Sumário: Pessoas colectivas de utilidade pública. Sua sujeição a registo comercial. Obrigatoriedade.

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Transcrição:

Proc.º C. Co.110/2008 SJC-CT Sumário: Pessoas colectivas de utilidade pública. Sua sujeição a registo comercial. Obrigatoriedade. Consulente: A Senhora Notária do Cartório da 1 A Senhora Notária do Cartório da pretende saber se as pessoas colectivas de utilidade pública definidas no Decreto-Lei n.º 460/77, de 7 de Novembro, estão sujeitas a registo obrigatório por força do que preceitua o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 57/78, de 1 de Abril, ou se o registo é apenas uma possibilidade. A razão da consulta prende-se com o facto de ter sido feito um legado a todas as pessoas colectivas de utilidade pública (128) do distrito de. e elas pretenderem vender o bem legado e distribuir o produto dessa venda pelos respectivos legatários. Apesar de não existir unanimidade sobre a obrigatoriedade do registo destas pessoas colectivas crê que o mesmo é obrigatório e se assim for torna-se indispensável a apresentação de uma certidão do registo comercial, como se de uma sociedade comercial se tratasse, para atestar a qualidade de representante da pessoa colectiva de utilidade pública. 2 Na informação dos Serviços Jurídicos e de Contencioso defendeu-se que o registo das pessoas colectivas de utilidade pública não é obrigatório, uma vez que o acto constituinte e as suas subsequentes alterações estão sujeitas a publicação que tem por finalidade (tal como nas sociedades comerciais) ser condição de eficácia em relação a terceiros. No entanto, devido à controvérsia e complexidade da matéria em apreço foi determinada a audição deste Conselho. Cumpre, pois, emitir parecer. Fundamentação 1 A legislação base para a atribuição do estatuto de pessoas colectivas de utilidade pública quer a associações ou fundações, pessoas colectivas que prossigam fins de interesse geral, quer a pessoas colectivas de utilidade pública 1

administrativa encontra-se previsto no Decreto-Lei n.º 460/77, de 7 de Novembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 40/2007, de 28 de Abril, e pelo Decreto-Lei n.º 391/2007, de 13 de Dezembro. A noção de pessoas colectivas de utilidade pública 1 consta do artigo 1.º deste diploma nos seguintes termos: «1 São pessoas colectivas de utilidade pública as associações ou fundações que prossigam fins de interesse geral, ou da comunidade nacional ou de qualquer região ou circunscrição, cooperando com a administração central ou a administração local, em termos de merecerem da parte desta administração a declaração de utilidade pública. 2 As pessoas colectivas de utilidade pública administrativa são, para efeitos do presente diploma, consideradas como pessoas colectivas de utilidade pública». Sobre a epígrafe «Registo das pessoas colectivas de utilidade pública» o artigo 8.º do referido decreto-lei, na sua versão inicial, dava-nos conta que seria criado na Direcção-Geral dos Registos e do Notariado o registo destas pessoas colectivas de utilidade pública 2. 1 A posição expendida por MARCELLO CAETANO in Manual de Direito Administrativo, Tomo I, 10.ª edição, págs. 396 e segs., relativamente à classificação de pessoas colectivas de utilidade pública e de pessoas colectivas de direito privado que não tivessem «por fim o lucro dos associados» deve, segundo reconhece FREITAS DO AMARAL, ser revista à luz da significativa evolução legislativa verificada após a Revolução de 1974. Actualmente, segundo este autor, in Curso de Direito Administrativo, Volume I, 1992, págs. 552 e segs., as pessoas colectivas de direito privado e regime administrativo devem designar-se por instituições particulares de interesse público e define estas instituições como «pessoas colectivas privadas que, por prosseguirem fins de interesse público, têm o dever de cooperar com a Administração Pública e ficam sujeitas, em parte, a um regime especial de Direito Administrativo». 2 Este preceito foi alterado pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 391/2007, que lhe manteve a epígrafe, mas dele passou a constar que será criada uma base de dados das entidades declaradas de utilidade pública no âmbito do Decreto-Lei 460/77, mantida pela Secretaria-Geral da Presidência de Conselho de Ministros que a disponibiliza, para efeitos de consulta pública, no respectivo portal na Internet. Esta alteração, conforme se proclama no seu preâmbulo, visa introduzir medidas de simplificação administrativa mediante a desburocratização e desmaterialização dos 2

