CONTRATOS ADMINISTRATIVOS O primeiro passo no estudo dos contratos administrativos, como não poderia deixar de ser, é definirmos o conceito de contrato. Para o notável civilista Caio Mário da Silva Pereira (1990), eis a definição de contrato: Contrato = acordo de vontades, na conformidade da lei, e com a finalidade de resguardar, transferir, conservar ou modificar direitos. adquirir, Trata-se de um dos mais importantes institutos jurídicos, uma vez que se situa na base das diversas relações na sociedade. Várias são as características dos contratos, bem como vários são os tipos de contratos. Os contratos administrativos são uma espécie do gênero contrato, no qual a Administração Pública age como uma das partes em nome do Estado e, como tal, carregam consigo os aspectos gerais aplicados aos contratos em sentido amplo. Longe de querer esgotar todas as características dos contratos, apresenta-se, a seguir, uma compilação de seus aspectos principais: Bilateralidade: os contratos são acordos entre partes, tratando-se, portanto, de um negócio jurídico bilateral. Diferem, portanto, dos atos jurídicos, que são unilaterais. Autonomia das vontades: O Princípio da Autonomia da Vontade estipula que sempre será necessária a livre manifestação de vontade do particular para a formação de vínculo contratual (até mesmo quando este contrato seja efetuado com a Administração Pública). Vontades divergentes: Não há convergência de vontades em um contrato, mas apenas a satisfação recíproca dos interesses. Quando a Administração Pública firma um contrato com um particular, por exemplo, geralmente ela tem por interesse o fornecimento de um material ou serviço, ao passo que ao particular interessa o pagamento ($). A convergência de vontades é encontrada em outro instituto jurídico, denominado convênio. Quando a Administração Pública firmar contratos com particulares, sem que figure na qualidade de Poder Público, seus contratos não serão do gênero administrativo, mas sim regidos por normas de direito privado. Neste caso, falamos de contrato da Administração, no qual a Administração Pública figura numa relação horizontal (de igualdade) com o particular. Ex: Locação de imóveis, quando a Administração figura como locatária. 1
É de especial interesse o conceito de contratos administrativos, espécie de contrato que envolve a Administração Pública. Neste sentido, Hely Lopes Meirelles apresenta a seguinte definição: Contrato Administrativo = ajuste que a Administração Pública, agindo nesta qualidade, firma com particular ou com outra entidade administrativa para a consecução de objetivos de interesse público, nas condições estabelecidas pela própria Administração. Há características peculiares dos contratos administrativos que merecem nossa atenção. O fato de a Administração Pública ser uma das partes, representando, em última instância, o interesse público, implica especificidades fundamentais em nosso estudo. Uma vez mais, estes aspectos são sumarizados na tabela a seguir: CARACTERÍSTICA CONTRATOS ADMINISTRATIVOS Os contratos administrativos são sempre formais, produzidos por escrito. Há apenas uma exceção: o contrato verbal de pequenas compras, feita por suprimento de fundos. Veja o parágrafo único do artigo 60 da Lei de Licitações e Contratos: Formalismo Parágrafo único. É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento [...] Ainda, a publicação do resumo do conteúdo do contrato (na imprensa oficial) deve se dar no prazo máximo de 20 dias, contados a partir do quinto dia útil ao mês seguinte ao de sua assinatura, sendo condição indispensável para sua eficácia. Onerosos Comutativos Há remuneração ao particular relativa à contraprestação do objeto do contrato. As partes do contrato são compensadas reciprocamente. À Administração cabe o cumprimento ou execução do contrato; ao particular, a remuneração. Os contratos administrativos são contratos pessoais. A celebração intuitu personae (= em consideração à pessoa ) exige 2
CARACTERÍSTICA Pessoalidade CONTRATOS ADMINISTRATIVOS que a execução do contrato seja efetuada pela mesma pessoa (física ou jurídica) que aceitou a obrigação perante a Administração. Já que os contratos administrativos são resultantes de um procedimento licitatório (com as ressalvas dos casos de dispensa e inexigibilidade de licitação), não há como se falar em subcontratação para o fornecimento de um objeto. A empresa vencedora de um convite para a manutenção de um tomógrafo, por exemplo, passou, durante o certame, por um exame de suas qualidades técnicas e de seu status fiscal durante a fase de habilitação. Assim, uma eventual subcontratação desta vencedora envolve uma outra empresa que sequer passou pelo crivo da Administração. No entanto, a Lei nº 8.666/93, em seu artigo 72, prevê a possibilidade de subcontratação parcial, desde que haja previsão específica em edital e no contrato. Neste caso, a Administração estabelece os limites das partes do objeto do contrato cuja execução poderá ser subcontratada. A Administração age na qualidade de Poder Público A finalidade de um contrato administrativo é a tutela do interesse público. Por esse motivo fundamental, a Administração é legalmente investida de prerrogativas especiais que assegurem o adequado cumprimento do contrato. Tais prerrogativas (privilégios) subordinam o interesse do particular ao interesse da coletividade. Estamos falando das cláusulas exorbitantes, abordadas a seguir. As cláusulas exorbitantes São as chamadas cláusulas exorbitantes que diferenciam os contratos administrativos dos demais acordos situados no âmbito do Direito Privado. O termo exorbitante é empregado no sentido de que o conteúdo das cláusulas extrapolam as cláusulas usuais do Direito Privado. 3
