Ficha catalográfica Seminário BH pelo Parto Normal Coordenação Sônia Lansky Miriam Rego de Castro Leão



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Apresentação Seminário BH Pelo Parto Normal Sumário Paradoxo perinatal brasileiro: mudando paradigmaspara a redução da mortalidade materna e neonatal Abertura Entre os do dias Seminário...11 19 e 23 de agosto de 2008 foi realizado, Belo Horizonte, o Seminário BH Pelo Parto Normal Paradoxo perinatal brasileiro: 1. Parto mudando e nascimento paradigmas para no mundo a redução contemporâneo: da mortalidade materna Confe-rência O evento, de abertura financiado do pelo Seminário Departamento BH pelo de Ciência Parto e Normal Tecnologia neonatal. do Ministério Michel Odent...13 da Saúde / Organização Pan-americana Saúde (OPAS), foi promovido pela Comissão Perinatal da Secretaria Municipal de Saúde de 2. Belo Oficina Horizonte I: Aumento e contou com da prematuridade o apoio das seguintes no país: instituições: melhoria Agência Nacional de Saúde Suplementar, Associação Brasileira de Enfermagem de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? Obstétrica; Associação Médica de Minas Gerais; Frente Parlamentar de Saúde da Mulher da Assembléia Legislativa de Minas Gerais; Hospital 2.1. Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? Lacunas para a pesquisa e di- Sofia Feldman; Instituto Brasileiro para o Estudo e o Desenvolvimento do Setor de Saúde (IBEDESS); Rede FHEMIG; Rede Unidas; Secretaria vulgação para a assistência do Estado da Saúde de Minas Gerais; Sindicato dos Médicos; Sociedade Mineira de Ginecologia e Obstetrícia; Sociedade Mineira de Pediatria, Maria do Carmo Leal...23 Academia Mineira de Pediatria e demais parceiros do Movimento BH pelo 2.2. Aumento da prematuridade - prematuridade evitável? Parto Normal. Alicia Matijasevich...29 O objetivo do Seminário BH Pelo Parto Normal foi socializar informações e experiências por meio do debate entre os participantes e 2.3. Nascimento pré-termo: melhoria de acesso à tecnologia ou iatrogenia evitável? apontar estratégias e ações, orientando a produção do conhecimento e as políticas públicas nos temas em questão. Antônio Augusto Moura da Silva4...31 Durante quatro dias, profissionais de saúde, pesquisadores e gestores de todo o país, mulheres, profissionais de comunicação e demais interessados discutiram o modelo e a qualidade da assistência obstétrica e 2.4. Nascimento pré-termo e baixo peso ao nascer em Ribeirão Preto Marco Antônio Barbieri...33 neonatal. Além das exposições dos/as convidados/as, todos os participantes contribuíram com reflexões e sugestões no sentido de contribuir para uma melhor 3. Oficina assistência II: Evitabilidade obstétrica em nosso de óbitos País e infantis enfrentar e a perinatais grave situação relativa aos índices alarmantes e crescentes de ceariana. 3.1. Esta Classificação publicação reúne das principais tanto as exposições causas de mortalidade do Seminário neonatal BH Pelo Parto no Normal Brasil quanto as considerações e recomendações - a Carta de BH - elaboradas Elisabeth a partir França...35 das discussões entre os participantes, e pretende con-

tribuir 3.2. ao avanço O quanto necessário a vigilância e urgente dos óbitos rumo infantis à qualificação pode contribuir da atenção na obstétrica melhoria e neonatal, da qualidade redução da da morbi-mortalidade informação e assistência: materna, fetal a experiência do e ao Recife parto autônomo e prazeroso. e infantil no Brasil Paulo Germano de Frias...44 3.3. Resultados do Comitê BH-Vida: Comitê de Prevenção do Óbito Infantil e Fetal de Belo Horizonte Sônia Lansky Isabel Triani...49 Mônica Maia Miriam Rego de Castro Leão 3.4. Rede Norte-Nordeste de Saúde Perinatal Álvaro Jorge Madeiro Leite...51 3.5. Mortalidade infantil em São Luis, Maranhão Antônio Augusto Moura da Silva...53 3.6. Mortalidade infantil e perinatal evitável Alicia Matijasevich...54 4. Oficina III: Experiências de redução da mortalidade materna 4.1. Trajetória dos Comitês de Prevenção da Mortalidade Materna do Paraná Vânia Muniz Nequer Soares...59 4.2. A experiência do Comitê Estadual de Pernambuco no enfrentamento da mortalidade materna Sandra Valongueiro...64 4.3. Morte Materna Experiência do Comitê de Prevenção de Óbitos BH Vida Rosangela Durso Perillo...68 5. Oficina IV: Práticas baseadas em evidências científicas no parto e nascimento: experiências no setor público e privado 5.1. Parto Normal está no meu Plano: Movimento da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em favor do Parto Normal Cláudia Soares Zouain...72 5.2. Experiência do Setor Privado Stella Safar Campos...75 5.3. Maternidade do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina Marcos Leite...77 5.4. A experiência do Hospital Sofia Feldman Ivo de Oliveira Lopes...81 5.5. Práticas baseadas em evidências científicas no parto e nascimento: a experiência da Maternidade Risoleta Tolentino Neves Patrícia Pereira Rodrigues Magalhães...84 5.6. Experiência do Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros Corintio Mariani Neto...87 6. Mesa Redonda: Atenção Obstétrica e Neonatal 6.1. Pacto Nacional de Redução da Morte Materna e Neonatal Regina Viola...89 6.2. Políticas Públicas na Atenção ao Recém-Nascido Elsa Regina Giugliani...95

6.3. Parto Normal está no meu Plano: Movimento da Agência Nacional de Saúde Suplementar em favor do Parto Natural Alexia Luciana Ferreira...100 7. Mesa Redonda: A cessariana desnecessária em questão: evidências científicas e experiências das mulheres 7.1. Riscos da cesariana sem indicação precisa Alicia Matijasevich...106 7.2. Estudo(s) sobre parto cesáreo indesejado André Junqueira Caetano...109 8. Mesa Redonda: Assistência no parto e nascimento: modelo humanístico e as práticas baseadas em evidências científicas 8.1. Cesarianas nas maternidades do Rio de Janeiro Marcos Dias...116 8.2. Experiência das mulheres em rede Ana Cristina Duarte...120 8.3. Direitos reprodutivos e sexuais e integridade corporal no parto Simone Grilo Diniz...123 8.4. Atenção humanizada ao recém-nascido Zeni Carvalho Lamy...130 10. Considerações e Recomendações: Seminário BH pelo parto normal Carta de BH 10.1. Oficina I - Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável?...140 10.2. Oficina II Evitabilidade dos óbitos infantis e fetais...143 10.3. Oficina III Experiência de Redução da Mortalidade Materna...146 10.4. Oficina IV- Práticas Baseadas em evidências científicas no parto e nascimento: experiências no setor público e privado...149 10.5. Oficina V Roda de Conversa - Valorização do parto e nascimento como evento fisiológico: o papel da mídia e a experiência das mulheres...151 11. Mesa redonda Políticas públicas de atenção obstétrica e neonatal A Cesariana desnecessária em questão: evidências científicas e a experiência das mulheres...153 12. Mesa redonda - Assistência no parto e nascimento: modelo humanístico e as práticas baseadas em evidências científicas...155 9. Oficina V: Roda de Conversa: Valorização do parto e nascimento como evento fisiológico o papel da mídia e a experiência das mulheres...138

Abertura do Seminário Abertura do Seminário 19 de agosto de 2008 19 horas Associação Médica de Minas Gerais Mesa de Abertura Secretário Municipal de Saúde de Belo Horizonte Dr. Helvécio Magalhães Presidente da Associação Médica de Minas Gerais Dr. José Carlos Vianna Colares Filho Presidente do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais Dr. Cristiano Gonzaga da Matta Machado Presidente do Conselho Municipal de Saúde Paulo Carvalho Presidente do Conselho da Criança e do Adolescente Lúcia Helena de Santos Junqueira Presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher Isabel Cristina de Lima Coordenadoras do Seminário BH pelo Parto Normal Sônia Lansky e Miriam Rego de Castro Leão 10 11

