AIDS, ativismo e regulação de ensaios clínicos no Brasil: o Protocolo 028



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Transcrição:

A RTIGO A RT I C L E 8 6 3 AIDS, ativismo e regulação de ensaios clínicos no Brasil: o Protocolo 028 AIDS, activism, and the regulation of clinical trials in Brazil: Protocol 028 Maria Au x i l i a d o ra Ol i ve i ra 1 Elizabeth Mo re i ra dos Santos 2 José Manoel Ca rvalho Mello 3 1 Núcleo de As s i s t ê n c i a Fa r m a c ê u t i c a, Es c o l a Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz. Rua Leopoldo Bulhões 1480, sala 617, Rio de Ja n e i ro, R J 2 1 0 4 1-2 1 0, Bra s i l. d o ra @ e n s p. f i o c r u z. b r 2 De p a rtamento de En d e m i a s Samuel Pe s s o a, Es c o l a Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz. Rua Leopoldo Bulhões 1480, t é r re o, Rio de Ja n e i ro, R J 2 1 0 4 1-2 1 0, Bra s i l. b m o re i ra @ e n s p. f i o c r u z. b r 3 Instituto Al b e rto Lu i z C o i m b ra de Pós Graduação e Pesquisa de En g e n h a r i a, Un i versidade Fe d e ral do Rio de Ja n e i ro. Ce n t ro de Te c n o l o g i a, Bloco F, sala 109, Cidade Un i ve r s i t á r i a, Rio de Ja n e i ro, RJ 2 1 9 4 5-9 7 0, Bra s i l. j m e l l o @ p e p. u f r j. b r Abstract This paper examines the politics and practices of drug evaluation in Bra z i l. It tra c e s the history of AIDS activists influence on the organization of modern clinical trials and their scientific ra t i o n a l e. Using the Me rck indinavir trial as a case study, the authors discuss how org a n i zed civil society has developed strategies to intervene in the course of drug evaluation trials, shaping them according to its own intere s t s. Adopting translation sociology as the theore t i c a l f ra m ew o rk, the paper describes and analyzes the strategies used by activists from Gr u p o Pe l a Vi d d a / S P (an AIDS NGO) to build a consensus concerning indinavir monothera p y s lack of e f f i c a c y. The study considers the seve ral re g u l a t o ry forums invo l ved in dealing with the controversy during the trial period. Key words Ac q u i red Immunodeficiency Sy n d ro m e ; Et h i c s ; Clinical Tr i a l s Resumo Este artigo examina a política e a prática da avaliação de medicamentos no Bra s i l, buscando identificar a influência que a sociedade civil organizada, no caso, os ativistas da AIDS, exe rce na construção da racionalidade científica de ensaios clínicos modernos. Baseando-se na experiência do ensaio clínico do In d i n a v i r / Me rck (Protocolo 028), como estudo de caso, d i s c u t e - se de que maneira grupos sociais organizados desenvo l vem estratégias para interferir na condução de estudos de avaliação de medicamentos, adequando-os aos seus próprios intere s s e s. Te n d o como referência teórica a sociologia da tra d u ç ã o, este artigo descre ve e analisa as estratégias utilizadas pelos ativistas do grupo Pe l a Vidda/SP (ONG/AIDS) no processo de construção do consenso sobre ineficácia da monoterapia com o Indinavir junto aos diversos fóruns regulatórios envolvidos na solução da controvérsia gerada durante o período de execução do referido estudo. Palavras-chave S í n d rome de Imunodeficiência Ad q u i r i d a ; É t i c a ; Ensaios Clínicos

8 6 4 OLIVEIRA, M. A.; SANTOS, E. M. & MELLO, J. M. C. I n t ro d u ç ã o Evidências re c e n t e s, part i c u l a rmente no campo dos Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia, têm enfatizado a influência dos movimentos sociais na validação dos conhecimentos científicos. Os fatos se tornam científicos não apenas por sere m e m p i ricamente ve ri f i c á ve i s, mas também porq u e são o resultado de negociação social de cre d i b i- l i d a d e, risco e legitimidade, que constrói o consenso sobre os mesmos (Brown, 1995; Ep s t e i n, 1995, 1996, 1997; Fu n t owicz & Ra vetz, 1993). Na arena política, part i c u l a rmente no campo da re g u l a ç ã o, esses fatos passam por um p rocesso híbrido de fabricação discursiva que i n t e g ra elementos hetero g ê n e o s, os quais garantem a sua consistência (Ab raham, 1995; Jasanoff, 1998; Mello & Fre i t a s, 1998; Rip & Gro e- n e wegen, 1989). Híbrido e heterogêneo porq u e e n vo l ve necessariamente relações entre uma e n o rme va riedade de atores e actantes como p e s q u i s a d o re s, técnicos, administra d o re s, grupos sociais org a n i z a d o s, equipamentos, parec e res técnicos, agências de fomento e de re g u- l a ç ã o, políticas gove rn a m e n t a i s. Nessa perspectiva, Callon (1989) afirma que p a ra compreender o processo de fabricação de um fato científico, é preciso analisar as re d e s sociotécnicas que lhes dão origem e estabilidad e. Estas redes são assim designadas por enfeix a rem uma heterogeneidade de fatores e entidades ( Te i x e i ra, 1994). Assim, num pro c e s s o dinâmico denominado por Law (1992) de e n- g en h aria hetero g ê n e a, pedaços e peças do social e do técnico se articulam e, por meio de p rocessos de conve r s ã o / t ra d u ç ã o, geram out ros produtos igualmente hetero g ê n e o s. Sob esta ótica, este artigo busca descre ver e analisar as estratégias utilizadas pelos ativistas do Grupo Pe l a Vidda/São Paulo (Org a n i z a ç ã o N ã o - Gove rnamental em defesa dos port a d o re s do HIV ONG/AIDS) no processo de construção do consenso sobre ineficácia da monoterapia com o In d i n a v i r. Discute a atuação dos diversos fóruns re g u l a t ó rios envolvidos na solução da controvérsia gerada durante o período de execução do ensaio clínico do In d i n a v i r, denominado de Prot oc olo 028 Estudo multic ê n t ri c o, duplo-cego, randomizado em pacientes soro p o s i t i vos ao HIV-1, para comparar a eficácia e a segurança do MK-0639 (L-735, 524), 800mg de 8/8h, e a Zi d ovudina (AZT ), 200mg 8/8h, administrados concomitantemente e c o m p a rado com o MK-0639 e com a Zi d ov u d i- na administrados isoladamente. Pa ra o presente estudo utilizo u - s e : revisão bibliográfica da produção re c e n t e, período de 1992 a 1997, sobre a construção do conhecimento científico sobre medicamentos a n t i re t rov i ra i s, identificando os principais m a r- cos científicos que balizaram a arg u m e n t a ç ã o técnica dos diversos atores envo l v i d o s ; análise de documentos oficiais, como o p rotocolo da pesquisa e consensos de especialistas bra s i l e i ros sobre terapia antire t rov i ral, publicados pelo Mi n i s t é rio da Saúde (MS) no ano de 1996; análise de artigos sobre o ensaio-clínico do In d i n a v i r / Me rck publicados na revista Ca d e r- nos Pe l a Vidda no período de setembro de 1995 a janeiro de 1998. Esta publicação foi escolhida por se constituir no principal veiculo de difusão das idéias, posições e reivindicações re l a- cionadas à pesquisa do ponto de vista das O N G / A I D S. O contexto O surgimento da AIDS e do ativismo no Brasil A história da epidemia da AIDS no Brasil começa em 1982, num momento político marc a d o pelo inicio do processo nacional de re d e m o c rat i z a ç ã o, após quase