CARACTERÍSTICA CONTRATOS ADMINISTRATIVOS As cláusulas exorbitantes são as constantes dos artigos 56 e 58 da Lei nº 8.666/1993 (veja abaixo) e referem-se às hipóteses de exigência de garantia, poder de alteração unilateral do contrato, possibilidade de rescisão unilateral, poder de fiscalização entre outras. Ante a relevância das cláusulas exorbitantes, vamos nos aprofundar ainda mais em seu entendimento. Primeiramente, vejamos o conteúdo dos artigos 56 e 58 da Lei nº 8.666/1993: Art. 56. A critério da autoridade competente, em cada caso, e desde que prevista no instrumento convocatório, poderá ser exigida prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e compras. Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado; II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei; III - fiscalizar-lhes a execução; IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste; V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo. 1 o As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado. 2 o Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual. 4
De forma didática, podemos sintetizar as cláusulas exorbitantes e suas implicações na tabela a seguir: EXIGÊNCIA / PODER AS CLÁUSULAS EXORBITANTES Exigência de Garantia Trata-se de montante a ser pago pelo contratado, que fica sob os cuidados da Administração e é restituído após a execução do contrato. Serve como facilitador na aplicação de multas, visto que assegura diretamente o recebimento do valor pela Administração. A garantia poderá ser prestada nas formas de caução em dinheiro, títulos da dívida pública, seguro-garantia e fiança bancária, usualmente não excedendo a 5% do valor do contrato. A exceção a esse percentual é provida pelo 3º do artigo 56 da Lei de Licitações e Contratos: 3º Para obras, serviços e fornecimentos de grande vulto envolvendo alta complexidade técnica e riscos financeiros consideráveis, demonstrados através de parecer tecnicamente aprovado pela autoridade competente, o limite de garantia previsto no parágrafo anterior poderá ser elevado para até dez por cento do valor do contrato. Alteração unilateral do contrato A possibilidade de alteração unilateral do contrato visa à melhor adequação do acordo ao interesse público. Esta alteração incide sempre sobre as cláusulas regulamentares ou de serviço (as que dispõem sobre o objeto a ser executado), e nunca sobre as cláusulas econômico-financeiras e monetárias. Rescisão unilateral do contrato Dentre as situações em que são cabíveis a rescisão unilateral do contrato pela Administração, podemos citar: atraso injustificado no início da execução do contrato, descumprimento ou cumprimento irregular do acordo, lentidão no cumprimento, paralisação da execução do contrato, subcontratação (desde que não prevista no edital), ocorrência de caso fortuito ou de força maior etc. 5
EXIGÊNCIA / PODER AS CLÁUSULAS EXORBITANTES Poder de fiscalização / ocupação temporária O acompanhamento dos contratos é normatizado pelo artigo 67 da Lei de Licitações e Contratos. Um representante da Administração o fiscal de contrato é designado, agindo de modo a regularizar, dentro de sua competência, as eventuais faltas e os defeitos observados. Quando o objeto do contrato for a prestação de um serviço essencial (fornecimento de água, energia elétrica etc.), a Administração pode assumir o objeto do contratado, bem como ocupar e utilizar o local, instalações, equipamentos, material e até pessoal empregados na execução do contrato e essenciais à sua continuidade. Manutenção do Equilíbrio Financeiro Na realidade, esta cláusula exorbitante não se trata de prerrogativa da Administração, mas sim de uma restrição à sua atuação. Afinal, apesar de o contrato administrativo visar unicamente ao interesse público, ele há de ser interessante (financeiramente) ao particular, sob o risco de não se encontrar parte que se disponha a contratar com o Poder Público. Caso haja a alteração unilateral de uma cláusula regulamentar que implique maiores ônus ao contratado, a Administração deverá ajustar economicamente o acordo. Pela inexecução total ou parcial do contrato, a Administração Pública possui (sempre se observando o princípio do contraditório e da ampla defesa) a prerrogativa de aplicar sanções. É o normatizado pelo art. 87 da Lei nº 8.666/93 Aplicação de sanções Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: I - advertência; II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato; 6
EXIGÊNCIA / PODER AS CLÁUSULAS EXORBITANTES III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos; IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade [...] Da mesma forma, o art. 7º da Lei nº 10.520/2002 traz as previsões de sanções nos casos de pregão: Art. 7º Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4o desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais. 7