1. Parto e nascimento no mundo contemporâneo: Conferência de abertura do Seminário BH pelo Parto Normal 1. Parto e nascimento no mundo contemporâneo: Conferência de abertura do Seminário BH pelo Parto Normal Michel Odent 1 Não podemos começar essa Conferência sobre Parto e nascimento no mundo contemporâneo sem nos referirmos aos inúmeros avanços técnicos e científicos que vão, sem dúvida, influenciar e acelerar a história do parto e nascimento. Temos que mencionar como as técnicas de cesárea foram, recentemente, simplificadas. Hoje, devido ao trabalho em especial do professor Michael Stark, de Berlim, é possível fazer uma cesárea em 20 minutos. Quando eu fiz minha primeira cesárea, há meio século, nós precisávamos de uma hora, e isso acelerado. A técnica foi dramaticamente simplificada. Talvez, possivelmente, é mais seguro que já mais foi. A cesárea é simples e rápida, mas é muito difícil avaliar a segurança da cesárea porque precisamos levar em consideração a razão pela qual a cesárea foi feita. Por exemplo, se o critério para avaliar a segurança da cesárea é o óbito materno, você tem que levar em consideração o motivo pelo qual a cesárea foi feita ao invés de avaliar a técnica por si só. No caso de uma apresentação pélvica, a termo, uma nova doutrina em praticamente todos os lugares do mundo é oferecer uma cesárea eletiva programada na 39ª semana de gestação, antes do trabalho de parto. Temos à nossa disposição hoje estudos de grandes séries temporais de cesáreas todas realizadas pela mesma razão: apresentação pélvica a termo. Em um estudo canadense publicado em 2007 que incluía 46 mil cesáreas a termo em apresentação pélvica não houve nenhum óbito materno. Teria sido inacreditável isso, mesmo há 20 anos atrás. Quando falamos de parto e nascimento, hoje, precisamos olhar esse ponto da virada da história da humanidade. Podemos dizer que hoje a cesárea é uma operação fácil, rápida e segura. Temos que aprender a formular questões novas. No mês que vem um livro será publicado, uma coletânea com vários autores, cujo organizador é Michael Sark, o pai da nova técnica fácil, veloz e segura de cesárea. Ele me pediu para escrever os últimos dois capítulos do livro. O objetivo do livro, publicado originalmente em alemão, é discutir, formular novas questões dentro de um novo contexto. No novo contexto em que estamos, se levarmos em consideração somente os critérios 1 Obstetra, Diretor do Primal Health Research Center, Londres 12 13

1. Parto e nascimento no mundo contemporâneo: Conferência de abertura do Seminário BH pelo Parto Normal convencionais de avaliar a prática da obstetrícia morbidade e mortalidade perinatal e a relação custo e benefício seria aceitável oferecer cesárea para todas as mulheres grávidas. A questão do momento é que, ao mesmo tempo em que existem tais avanços técnicos, existem outros avanços científicos oferecidos por disciplinas fora do campo da medicina que sugerem novos critérios para avaliar as práticas da obstetrícia e a arte de partejar. Por exemplo, hoje, devido a um braço da epidemiologia, temos um acúmulo de dados seguros sugerindo que a forma como nós nascemos tem conseqüências duradouras por toda a vida. Na realidade essa é a razão para a base de dados estabelecida no nosso centro de pesquisa em Londres, onde nós coletamos na literatura científica e médica todos os estudos explorando as conseqüências em longo prazo de como começamos nossa vida. Essa perspectiva sugere que precisamos aprender a pensar no longo prazo, pois até agora nós só pensamos no curto prazo. Os resultados nos fazem pensar, por exemplo, que a forma como a mulher deu à luz pode influenciar a qualidade e a duração da amamentação. Também estamos aprendendo como a flora intestinal é importante, e nossa saúde depende da interação entre a flora intestinal e nosso sistema imunológico. A flora intestinal se estabelece imediatamente após o nascimento, mas quais são os primeiros micróbios que o bebê vai encontrar? Já que o recém-nascido tem os mesmos anticorpos IgG da mãe, faz uma grande diferença o bebê encontrar primeiro os germes transmitidos e carregados pela mãe, germes já conhecidos e familiarizados pelo bebê, ou se ele vai ser colonizado imediatamente por germes de fora, não conhecidos pela mãe. Temos que levar em consideração esse critério, já que a nossa saúde depende muito de como nossa flora foi estabelecida desde o começo da nossa vida fora do útero. Como seres humanos, diferentes de outros mamíferos, precisamos incluir outras dimensões para pensar como os bebês nascem, considerando a civilização. Quando você estuda o parto de outros mamíferos, você pensa apenas no nível individual. Seja como for o parto, quando você prejudica o processo de nascimento de um mamífero não-humano, o efeito é que a mãe não cuida do recém-nascido. Por exemplo, no caso das ovelhas, se você interrompe o parto, a mãe simplesmente não vai aceitar o bebê. No ser humano é mais complexo, tudo é diluído pelo meio cultural. Então, no futuro, é possível pensar que todos os bebês pudessem nascer pela via abdominal. Por outro lado, várias disciplinas científicas nos informam que temos boas razões, mudando os critérios de avaliação, para tentar redescobrir as necessidades básicas da mulher em trabalho de parto e do bebê recém-nascido. Eu uso a palavra redescobrir porque é uma tarefa difícil entender essas necessidades depois de milhares de anos de controle cultural do processo de nascimento, com rituais e com a interferência no processo de nascimento em todas as sociedades. Para redescobrir as necessidades básicas da mulher em trabalho de parto e dos bebês recém-nascidos, não temos um modelo cultural para isso. Precisamos perceber o que podemos aprender no presente a partir de uma disciplina básica que é a fisiologia. Podemos aprender muito quando pensamos como cientistas que estudamos a fisiologia. Assim, vou tentar resumir como poderemos explicar, no contexto científico atual, quais as necessidades básicas da mulher em trabalho de parto e dos bebês recém-nascidos a partir de dados fornecidos por fisiólogos e influenciados por minha própria experiência de estar envolvido com parto desde 1953, em maternidades, hospitais e parto domiciliar. Quando falo como fisiologista, também me sinto influenciado pela minha experiência pessoal. Eu sugiro quatro pontos que facilmente explicam e nos ajudam a redescobrir as necessidades básicas da mulher em trabalho de parto e do bebê recém-nascido. O primeiro ponto é lembrar que a ocitocina, principal hormônio do parto, é especial quando nós consideramos as condições de sua liberação. A ocitocina é necessária para a contração uterina e é o principal hormônio do amor. A ocitocina é o hormônio-chave no processo de nascimento, mas a ocitocina é especial quando consideramos a condição para sua liberação, porque depende de fatores ambientais para sua liberação. Uma forma fácil de resumir é dizer que a ocitocina é um hormônio tímido. Se entendermos esse ponto, podemos explicar tudo. Podemos comparar a ocitocina com uma pessoa tímida que não aceita se mostrar para estranhos e observadores, evita se mostrar. Da mesma forma é a ocitocina, um hormônio tímido, e isso é algo que nos esquecemos com relação ao parto? Nós até entendemos o papel do ambiente na liberação da ocitocina em outras situações que não o parto, como na relação sexual, e que você não tem como fazer amor em qualquer ambiente. Em todas as sociedades que conhecemos as pessoas precisam de privacidade para fazer amor, e isso já foi observado por antropólogos mesmo em culturas com sexualidade precoce ou livre. Há uma regra universal na qual casais sempre se isolam para a relação sexual, como se soubessem que a ocitocina é um hormônio tímido. Com relação ao parto, podemos dizer que os mamíferos humanos não conhecem essas regras em termos de explicá-las com palavras, mas 14 15

