Entre mais e melhor escola: A Excelência Académica na Escola Pública Portuguesa [ ]

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Transcrição:

Entre mais e melhor escola: A Excelência Académica na Escola Pública Portuguesa [2013-2015] Leonor Lima Torres José Augusto Palhares CIEd - Universidade do Minho Projeto financiado por Fundos Nacionais através da FCT Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do projeto PTDC/IVC- PEC/4942/2012 do Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho (CIEd), intitulado Entre Mais e Melhor escola: A excelência académica na escola pública portuguesa.

Redefinição da missão da escola pública Mandato meritocrático Mandato democrático Situação de tensão contraditória Excelência, mérito, performance, qualidade Inclusão, igualdade, participação, diferenciação Que impactos? Que prioridades? Melhor escola (escola selectiva) Mais escola (escola para todos)

Processo de construção da excelência Formal Atividades não escolares: Associativismo Música Desporto Dança Explicações Liderança da escola Projeto Educativo Organização da escola Clubes e projetos Periferia Centro Origens sociais Quotidianos juvenis: Lazeres e tempos livres Convívios Viagens Clima pedagógico Qualidade dos professores Informal

Desenho metodológico multifocado ENFOQUE EXTENSIVO E MACRO-ANALÍTICO ENFOQUE INTENSIVO E MESO-ANALÍTICO ENFOQUE COMPREENSIVO Mapeamento das políticas de distinção dos melhores alunos do ensino secundário 4 estudos de caso realizados em escolas do norte e centro do país Trajetórias e processos de construção da excelência

Orientações socioeducativas 2014 Reintrodução dos Exames nacionais (4º e 6º anos) Expansão das academias de música 2008 2006 2000 Regime de administração e gestão Avaliação externa Exames nacionais Avaliação desempenho docente Implementação rituais distinção Provas internacionais Rankings escolares Expansão do mercado das explicações 1990 Criação do quadro de excelência 1974 ESTADO COMUNIDADE MERCADO

Excelência na escola pública portuguesa Mecanismos de distinção Distinção do mérito e da excelência Quadro de excelência Quadro de valor Bolsas de mérito Louvores de mérito Menções de mérito Certificados de mérito Menções de excelência Menções honrosas Títulos de mérito Diplomas de mérito Diplomas de louvor Diplomas de honra Quadro de honra Livro de honra Quadro de mérito Quadro de assiduidade Quadro de comportamentos meritórios Resultados escolares Tipo de distinção Valores e comportamentos Aluno excelente; aluno laureado; aluno modelo; porta-estandarte dos resultados produzidos na instituição escolar em trânsito para o ensino superior Mista Rituais cerimoniais públicos

Comparação entre distinção prevista e distinção praticada

Etapa 1: Aclimatização à cultura escolar (campo avançado) 50,0% Proximidade da cultura de origem dos alunos aos padrões da cultura escolar Presença de um grupo de alunos que contraria a função reprodutora da escola, no duplo sentido ascendente e descendente, configurando situações de contratendência O processo de aclimatização à cultura escolar constitui uma dimensão nuclear na trajetória de escolarização, colocando os alunos em condições de partida desiguais. 45,0% 40,0% 35,0% 30,0% 25,0% 20,0% 15,0% 10,0% 5,0% 0,0% EDL PTE TI Tipl EE OO AEpl Excelentes Não excelentes

Etapa 2: Traçar o trilho e prender as cordas Definição atempada do projeto de vida (escolar e profissional) Exemplo: escolha da escola, da área científica e da própria turma tornam-se amarras firmes na estruturação da vida escolar (e não escolar) do jovemaluno A persecução de um projeto individual bem definido implica escolhas racionais e estrategicamente pensadas ao longo da carreira escolar, com vista à obtenção de elevadas performances e, desta forma, à garantia de um lugar entre os melhores da escola. Razões para a escolha da escola: Espaço social e desempenho académico (3 clusters)

Etapa 3: Resistência e gestão do esforço USO DO TEMPO 3 Clusters Estudo e lazer para além do tempo formal da escola

Etapa 4: A efemeridade do triunfo Opção de acesso ao ensino superior 7% 4% 3% 8% 10% 54% 14% 1ª Opção 2ª Opção 3ª Opção 4ª Opção 5ª Opção 6ª Opção N/Col - N/Conh

Notas finais A avaliação das capacidades predominantemente cognitivas (fundada nos testes estandardizados), ao constituir a principal modalidade de prestação de contas (interna e externa), induz uma conceção monista de excelência - uma conceção de excelência reduzida às dimensões intelectuais, que hierarquiza o valor das distintas competências e que amplia os efeitos do veredicto escolar, seja ele o da consagração do mérito ou de condenação do fracasso escolar (cf. Bourdieu, 1987) O reconhecimento de uma pluralidade de excelências (Bourdieu, 1987) exigiria uma conceção mais avançada de accountability (Afonso, 2010).

Os dados empíricos apontam para uma tendência geral de sacralização do mérito individual, mas evidenciam igualmente o quanto as especificidades das organizações podem (e devem) impulsionar o reconhecimento da pluralidade de formas de sucesso (e de pedagogias) e de novas formas de competição, mais consentâneas com a natureza democrática da escola. Relevância do efeito-escola no desenvolvimento de figurinos organizacionais, na definição de estilos e padrões de liderança e no modo como o programa de socialização institucional (Dubet, 2002) condiciona as representações dos alunos. Os alunos, enquanto atores em processo de socialização, incorporam certos padrões de funcionamento, registados na memória como marcadores simbólicos que passam a modelar os seus comportamentos e expectativas face à escola.

Os alunos parecem interiorizar de forma significativa a cultura de escola, ao ponto de atribuir centralidade aos fatores organizacionais na construção da excelência académica. O protótipo de excelência dominante não deixa de ser parcelar, restrito apenas às esferas cognitivas e às dimensões do mérito individual. E neste sentido, a elitização da escola pública, mesmo que socialmente mais ampliada, induz uma formação (académica) de elites amputada de dimensões sociais, artísticas e culturais. Importaria, portanto, indagar a trajetória de afirmação destas elites académicas no ensino superior e no mundo do trabalho. Até que ponto as elites académicas produzidas na escola pública configuram (e se convertem em) efetivas elites sociais, com afirmação nos vários campos da vida social e profissional?

OBRIGADO PELA VOSSA ATENÇÃO