vinte anos de ditadura mil i t a r. Ao longo da década de 80, ocorre no país uma das mais importantes transições no campo das políticas sociais, cujo ápice se dá, na Assembléia Nacional Constituinte de 1988, com a a f i rmação do direito à saúde como direito fundamental da pessoa humana, cabendo ao Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício (MS, 1999). Consoante com esta dire t riz, a Lei 8.080/90 (Brasil, 1990) cria o Sistema Único de Saúde (SUS), organizado sob os princípios do atendimento integral, unive r- sal e part i c i p a t i vo, possibilitando a org a n i z a- ção da sociedade civil e a problematização de temáticas relacionadas à saúde. Assim, a dinâmica das ONG/ AIDS, guardada a especificidade temática de incluir questões re f e rentes à doença e à sexualidade, se insere na dinâmica de potencialização dos movimentos sociais, os q u a i s, naquela o c a s i ã o, atuavam de forma, pred o m i n a n t em e nt e, contraposta ao Estado (Si l- va, 1998). No mesmo período, a epidemia pro g re d i a ra p i d a m e n t e. Com apenas dez casos notificados ao MS até 1982 atingiu o patamar dos 5.613 no final de 1989. Deste total, a proporção de óbitos re g i s t rada pelo MS foi da ordem de 67, 6%, o que demonstra a gravidade da evo l u ç ã o clínica da doença (MS, 1998a). Bastos et al. (1994:30) descre ve ram o clima reinante na comunidade de soro p o s i t i vos nessa ocasião: Os

AIDS, ATIVISMO E REGULAÇÃO DE ENSAIOS CLÍNICOS 8 6 5 n ú m e ros re velam ainda sofrimento: dor física, p e rda de capacidades, ansiedade perante a escassez de tra t a m e n t o s, sua inacessibilidade, c a- re s t i a ; os estigmas associados à doença, o abandono por parte de antigos amigos e familiare s, p reconceitos de alguns profissionais de saúde, nos locais de tra b a l h o, nas escolas; i s o l a m e n t o, s o l i d ã o, n ã o - c o m u n i c a ç ã o ; ansiedade perante o f u t u ro, e n f rentamento do ve redicto de fatalidade inevitáve l, sensação de bomba-relógio no interior do corpo; esforços de ultrapassagem dessas cert e z a s,e n t rega a terapias esotéricas e a l- t e r n a t i va s, caminhos espirituais; e também, p a- ra muitos a descoberta da politização do estado de pessoa vivendo com HIV e AIDS, d e s c o b e rt a da solidariedade e da ação política, p ressão direta nas tomadas de decisão, conquistas no a c e s- so a medicamentos, na ampliação da pesquisa, na aposta dos resultados inova d o res desta, n o afastamento do pre c o n c e i t o, na lei, na atitude e na incorporação da AIDS ao cotidiano. No campo científico, o HIV foi re c o n h e c i d o como o agente etiológico da AIDS em 1983. Em seguida, foi estabelecido, mediante testes labora t o ri a i s, o estado de soro p o s i t i v i d a d e. Estes fatos mudaram a dimensão social da epidemia, i n t roduzindo desafios médicos, éticos e jurídicos de grande complexidade (Grmek, 1995). Em 1987, surge a possibilidade do tratamento específico para o HIV, com a identificação do prim e i ro antire t rov i ral: AZT (Fi schl et al., 1987). Este fármaco fora desenvolvido na década de 60 para o tratamento de neoplasias sangüíneas. Do ponto vista dos movimentos sociais, cabe ressaltar o pioneirismo de algumas iniciativas bra s i l e i ras na luta contra a epidemia. A c riação do pri m e i ro GAPA-São Paulo (Grupo de Apoio à Pre venção a AIDS), em abril de 1985, por exemplo, antecede em cerca de um ano a c riação do Pro g rama Nacional de DST e AIDS do MS. Em 1986, cientistas bra s i l e i ros se unem a dois conhecidos militantes políticos soro p o- s i t i vo s, pro m ovendo a criação da ABIA (Associação Bra s i l e i ra In t e rdisciplinar de AIDS), que se propunha a tematizar, do ponto de vista m u l t i d i s c i p l i n a r, a AIDS no contexto das políticas públicas (Dias & Pe d rosa, 1997). Em 1989, é fundado no Rio de Ja n e i ro o Grupo Pe l a Vidda (Va l o rização e Dignidade do Doente de AIDS), que denuncia a m o rte civil processo de desapro p riação da cidadania que o c o r re com as pessoas vivendo com HIV e AIDS ( Daniel, 1989) e exige do Estado uma pri o ridade para a questão. Além do coletivo, o gru p o, ao definir como seu princípio a defesa das pessoas vivendo com HIV e AIDS, resgata a implicação da pessoa singular na dinâmica política da luta contra a AIDS. Em sua carta de pri n c í- p i o s, explicita os direitos da pessoa vive n d o com HIV e AIDS, dentre eles: a liberdade de falar ou não sobre sua soropositividade; o dire i t o à vida com qualidade, ao trabalho e ao acesso aos cuidados necessários à saúde, tais como i n f o rm a ç ã o, tratamento e medicamentos (Si l- va, 1998). Em seu processo de ru p t u ra com as estrut u ras anteri o re s, o Grupo Pe l a Vidda pro p u n h a que as pessoas com HIV e AIDS abandonassem a posição de vítimas e tivessem uma part i c i p a- ção ativa na definição das políticas públicas no Brasil. Nessa empreitada já contava com o apoio de médicos e pesquisadores do Rio de Jan e i ro. No final de 1991, ocorreu uma gra n d e a p roximação entre ONG/AIDS, Grupos Pe l a- Vidda/Rio de Ja n e i ro, Pe l a Vidda/São Paulo e ABIA com pesquisadores e médicos intere s s a- dos no desenvolvimento de protocolos de va c i- n a s. Assim, segundo Dias & Pe d rosa (1997:9): Ong u i st a s,p e s q u i s a d o res e médicos estabelecem então uma agenda de trabalho com objetivos comuns. Ad i c i o n a l m e n t e, tendo como um de seus o b j e t i vos difundir amplamente informações de base científica, o Grupo Pe l a Vidda/São Pa u l o lançou, em setembro de 1990, o pri m e i ro núm e ro da revista Cadernos Pe l a Vi d d a, com um e d i t o rial assinado por He r b e rt Daniel, intitulado: In f o r m a r- s e, uma Questão de Vi d a ( Da n i e l, 1990). Esta revista foi escolhida para se pro c e- der à análise do discurso desta ONG em re l a- ção ao ensaio do In d i n a v i r. O ensaio clínico, as instituições e as normas de regulação brasileira Co n s i d e rado o maior experimento com antiret rov i rais que já ocorreu em terri t ó rio nacional (A. L. L. M. Lima, Comunicação Pessoal), o Protocolo 028 foi desenvolvido em São Paulo entre a b ril de 1995 e março de 1997. En vo l veu a participação de cinco importantes centros de pesquisa e assistência de referência pública a pacientes com HIV e AIDS: Hospital das Clínicas da Un i versidade Estadual de São Paulo (HC/ USP), Escola Paulista de Medicina (EPM) da Un i versidade Fe d e ral de São Pa u l o / Ho s p i t a l São Paulo (UNIFESP); Hospital das Clínicas da Un i versidade Estadual de Campinas (UNI- CAMP), Instituto de Infectologia Emílio Ribas e, posteri o rm e n t e, o Ce n t ro de Referência e Tratamento de AIDS (CRT), sendo estes dois últimos vinculados à Se c re t a ria de Estado da Saúde de São Pa u l o. Com uma duração prevista para três anos, o estudo acompanhou 996 adultos soro p o s i t i- vos para o HIV-1, distribuídos ao acaso em três