1. Parto e nascimento no mundo contemporâneo: Conferência de abertura do Seminário BH pelo Parto Normal comportam-se de uma maneira tal que mostra que as pessoas entendem o que é importante: que a ocitocina é um hormônio tímido. Todos os mamíferos têm uma estratégia de não serem observados no momento do parto. E quanto ao parto em seres humanos? Parece que houve uma fase, na história da humanidade, nas culturas pré-alfabetizadas e não literárias, em que as mulheres se separavam do grupo e iam para o mato na hora do parto, comportando-se como outros mamíferos, como se soubessem que a ocitocina é um hormônio tímido. Em sociedades mais sofisticadas, as mulheres se separavam do grupo, mas iam para uma cabana especial ou uma área separada do grupo. Parece, entretanto, que em todas as sociedades em que as mulheres se separavam do grupo para dar à luz, elas não ficavam muito longe de suas mães ou de uma mulher com experiência que as protegiam contra a presença de animais ou de algum homem. Essa, provavelmente, é a origem da parteira. Nós não temos timidez com relação à nossa mãe e o hormônio aceita aparecer na sua presença. É importante perceber que uma parteira é sempre, ou normalmente, uma figura materna. Depois disso tivemos uma socialização cada vez maior do parto. O papel das parteiras mudou e em muitas sociedades ela deixou de ser a mãe protegendo a mulher em trabalho de parto e gradualmente se tornou uma agente do meio cultural, transmitindo crenças e rituais, funcionando como uma guia e dizendo à mulher o que precisava ser feito. Às vezes um guia invasivo, apertando o abdômen ou realizando outras atividades. E em uma outra fase da socialização do parto as mulheres passaram a dar à luz no local onde viviam, ou seja, o parto domiciliar é recente na história da humanidade, e é um novo passo na socialização do parto e na nossa falta de compreensão da ocitocina como um hormônio tímido. Depois chegou o século XX e a história nesse período passa muito rápido. Na maior parte das sociedades, até então, o controle do processo de nascimento se dava via o meio cultural e era feito, principalmente, por crenças e rituais. Em meados do século XX surgiu algo novo: teorias consideradas científicas mas que representaram um passo para amplificar a nossa falta de compreensão da ocitocina como um hormônio tímido e que direta ou indiretamente influenciaram a maior parte das escolas de parto natural, como a teoria de reflexos condicionais e da psico-profilaxia. A idéia na origem dessas teorias é de que a dor no parto não era fisiológica e sim cultural, um reflexo condicionado. Desta forma, as mulheres precisavam ser recondicionadas e ensinadas a como dar à luz, como respirar, como apertar, o que levou à introdução de pessoas adicionais na cena do nascimento. Tais teorias abriram o espaço para a idéia de que, durante o parto, a mulher precisa de um guia, de alguém que lhe diga como respirar ou como fazer força. Em inglês, usa-se inclusive o termo coach, ou seja, um treinador para ajudar no parto. Isso faz parte da nossa história da incompreensão da ocitocina como um hormônio tímido. Até recentemente era compreendido que a ocitocina seria menos tímida no ambiente feminino comparado ao masculino e, embora o parto já venha sendo socializado há milhares de anos, os homens quase sempre estavam excluídos da cena. Mas houve um passo novo na metade do século XX, que foi a masculinização da cena do parto. Além de cada vez mais médicos se especializaram em obstetrícia, subitamente, na década de 1970, havia uma nova doutrina do pai participando do processo de parto. Também foi o momento em que as máquinas eletrônicas e a alta tecnologia foram introduzidas na cena do parto. Ou seja, o ambiente do nascimento se tornou altamente masculino, o que foi um outro passo nesse processo de socialização do parto. Recentemente há ainda uma nova fase: uma epidemia de vídeo. Hoje é fácil fazer um vídeo e no movimento do parto natural ficou comum filmar o nascimento. Quando olhamos esses vídeos é quase sempre a mesma história: você vê uma mulher dando à luz cercada de três ou quatro pessoas, observando, além da câmera. E isso tem sido chamado de parto natural porque a mulher está na banheira, ou está de cócoras ou está de quatro, mas o ambiente é tão não natural quanto possível. Quem olha acha que parto natural significa parto domiciliar ou na banheira, e deixam de perceber o que era importante: a ocitocina é um hormônio tímido. Isto é algo que precisamos redescobrir em todas as fases do parto, mas particularmente na fase logo após o nascimento do bebê. Este é o momento quando a mãe tem a capacidade de liberar os níveis mais altos de ocitocina, mais do que durante o parto, mais do que durante o orgasmo, mais do que em qualquer outra situação. Esse pico de ocitocina é vital e necessário para que haja um pós-parto sem sangramento. Além disso, por ser a ocitocina o hormônio do amor, é importante saber que o maior pico de sua liberação ocorre imediatamente após o nascimento do bebê. Uma vez que a ocitocina é um hormônio tímido, é preciso pensar: o que torna possível esse pico de ocitocina? Hoje esse pico é praticamente impossível de acontecer porque a condição para ele ocorrer é o contato pele-a-pele com o bebê, que a mãe pudesse olhar nos seus olhos, sentir seu cheiro, sem qualquer distração. Mas os cientistas tornaram isso impossível com as crenças e práticas de separar 16 17

1. Parto e nascimento no mundo contemporâneo: Conferência de abertura do Seminário BH pelo Parto Normal o bebê da mãe após o parto. Isso é prejudicial. Da mesma forma, o colostro, que o bebê busca quase imediatamente após o parto, mas que para achá-lo precisa estar nos braços da mãe. O segundo ponto a ser lembrado é bastante simples quando consideramos as ncessidades da mulher em trabalho de parto. Quando nós, os mamíferos, liberamos adrenalina, não conseguimos liberar ocitocina. A adrenalina é o hormônio da emergência, e os mamíferos a liberam em certas situações: quando estão assustados, ou com frio, ou com medo. Ou seja, para o parto a mulher precisa se sentir segura sem se sentir observada; e há o antagonismo adrenalina-ocitocina. Existem vários dados científicos que não estão digeridos ou integrados à prática obstétrica, e esse é um bom exemplo. Há livros sobre parto natural que comparam dar à luz com correr uma maratona, e o conselho para a mulher em trabalho de parto é uma alimentação rica em carbohidratos. Entretanto, esse tipo de recomendação é inaceitável no contexto científico atual, uma vez que o pré-requisito para que o parto ocorra adequadamente é um baixo nível de adrenalina para garantir que os músculos voluntários estejam em repouso, relaxados, ou seja, não necessitem de glicose, é o oposto de correr uma maratona. Esse tipo de recomendação além de ser contraproducente, pode ser até perigoso. Nós aprendemos com os estudos da década de 1980 que glicose e açucares durante o parto é perigoso, soro com glicose na veia é um fator de risco para icterícia e hipoglicemia no recém-nascido, pois o bebê é inundado com glicose, mas a insulina materna não atravessa a placenta. Esse é só um exemplo para mostrar como dados científicos simples, como o antagonismo ocitocina-adrenalina, não são bem divulgados e disseminados. O terceiro ponto necessário para redescobrir as necessidades básicas de mulheres em trabalho de parto é aquele que faz os seres humanos especiais. Os seres humanos têm mais propensão para partos difíceis, em comparação com outros mamíferos e outros primatas. Uma das razões da dificuldade humana no período do trabalho de parto advém do nosso grande neo-córtex, o cérebro novo, o cérebro do intelecto. Nós humanos somos chipanzés com grandes neo-córtex. Mas por que o grande neocórtex é uma deficiência durante o processo de parto? Porque durante o processo de parto, ou de uma experiência sexual, as inibições vêem do neo-córtex. Se olharmos uma mulher em trabalho de parto do ponto de vista do fisiólogo, nós vamos ver que a parte primitiva do cérebro, uma estrutura arcaica chamada hipotálamo, é a mais ativa durante o trabalho de parto. O fluxo de hormônios que a mulher tem que liberar para o trabalho de parto vem dessa parte profunda e primitiva do cérebro. Ao mesmo tempo, vamos conseguir visualizar as inibições vindo do neo-córtex. Mas a natureza achou uma solução para superar essa deficiência: durante o parto o neo-córtex deve parar de funcionar. O nascimento é um processo primitivo e durante esse processo o neo-córtex deve estar desligado. Quando a mulher está em trabalho de parto sozinha, ela se desconecta do nosso mundo e esquece o que está acontecendo à sua volta. Seu comportamento pode, inclusive, ser considerado inaceitável para uma mulher civilizada : ela grita, xinga, é pouco polida, assume diferentes posições. Ela fica em outro planeta. Isso significa que o neo-córtex reduziu sua atividade, o que é essencial na fisiologia do parto. Uma mulher em trabalho de parto precisa, em primeiro lugar, de ser protegida contra qualquer estímulo do neo-córtex. Na prática isso significa que temos que lembrar quais são os estimulantes do neo-córtex para evitá-los. Um desses estimulantes é a linguagem, que é processada no neo-córtex. Se utilizarmos a perspectiva fisiológica vamos reconhecer que é preciso cautela para usar a linguagem durante o trabalho de parto e vamos redescobrir o silêncio. Vamos demorar muito a aceitar o silêncio na sala de parto depois de séculos de socialização. Recentemente, assistindo a um desses vídeos de parto natural, assim chamado porque era domiciliar e a mulher estava de quatro, pudemos observar que a parteira não parava de falar. Precisamos redescobrir que a linguagem estimula o neo-córtex e interfere na liberação da ocitocina e a importância da privacidade. O neo-córtex também é estimulado pela luz, é muito sensível ao estímulo visual em geral. É interessante observar como uma mulher em trabalho de parto que não é guiada, não é observada e não é orientada por nenhum plano pré-concebido, geralmente encontra, por conta própria, uma posição tal, na qual ela elimina os estímulos visuais. Ela se acocora, se inclina para frente, deixa os cabelos caírem sobre o rosto e assim não enxerga nada e pode esquecer o resto do mundo. O quarto ponto para podermos redescobrir e atender as necessidades da mulher em trabalho de parto e do bebê recém-nascido é seguir uma regra simples: aprender a eliminar, no período perinatal, tudo que é especificamente humano. O que isso significa? Que devemos eliminar todas as crenças e rituais que interferem com o processo de nascimento, como alguns que eu mencionei. Nós constantemente reproduzimos tais rituais. Por exemplo, em algumas sociedades a mãe não está autorizada a pegar o bebê se não tiver recebido a permissão para tal de outra pessoa. Entre os Arapesch, da Nova Guiné, a condição para a mãe ser autorizada a tocar o 18 19