Ora, como é sabido, a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado 3 não estava estruturada para funcionar como serviço registral, sendo apenas competente para a supervisão e orientação geral dos serviços externos, pelo que teve de se providenciar, por diploma de igual força, à regulamentação do registo das referidas pessoas colectivas. Com tal desiderato foi publicado o Decreto-Lei n.º 57/78, de 1 de Abril, que veio, no seu artigo 1.º, equiparar as pessoas colectivas de utilidade pública a que se refere o Decreto-Lei n.º 460/77, exclusivamente para fins de registo, às sociedades comerciais. No artigo 2.º daquele diploma são elencados os factos sujeitos a registo comercial e nos artigos subsequentes a forma e as menções do extracto das respectivas inscrições e averbamentos. Além dos actos de constituição ou instituição das pessoas colectivas declaradas de utilidade pública 4, bem como dos respectivos estatutos e suas alterações, outros factos são também sujeitos a registo designadamente a eleição, designação ou exoneração dos respectivos administradores e outros representantes legais. procedimentos relativos à instrução dos pedidos de declaração de utilidade pública, não visando interferir com o registo comercial. 3 Hoje Instituto dos Registos e do Notariado, I.P. cfr. o artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 129/2007, de 27 de Abril. 4 A utilidade pública consiste numa atribuição ou qualificação conferida (reconhecida) pela Administração a determinadas pessoas colectivas (associações ou fundações), de natureza privada e de fins não lucrativos, tendo em conta o relevo dos interesses que prosseguem e dos serviços que prestem à comunidade. 3

Por não resultar clara a obrigação do registo para as associações que na data da publicação do Decreto-Lei n.º 460/77 já tivessem sido reconhecidas como pessoas colectivas de utilidade pública administrativa pela entidade competente foi publicado o Despacho Normativo n.º 51/79, de 28 de Fevereiro, que esclareceu, inter alia, que o artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 460/77, abrange as pessoas colectivas de utilidade administrativa referidas no Código Administrativo já constituídas ou a constituir em data posterior à da publicação daquele decreto e que a obrigação do registo consignada no artigo 8.º deve ser observada por todas estas pessoas colectivas. No entanto, as dúvidas quanto à interpretação e aplicação de algumas das disposições constantes do Decreto-Lei n.º 460/77 às pessoas colectivas de utilidade pública administrativa constituídas nos termos do Código Administrativo e às pessoas colectivas de direito privado constituídas antes da entrada em vigor do Código Civil persistiram pelo que surgiu necessidade de nova clarificação o que veio a acontecer com a publicação do Despacho Normativo n.º 147/82 5, de 16 de Julho. 2 Cremos que será agora oportuno fazer uma breve alusão à catalogação actualmente apresentada pelos autores para identificar as pessoas colectivas de utilidade pública. Segundo o entendimento de Freitas do Amaral 6, entre outros, as pessoas colectivas de utilidade pública dividem-se em três subespécies: pessoas colectivas de mera utilidade pública, instituições particulares de solidariedade social e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa. As pessoas colectivas de mera utilidade pública compreendem todas as pessoas colectivas de utilidade pública que não sejam instituições particulares de solidariedade social nem pessoas colectivas de utilidade pública administrativa o seu conteúdo determina-se, portanto, por exclusão de partes. As instituições de solidariedade social são as que se constituem para dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e de justiça entre os 5 Este Despacho Normativo bem como o anteriormente mencionado foram revogados pelo artigo 2.º do referido Decreto-Lei n.º 391/2007. 6 In ob. e págs. cit. na nota 1. 4

