 produtores financiaram entre 10% a 30% de suas áreas. Dos 50 produtores entrevistados, 6 financiaram de 31% a 50%, 5 financiaram entre 51% a 70%, dois entre 71% a 90% e apenas um financiou acima de 90% de sua área de plantio. Diante de tal quadro pode-se perguntar a razão do endividamento se poucos produtores financiaram mais de 50% de sua área de plantio. A maioria respondeu que tal financiamento serve para rolagem de dívidas anteriores, além de usá-lo para a aquisição de máquinas e implementos para a lavoura, ou ainda para a compra de automóvel, ações que desvirtuam o objetivo do financiamento. Ao mesmo tempo, tais procedimentos se dão sobre valores elevados que, em muitos casos, os ganhos com a colheita não são suficientes para pagá-los, fato que aumenta a dívida já existente, gerando uma bola de neve. O crédito Pronaf possui 16 linhas de investimentos, dentre elas as linhas para a aquisição de máquinas e para o plantio da lavoura. Nota-se, portanto, que parte do crédito que deveria ser destinado ao plantio acaba sendo desviado para a compra de máquinas e outros bens. A explicação para este fato, segundo parte dos entrevistados, estaria na existência do Proagro. Ou seja, usar o dinheiro com cobertura do Proagro paga parte, senão toda, a dívida feita com a compra de máquinas e implementos fato que não aconteceria se o produtor usasse a linha de financiamento para aquisição destes bens. Dito de outra forma, por falta de controle oficial, o dinheiro do custeio das lavouras acaba sendo usado para outros fins. Isso leva, em muitos casos, especialmente quando o mercado não está correspondendo às expectativas, aos

28 produtores preferirem que haja frustração de safra (no caso do trigo tal ação é muito comum). Obviamente, tal estratégia funciona se o sistema oficial do Proagro aceitar cobrir os prejuízos das lavouras. Em caso contrário, o endividamento do produtor acaba aumentando. O Proagro, conforme o Ministério da Agricultura brasileiro é administrado pelo Banco Central do Brasil e operado por seus agentes, representados pelas instituições financeiras autorizadas a operar em crédito rural, as quais contratam as operações de custeio e se encarregam de formalizar a adesão do mutuário ao Programa. Em 2004 foi criado o Proagro Mais, que nada mais é que um seguro público destinado a atender os pequenos produtores vinculados ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) nas operações de custeio agrícola, que passou a cobrir também as parcelas de custeio rural e investimento, financiadas ou de recursos próprios. Quando o pedido de cobertura do Proagro é negado pelo agente financeiro, o produtor pode recorrer à Comissão Especial de Recursos (CER), que é a única instância administrativa do Proagro. A CER é um órgão Colegiado, cuja Secretaria Executiva está ligada ao Ministério da Agricultura. Dito isso, a pesquisa demonstrou que dos 50 agricultores entrevistados no município, 29 relataram ter ficado inadimplentes no período de 2006 a 2016, com maior concentração entre os anos de 2008 e 2011. No quadro a seguir, demonstra-se a inadimplência média dos produtores do município de Catuípe. Quadro 8- Inadimplência média dos produtores de Catuípe em relação ao total financiado entre 2006 a 2016 (em %) Produtores % 16 Até 10% 22 Entre 11% e 30% 11 Entre 31% e 50% 1 Entre 51% e 70% 0 Entre 71% e 90% 0 Acima de 90% Fonte: Entrevista realiza pela autora em outubro de 2016.

29 Percebe-se que 66% dos produtores do município de Catuípe possuem entre 11% e 50% de inadimplência em relação do total financiado com o sistema financeiro, sendo que 22 produtores possuem entre 11% a 30% e 11 entre 31% e 50%. Dos 50 produtores entrevistados, 16 possuem até 10% de inadimplência, e apenas um entre 51% e 70%. De forma geral, nota-se que todos os entrevistados possuem algum nível de inadimplência no período considerado. Na última safra (2015/16) a inadimplência aumentou, sendo que, dos 50 agricultores entrevistados, 33 relataram ter ficado inadimplentes. Os mesmos destacaram que a inadimplência não foi um problema apenas da última safra e sim causada pela soma de dificuldades enfrentadas já nos dois ou três anos anteriores. O quadro ficou mais difícil porque, para alguns destes produtores, houve quebra de safra por motivos climáticos. Quadro 9- Inadimplência em 20015/16 em relação ao total financiado (em %) Produtores % 3 Até 10% 13 Entre 11% e 30% 14 Entre 31% e 50% 3 Entre 51% e 70% 0 Entre 71% e 90% 0 Acima de 90% Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. No quadro 9 percebe-se que dos 33 produtores que informaram ter tido problemas na safra de 2015/16, 81,8% destes ficaram na faixa de 11% a 50%. Já três dos mesmos ficaram comprometidos até 10% e outros três entre 51% e 70%. Nota-se, no comparativo entre os quadros 8 e 9 que os produtores do município de Catuípe tiveram maiores problemas de inadimplência na última safra (2015/16) em relação aos anos anteriores. Este problema, segundo os produtores rurais do município de Catuípe, se dá justamente pela falta de recursos dos produtores para realizar o plantio, pois seus custos de produção são muito elevados e os mesmos possuem pouca renda própria para realizar um