1. Parto e nascimento no mundo contemporâneo: Conferência de abertura do Seminário BH pelo Parto Normal bebê é que o pai receba a notícia do sexo do bebê e decida se ele vai viver ou não e se a mãe está autorizada a cuidar do bebê, sendo que essa ordem é transmitida da parteira para o pai. Essa situação se reproduz em todas as sociedades. No Brasil podemos mencionar um grupo étnico indígena do Mato Grosso, entre os quais a mães não está autorizada a pegar no bebê enquanto o líder espiritual, o Xamã, não decidir se o bebê deve viver. Entre um grupo étnico da Amazônia a permissão tem que ser dada pelo padrinho, que tem que chegar com a roupa cerimonial, decidir se o bebê vai viver para a mãe poder cuidar dele. Sempre reproduzimos o mesmo ritual. Recentemente eu visitei uma maternidade no Rio de Janeiro e na sala de parto tinha uma janela de vidro. Mas por que a janela? Porque assim que a criança nasce, a atendente corta o cordão umbilical e passa o bebê por essa janela, sendo que do outro lado está o pediatra. A mãe não pode cuidar do seu bebê até que o pediatra permita. É o mesmo ritual. Nós sempre encontramos desculpas para separar a mãe do bebê recém-nascido. No movimento do parto natural, uma nova teoria surgiu há um tempo atrás, uma idéia de que seria possível, imediatamente após o parto, induzir uma ligação entre o pai e o recém-nascido semelhante à ligação entre a mãe e o bebê. Isso é irrealista. A razão pela qual este é um período crítico para a mãe e o bebê está no equilíbrio hormonal especial que nunca mais vai acontecer. E esse período crítico não pode ser o mesmo para o pai. O efeito foi de introduzir outra pessoa que distrai a mãe no momento exato que ela deve liberar um alto pico de ocitocina. É a reprodução do mesmo ritual. Estamos, sempre, introduzindo rituais e crenças com o efeito de separar a mãe do bebê, e temos que redescobrir na ciência que o bebê recém-nascido precisa, em primeiro lugar, da sua mãe, e a mãe precisa do bebê recém-nascido. Vai levar tempo redescobrir esta verdade. Por isso, devemos eliminar o que é especificamente humano, as crenças e os rituais do parto. Eliminar o que é especificamente humano significa que durante o processo do nascimento o neo-córtex deve parar de funcionar. Ao mesmo tempo, temos que redescobrir, atender e satisfazer as necessidades universais que todos os mamíferos em trabalho de parto têm, que é se sentir seguro se existe um predador em volta, a fêmea libera adrenalina para ter energia para lutar ou fugir, e vai adiar o parto até se sentir segura e ter privacidade todos as fêmeas de mamíferos têm estratégias para não se sentirem observadas quando dão a luz. Essas são as regras simples que devemos seguir. No contexto científico atual pode-se dizer que a mulher foi programada para liberar um coquetel de hormônios do amor quando está em trabalho de parto. Mas hoje, a maioria das mulheres tem seus bebês sem depender da liberação desse coquetel de hormônios, muitas por fazerem cesárea e, entre as que dão a luz por parto vaginal, por não poderem facilmente liberar os hormônios em ambientes inapropriados. E como não conseguem liberar facilmente os hormônios naturais, precisam de medicamentos que os substituem: precisam de ocitocina sintética no soro, precisam da analgesia peridural para substituir as endorfinas, precisam de medicamentos para eliminar a placenta. Tudo isso bloqueia a liberação dos hormônios naturais. Estamos em um momento hoje em que o número de mulheres que dão a luz e que eliminam os hormônios naturais do amor está tendendo a zero. Isso é uma situação sem precedentes. Os seres humanos são tão inteligentes e tão espertos, devido ao seu neo-córtex, que conseguiram tornar os hormônios do amor em hormônios inúteis. Precisamos levantar questões sobre isso em termos da nossa civilização, não agora, não para esse bebê ou essa mulher, mas o que vai acontecer daqui a três ou quatro gerações se continuarmos nessa direção? Se fizermos a pergunta dessa forma e percebendo que precisamos redescobrir as necessidades básicas da mulher em trabalho de parto e do bebê recém-nascido e atender às regras básicas e simples, podemos dizer que a prioridade hoje não é humanizar o parto. A prioridade hoje é mamiferizar o parto. 20 21

2. Oficina I: Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? 2. Oficina I: Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? Data e hora: 20 de agosto, das 8h às 12h Coordenação: Fábio Augusto Guerra (Sociedade Mineira de Pediatria) Expositora: Maria do Carmo Leal (Fiocruz) Debatedores externos: Alicia Matijasevich (UFPel) Antônio Augusto Moura da Silva (UFMA) Marco Antônio Barbieri (USP Ribeirão Preto) Participantes do debate: Andréa Chaimowicz; Daphne Rattner (Ministério da Saúde); Ellen; Esther Vilella (Ministério da Saúde); João Batista Lima (Hospital Sofia Feldman); José Orleans da Costa (Hospital Mater Dei); Marcos Dias (Escola Nacional de Saúde Pública - Fiocruz); Maria Albertina S. Rego (Sociedade Mineira de Pediatria e UFMG); Maria Helena (Universidade de São Paulo); Navantino Alves Filho (Academia Mineira de Pediatria); Simone Diniz (Faculdade de Saúde Pública - Universidade de São Paulo); Sônia Lansky (Coordenadora da Comissão Perinatal de Belo Horizonte); Zeni Carvalho Lamy (Universidade Federal do Maranhão). 2.1. Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? Lacunas para a pesquisa e divulgação para a assistência Maria do Carmo Leal 2 O Brasil vive, no momento atual, um grande processo de inclusão social por meio do Sistema Único de Saúde, o que resulta em aumento da cobertura da assistência pré-natal e do parto hospitalar, da cobertura de vacinal e de procedimentos de maior complexidade, como UTI Neonatal. Entretanto, o SUS mantém e reproduz iniqüidades, que devem ser vistas como pano de fundo na abordagem sobre a prematuridade. A prematuridade é o maior determinante da morbidade e da mortalidade do recém-nascido e vem aumentando no mundo contemporâneo. As causas desse aumento não são totalmente conhecidas, mas podem estar relacionadas, também, com o fato das mulheres estarem tendo filhos mais velhas, com as condições da vida urbana, com o padrão de alimentação, com o ideal estético da magreza, entre outros. O principal componente da prematuridade é a prematuridade tardia, onde o recém-nascido tem entre 34 e 36 semanas de gestação. Mas, apesar de compor quase 70% de toda a prematuridade, nada sabemos sobre ela, ao contrário da prematuridade precoce, que tem seus prejuízos mais bem documentados. Estudos recentes apontam para o risco de efeitos adversos em qualquer nível de prematuridade, e as intervenções obstétricas têm sido responsabilizadas por uma parte do crescimento da prematuridade no mundo. Segundo dados americanos, a prematuridade aumentou em 30% entre 1981 e 2004. Os precursores obstétricos da prematuidade nos EUA estão assim distribuídos: 45% resulta de trabalho de parto espontâneo com membranas intactas (mantém-se inalterado ao longo do tempo); 25% resulta de trabalho de parto espontâneo com rutura de membranas (que vem diminuindo com o tempo); e 30% decorrem da decisão médica de intervir e adiantar o parto com o objetivo de diminuir riscos maternos e/ou infantis este é o componente que vem aumentando ao longo do tempo (Goldenberg et al., 2008). Os resultados indicam que um componente importante no aumento da prematuridade está relacionado com a forma como a medicina e o sistema de saúde vem assistindo ao risco obstétrico, ou seja, uma 22 2 Médica, doutora em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz. Pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz, integrante do Comitê editorial da Revista Materno Infantil de Pernambuco, editor associado da Revista Brasileira de Epidemiologia (ABRASCO) e diretora da Editora Fiocruz. 23