indivíduos encontrando-se o seu regime consagrado no Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de Fevereiro, e actualmente regulamentado pela Portaria n.º 139/2007, de 29 de Janeiro, que revogou a Portaria n.º 778/83, de 23 de Julho. Por seu turno, as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa são as que prosseguem algum dos fins previstos no artigo 416.º do Código Administrativo (CA). O seu regime encontra-se ainda fixado no citado Código, adquirindo personalidade jurídica no acto da constituição e sendo para todos os efeitos legais reconhecidas desde logo de utilidade pública, como decorre do prescrito no artigo 417.º do CA 7. Destas subespécies, adiantamos já, apenas as instituições particulares de solidariedade social não estão sujeitas a registo comercial, por força da excepção consignada no artigo 8.º do Decreto-Lei 119/83. É da competência dos Centros Distritais de Segurança Social (CDSS) a emissão de declarações comprovativas dos actos de registo cuja efectivação lhes tenha sido comunicada pela Direcção-Geral da Segurança Social cfr. o disposto nos artigos 3.º e 28.º do RRIPSS, aprovado pela Portaria n.º 139/2007. 3 Outro aspecto que não pode ser aqui descurado, e que, por isso, abordaremos de seguida, prende-se com o meio de constituição das associações e das fundações 8. 3.1 As associações são pessoas colectivas de tipo corporativo, assentando a sua constituição na formação de um substrato pessoal, ou seja, na existência de um grupo de pessoas que se associam para a realização de determinados fins não lucrativos, cujo regime se encontra consagrado nos artigos 157.º e segs. do Código Civil. 7 Foi a necessidade de conjugação deste preceito com o prescrito no Decreto-Lei n.º 460/77 que determinou a publicação do supracitado Despacho Normativo n.º 51/79. 8 As associações gozam da faculdade de se constituírem e de prosseguirem os seus fins sem interferência do Estado, por força do prescrito nos n.ºs 1 e 2 do artigo 46.º da Constituição da República Portuguesa, preceito que corresponde sensivelmente aos ideais consagrados no artigo 20.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, proclamada na Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de Abril de 1948. 5

O acto de constituição e os estatutos das associações 9 (bem como as suas alterações) devem constar de escritura pública ou de qualquer outro meio legalmente admitido 10, não devendo ser lavrada sem a apresentação do certificado de admissibilidade da firma, dentro do prazo de validade (artigos 36.º, 45.º, 53.º e 55.º do RJRNPC). Estão também sujeitas a exigências de publicidade que se traduzem a promoção imediata da publicação da constituição e dos estatutos, nos termos previstos para as sociedades comerciais, como decorre do disposto nos artigos 167.º 11 e 168.º do Código Civil. Observadas que sejam as especificações referidas no n.º 1 do citado artigo 167.º, as associações gozam de personalidade jurídica por força do prescrito no n.º 1 do artigo 158.º do citado Código 12. 3.2 Por seu turno, as fundações são instituídas por um acto unilateral do fundador que procede à afectação de uma massa de bens a um dado escopo de interesse social 13 (o elemento patrimonial integrador do seu substrato é essencial 9 Apesar de a lei ora falar em acto de constituição (artigos 158.º, n.º 1, e 158.º-A) ora em estatutos (v. g., artigos 159.º, 162.º, 163.º, n.º 1, 166.º, n.º 2, 170.º, n.º1, 173.º) nada impede que conste de um único documento, desde que contenha os inerentes requisitos de forma e de substância. Em regra, é até o que acontece atenta a faculdade concedida pelo disposto no artigo 64.º do Código do Notariado. Cfr, neste sentido, PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, in Código Civil Anotado, 1.º Volume, 4.ª edição, pág. 170, e ainda MENEZES CORDEIRO, in Tratado de Direito Civil Português, Tomo III, 2004, pág. 572. 10 Veja-se a Lei n.º 40/2007, de 24 de Agosto, que criou um regime especial de constituição imediata de associações. 11 Segundo salienta CARVALHO FERNANDES, in Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª edição, pág. 622, a lei civil, ao traçar o regime das associações embora não se ocupe especificamente deste ponto ele não deixa de estar pressuposto no n.º 1 do artigo 167.º do Código Civil, quando nele se determina que o acto de constituição deve especificar «os bens com que os associados concorrem para o património social». No mesmo sentido veja-se, também, MENEZES CORDEIRO, in ob. cit., págs. 551 e segs. 12 Quanto ao momento da aquisição da personalidade veja-se o parecer proferido no proc.º R.Co.8/1997DSJ, in BRN n.º 2/2001, I, pág. 29. 13 Para mais desenvolvimentos, veja-se MOTA PINTO, in Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição, 2005, págs. 282 e segs. 6