30 plantio adequado. Outro problema bastante frequente é o preço do produto. Muitos entrevistados elencaram que durante o plantio o preço da saca está relativamente bom, fato que não se confirma no momento da colheita. Isso confirma que o sistema de comercialização dos produtores é frágil, pois os mesmos não realizam vendas futuras visando realizar média de comercialização e cobrir, antecipadamente, seus custos de produção, salvo raros casos. Muitos dizem que o problema está na falta de incentivo do governo para a produção de alimentos. Por sua vez, apontam como uma possível solução ao problema a tomada de medidas governamentais que assegurassem o preço em um bom patamar, até que a colheita termine e os produtores pudessem pagar suas dívidas realizadas. No geral, como se nota, um posicionamento simplista em relação à realidade do mercado e à capacidade de o governo interferir nos preços. Entretanto, como os agricultores relatam na pesquisa, não é só o preço que influencia na inadimplência dos agricultores do município. Também os juros exercidos pelo sistema financeiro, na aquisição de um financiamento para o plantio, são assinalados, embora tais juros sejam subsidiados quando comparados aos juros normais de mercado no país. A pesquisa igualmente revelou que os agricultores do município de Catuípe possuem valores relativamente altos de inadimplência. Quadro 10 - Valor aproximado de inadimplência dos produtores de Catuípe no acumulado de 2006 até outubro de 2016 Produtores Em R$ 9 Até 50 mil 22 Entre 51 mil e 100 mil 15 Entre 101 mil e 300 mil 4 Entre 301 mil e 500 mil 0 Acima de 500 mil Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016.

31 No quadro 10 se observa que, dos 50 agricultores entrevistados no município de Catuípe, 22 dos mesmos relataram ter um valor inadimplente entre R$ 51 mil e R$ 100 mil. Outros 15 relataram ter entre R$ 101 mil e R$ 300 mil, nove até R$ 50 mil e quatro entre R$ 301 mil a R$ 500 mil. Tais valores comprometem uma parcela elevada do faturamento de um número importante de produtores. Quadro 11- Inadimplência sobre o faturamento anual (em %) Produtores % 4 Até 10% 23 Entre 11% e 30% 15 Entre 31% e 50% 8 Entre 51% e 70% 0 Entre 71% e 90% 0 Acima de 90% Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Em relação ao valor da inadimplência, 76% dos agricultores do município de Catuípe possuem seu faturamento anual comprometido com o sistema financeiro entre 11% a 50%. De forma mais explícita, 23 dos 50 agricultores entrevistados no município relataram que o valor de sua inadimplência atinge cerca de 11% a 30% de seu faturamento anual. Já 15 destes relatam que a inadimplência afeta entre 31% a 50% de seu faturamento, oito descrevem que afeta entre 51% a 70% do faturamento e quatro que afeta até 10% do mesmo. Por sua vez, 23 produtores (quase a metade dos entrevistados) acusam um comprometimento de seu faturamento bruto entre 31% e 70% com a inadimplência junto ao crédito agrícola. Pode-se concluir que o valor da inadimplência dos agricultores do município de Catuípe é relativamente alto. Todavia, essa inadimplência não se dá apenas pela dívida de plantio, já que 27 dos 50 produtores entrevistados tomam igualmente crédito para investimentos, como aquisição de

32 maquinas e equipamentos para a propriedade rural, além de construção de galpões, casas, silos etc. Esse crédito de investimento é oriundo, em sua maioria, igualmente do Programa Nacional de Fortalecimento de Agricultura Familiar (PRONAF), como citado no capítulo anterior. Quanto ao valor tomado para este tipo de crédito, 15 dos 27 produtores captaram valores entre R$ 100 mil a R$ 200 mil, nove até R$ 100 mil e três acima de R$ 200 mil. Quadro 12- Volume de crédito para investimentos captado pelos produtores de Catuípe (em R$) Produtores R$ 9 Até R$100 mil 15 Entre R$101 mil a R$200 mil 3 Acima de R$201 mil Fonte: Entrevista realizada pela autora em outubro de 2016. Em suma, a maioria dos produtores relatou que é impossível realizar qualquer ação sem ficar endividado e, por consequência, com risco potencial de inadimplência. Isso porque o resultado sendo imprevisível e nunca se sabe o que irá acontecer no transcorrer da safra. Além disso, a maioria não consegue mais cobertura integral de sua área para o Proagro. Nesse contexto, para conseguir que sua propriedade se mantenha e, em alguns momentos, dê lucro, é necessário ter um bom relacionamento com o sistema financeiro. No próximo capítulo busca-se elencar os fatores ocorridos entre 2006 e 2016 que levaram os agricultores de Catuípe a esta situação.