2. Oficina I: Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? assistência voltada para as intervenções, tanto por indução do trabalho de parto quanto por cesárea. No Brasil não existem informações nacionais acerca do componente da prematuridade que resulta da intervenção médica e essa é uma questão para a qual urge o desenvolvimento de pesquisas: qual a intensidade da prematuridade, no Brasil, pode ser atribuída à intervenções médicas no trabalho de parto ou mesmo à cesárea eletiva? Segundo os dados do SINASC de 2005, o Brasil teria uma taxa de prematuridade de 6,6% (Andrade, Szwarcwald e Castilho, 2008), o que é baixo. É sabido que o SINASC apresenta problemas na conformação das informações, principalmente sobre peso ao nascer e idade gestacional. Identifica-se que a sub-notificação desses dados é maior nas regiões Norte e Nordeste, e nas cidades pequenas. Os dados também apresentam um importante paradoxo: onde os indicadores de saúde são melhores (maior nº de consultas pré-natal pe.), a prematuridade é maior. Além disso, a forma como os dados são agrupados pelo SINASC não permite um olhar sobre a prematuridade limítrofe, entre 34 e 36 semanas de gestação. Analisando os dados do SINASC do município do Rio de Janeiro cujo SINASC já foi validado em estudo prévio tem-se um aumento de 30% na prematuridade entre 1996 e 2006. Quando se considera o tipo de parto, há diminuição de 2,4% da prematuridade no parto vaginal e aumento de 70,6% na prematuridade em mulheres que realizaram cesárea. Considerando o tipo de parto por estabelecimento de saúde, tem-se que, no SUS, a prematuridade no grupo que fez parto vaginal cai 7,1% e a prematuridade no grupo que fez cesárea aumenta 55,3%. Já nos estabelecimentos privados, a prematuridade no grupo do parto via vaginal aumenta 51% e por cesárea, 98%, apesar de se tratar de um grupo social com melhores condições de saúde. Analisando as características das mães, por estabelecimento de saúde (público e privado) e por tipo de parto, no período entre 1996 e 2006, observa-se que apesar da melhora de alguns indicadores de condição de vida e de acesso aos serviços de saúde na área obstétrica aumento do nível de instrução das mães, queda na taxa de gravidez na adolescência e melhoria do acesso ao pré-natal vem ocorrendo aumento da prematuridade, aumento do baixo peso ao nascer e melhoria do Apgar no 7º minuto de vida do recém-nascido. É provável que estejamos provocando uma epidemia de prematuridade iatrogênica, no município do Rio de Janeiro, principalmente entre as mulheres que são clientes do Sistema de Saúde Suplementar. Outro dado disponível é o das três coortes da cidade de Pelotas/ RS (1982, 1993 e 2004), nas quais se observa diminuição do número de nascidos vivos, aumento de cesáreas e aumento da prematuridade tardia (Barros et al., 2005). Os resultados apontam para uma provável intervenção no padrão de nascimento das crianças. Buscando evidências sobre os prejuízos da prematuridade, Tomashek et al. (2007) estudaram as diferenças entre as taxas de mortalidade infantil entre bebês nascidos a termo (37 a 41 semanas de gestação) e bebês pré-termo tardio (34 a 36 semanas de gestação). Os autores identificaram que a mortalidade é sempre maior entre os pré-termos tardios: a taxa de mortalidade do pré-termo, entre 0 e 6 dias de vida, é o dobro do que no nascido a termo e a taxa de mortalidade entre 28 e 364 dias de vida chega a ser 5 vezes maior no pré-termo do que no nascido a termo. Os estudos atuais estão mostrando que a prematuridade tardia é um fator de risco para a mortalidade infantil, apesar de o senso comum ainda acreditar que ela não seja um problema. Swamy et al. (2008), em estudo sobre a mortalidade a curto e longo prazo entre nascidos vivos das coortes de nascimento de 1967 a 1988, na Noruega, identificaram que o risco de morrer, entre os pré-termos, é sempre maior do que entre os nascidos a termo, risco esse que se mantém maior até a adolescência. O estudo indica que a prematuridade é uma marca que interfere no padrão futuro de saúde e doença do indivíduo. O mesmo estudo observou as características reprodutivas e educacionais das mulheres dessas coortes de nascimento e identificou que o nascimento pré-termo impacta, de maneira negativa, a escolaridade de mulher, que tem um risco maior de ter uma escolaridade menor. A prematuridade também impacta a vida reprodutiva da mulher, que tem menos filhos e maior risco de ter história de morte fetal e infantil na sua prole. Barros e Velez-Gomez (2006), estudando a prevalência de nascimentos prematuros por subgrupos de causas, entre 1985 a 2003, na América Latina (Sistema de Informação Perinatal), identificaram que diminui a prematuridade por causas espontâneas sem complicações maternas e por rutura de membranas, ao passo que aumenta a prematuridade por indução e cesárea eletiva. Desta forma, a cesárea está relacionada com o aumento da prematuridade. No Brasil, são cerca de 3 milhões de nascimentos por ano, 43% por cesárea. No SUS, a taxa de cesárea é de 29%, enquanto na saúde suplementar ela é de 80%. Quanto maior a população inserida no sistema de saúde suplementar, maior será o índice de cesárea. Mas muitos são os fatores 24 25

2. Oficina I: Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? que influenciam as taxas de cesárea, no Brasil: a localização geográfica de residência da mãe, as condições socioeconômicas da clientela, as fontes de financiamento dos serviços de saúde e o modelo vigente de atenção médica. Por outro lado, a explicação do aumento das cesáreas por demanda das mulheres não encontra respaldo nos estudos realizados, tanto nos serviços públicos quanto nos privados. Em estudo recente realizado pela Fiocruz e financiado pela ANS, foram entrevistadas mais de 430 mulheres, após o parto, em duas unidades de saúde do Sistema Suplementar, localizadas na cidade do Rio e na Região Metropolitana do Rio (Leal et al., 2007). As mulheres foram inquiridas sobre o seu desejo quanto ao tipo de parto. Os resultados mostraram que, no início da gestação, 70% das multíparas e 80% das primíparas queriam ter um parto normal. Ao chegarem à maternidade, no momento do parto, apenas 30% delas ainda queriam ter parto normal. Ao saírem da maternidade, apenas 10% tiveram parto normal. Uma parte dos motivos referidos pelas mulheres para a realização da cesárea não coincidiam com o que estava escrito no prontuário (1/3 deles sem anotações) nem com os resultados perinatais observados (ex: desproporção céfalo-pélvica, hipertensão arterial materna, etc.). Resultados semelhantes foram obtidos por Maluf, para a cidade de São Paulo, em sua tese de doutoramento (Maluf, 2008). Hansen et al. (2007), estudando a coorte de Aarhus que contém dados de 34.458 nascimentos sem malformação congênita entre 1998 a 2006, na Dinamarca, avaliaram a morbidade respiratória (taquipnéia respiratória, síndrome de insuficiência respiratória, hipertensão pulmonar persistente), a necessidade de oxigênio por mais de dois dias, a ventilação mecânica e o uso de oxigênio nasal por pressão positiva nos recém-natos de cesáreas eletivas. Os resultados indicaram que os nascidos de cesárea eletiva, quando comparados com os nascidos de parto vaginal, apresentaram risco mais elevado de morbidade respiratória. O risco aumentava à medida que diminuía a idade gestacional: com 37 semanas, o risco era 3,9 vezes maior; com 38 semanas o risco era 3 vezes maior; com 39 semanas, o risco era 1,9 vezes maior. O mesmo padrão foi encontrado para morbidade respiratória grave, sendo que o risco foi 5 vezes maior para os recém-nascidos de 37 semanas de gestação. Os resultados sugerem que o trabalho de parto tem uma função na maturação pulmonar da criança. Ou seja, o bebê que não passa pelo trabalho de parto não termina o seu amadurecimento pulmonar e, mesmo que nasça a termo, apresenta chance maior de ter problemas respiratórios. Estudo de Kennare et al. (2007) com coorte retrospectiva de nascimentos únicos de secundíparas, entre 1998 a 2003, na Austrália, comparou as conseqüências de um segundo parto normal em mulheres com cesárea prévia e em mulheres com parto vaginal prévio. Os resultados mostraram que as mulheres que fizeram um parto normal após uma cesárea prévia apresentaram risco mais elevado de: mal-apresentação (1,8); placenta prévia (1,7); hemorragia anteparto (1,2); trabalho de parto prolongado (5,9); cesárea de emergência (9,4); ruptura uterina (84,4); óbito materno (7,6); baixo peso ao nascer (1,3); nascimento morto inexplicável (2,3). Ou seja, a cesárea prévia resulta em prejuízo posterior para a história reprodutiva da mulher. Por fim, estudo transversal acerca da admissão de recém-nascidos a termo em UTI Neonatais de nascidos únicos de mulheres de baixo risco gestacional, entre 1999 a 2002, na Austrália (Tracy et al., 2007), identificou que a taxa de admissão em UTI foi de 8,9% para primíparas e de 6,3% para multíparas. Para as mulheres que fizeram uma cesárea eletiva, sem entrar em trabalho de parto, as taxas de internação do bebê na UTI foram de 15,4% para 37 semanas de gestação, 12,1% para 38 semanas de gestação e 5,1% para 39 semanas de gestação. Não houve diferença importante para a idade gestacional de 40 semanas e mais. Nos Estados Unidos se determinou que a cesárea eletiva só deve ser realizada após 39 semanas de gestação. Para conhecer melhor a situação brasileira é preciso: documentar as evidências dos prejuízos da prematuridade para os recém-nascidos e para as mulheres; realizar, urgentemente, investigações de abrangência nacional, em parceria com a Agência Nacional de Saúde e o Ministério da Saúde; e estabelecer estratégias para redução das cesáreas eletivas, em parceria com as sociedades médicas. 26 27