8 6 6 OLIVEIRA, M. A.; SANTOS, E. M. & MELLO, J. M. C. b raços com os diferentes regimes tera p ê u t i c o s d e s c ritos no título do pro j e t o. Segundo a desc rição do Protocolo 028, os sujeitos da pesquisa foram selecionados de acordo com os seg u i n- tes cri t é rios de inclusão: adultos maiores de 18 anos; soro p o s i t i vos para o HIV-1; contagem média de linfócitos T CD4 entre 50-250cel/ m m3; sem evidências clínicas e/ou labora t o- riais de outras doenças infecciosas ou malign a s. Os principais cri t é rios de exclusão fora m : g ra v i d ez, aleitamento, utilização prévia de ant i re t rov i ra i s, bem como o uso corrente de terapia para combate a infecções oportunistas ou m a l i g n a s. O e n dpoint e ra clínico, ou seja, o e vento definidor de mudança de regime terapêutico era a manifestação clínica da AIDS, definida pela presença no vo l u n t á rio de tumor ou doença oportunista labora t o rialmente comp rovada. Vale ressaltar que a técnica do duplo cego era aplicada tanto para a alocação do regime tera p ê u t i c o, quanto para o acesso aos resultados dos exames marc a d o res de infecção como contagem de CD4 e medida da carga viral, o que significava que nem os clínicos nem seus pacientes dispunham destas inform a ç õ e s. O monitoramento externo do experimento era feito por um comitê independente de especialistas denominado Data Safety Committee Bo a rd (DSCB), o qual fora contratado pelo pat rocinador com o objetivo de proceder à re v i- são das condutas médicas e dos aspectos éticos da pesquisa. Somente este comitê tinha acesso a todas as informações coletadas. O estudo foi patrocinado pelo labora t ó ri o Me rck, Sharp & Dohme (MSD), que utilizari a seus resultados para o re g i s t ro do In d i n a v i r, então em andamento, na agência re g u l a t ó ri a Food and Drug Ad m i n i s t ra t i o n (FDA), re s p o n- s á vel pelo re g i s t ro e vigilância sanitária de medicamentos nos Estados Un i d o s. De n t re os p rincipais motivos alegados pelo labora t ó ri o p a ra a escolha do Brasil, estavam a capacidade instalada em termos de centros de pesquisa de e l e vado padrão técnico e a grande quantidade de pacientes virgens de tra t a m e n t o, que é cons i d e rada a população ideal para testes de novos antire t rov i rais (A. L. L. M. Lima, Co m u n i c a- ção Pessoal). A MSD é uma subsidiária da empresa nort e - a m e ricana Me rck & Co. In c., que opera no Brasil desde 1940 e teve um faturamento estimado em 230 milhões de dólares no ano de 1996. No início de 1988 fez uma joint ve n t u re com o labora t ó rio nacional Aché formando a Prodome Química & Fa rmacêutica Ltda. (PRO- DOME), que comercializa a maioria dos pro d u- tos da MSD e teve um faturamento estimado p a ra o ano de 1996 de 130 milhões de dólare s ( Ga zeta Me rcantil, 1997). Esse valor deve ter c rescido nos anos seguintes, pois, de acord o com a pro g ramação de medicamentos para AIDS do MS, foram gastos R$88.163.064,00 na aquisição de Indinavir para atender à meta estabelecida de garantir assistência farm a c ê u t i c a a 85.000 adultos, 3.200 crianças e 10.200 gestantes com HIV/AIDS durante o ano de 1998 (MS, 1998b). In t e rn a c i o n a l m e n t e, o processo de desenvolvimento de um medicamento obedece a um conjunto de procedimentos padronizados pela FDA (Kweder et al., 1995). Após a síntese e purificação de uma nova substância candidata a m e d i c a m e n t o, são realizados os testes pré-clín i c o s, que envo l vem técnicas labora t o riais e de e x p e rimentação em animais. A etapa seguinte c o m p reende os testes clínicos, ou seja, experimentos em seres humanos, os quais só podem ser realizados mediante autorização da agência re g u l a t ó ria nacional. Os ensaios clínicos são realizados em quatro fases. A fase I, objetiva ava l i a r, em um pequeno grupo indivíduos sadios (50 a 100), aspectos re l a t i vos à farm a c o- cinética, tolerância e segurança do medicam e n t o. A fase II é realizada em dois ou mais g rupos de 100 a 200 pessoas port a d o ras da doença que se pretende combater. Seu objetivo é obter evidência compara t i va da eficácia e s e g u rança do medicamento em grupos control a d o s. A fase III consiste em um ensaio clínico c o n t ro l a d o, cujo objetivo é fornecer inform a- ções sobre a eficácia e os efeitos colaterais e a d versos do medicamento em um número maior de pacientes (de 1.000 a 3.000). Após a licença para comercialização do medicamento, ainda é necessário a realização dos estudos de fase IV ou farm a c ovigilância, nos quais são coletadas e avaliadas informações sobre o uso do medicamento na população em gera l. Até 1996, a regulação de ensaios clínicos no Brasil se limitava a um processo buro c r á t i c o efetuado pela Se c re t a ria Nacional de Vi g i l â n c i a Sa n i t á ria órgão do MS re s p o n s á vel pelas atividades de regulação da pro d u ç ã o, comerc i a l i- zação e consumo de medicamentos no Brasil, q u e, após observância das normas definidas pela Resolução no 01/88 do Conselho Na c i o n a l de Saúde (CNS, 1995), concedia a licença para realização dos mesmos. Nessa re s o l u ç ã o, pesquisas em seres humanos estavam condicionadas à avaliação de um comitê de ética da instituição sede do estudo. Em 1995, o CNS criou um grupo de tra b a- l h o, composto por técnicos do MS, re p re s e n- tantes da comunidade científica e da sociedade civil organizada, para revisar e atualizar as n o rmas vigentes, adequando-as às novas ne-

AIDS, ATIVISMO E REGULAÇÃO DE ENSAIOS CLÍNICOS 8 6 7 cessidades do país. Deste trabalho resultou a Resolução no 196/96 do CNS, aprovada e publicada em outubro de 1996, que criou a Co m i s- são Nacional de Ética em Pesquisa (CO N E P ), com a função de implementar as normas e dire t ri zes re g u l a m e n t a d o ras de pesquisas envo l- vendo seres humanos (CNS/CO N E P, 1998b). Esta resolução estabeleceu exigências adicionais para análise de eticidade dos pro j e t o s, d e n t re elas, a obri g a t o riedade da criação dos comitês de ética em pesquisa. Os novos comit ê s, diferentes dos anteri o re s, compostos exc l u s i vamente por médicos, deve riam ser constituídos por re p resentantes de outras categorias profissionais tanto da saúde como de out ras áre a s, além de um re p resentante dos usuári o s. Em resolução posteri o r, no 240, o CNS define usuário como: p e ssoas capazes de ex p re s- sar pontos de vista e interesses de indivíduos e/ou grupos de sujeitos de pesquisa de uma determinada instituição, e que sejam re p re s e n t a t i- vos de interesses coletivos e públicos dive r s o s ( C N S / CO N E P, 1998a:11). Em agosto de 1997 a resolução no 251 é aprovada, re g u l a m e n t a n d o a análise ética de pesquisas com novos fárm a- c o s, medicamentos, vacinas e testes diagnósticos (CNS/CO N E P, 1998c). O re f e rencial teórico: a sociologia da tradução Callon & Latour (1991) denominam de operações de tradução o processo que permite a interligação dos elementos heterogêneos mobilizados no processo de produção do conhecimento científico, os quais podem ser não mens u r á veis ou não equivalentes em termos de unidades de medida. Pelas operações de tra d u- ção é