para que venham a constituir-se como pessoas colectivas 14 ) e, adquirem personalidade jurídica pelo reconhecimento, que é individual e da competência da autoridade administrativa cfr. o disposto no n.º 2 do citado artigo 158.º e também nos artigos 185.º e segs. todos do Código Civil. 3.3 Os requisitos necessários para a concessão da declaração de utilidade pública destas associações ou fundações encontram-se previstos nos artigos 2.º e 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei 460/77, na redacção introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 391/2007, sendo de realçar que só podem ser como tal declaradas ao fim de três anos de efectivo e relevante funcionamento. 3.4 A forma de obrigar as pessoas colectiva de utilidade pública, bem como a composição dos órgãos de gestão e representação são elementos que deverão também constar do respectivo registo, por força do que prescrevem as alíneas g) e h) do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 57/78. Contudo, a forma de obrigar encontra-se também regulada supletivamente na lei substantiva cfr. o disposto nos artigos 163.º, n.º 1, e 167.º, n.º 1, a contrario, do Código Civil daí que a omissão daquela menção no registo não possa constituir obstáculo à elaboração em termos definitivos do registo do acto constitutivo ou da sua alteração 15. 4 O nosso ordenamento jurídico contempla, no que respeita às pessoas colectivas, um registo geral e vários registos especiais 16. 14 A dotação assume um papel de tal modo importante nas fundações que se revela mesmo indispensável para que possam ser constituídas cfr. FERRER CORREIA e ALMENO DE SÁ, Algumas Notas sobre as Fundações, in Revista de Direito e Economia, págs. 588 e 589. 15 Cfr., neste sentido, o parecer proferido no proc.º 206 R.P.92, publicado no BRN n.º 1/2001, I, págs. 15 e segs. 16 O registo das pessoas colectivas religiosas encontra-se inserido no âmbito de competência do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, dele decorrendo a atribuição da personalidade jurídica, como resulta do disposto no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 134/2003, de 28 de Junho. 7

4.1 O registo geral deve ser feito no Ficheiro Central de Pessoas Colectivas existente no Registo Nacional de Pessoas Colectivas, nos termos e por força do prescrito no artigo 4.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 129/98, que aprovou o RJRNPC. 4.2 Como exemplos de registos especiais, com pertinência para o caso, apresentamos o registo comercial que abrange, entre outras, as sociedades comerciais e as pessoas colectivas de utilidade pública, devido à equiparação atrás referida, e também o registo das instituições particulares de solidariedade social. 4.2.1 Consabidamente, o registo de constituição das sociedades comerciais assume um efeito constitutivo como resulta da análise conjugada do prescrito no artigo 13.º, n.º 2, do Código do Registo Comercial (CRC), e no artigo 5.º do Código das Sociedades Comerciais 17. Este registo é obrigatório por força do disposto nos artigos 3.º, n.º 1, alínea a) e 15.º, n.º 1, alínea a), ambos do CRC, funcionando como condição de atribuição da personalidade jurídica em relação às sociedades comerciais 18. Da publicação do correspondente acto de registo decorre a oponibilidade a terceiros cfr. o disposto nos artigos 70.º, n.º 2, e 14.º, n.º 2, do citado Código. Ora, de harmonia com o modelo geral estatuído no Código Civil, o registo das referidas pessoas colectivas de utilidade pública não funciona como elemento constitutivo já que nada vem acrescentar à personalidade já existente. Mas este registo apesar de não ser requisito da sua personificação (revestindo apenas eficácia enunciativa em matéria de personificação colectiva), não é despiciendo já que preenche uma forma legal tida como particularmente idónea de publicidade da qualidade da pessoa colectiva, podendo a sua falta 17 Relativamente ao efeito constitutivo do registo, veja-se MENEZES CORDEIRO, in Manual de Direito Comercial, I Volume, 2001, pág. 328, e no Código das Sociedades Comerciais Anotado, 2009, pág. 85, a defender neste que com a exigência do registo feita pelo CSC de 1986, o sistema ficou mais claro. 18 E também às sociedades civis sob forma comercial, por força do prescrito no artigo 1.º, n.º 4, do Código das Sociedades Comerciais. 8