2. Oficina I: Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? Referências bibliográficas Andrade CLT, Szwarcwald CL, Castilho EA. Baixo peso ao nascer no Brasil de acordo com as informações sobre nascidos vivos do Ministério da Saúde, 2005. Cadernos de Saúde Pública, 2008 (no prelo). Barros FC, Velez-Gomez MP. Temporal trends of preterm birth subtypes and neonatal outcomes. Obstet Gynecol. 107(5): 1035-1041, 2006. Barros FC, Victora CG, Barros AJ, Santos IS, Albernaz EP, Matijasevich A, et al.. The challenge of reducing neonatal mortality in middle-income countries: findings from three Brazilian birth cohorts in 1982, 1993, and 2004. Lancet 365(9462): 847-854, 2005. Goldenberg RL, Culhane JF, Iams JD, Romero R. Epidemiology and causes of preterm birth. Lancet 5(371): 75-84, 2008. Hansen AK, Wisborg K, Uldbjerg N, Henriksen TB. Risk of respiratory morbidity in term infants delivered by elective caesarean section: cohort study. BMJ 336(7635): 85-87, 2007. Kennare R, Tucker G, Heard A, Chan A. Risks of adverse outcomes in the next birth after a first cesarean delivery. Obstet Gynecol. 109(2): 270-276, 2007. Leal MC et al.. Avaliação da demanda por cesariana e adequação de sua indicação em unidades de saúde suplementar do Rio de Janeiro. Fundação Oswaldo Cruz: Rio de Janeiro, 2007. Mimeo. Maluf, LE. Por que 90? Uma Análise das Taxas de Cesariana em Serviços Hospitalares Privadas no Município de São Paulo. USP, 2008 PatahSwamy GK, Østbye T, Skjærven R. Association of preterm birth with long-term survival, reproduction, and next-generation preterm birth. JAMA 299(12): 1429-1436, 2008. Tomashek KM, Shapiro-Mendoza CK, Davidoff MJ, Petrini JR. Differences in mortality between late-preterm and term singleton infants in the United States, 1995-2002. J Pediatr. 151(5): 450-456, 2007. Tracy SK, Tracy MB, Sullivan E. Admission of term infants to neonatal intensive care: a population-based study. Birth-issues in perinatal care 34(4): 301-307, 2007. 2.2. Aumento da prematuridade - prematuridade evitável? Alicia Matijasevich 3 Segundo os dados das coortes de Pelotas (tabela 1), pode-se observar que diminui o número de nascimentos na cidade em 19% entre 1982 e 2004. No mesmo período, enquanto o baixo peso ao nascer permaneceu constante, a prematuridade aumentou muito: mais do que dobrou em 22 anos, tanto no parto normal quanto na cesárea. Tabela 1 - Dados dos nascimentos em 3 coortes de Pelotas. 1982, 1993 e 2004. 1982 1993 2004 Número de Nascidos vivos 6.011 5.302 4.287 Proporção de baixo peso ao nascer (< 2.500 g) 9,0 9,0 10,0 Proporção de nascimento pré-termo (< 37 sem.) 6,3 11,4 14,5 Proporção de nascimento pré-termo conforme tipo de parto Pré-termo por parto vaginal 6,3 10,8 14,1 Pré-termo por parto cesárea 6,4 12,7 15,3 Proporção de nascimento pré-termo conforme renda familiar < 1 SM 7,7 13,3 19,8 1,1 3,0 SM 5,9 11,8 13,8 3,1 6,0 SM 5,8 10,1 12,1 6,1 10,0 SM 6,8 10,3 11,1 > 10,0 SM 5,7 9,3 13,5 Proporção de cesárea 27,2 30,5 45,2 Proporção de cesárea conforme renda familiar < 1 SM 16,9 23,4 36,4 1,1 3,0 SM 25,3 25,1 42,3 3,1 6,0 SM 36,2 33,3 55,0 6,1 10,0 SM 41,3 45,1 74,7 > 10,0 SM 46,7 55,7 79,1 Proporção de cesárea conforme níveis de risco Alto 26,1 28,2 41,3 Médio 25,9 29,1 44,5 Baixo 33,0 37,2 53,6 Composição dos recém nascidos pré-termo < 33 semanas de idade gestacional 1,1 2,3 3,5 34-36 semanas de idade gestacional 5,2 9,1 11,0 3 Doutora em Medicina pela Universidad de la República Oriental del Uruguay. Professora visitante do Programa de Pós-graduação em Epidemiologia da Universidade Federal de Pelotas. 28 29

2. Oficina I: Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? O nascimento pré-termo variou pouco conforme a renda familiar, em 1982; já em 2004, o nascimento pré-termo é um problema para duas faixas de renda, as mulheres muito pobres e as muito ricas. O mais provável é que a causa da prematuridade nos dois extremos de renda sejam diferentes. Ainda não é possível provar, mas a hipótese é que as infecções sejam as causas mais importantes entre as mulheres pobres e as cesáreas eletivas sejam o mais importante entre as mulheres ricas. As taxas de cesárea dobraram em 22 anos, em todas as faixas de renda, em Pelotas. Mas o interessante é que as cesarianas não se relacionam com os níveis de risco da mãe: as cesarianas têm sido mais freqüentes em mulheres de risco baixo. Por fim, a prematuridade que mais cresce, em Pelotas, é a prematuridade tardia. Entre as ações que podem prevenir a prematuridade está o tratamento das doenças de transmissão sexual, da infecção urinária e dos corrimentos. Além disso, para prevenir os pré-termos tardios (late preterm births), ou seja, para evitar o nascimento de crianças saudáveis com menos de 40-41 semanas de idade gestacional, deve-se evitar as cesarianas programadas, principalmente aquelas baseadas em datação pelo ultrassom, já que o ultra-som superestima a idade gestacional, ainda mais quando feito depois da 20ª semana de idade gestacional. Nosso último trabalho (Santos et al., 2008), comparando prematuros limítrofes com recém-nascidos a termo, observamos que os prematuros limítrofes apresentam 5 vezes mais risco de morte neonatal, 2 vezes mais risco de morte infantil, quase 3 vezes mais risco de ter um Apgar ao cinco minutos menor do que 7 e 3 vezes mais risco de receber outro leite que não o leite materno nas primeiras 24 horas de vida. Referências bibliográficas Santos IS, Matijasevich A, Silveira MF, Sclowitz IKT, Barros AJ, Victora CG et al.. Associated factors and consequences of late preterm births: results from the 2004 Pelotas birth cohort. Paediatr Perinat Epidemiol. 22(4): 350-359, 2008. 2.3. Nascimento pré-termo: melhoria de acesso à tecnologia ou iatrogenia evitável? Antônio Augusto Moura da Silva 4 Apesar do aumento na taxa de nascimento pré-termo estar ocorrendo em vários países do mundo, no Brasil a elevação parece ter se dado de forma mais rápida. Este aumento parece estar relacionado tanto com a melhoria de acesso à tecnologia quanto à iatrogenia evitável. Comparando-se indicadores perinatais de duas cidades brasileiras (Ribeirão Preto/SP e São Luis/MA), na década de 1990, observou-se o paradoxo de que em Ribeirão Preto, uma cidade mais rica, o baixo peso foi maior (10,7%) do que em São Luis (7,6%), uma cidade mais pobre, contrariando as expectativas de que o baixo peso deveria ser mais prevalente em localidades mais pobres. Por outro lado, a taxa de nascimento pré-termo foi igual nas duas cidades. Entretanto, usando-se o método de Wilcox para estimativa de pré-termos pequenos, confirmou-se que a taxa de pré-termos pequenos foi maior em Ribeirão Preto e menor em São Luis. Dada a forma como o SINASC disponibiliza a informação sobre idade gestacional (em intervalos e não em semanas completas), o peso ao nascer é melhor indicador para se avaliar, indiretamente, a taxa de nascimentos pré-termos. Utilizando-se dados do SINASC de 1996 e 2004, para as capitais brasileiras considerando-se que sejam dados de melhor qualidade a taxa de baixo peso ao nascer aumentou de 8,5% para 9,2%. Observou-se que ao mesmo tempo em que a taxa de baixo peso ao nascer foi maior nas capitais dos estados mais desenvolvidos, o acréscimo de pré-termos pequenos foi maior no Nordeste do que no Sudeste. Ou seja, o aumento do nascimento pré-termo também está relacionado com a intervenção médica que visa a salvar a vida de mães e bebês, principalmente daqueles que iam morrer intra-útero. A melhor assistência perinatal nas cidades mais ricas parece estar se refletindo no aumento de bebês de baixo peso, que sem a assistência adequada seriam natimortos. Nesse sentido, as duas hipóteses para o aumento da taxa de nascimento pré-termo maior intervenção médica (cesárea e indução do parto) e prematuridade iatrogênica por cesárea eletiva devem ser consideradas como explicativas. Estudando-se os fatores de risco para cesárea, em São Luis, entre 30 4 Doutor em Medicina Preventiva pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Professor da Universidade Federal do Maranhão. Revisor dos periódicos Revista de Saúde Pública, BMC Public Health, Paediatric and Perinatal Epidemiology e Cadernos de Saúde Pública. 31