que são estabelecidas as equiva l ê n c i a s, como por exemplo, para as relações entre o social e técnico, o técnico e o jurídico e o jurídico e o ético. Segundo Callon (1986), o processo de trad u- ção engloba quatro operações principais: a p rob l e m a t i z a ç ã o, a persuasão ou l i n t e re s s e m e n t, o e n redamento e a mobilização de aliados. Pa ra esse autor, a problematização parte de uma formulação simples, que inclui elementos do mundo natural e social, definindo desta forma um sistema de alianças e associações entre e n t i d a d e s, cujos interesses e identidades são c o n s t ruídos no próprio pro c e s s o. Indica, port a n t o, movimentos e desvios, que devem ser p roduzidos e aceitos, além das alianças que d e vem ser estabelecidas. A persuasão se re f e re ao conjunto de ações por intermédio das quais uma entidade tenta impor e estabilizar a identidade dos outros atore s, definida na operação de pro b l e m a t i z a ç ã o. Persuadir outros atores significa construir as e s t ratégias e os mecanismos que possam intermediar as relações entre eles e todas as demais entidades que queiram definir suas identidades de outra maneira. Arvech (1987), analisando os processos de alocação de recursos para Ciência & Tecnologia nos Estados Un i d o s, definiu estratégias como combinações de afirm a- ções factuais, pre d i ç õ e s, pre s c rições e pre f e- rências destinadas a persuadir os re p re s e n t a n- tes do poder decisório a agir de uma ou outra f o rma. Os mecanismos de persuasão criam um balanço de poder favo r á vel ao proponente da o p e ração de modo a interromper todas as associações potencialmente competitiva s. A operação de enredamento designa os mecanismos pelos quais são definidos papéis int e r- re l a c i o n a d o s, que são atribuídos a atore s que os aceitam. Implica um conjunto de negociações multilatera i s, jogos de poder e art i f í- c i o s, que acompanham os mecanismos de persuasão viabilizando seu sucesso. A mobilização de aliados, descre ve Ca l l o n (1986), se re f e re à re p resentatividade de quem fala em nome de quem. Esta operação identifica port a - vozes e, como a própria palavra mobilização indica, torna móveis identidades, possibilitando o alinhamento de entidades com i n t e resses dive r s o s. Nessa perspectiva, o exame de pesquisas de a valiação de medicamentos em países peri f é ricos deve considerar as especificidades das operações de tradução entre entidades difere n c i a- d a s. Nestes processos estão em jogo intere s s e s dos ativistas, que incluem seus direitos específicos e direitos humanos, além daqueles que d i zem respeito aos interesses dos pesquisadores e do mercado (Lu ri e, 1997). A dinâmica da conformação de re d e s sócio-técnicas no processo de nascimento e morte do Protocolo 028 Primeiras traduções: q u e remos mais ensaios e re m é d i o s No segundo semestre de 1994, pesquisadore s paulistas foram convidados por re p re s e n t a n t e s da MSD para participar de um estudo multic ê n t ri c o, cujo objetivo era avaliar a eficácia e s e g u rança de um novo inibidor da pro t e a s e, então denominado MK-639. O desafio era g ra n- de em termos de planejamento e gestão do est u d o, considerado de larga escala, visto que tinha como meta o acompanhamento de mil pa-

8 6 8 OLIVEIRA, M. A.; SANTOS, E. M. & MELLO, J. M. C. cientes ao longo de três anos (A. L. L. M. Lima, Comunicação Pe s s o a l ). O protocolo já estava pro n t o, mas as condições exigidas para a pesquisa em termos legais e de infra - e s t ru t u ra física, material e de pessoal t re i n a d o, demandavam muito tra b a l h o, que consumiu cerca de seis meses. Assim, além do encaminhamento do protocolo para análise nas instâncias re g u l a d o ra s, no caso as comissões de ética médica de todos os centros part i c i p a n- t e s, e a licença para realização da pesquisa junto ao MS, foram realizados treinamentos com todos os profissionais envolvidos na pesquisa. E s t ru t u rou-se um esquema de re c ru t a m e n- to dos voluntários, com a fixação de cartazes e m s e rviços de atendimento a port a d o res de HIV e AIDS, especialmente nos serviços públicos de referência, bem como a publicação de matérias pagas em jornais de grande circulação nacional (A. L. L. M. Lima, Comunicação Pe s s o a l ). Foi nessa etapa do ensaio que os ativistas tiveram seu pri m e i ro contato com a pesquisa. O estudo teve inicio em abril de 1995, contudo o pri m e i ro número da revista Ca d e rn o s Pe l a Vidda, que aborda questões a ele re l a c i o- n a d a s, só foi editado em setembro daquele a n o. O título da matéria MK639 no Bra s i l, dava um tom de neutralidade política e científica à q u e s t ã o. Sem assumir claramente sua part i c i- pação no re c rutamento dos vo l u n t á rios para a pesquisa, o artigo divulgava informações técnicas sobre a mesma, fornecendo os nomes e e n d e reços dos médicos-pesquisadores e dos c e n t ros de pesquisa envolvidos e, ao final, re i- v i n d i c a va a ampliação do protocolo para um n ú m e ro maior de participantes: O Pe l a Vi d- da/sp enviou carta à Me rck solicitando acesso expandido da dro g a, ou pelo menos a ex t e n s ã o do protocolo para outras cidades (Ca d e rn o s Pe l a Vidda, 1995a:20). Naquele momento, não apareciam críticas nem à existência nem à metodologia do experi m e n t o. No que se re f e re ao desenho do estud o, não se questionava, por exemplo, a monot e rapia ou o e n dpoint c l ín ic o. Do ponto de vista do ativismo, não se questionava a não-part i- cipação dos soro p o s i t i vos ou de seus re p re s e n- tantes org a n i z a d o s, na decisão da realização de uma intervenção sobre eles, nem a part i c i p a- ção nos comitês locais de ética ou no DSCB. Com relação à forma de re c ru t a m e n t o, a divulgação do experimento por meio de cart a ze s em serviços de saúde já assinalava aos part i c i- pantes a possibilidade de acesso privilegiado a medicamentos e a serviços diferenciados no cuidado à saúde. Nesse aspecto, não é surp re e n- dente que, naquele momento, não apare c e s- sem críticas ao ensaio, aos pesquisadores ou ao l a b o ra t ó rio pro d u t o r. Ao contrári o, a posição e ra de aprova ç ã o, já que, na ausência de uma política gove rnamental de assistência farm a- cêutica aos port a d o res de HIV e AIDS e fre n t e às dificuldades do acesso aos antire t rov i ra i s, a pesquisa re p re s e n t a va não somente a possibilidade de obtenção dos medicamentos, como também a garantia de atenção médica para os vo l u n t á rios nos melhores serviços públicos de saúde do Estado de São Pa u l o. Por estes motivo s, o artigo dos Ca d e rnos Pe l a Vidda pro p u n h a a flexibilização dos cri t é rios de inclusão no est u d o, permitindo a incorporação de pacientes com CD4 inferior a 50cel/mm3. Re i v i n d i c a va, ainda, a extensão do ensaio para outras cidades bra s i l e i ra s. Pa ra os soro p o s i t i vo s, a pesquisa re p re s e n- t a va a possibilidade de uma solução concre t a p a ra o combate à doença. O depoimento