envolver importantes consequências no seu regime jurídico, além de poder acarretar a aplicação de sanções diversas 19. Assim, enquanto a aquisição da personalidade das sociedades comerciais decorre do registo comercial a personalidade jurídica das associações resulta logo da sua constituição e será oponível a terceiros com a publicação do respectivo título constitutivo, sendo que as fundações adquirem personalidade com o reconhecimento (artigo 158.º do Código Civil) tendo o registo que destas venha a ser efectuado após a declaração de utilidade pública efeitos meramente enunciativos. A equiparação consagrada no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 57/78 parece restringir-se apenas a procedimentos registrais. 4.2.2 Por seu turno, o registo das instituições particulares de solidariedade social (que revestem uma das formas seguintes: associações de solidariedade social, associações de voluntários de acção social, associações de socorros mútuos, fundações de solidariedade social e irmandades da misericórdia) tem lugar na Direcção-Geral da Segurança Social do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social por força do prescrito no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de Fevereiro. Estas instituições logo que sejam registadas adquirem automaticamente a natureza de pessoas colectivas de utilidade pública, com dispensa do registo previsto no Decreto-Lei n.º 460/77, como decorre expressamente do disposto no artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 119/83 20. 5 Os termos da consulta não nos dão a conhecer o teor do testamento pelo que chamamos ainda a atenção da consulente para o disposto no artigo 88.º 19 Veja-se, neste sentido, CARVALHO FERNANDES, in Teoria Geral do Direito Civil, I Volume, 3.ª edição, 2001, pág. 553. 20 Veja-se também o que dispõe o Regulamento do Registo das Instituições Particulares de Solidariedade Social no âmbito da acção do sistema da segurança social, aprovado pela Portaria n.º 139/2007, de 29 de Janeiro, designadamente os seus artigos 2.º (finalidades do registo), 3.º (competência para o registo), 5.º (actos sujeitos a registo), 6.º (requisitos do registo), 9.º (efectivação do registo), 14.º (eficácia do registo) e 28.º (prova dos actos de registo). 9

do Código do Notariado que demanda a elaboração de habilitação de legatários, quando estes sejam indeterminados ou instituídos genericamente ou quando a herança seja toda distribuída em legados. 6 A representação das pessoas colectivas cabe, de harmonia com o que se encontra prescrito no n.º 1 do artigo 163.º do Código Civil, a quem os estatutos determinarem ou, na falta de disposição estatutária, à administração ou a quem por ela for designado. 7 - Julgamos ter respondido às questões colocadas na consulta sustentando que o registo de constituição das pessoas colectivas de utilidade pública não é constitutivo e que aquela constituição e factos, designadamente a designação de administradores, são factos sujeitos a registo, mas não a registo obrigatório cfr. o disposto na alínea f) do nº 1 do artigo 8º do Regulamento do Registo Comercial, introduzida pela Portaria nº 1256/2009, de 14 de Outubro, que reforça o entendimento firmado. Não foi colocada na consulta a questão da comprovação perante o titulador da qualidade de representante das referidas pessoas colectivas e da suficiência dos seus poderes, pelo que sobre tal matéria não vamos emitir pronúncia. Em conformidade com o exposto, o entendimento deste Conselho vai sintetizado nas seguintes Conclusões I São consideradas pessoas colectivas de utilidade pública as associações ou fundações que prossigam fins de interesse geral, ou da comunidade nacional ou de qualquer região ou circunscrição, cooperando com a administração central ou a administração local, em termos de merecerem da parte desta administração a declaração de utilidade pública, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 460/77. Para efeitos deste diploma, as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa também são consideradas como pessoas colectivas de utilidade pública n.º 2 do citado preceito. 10

II As pessoas colectivas de utilidade pública são equiparadas, para fins exclusivamente de registo, às sociedades comerciais, por força do que prescreve o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 57/78, de 1 de Abril. III As instituições de solidariedade social previstas no Decreto-Lei n.º 119/83 encontram-se dispensadas do registo comercial por força do disposto no artigo 8.º do referido diploma. IV É obrigatório o registo de constituição das sociedades comerciais previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do Registo Comercial, bem como o dos factos constantes, designadamente, das alíneas m) e t), do mesmo preceito, como resulta da análise conjugada destas normas com o prescrito no artigo 15.º, n.º 1, do citado Código. V Tal obrigatoriedade, contudo, não é extensiva ao registo dos mesmos factos (constantes do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/78) atinentes às pessoas colectivas de utilidade pública uma vez que a sua equiparação às sociedades comerciais respeita apenas a procedimentos registrais. Lisboa, 21 de Outubro de 2009 Parecer aprovado em sessão do Conselho Técnico de 21 de Outubro de 2009. Isabel Ferreira Quelhas Geraldes, relatora, Luís Manuel Nunes Martins, João Guimarães Gomes Bastos, Carlos Manuel Santana Vidigal, Ana Viriato Sommer Ribeiro, José Ascenso Nunes da Maia. Este parecer foi homologado pelo Exmo. Senhor Presidente em 29.10.2009. 11