33 CAPÍTULO 3 ANÁLISE DOS FATORES: UM BREVE DIAGNÓSTICO SOBRE O QUE OCORREU ENTRE 2006 E 2016 No capítulo anterior se apresentou a realidade do endividamento e da inadimplência dos produtores rurais de Catuípe no período de 2006 a 2016, a partir de uma amostra de 50 entrevistados. Observou-se que o endividamento e a consequente inadimplência, estão fortemente ligados a fatores climáticos (excesso de chuvas, estiagem, fenômenos naturais como granizo, temporais, entre outros) e ao próprio sistema financeiro (juros altos e volume de empréstimos elevados, dentre outros). Entre 2006 e 2016 ocorrem vários problemas, além do rescaldo da estiagem de 2005, uma das maiores da história recente na região, os produtores enfrentaram em 2012 outro ano de clima seco. Já na safra 2015/16 foi o excesso de chuva no início do plantio da soja, no mês de novembro, que afetou fortemente a produção, exatamente em um momento em que os produtores haviam decidido investir maiores volumes na lavoura, particularmente de soja. O excesso de chuva afeta a planta da seguinte maneira: quando o agricultor lança ao solo a semente, ela fica a uma profundidade de 3 a 4 centímetros abaixo do solo. Como nas laterais da linha do plantio existe uma terra solta, que a plantadeira empurra para os lados, quando chove a terra solta é empurrada pela água para cima do grão, o abafando e enterrando-o ainda mais. Sendo assim, ele demora mais a sair do solo e, por consequência, as vezes não consegue germinar. Isso acaba desenvolvendo um fungo que mata a semente. Por consequência o produtor rural precisa fazer o replante, fato que aumenta os custos e, em muitos casos, o endividamento. Isso quando não for necessário realizar um amplo tratamento em toda a terra semeada. Além dos excessos de chuvas também temos o fator da seca. Esta caracteriza-se pela falta de chuvas de forma consiste. A mesma reflete na falta de agua para germinar o grão, ou seja, quando este é lançado ao solo, a humidade é fundamental para que ele comece a germinar. Em caso contrário, o mesmo não germinará. As vezes o solo está bem úmido, porém no passar dos dias, quando a semente já germinou e está se tornando uma pequena planta, a chuva é necessária para que o calor do sol não prejudique e acabe matando o grão.

34 Em havendo tais perdas, que o setor agrícola chama de frustração de safra, os agricultores não conseguem obter renda suficiente com sua atividade. Quando ocorre fatores climáticos que afetam a produção o produtor rural acaba por ter que prorrogar seu empréstimo junto a cooperativas, bancos locais e empresas privadas. Este fato, a prorrogação da dívida, é a maior ocorrência de inadimplência entre os agricultores em geral e do município de Catuípe em particular. Quando o agricultor prorroga, ou seja, transfere sua dívida para um, dois, três anos à frente, a parcela do empréstimo adquirido, que já tem seu juro embutido, sofre uma nova incidência de juro. É uma espécie de multa pelo fato de necessitar da prorrogação do empréstimo. Esse prolongamento acaba gerando uma bola de neve levando o produtor a perder o seu controle sobre as dívidas em muitos casos. Esse descontrole acaba fazendo com que o produtor tenha que vender ou empenhar suas terras perante o sistema financeiro para conseguir sanar esta dívida, que cada vez aumenta mais devido ao acúmulo de juros. Esse descontrole se dá pela falta de compreensão dos cálculos exercidos pelo sistema financeiro, acabando por comprometer ainda mais o faturamento do produtor rural. Como os bancos locais, as cooperativas de crédito e as empresas privadas que prestam serviços aos agricultores também visam lucro, acabam por incluir nos financiamentos taxas extras, juros mais altos, seguros de vida, seguros da lavoura, seguros da propriedade etc. E, segundo os agricultores do município de Catuípe, muitas vezes, a falta de leitura do contrato do empréstimo, ou a falta de um bom diálogo entre o credor e o agricultor, acabam sendo fatores decisivos na inadimplência deste último. A maioria dos agricultores entrevistados relatou desconhecer alguns serviços embutidos em seus empréstimos que tiveram de pagar no decorrer das parcelas. Outros explanaram que se utilizam destes serviços, pois são de suma importância para o andamento de suas lavouras e propriedades rurais. Sem ignorar que tais serviços são importantes, destacase que é decisivo os credores explicarem tudo o que está descrito nos empréstimos, pois a maioria dos agricultores não possui o segundo grau completo (caso dos agricultores entrevistados de Catuípe). Os produtores rurais consideram que a solução para suas dividas e inadimplência seja a necessidade de um novo financiamento ou a prorrogação da dívida. Isso acaba por