de um vo l u n t á rio da pesquisa re f e rindo-se a este período demonstra o clima de esperança vivenciado por eles: Fui para Campinas para e n- t rar no protocolo da Me rc k, na UNICAMP. C h e- guei lá, fiz os exames e os médicos considera ra m minhas contagens (CD4) boas demais para ent rar no estudo. C h o rei dias, p o rque achava que a solução para a AIDS tinha chegado, e eu não podia usar. Eu perguntava : vocês vão esperar o quê? Es p e rar eu morrer? Eu ficar mal? (Ca d e r- nos Pe l a Vidda, 1998:27). Naquela ocasião, a mídia alard e a va o uso d e a n t i re t rov i rais como estratégia terapêutica de c u ra, contra p o n d o - s e, inclusive, à posição prudente dos pesquisadore s, que aceitavam a possibilidade do controle e não da cura da infecção (Folha de São Pa u l o, 1995a, 1995b, 1995c). Este aspecto foi abordado pelo artigo intitulado Pel avi dda se reúne com a Me rc k, publicado em outubro de 95, no qual foram explicitadas para o labora t ó rio patrocinador algumas reivindicações dos ativistas (Ca d e rnos Pe l a Vi d- da, 1995b). Defendendo uma posição de diálogo com a Me rck, até porque aos ativistas intere s s a va lutar por um pro g rama de acesso exp a n d i d o, a mídia foi condenada pelo tra t a m e n- to sensacionalista que vinha dando à questão dos inibidores de pro t e a s e. Apesar da inexistência de provas de eficácia terapêutica desses re m é d i o s, a imprensa acenava com a possibilidade de cura, gerando um clima de instabilidade e de falsas expectativas para os port a d o re s de HIV/AIDS e seus familiare s. O labora t ó rio se defendeu dizendo que a a b o rdagem evidenciada na mídia não fazia p a r- te de suas estratégias de m a rk et i n g e assumiu o c o m p romisso de criar o pro g rama de acesso h u m a n i t á ri o para um número re s t rito de pacientes em estágio evo l u t i vo avançado da d o e n-

AIDS, ATIVISMO E REGULAÇÃO DE ENSAIOS CLÍNICOS 8 6 9 ça. No mesmo número outras questões éticas f o ram citadas. Ou t ras questões que o Pe l a Vidda leva n t o u s o b re o consentimento informado e os dire i t o s dos pacientes que participam do estudo estão sendo tratados diretamente com os pesquisad o res re s p o n s á veis em cada unidade (Ho s p i t a l Emílio Ribas, HC/USP, EPM, UNICAMP e CRT). Desta forma, o ensaio atendia aos intere s- ses dos cientistas, dos vo l u n t á rios e de seus rep resentantes org a n i z a d o s, tanto quanto da ind ú s t ria. Pa ra os pri m e i ro s, ele significava pre s- tigio e a chance de entrar no circuito intern a- cional de pesquisas clínicas. Pa ra os vo l u n t á- rios e ativistas, re p re s e n t a va acesso ao tra t a- mento; para a indústria, a produção de dados n e c e s s á rios ao re g i s t ro no FDA. Po rt a n t o, pelas o p e rações de tra d u ç ã o, foram enredados e mobilizados aliados configurando-se uma re d e sociotécnica re l a t i vamente estável. Isso não i m p l i c a va total conve rgência de intere s s e s, uma vez que, se para os ativistas a amostra deve ria ser ampliada, pela extensão da pesquisa p a ra outras cidades e flexibilização dos cri t é- rios de inclusão, para os pesquisadore s, a manutenção do plano de amostra original era o fundamento para atingir os objetivos pro p o s- tos no pro t o c o l o. Desta forma, a rede se consolida em torn o do alinhamento de interesses estabelecido ent re a indústria e o seu medicamento, os pesquis a d o res e suas instituições (o experi m e n t o, o c o n t role da infecção e o prestígio acadêmico) e os re p resentantes organizados dos vo l u n t á ri o s (acesso a medicamento e à cura), sendo a mídia o pri m e i ro ator- rede a ser questionado. A monoterapia com o Indinavir gera polêmica No último tri m e s t re de 1995 começam os questionamentos acerca do desenho do estudo. A mudança de postura dos ativistas ocorre a partir da divulgação dos resultados de dois estud o s, o AC TG175 (Hammer et al., 1996) e o De lt a C o o rdinating Committee (1996). Ambos apontando para a superi o ridade das associações de a n t i re t rov i rais sobre o uso de AZT isoladament e. Ad i c i o n a l m e n t e, na Conferência In t e rn a c i o- nal sobre antire t rov i ra i s, realizada em janeiro de 1996, em Washington, DC, Estados Un i d o s, a monoterapia com AZT foi definitiva m e n t e c o n d e n a d a. Co n vencidos de que o braço de monoterapia com AZT era prejudicial para uma part e dos vo l u n t á rios da pesquisa, os ativistas pre s- s i o n a ram até conseguir que o labora t ó rio e s e u s p e s q u i s a d o res re f o rmulassem o pro t o c o l o, int roduzindo um outro antire t rov i ral, a Lamivudina (3TC), em dois dos braços da pesquisa. Isto é, o desenho do estudo passou a incluir três g rupos compara t i vos: (1) AZT e 3TC (pre v i a- mente só AZT); (2) AZT, Indinavir e 3TC (previamente AZT e Indinavir); e (3) o Indinavir q u e p e rmaneceu como braço monoterápico. En t ã o, sob a alegação de que não se dispunha ainda de provas científicas da ineficácia do uso do Indinavir isoladamente, foi mantido o braço de m o n o t e rapia com o mesmo por cerca de mais um ano. Diante da insistência do labora t ó rio e de seus pesquisadores em manter a monotera p i a com o In d i n a v i r, os ativistas buscaram aliança com outros atores que foram sendo mobilizad o s. Segundo Latour (1987), sempre que eclode uma controvérsia científica, o pri m e i ro movimento na direção do fortalecimento dos argumentos é a busca de aliados, no caso outro s c i e n t i s t a s, cuja autoridade é conferida pelo g rau de titulação acadêmica e pelos artigos que publicam em revistas científicas. Nestes casos, tanto a linguagem quanto a litera t u ra se tornam técnicas. Foi essa lógica que norteou o c o m p o rtamento dos ativistas diante da polêmica sobre a manutenção do braço de monot e rapia com o In d i n a v i r. Na seção de opinião do Ca d e rnos Pe l a Vi d- da, os ativistas reivindicam o direito de que o assunto fosse tratado e divulgado com tra n s p a- rência, ética e re s p o n s a b i l i d a d e, conclamando v á rios especialistas a re s p o n d e rem à seguinte p e rgunta: O protocolo de pesquisa da Me rc k, Sharp & Dohme deve continuar submetendo pacientes à monoterapia com o inibidor da prot e a s e? Ca d e rnos Pe l a Vidda (1996a:22). Essa questão foi dirigida a médicos pesquis a d o res participantes do pro t o c o l o, a médicos p e s q u i s a d o res externos à pesquisa, a médicos clínicos e às comissões de ética médica das instituições envolvidas no estudo. As opiniões foram dive rgentes: médicos p e s q u i s a d o res vinculados à pesquisa sustentaram a argumentação de que a manutenção do b raço de monoterapia com o Indinavir era correta. Na visão destes, não havia ainda cert ez a científica sobre a ineficácia da monotera p i a com o Indinavir e nem recomendação de órg ã o nacional ou internacional para a terapia antire t rov i ral-hiv combinada. Quanto ao impacto s o b re os vo l u n t á rios diziam eles: as pessoas que participam de qualquer ensaio podem ter benefícios ou pre j u í zo s. Os médicos-pesquisadores não ligados à pesquisa foram muito mais contundentes: m on ot erapia com inibidor da protease é absolutamente despro p o s i t a d a, pois pode selecionar