2. Oficina I: Aumento da prematuridade no país: melhoria de acesso à tecnologia ou prematuridade evitável? 1997 e 1998, verificou-se que ter sido atendida pelo mesmo médico no pré-natal e no parto aumentou em nove vezes a chance da mulher ser submetida à cesárea. Ser atendida em hospital privado veio em segundo lugar, aumentando em cinco vezes a chance de cesárea. Em terceiro lugar, a hora do nascimento também foi um fator de risco para a cesárea, indicando a prática de se agendar a cesárea, de acordo com a conveniência. Outro dado importante é a desnutrição intra-uterina entre pré-termos e a termos. A taxa de desnutrição intra-uterina foi maior nos nascidos a termo em São Luis do que nos de Ribeirão Preto, conforme se esperava. Por outro lado, a desnutrição intra-uterina dentre os pré-termos de Ribeirão Preto foi mais do que o dobro do que entre os pré-termos de São Luis. Tal dado pode indicar que nas cidades mais desenvolvidas, a detecção e o diagnóstico das condições de desnutrição intra-uterina são melhores. Considerando-se uma série histórica do SINASC em São Luis, de 1994 a 2003 houve aumento do baixo peso ao nascer de 8,3% para 10% e a curva da distribuição do peso ao nascer foi deslocada para a esquerda. No mesmo período, aumentou a proporção de crianças que nasceram em maternidades que dispõem de UTI Neonatal, de 15% para quase 60%. Também houve aumento da taxa de baixo peso ao nascer, diminuição da mortalidade infantil (de 50 para 20 por 1.000 nascidos vivos) e da natimortalidade. Possivelmente, parte das crianças que morreriam no útero está deixando de morrer porque intervenções salvadoras estão sendo feitas. Nos estados brasileiros, em 2005, observou-se que onde havia mais leitos de UTI Neonatal maior foi a taxa de baixo peso ao nascer. Em uma correlação não linear, mas significante, maiores taxas de baixo peso foram observadas em locais com maior razão entre leitos de UTI neonatal por mil nascidos vivos, maior taxa de nascimento pré-termo e menores taxas de natimortalidade e mortalidade neonatal. Este é o fenômeno que parece que estamos vivendo hoje. 2.4. Nascimento pré-termo e baixo peso ao nascer em Ribeirão Preto Marco Antônio Barbieri 5 Apesar da cesárea eletiva estar relacionada com o aumento da prematuridade; isto também tem ocorrido no parto normal, indicando um componente diferente da prematuridade iatrogênica associada com cesárea eletiva. Com relação à epidemiologia do baixo peso ao nascer, é esperado que o baixo peso ao nascer seja um indicador de desenvolvimento social, associado com a mortalidade infantil e com tendência a diminuir com o desenvolvimento. Entretanto, o que se observa é que o baixo peso ao nascer está aumentando em cidades brasileiras nas quais o padrão de vida está melhorando, é mais alto nas cidades ricas e onde a mortalidade infantil é mais baixa. Está criado o paradoxo?! Em Ribeirão Preto, entre 1978/1979 e 1994, o baixo peso ao nascer (retirados os gemelares) passou de 7,2 para 10,6% e a prematuridade dobrou, de 7,6 para 13,6%, indicando uma mudança na cultura de intervenção tecnológica no período perinatal. Os principais determinantes do baixo peso ao nascer, em 1978/1979 foram: idade materna acima de 35 anos; escolaridade da mãe menor do que 4 anos e fumo na gravidez. Já em 1994, os principais determinantes foram: parto cesárea e fumo na gravidez. A cesárea, que não tinha importância na primeira coorte, foi determinante na segunda. Com os dados oficiais, há grande dificuldade de relacionar o peso com a idade gestacional, ocorrendo grande discrepância entre as duas variáveis registradas pelos serviços (há absurdos como 1.100 gramas e 39 semanas). Quando se confronta o dado do prontuário com a informação da puérpera sobre a data da sua última menstruação, a freqüência maior de idade gestacional fica entre 35 e 36 semanas, mostrando uma discrepância entre o registro e a realidade. Concluindo, em Ribeirão Preto em 2004, a cesárea esteve associada ao baixo peso após o controle das variáveis de confusão. O aumento do baixo peso ao nascer foi no grupo social mais elevado, onde a cesárea foi mais freqüente. O aumento da cesárea foi maior no período gestacional de 35 a 40 semanas e nos bebês de 1.500 a 2.499g (cesárea eletiva?!). Por fim, a cesárea teve impacto não somente no aumento do baixo peso, mas também diminuiu a média e a mediana do peso ao nascer. 5 Doutor em Pediatria pela Universidade de São Paulo. Professor Titular do Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP. 32 33

3. Oficina II: Evitabilidade de óbitos infantis e perinatais 3. Oficina II: Evitabilidade de óbitos infantis e perinatais Data e hora: 20 de agosto, das 14h às 18h Coordenação: Maria da Conceição Juste Werneck (Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais) Expositor: Elisabeth França (Universidade Federal de Minas Gerais) Debatedores externos: Paulo Frias (Instituto Materno Infantil de Pernambuco e Secretaria Municipal de Saúde de Recife) Isabel Triani (Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte) Álvaro Madeiro Jorge (Universidade Federal do Ceará) Antônio Augusto Moura da Silva (Universidade Federal do Maranhão) Alicia Matijasevich (Universidade Federal de Pelotas) Participantes do debate: Daphne Rattner (Área técnica de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde); Esther Vilella (Política Nacional de Humanização do Ministério da Saúde); Fátima Guedes (Secretaria Estadual de Saúde); João Batista Marinho (Hospital Sofia Feldman); Marcos Dias (Instituto Fernandes Filgueiras da Fiocruz); Maria Albertina S. Rêgo (Sociedade Mineira de Pediatria e Universidade Federal de Minas Gerais); Simone Diniz (Universidade de São Paulo); Sônia Lansky (Coordenadora da Comissão Perinatal da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte). 3.1. Classificação das principais causas de mortalidade neonatal no Brasil Elisabeth França 6 A mortalidade neonatal (0-27 dias) adquire cada vez maior importância na mortalidade infantil, sendo que atualmente cerca de 70% dos óbitos infantis são neonatais e 50% são neonatais precoces (0-6 dias). Quando se analisam as causas das mortes neonatais a partir dos capítulos da Classificação Internacional de Doenças (CID), as afecções perinatais representam a principal causa (81% dos óbitos em 2003-2005), seguida pelas anomalias congênitas (14% dos óbitos). Entretanto, o grupo afecções perinatais reúne causas que demandam intervenções bastante diferenciadas, algumas delas com maior potencial de evitabilidade. Por isso, uma abordagem mais detalhada das causas dos óbitos neonatais torna-se necessária, levando em conta o conceito de evitabilidade, com o objetivo de propor intervenções mais específicas e efetivas. O grupo das afecções perinatais encontra-se no Capítulo XVI da CID-10 e contém 58 códigos de 3 caracteres (P00-P96) e 327 códigos de 4 caracteres (P00.0-P96.9). No capítulo, a própria CID-10 lista grupos de 3 caracteres para as afecções perinatais, dentre eles um grupamento (códigos P00-P04), que se refere ao feto e recém-nascido afetados por fatores maternos e por complicações da gravidez, do trabalho de parto e do parto, e um grupamento (P20-P29), que se refere a transtornos respiratórios e cardiovasculares. São grupamentos de causas de óbito que demandam intervenções muito diferentes quando se considera o enfoque da evitabilidade. Analisar as principais causas de mortalidade significa avaliar primeiramente as formas de tabulação a serem utilizadas. A ordenação das principais causas depende da lista usada e a hierarquia de determinada categoria de causas depende de sua freqüência relativa e também de todas as outras categorias definidas. Ou seja, o processo de criação de listas condensadas de tabulação deve ser baseado no objetivo da análise e uma lista deve conter categorias relevantes do ponto de vista da saúde pública e da prevenção (Becker et al., 2005). A 9ª. Revisão da CID recomendou que cada país criasse suas listas, levando em consideração os principais problemas de saúde pública, e no final de década de 1980 foi criada a CID-BR para o Brasil. Pela CID-BR, 34 6 Professora Associada do Programa de Pós-graduação em Saúde Pública do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Pesquisadora do Grupo de Pesquisas em Epidemiologia e Avaliação em Saúde (GPEAS/UFMG). 35