8 7 0 OLIVEIRA, M. A.; SANTOS, E. M. & MELLO, J. M. C. vírus re s i s t e n t e ou d e sde a divulgação dos estudos Delta e AC TG175 ninguém está autorizado a fazer monoterapia antire t rov i ra l,s o b re t u- do com AZT. Nesse momento, o discurso dos ativistas se deslocou da problematização da demanda por medicamento para um conteúdo de questionamento ético do desenho do estudo. Na ve rd a- d e, a esperança de cura se dirige a uma nova e s t ratégia terapêutica defendida por David Ho et al. (1995), centrada na tese do b ater forte e c e d o na infecção. Do ponto de vista do conhecimento cert i f i c a d o, já havia, nessa ocasião, f o rtes evidências científicas de que o HIV tinha capacidade de desenvo l ver resistência às drogas devido a suas altas taxas de mutação, send o, por isso, colocada em pauta a discussão da t e rapia combinada de dois ou mais antire t rov i- rais (Bu rns & Temin, 1994; Coffin, 1995; Co n- c o rde Co o rdinating Co m m i t t e e, 1994; Ho et al., 1995; Mansky & Temin, 1995). Assim, de uma posição favo r á vel à re a l i z a- ção do ensaio, os ativistas evo l u í ram para uma situação de condenação radical da pesquisa como antiética. Nesse pro c e s s o, vários elementos heterogêneos ou redes sócio-técnicas foram sendo mobilizados, como consensos, comissões de ética, pare c e res técnicos, art i g o s c i e n t í f i c o s, entidades que regulam o exerc í c i o p rofissional, entre outro s. O encerramento da controvérsia: a polêmica é ética e pública Em março de 1996 observa-se a pri m e i ra inic i a t i va oficial de criar normas para o uso de ant i re t rov i rais no Brasil. O MS, em oficina que reuniu sessenta médicos especialistas, definiu o pri m e i ro consenso nacional para utilização desses medicamentos. Re c o m e n d a va - s e, com base na litera t u ra científica, a terapia combinada para todos os pacientes sintomáticos desde o início do tratamento (MS, 1996). Ad i c i o- n a l m e n t e, iniciou-se a distribuição dos antiret rov i ra i s, incluindo os inibidores da pro t e a s e, na rede de serviços públicos de saúde no país. A inclusão desses medicamentos no elenco daqueles distribuídos gratuitamente a pessoas vivendo com HIV/AIDS lhes viabilizou o acesso a regimes terapêuticos antes inacessíve i s. Consolidou-se assim, uma política nacion a l p a ra o tratamento da AIDS, cuja base científica f o rtalecia o argumento dos ativistas de que o desenho da pesquisa, então em andamento, e ra inadequado. A controvérsia era ess e n c i a l- mente ética, ou seja, a monoterapia com o Indinavir não oferecia aos participantes a melhor a l t e rn a t i va disponível, conforme re c o m e n d a d o pelas normas das boas práticas da pesquisa clínica (W H O, 1995). Co r ro b o ra va-se assim o julgamento de que o ensaio era antiético. Do ponto de vista da mobilização de novo s a l i a d o s, o movimento contra a manutenção do b raço de monoterapia se fortalecia, abri n d o n ovas frentes e formas de atuação. No nível da regulação do exercício profissional, foi feita denúncia formal ao Conselho Regional de Me d i- cina de São Paulo (CRM-SP), em 26 de abril de 1996, solicitando um posicionamento deste órgão em relação ao f er im e nto de preceitos éticos que devem nortear os experimentos clínicos em s e res humanos (Ca d e rnos Pe l a Vidda, 1996b:9). De acordo com artigo intitulado Den u nc i am o s a Me rck no CRM, os ativistas denunciam os médicos pesquisadores tendo como base o Código de Ética Médica (CFM, 2000:230), Ca p. V, a rt.57: É vedado ao médico deixar de utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento a seu alcance em favor do paciente. Si m u l t a n e a m e n t e, foi solicitada a re v i s ã o dos pare c e res das comissões de ética em pesquisa de cada um dos centros envolvidos na pesquisa. Segundo o artigo analisado, três delas re s p o n d e ram, das quais duas, datadas de 07/03 e 26/04/96, apre s e n t a vam pare c e re s, cujos textos eram absolutamente idênticos. Ambos baseavam sua argumentação no fato de que não existia recomendação oficial para o uso de terapia combinada: nenhum órgão c i e n- tífico nacional ou internacional estabeleceu oficialmente um padrão de tratamento com medicamentos combinados... (Moti, 1996:2). As duas comissões corro b o ra ram a opinião dos p e s q u i s a d o res da Me rc k. A terc e i ra comissão de ética, assumindo uma postura de não dialogar diretamente com os ativistas, respondeu que o tema vinha sendo discutido e n o ssas respostas serão fornecidas ao CRM (Ca d e rnos Pe l a Vidda, 1996b:10). A l é m d i s s o, a imprensa re g i s t rou a posição de pesq u i s a d o res da UNIFESP e da USP. Os pri m e i ro s d i s s e ram: não defendemos ou combatemos m o n o t e rapia ou terapia combinada com este ou o u t ro composto. Apenas defendemos estudos que sejam desenvolvidos dentro de estritos par â m e t ros éticos em instituições reconhecidas de ensino/pesquisa sem pre j u í zo de qualquer tipo, aos pacientes part i c i p a n t e s (Folha de São Pa u- l o, 1997:2). Ainda de acordo com o art i g o, um pesquisador envolvido no estudo contestou, e x p l i c i t a m e n t e, pela imprensa, dizendo não admitir p a t rulhamento científico. Neste clima de forte turbulência, no segundo semestre de 1996, os ativistas adotaram u m a posição mais agre s s i va denunciando à sociedade que a pesquisa da Me rck era antiética e,

AIDS, ATIVISMO E REGULAÇÃO DE ENSAIOS CLÍNICOS 8 7 1 por isso, deve ria ser interrompida. No art i g o Pe sq u isa An t i é t i c a ( C AC, 1996d:22) os ativistas a f i rmam: Com grande re p e rcussão na mídia, as ONG/AIDS de São Paulo denunciaram publicamente o protocolo de pesquisa do inibidor da p rotease In d i n a v i r, do laboratório Me rc k, Sh a r p & Dh o m e. Vale ressaltar também que, nessa o c a s i ã o, foi criado em São Paulo o CAC (Co m i- tê de Acompanhamento Co m u n i t á rio de Pe s- quisas em HIV/AIDS), que contava com a participação dos Grupos Pe l a Vidda, GIV (Grupo de In c e n t i vo à Vida) e GAPA / S P. Este comitê elab o rou uma carta (CAC, 1996) dirigida à população em geral e a diferentes fóruns de re p resentação da sociedade. O texto da carta começa re a f i rmando a credibilidade da ciência, enquanto instituição que detém autoridade para a valiar a eficácia de um medicamento e seu valor prático para o pac i e n t e. Em seguida, revê a posição sobre os vol u n t á ri o s, que são agora: Pe ssoas seduzidas pela propaganda de remédio inovador e pelas condições de tratamento difere n c i a d o.... Ap ó s b re ve histórico sobre o desenvolvimento do ensaio do Indinavir no Brasil, elaboram suas críticas ao estudo, considerando quatro aspect o s, eminentemente éticos: f o rn ecem tra t a- mento pior que o da rede pública ; i ns i stem na m o n o t e rapia com o In d i n a v i r ; n egam aos voluntários informações sobre sua saúde ; a ss i s- tem a piora do paciente sem tomar prov i d ê n- c i a s. O texto termina com uma clara convo c a- ção ao controle social: c o nc l am amos as Comissões de Ética dos renomados centros de pesquisa envo l v i d o s,c R M - S P, C N S,C O N E P, Pro g ramas Nacional e Estadual de DST/AIDS e todos os interessados na prática da ética em ex p e r i- mentos com seres humanos que apurem estas g ra ves denúncias e tornem públicas suas posiç õ e s. São centenas de vida em jogo!!! (CAC, 1 9 9 6 : 2 2-2 3 ). A rede se expande incluindo numero s o s a t o res e a questão da ética, que ao ultra p a s s a r os limites da ética profissional e pro b l e m a t i z a r a ética em pesquisa com seres humanos, mobiliza novos aliados. O parecer solicitado à re c é m c riada CO N E P, teve resposta em 7/12/96 re c o- mendando a suspensão do ensaio por violar p rincípios éticos. A CONEP não só acatou as denúncias contra o Protocolo 028, como concluiu parecer questionando a monoterapia e o não fornecimento de exames que eram feitos nos pacientes. Com um artigo intitulado Pe sq u isa Po l ê m i- ca da Me rck Chega ao Fi m ( Ca d e rnos Pe l a Vi d- da, 1997a:23) os ativistas fazem uma re f l e x ã o s o b re a fragilidade do sistema de regulação da ética em pesquisa no Brasil. Du rante o pro c e s- so de questionamento do desenho do ensaio, quando re c o r re ram às diversas instâncias oficiais de decisão como as comissões de ética dos centro s, o Pro g rama Nacional de DST e AIDS, o CRM-SP, esbarra ram no corpora t i v i s- mo ou na lentidão de uma legislação arc a i c a. Assim, a única altern a t i va foi a pressão informal exercida sobre os médicos dos centros envolvidos na pesquisa, mediante dos debates p ú b l i c o s, entrevistas e artigos publicados na mídia nacional e intern a c i o n a l. O f i c i a l m e n t e, quem decretou o fim do protocolo foi o Data Safety Monotoring Bo a rd ( Cad e rnos Pe l a Vidda, 1997a). En t re t a n t o, essa decisão só foi tomada duas semanas após o parecer da CO N E P. D i s c u s s ã o Os ensaios clínicos controlados e ra n d o m i z a- dos são considera d o s, tanto pela comunidade científica quanto pelas agências re g u l a d o ra s, como o padrão ouro para testar a eficácia e a s e g u rança do uso de medicamentos, porq u e p roduz evidências mais diretas e inequívo c a s no sentido de esclarecer uma relação de causaefeito entre dois eve n t o s (Pe re i ra, 1995:290). Neste tipo de experi m e n t o, os sujeitos da pesquisa são alocados, de maneira aleatória, em g rupos denominados de braços experimental e de contro l e, para em seguida, serem expostos a uma dada-interve n ç ã o. Como os parâmetro s p a ra o controle do experimento são definidos a p r i o r i, a qualidade dos dados produzidos sobre a intervenção e seus efeitos costuma ser de excelente nível, do que resulta sua a lta cre d i b i l i- dade como produtor de evidências científicas ( Pe re i ra, 1995:291). En t re t a n t o, apesar do seu inegável pre s t í g i o a c a d ê m i c o, são identificadas algumas limitações determinadas por questões de naturez a ética e/ou metodológica, principalmente, q u a n- do são realizados em países subdesenvo l v i d o s ( Lu ri e, 1997). De n t re elas, ressaltamos a exigência de que a população de sujeitos da pesquisa seja estável e coopera t i va (Pe re i ra, 1995). Co n s i d e rando o número de pessoas normalmente envolvidas nesses estudos, que pode va riar de algumas dezenas a milhares de indivíd u o s, pode-se imaginar o desafio que re p re s e n- ta para os pesquisadores garantir a aderência de tantos sujeitos da pesquisa às re g ras estabelecidas no pro t o c o l o. Além do cumprimento rig o roso no que se re f e re à tomada dos medicamentos nas doses e horários estabelecidos, é p reciso ainda se submeter, peri o d i c a m e n t e, a uma bateria de exames clínicos e labora t o ri a i s.

8 7 2 OLIVEIRA, M. A.; SANTOS, E. M. & MELLO, J. M. C. Nesse aspecto, diferente dos animais de exp e ri m e n t a ç ã o, que podem ser completamente subjugados às normas do estudo, os sujeitos das pesquisas clínicas têm desejos, expectativas e interesses em relação ao ensaio, que podem ser expressos coletiva m e n t e, por seus rep resentantes org a n i z a d o s, ou, individualment e, pela não aderência ao esquema pro p o s t o. Isto implica que a garantia da qualidade dos dados produzidos esteja condicionada a um p rocesso de negociação entre os pesquisadore s, não somente com os patro c i n a d o res da pesquisa, como é o mais usual, mas, sobre t u d o, com os sujeitos da pesquisa e/ou seus re p resentantes organizados (Epstein, 1995). Epstein (1997:692) discutindo a questão da aderência ao pro t o c o l o, afirmou: s u bjects participate or don t participate,and comply with the study protocols or not, depending on their perceptions of what works and what doesn t, h ow desperate their own health situation may be,and what options may be open to them or closed. No que se re f e re à questão dos intere s s e s c o m e rciais da indústria farmacêutica, Ab raham (1995) cita a declaração de um pesquisador da Gl a xo, que, em encontro científico de m é d i c o s, disse não ter nenhuma dúvida de que a principal tarefa da pesquisa e desenvo l v i- mento de uma organização era buscar, encont rar e desenvo l ver novos medicamentos que fossem capazes de pro p o rcionar lucros substanciais às suas empre s a s. Vale ressaltar ainda, que fre q ü e n t e m e n t e, os contratos efetuados e n t re instituições de pesquisa e as re f e ri d a s e m p resas contêm cláusulas de confidencialid a d e, as quais podem ser usadas como instrumento de pressão contra os pesquisadore s, em caso de divulgação de resultados que comprometam a mercadização do medicamento testado (Sp u rgeon, 1998). Po d e - s e, port a n t o, constatar que nestes est u d o s, tanto os patro c i n a d o re s, que são os próp rios labora t ó rios pro d u t o res do medicamento sob teste, quanto os vo l u n t á ri o s, cuja vida está em jogo, apostam alto podendo obter ao final g randes lucros ou acumular perd a s. Ne s t a p e r s p e c t i va, concordamos com Epstein (1997: 691) quando afirma que os testes para ava l i a- ção de eficácia terapêutica a re crucial sites for the negotiation of cre d i b i l i t y, risk and trust. Por esse motivo, torna-se fundamental discutir que re g i s t ros discursivos assinalam a c o n s t rução dessa credibilidade e confiança no caso em estudo. No Protocolo 028 identificamse três núcleos discursivos por meio dos quais as operações de tradução se realizam: a existência do ensaio; a polêmica entre mono e terapia associada e a ética. No pri m e i ro momento, ativistas, pesquisad o res e indústria consensualmente pro m ove m e defendem a realização do pro t o c o l o. A operação de tradução tra n s f o rma acesso a medicam e n t o s, prestígio científico e dados para re g i s- t ro do Indinavir em equivalentes e viabiliza o e n s a i o. Num segundo momento, com a entrada de novos atore s, novos discursos são pro d u- zidos