3. Oficina II: Evitabilidade de óbitos infantis e perinatais 40% das mortes neonatais em 2005 são classificadas no grupamento P20- P29 (transtornos respiratórios e cardiovasculares específicos do período perinatal), que é uma categoria muito ampla e pouco específica. Há listas de tabulação de causas de mortalidade infantil e perinatal que incorporam o conceito de evitabilidade. Uma das mais utilizadas no Brasil é a de Wigglesworth, da década de 1980, específica para mortes perinatais (Lansky et al., 2002). Uma limitação para o uso generalizado desta lista, entretanto, é que depende da investigação dos óbitos e não utiliza a CID para a classificação. Outra lista de óbitos evitáveis é da Fundação SEADE (Ortiz, 1996, 2001) e, mais recentemente, a do Ministério da Saúde com uma lista de causas de mortes evitáveis pelo SUS (Malta et al., 2007). Essas listas não são específicas para mortalidade neonatal e classificam as causas em categorias nomeadas segundo a proposta de intervenção. Assim, temos o agrupamento das causas redutíveis por imunoprevenção, o de causas redutíveis por adequado controle da gravidez, o de causas redutíveis por adequada atenção à mulher no parto, e assim por diante. Nesta lógica, a prematuridade, por exemplo, ficou classificada em grupamento diferente da síndrome de angústia respiratória do recém-nascido, quando deveriam estar agrupadas. Buscando superar essas limitações, foi recentemente proposta uma lista reduzida de tabulação das causas de óbitos neonatais no Brasil (França & Lansky, 2009) que não classifica as causas segundo grupos nomeados a partir da intervenção, já que isso tem pouca relação com o significado do problema para os profissionais de saúde, em particular os médicos, responsáveis pelo preenchimento das declarações de óbito (DO). A lista proposta se baseou na lista de Wigglesworth ampliada (Confidencial Enquiry into Maternal and Child Health, 2005), na proposta da Organização Mundial da Saúde (WHO, 2007) e na de Lawn et al. (2006), considerando também a magnitude das causas de óbito neonatal no País e a avaliação por um consenso de especialistas. A lista de Wigglesworth ampliada apresenta sete grupamentos para óbitos neonatais: anomalias congênitas, asfixia, prematuridade, infecção, causa externa, morte súbita e outras causas específicas. Já a lista de Lawn et al (2006) define os seguintes grupamentos: 1) anomalias congênitas; 2) tétano neonatal; 3) prematuridade (menos de 33 semanas de gestação ou menos de 1.800 g para idade gestacioanal desconhecida), ou suas complicações (síndrome da angústia respiratória do recém-nascido, hemorragia intraventricular, enterocolite necrotizante, etc); 4) asfixia ao nascer, baseado no Apgar (excluídos prematuros) ou em história de complicações no parto ou recém-nascido a termo grave nos dois primeiros dias do nascimento; 5) septicemia/pneumonia (septicemia, pneumonia, infecção neonatal, meningite); 6) diarréia (que pode ficar separada ou ser incluída nesse grupo, dependendo da realidade de cada país); e 7) outras causas. A proposta da Lista reduzida visa destacar os grupamentos segundo sua importância na orientação das ações de saúde dirigidas à prevenção da mortalidade neonatal, incluído também o grupamento de causas relacionadas com as afecções respiratórias, que se relacionam com diferentes momentos da assistência à saúde da gestante e da criança. Foram definidos seis grupamentos de causas: prematuridade, infecções, asfixia/hipóxia, malformações congênitas, fatores maternos e relacionados à gravidez, e afecções respiratórias do recém-nascido. Para todas as causas foram utilizados códigos da CID tradicionalmente registrados e códigos relacionados, exceto para as malformações congênitas. A conformação da proposta da Lista reduzida de tabulação das causas de óbitos neonatais e a distribuição dos óbitos no Brasil, em 2005, está apresentada na Tabela 1. Tabela 1 - Causas de mortalidade neonatal segundo a Lista Reduzida de Tabulação de Causas. Brasil, 2005. Grupamentos de causas Códigos da CID-10 Frequência pela Lista e códigos N % 1. Prematuridade 8.274 24,0 P07 Transt rel gest curt dur peso baix nasc NCOP 2.876 8,4 P22.0 Síndrome da angústia respiratória do RN 4.446 13,0 P25 Enfisema intersticial e afecções correlatas 151 0,4 P26 Hemorragia pulmonar 274 0,8 P52 Hemorragia intracraniana não-traumática 195 0,6 P77 Enterocolite necrotizante 312 0,9 2. Infecções 5.858 17,0 P35-P39 Infecções específicas do RN 4.913 14,3 P23 Pneumonia congênita 532 1,6 A00-A09 Doenças infecciosas intestinais 79 - A40-A41 Septicemia 20 - A33 Tétano recém-nascido 4-36 37

3. Oficina II: Evitabilidade de óbitos infantis e perinatais Tabela 1 - Continuação. Grupamentos de causas Códigos da CID-10 Frequência pela Lista e códigos N % A50 Sífilis congênita 60 - B20-B24 Doença pelo vírus da imunodeficiência humana 3 - J12-J18 Pneumonia 190 0,6 G00, G03, G04 Meningite, encefalite mielite e encefalomielite 57-3. Asfixia/Hipóxia 4.923 14,3 P20-P21 Hipóxia intra-uterina e asfixia ao nascer 2.713 8,0 P01.7 Fet rec-nasc afet apres anor antes trab part 12 - P02.0 Fet rec-nasc afetados p/placenta previa 44 - P02.1 Fet rec-nasc afet outr form descolamento plac e hemor 523 1,5 P02.4 Fet rec-nasc afet prolapso cordão umbilical 68 - P02.5 Fet rec-nasc afet outr compr cordão umbilical 116 - P02.6 Fet rec-nasc afet outr afecc cordão umb NE 29 - P03 Fet rec-nasc afet out compl trab parto e parto 355 1,0 P10-P15 Traumatismo de parto 85 - P24 Sindr de aspiração neonatal (exceto P24.3) 978 2,8 4. Malformações congênitas 5033 14,6 Q00-Q07 MC do sistema nervoso 1015 2,9 Q10-Q18 MC do olho, ouvido, face e pescoço 6 - Q20-Q28 MC do aparelho circulatório 1568 4,6 Q30-Q79 Demais MC especificadas 1331 3,9 Q80-Q89 Outras MC 908 2,6 Q90-Q99 MC não classificadas em outra parte 205 0,6 5. Fatores maternos e relacionados à gravidez 2.703 8,0 P00 RN afetado por afecções maternas 1.002 2,9 P01 RN afetado por complicações maternas da gravidez (exceto P01.7) 1.140 3,3 P02 RN afet compl plac e membranas (exceto P02.0, P02.1, P02.4-P02.6) 370 1,1 P04 RN afet influências nocivas transm plac leit mat 45 - P05 Crescimento fetal retard e desnutric fetal 111 - P96.4 Interrupção de gravidez afet feto rec-nasc 35 - Tabela 1 - Continuação. Grupamentos de causas Códigos da CID-10 Frequência pela Lista e códigos N % 6. Afecções respiratórias RN 2.988 8,7 P28 Outr afecções respirat orig per perinatal 2.536 7,4 P22.1 Taquipnéia transitória RN 14 - P22.8 Outros desconfortos resp. RN 27 - P22.9 Desconforto resp. NE RN 411 1,2 Além dos seis grupamentos de causas definidas de óbito neonatal, foram considerados três outros relativos a causas mal-definidas ou contendo códigos inespecíficos: causas mal-definidas (códigos R00-R99), transtornos cardíacos originados no período perinatal (P29) e afecções originadas no período perinatal não especificadas (P96.9). Reagrupando os dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) de 2005 a partir da lista reduzida proposta acima, as principais causas de óbito neonatal no Brasil foram: prematuridade (24% dos óbitos), infecções (17%), malformações congênitas (14,6%), asfixia/hipóxia (14,3%), afecções respiratórias do recém-nascido (8,7%) e os, fatores maternos e relacionados com a gravidez (7,9%) Os transtornos cardíacos originados no período perinatal representaram 3,7% dos óbitos, as afecções perinatais não-específicas 3% e as causas mal-definidas 1,5%. A Lista reduzida proposta possui algumas limitações. Primeiramente, não foi considerado na sua criação o peso ao nascer, um critério básico para avaliar a evitabilidade do óbito. Além disso, quando se utilizam as causas básicas de óbito registradas, há sempre o problema da validade do diagnóstico médico. Vários estudos mostram que, após a investigação do óbito, as afecções maternas adquirem muito maior importância do que o previamente registrado na DO (Mendonça et al, 1994; Carvalho e Silver, 1995). Por fim, as taxas de mortalidade neonatal por prematuridade e asfixia/hipóxia podem estar subestimadas. Por exemplo, em relação aos dados de mortalidade neonatal de 2005, foram identificados 1.277 óbitos classificados como outras afecções respiratórias do recém-nascido (código P28) e 456 classificados como transtornos cardiovasculares do período perinatal (código P29), nos quais o recém-nascido tinha menos de 32 semanas de idade gestacional e, talvez, o mais adequado seria classificá-los 38 39