alterando o equilíbrio prov i s ó rio da re d e sociotécnica. Em e rge a controvérsia científica, que se dá, pri n c i p a l m e n t e, em torno da monot e rapia com antire t rov i ra i s. O terc e i ro momento é marcado pela controvérsia em que a questão ética, inicialmente apreendida nos limites do código profissional, é expandida para a regulação das pesquisas em sujeitos humanos, constituindo-se no principal argumento dos a t i v i s t a s, que, nesse momento, passam a re i- vindicar a suspensão do ensaio. As práticas discursivas re f e rentes à AIDS no campo da biomedicina se inscre vem em pelo menos quatro disciplinas: a virologia, a imunologia, a clínica e a epidemiologia. De cada uma destas disciplinas emergem descrições técnic a s, avaliações de afastamento em relação a padrões de normalidade e qualidade. Um componente comum a esses discursos se re f e re à noção de tempo e contro l e. Tempo de incubação e replicação viral, de estagiamento da d o e n- ça, de evolução dos níveis de compro m e t i m e n- to corporal e de sobrevida. Tempo necessári o ao desenvolvimento de novas dro g a s, a pro d u- ção do conhecimento, aos processos de peer rev i ew. Tempos necessários à tra n s f o rmação destes conhecimentos em tecnologias, das re s p o s- tas gove rnamentais e da mídia. É, exatamente, em relação à construção d e s- sas temporalidades que se estabelecem conf rontos e negociações entre as formações disc u r s i vas da biomedicina e dos grupos ativistas. Com base nessas temporalidades pri m a ri a- mente conflitantes a científica é pre d o m i- nantemente diacrônica, enquanto a dos ativistas é sincrônica em termos de intensidade e vivência dos sujeitos concretos é que se estrut u ram interpenetrações de discursos e de pod e res (Erni, 1994). A experiência da doença, enquanto experiência singular de uma norma re s t rita ou da possibilidade de um desfecho fatal (Ca n g u i- lhem, 1982), ainda mais se inserida na perspect i va de uma epidemia, entendida como um acontecimento desordenador das estru t u ra s sociais (De t i e n n e, 1994), expressa uma noção de tempo-urgência, de intensidade e de pres e n t e. De um lado, os pesquisadores enfatizam a necessidade de tempo que permita o seguimento das re g ras do método e do controle c i e n-

AIDS, ATIVISMO E REGULAÇÃO DE ENSAIOS CLÍNICOS 8 7 3 t í f i c o, o que para eles é um tempo objetivo e real. De outro, os ativistas e os sujeitos da pesquisa para quem o tempo urg e, porque é embebido na expectativa de viver e de morre r, tempo este, subjetivo para os cientistas. Na m e- dida deste conflito, a necessidade do julgamento ético passa a ser cru c i a l. Jasanoff (1998), analisando processos de tomada de decisão em questões re l a t i vas à re g u- lação de base científica, identifica três instânc i a s, que ela denomina de Forum De s i g n, Process De s i g n e Jud icial Re v i ew, cuja dinâmica pode facilitar a negociação e o alinhamento dos interesses dos diversos atores envo l v i d o s nesses embates. A pri m e i ra re f e re-se à escolha institucional de um fórum multipart i t e, que seja capaz de negociar, ao mesmo tempo, diferenças sobre f a t o s e va l o re s. A segunda incorp o ra um comitê consultivo (a dv is o ry comittee p ro c e e d i n g s) formado por especialistas, cuja função é criar a oportunidade para que, tanto a agência re g u l a d o ra quanto os outros atores int e re s s a d o s, tenham um melhor conhecimento das diferentes opções metodológicas e interp re t a t i vas para cada questão em jogo. O terc e i- ro, o fórum judicial, é a instância de ve ri f i c a ç ã o e certificação de que as inferências assumidas pela agência re g u l a d o ra têm o respaldo dos especialistas e se situam dentro de um espectro de escolhas cientificamente aceitável. Vale re s- saltar que a autora focaliza sua análise nas est ratégias de resolução de controvérsias científic a s, usualmente ori g i n á rias entre grupos científicos hiera rquicamente semelhantes no que se re f e re às relações de poder. No desenvolvimento da pesquisa de São Paulo observa-se que, no confronto entre os int e resses dos ativistas e dos demais atore s, part i c u l a rm e n t e, dos médicos pesquisadores e da Me rck, a natureza da controvérsia não se limita a dive rgências técnico-científicas, mas se insere na esfera do controle de interesses e necessidades explicitadas pelos grupos envo l v i d o s, g rupos que ocupam lugares desiguais na estrut u ra de poder na sociedade. Assim, entende-se que além dos três espaços de resolução já descritos pela autora, no ensaio de São Pa u l o, o encerramento da cont rovérsia ocorreu no espaço de uma arena pública multipart i t e, constituindo-se numa quarta instância de negociação, o fórum da ética. R e f e r ê n c i a s ABRAHAM, J., 1995. S c i e n c e, Politics and the Ph a r m a- ceutical In d u s t ry. New Yo rk: St. Ma rt i n s Pre s s. A RVECH, H., 1987. Principles of re s e a rch allocation. In: A St rategic Analysis of Science & Te c h n o l o gy Policy (H. Arvech, ed.), pp. 8-41, Ba l t i m o re / L o n- don: Johns Hopkins Un i versity Pre s s. B A S TOS, C.; GALV Ã O, J.; PE D ROSA, J. S. & PA R K E R, R., 1994. A AIDS no Bra s i l. Hi s t ó ria Social da AIDS, no 2. Rio de Ja n e i ro: Relume & Du m a r á / A s- sociação Bra s i l e i ra In t e rdisciplinar de AIDS/Instituto de Medicina Social, Un i versidade do Estado do Rio de Ja n e i ro. BRASIL, 1990. Lei 8.080, de 19 de Se t e m b ro de 1990. Dispõe sobre as Condições para a Pro m o ç ã o, Proteção e Re c u p e ração da Saúde, a Organização e Funcionamento dos Se rviços Correspondentes e dá Ou t ras Prov i d ê n c i a s. 29 Março 2001 <http://www. s a u d e. g ov. b r / d o c / l e i 8 0 8 0. h t m >. B ROWN, P., 1995. Popular epidemiology, toxic waste and social move m e n t s. In: Medical Health and R i s k. Sociological Ap p ro a c h e s ( J. Ga b e, ed.), pp. 92-112, Ca m b ridge: Bl a c k well Pu b l i s h e r s. BURNS, D. P. W. & TEMIN, H. M., 1994. High rates of f rameshift mutations within homo-oligomeri c runs during a single cycle of re t rov i ral re p l i c a t i o n. Journal of Vi ro l o gy, 6 8 : 4 1 9 6-4 2 0 3. C AC (Comitê de Acompanhamento Co m u n i t á rio de Pesquisas em HIV/AIDS), 1996d. Pesquisa antiética. Cadernos Pe l a Vi d d a, 21:22-23. CADERNOS PE LAVIDDA, 1995a. Inibidor da pro t e a- s e. Cadernos Pe l a Vi d d a, 6:19-20. CADERNOS PE LAVIDDA, 1995b. Pe l a Vidda se re ú n e com a Me rck. Cadernos Pe l a Vi d d a, 17:19-20. CADERNOS PE LAVIDDA, 1996a. Mo n o t e rapia com inibidor da protease gera polêmica. Cadernos Pel a Vi d d a, 18:22-23. CADERNOS PE LAVIDDA, 1996b. Denunciamos a Me rck no CRM. Cadernos Pe l a Vi d d a, 19:9-10. CADERNOS PE LAVIDDA, 1996c. A hora da ve rd a d e. Cadernos Pe l a Vi d d a, 20:16. CADERNOS PE LAVIDDA, 1997a. Pesquisa polêmica da Me rck chega ao fim. Cadernos Pe l a Vi d d a, 22:22-23. CADERNOS PE LAVIDDA, 1997b. Se falta ética. Fa l t a t u d o. Cadernos Pe l a Vi d d a, 25:25.

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