Estresse Psíquico no Voleibol Infanto-Juvenil: avaliação de situações de treino



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ORIGINAL / ORIGINAL Estresse Psíquico no Voleibol Infanto-Juvenil: avaliação de situações de treino Under-18 Volleyball Teams Psychic Stress: evaluation of training situations FÁBIO LUIZ GOUVÊA* Docente do Instituto de Ciências da Saúde (Unip/SP) e Núcleos de Formação Finasa/Osasco MARLON ROBERTO BEISIEGEL Preparador físico da Associação Atlética Banco do Brasil em Jundiaí e membro do Grupo de Pesquisas em Voleibol (FEF/ Unicamp) DARIO ROCHA DA FONSECA NETO Membro do Grupo de Pesquisas em Voleibol (FEF/ Unicamp) MARCIO MARIO ARTUR DE OLIVEIRA Professor de Voleibol Feminino Clube Fonte São Paulo (Campinas/SP) MARCELO BELÉM SILVEIRA LOPES Docente da Faculdade de Educação Física (Unicamp/SP) * Correspondências: R. Aparecida Catocci Luchini, 43, ap. 22B, Parque da Represa, 13214-584, Jundiaí/SP gouvea.fl@gmail.com RESUMO O objetivo deste estudo foi conhecer se existem diferenças entre gêneros no que se refere às situações de treinamento que provocam mais estresse psíquico. A amostra incluiu 80 jogadoras do sexo feminino e 56 jogadores do sexo masculino (15 a 17 anos de idade) de diferentes times. A análise estatística utilizou média, desvio-padrão e distribuição de freqüências das respostas. A comparação entre os dois grupos foi feita utilizando-se o Teste t de Student (p<0,05) e a correlação entre os rankings classificatórios das respostas com o Coeficiente de Correlação de Postos de Spearman (rs). Não houve diferenças estatisticamente significantes entre os grupos, com os rankings de respostas tendo altíssima correlação (rs=0,96). As situações de treinamento que mais se aproximam das condições de jogo são apontadas como as mais motivantes pelos atletas. As condições de treinamento e preparação insuficientes e a integridade física prejudicada proporcionaram uma percepção de maior carga psíquica nos atletas dos dois grupos. Os dados deste estudo auxiliam a orientar o tipo de conduta que os técnicos, preparadores, dirigentes, pais e familiares podem ter, com o intuito de minimizar os efeitos de situações negativas e estressantes a que são submetidos esses jovens atletas. Palavras-chave ESTRESSE PSICOLÓGICO AVALIAÇÃO SAÚDE DO ADOLES- CENTE. ABSTRACT The objective of this study is to know if there are gender differences in training situations provocative of higher psychic stress. The sample included 80 girls and 56 boys (15-17 years old) from different teams. The statistical analysis used the average, deviation of standards and the frequency of answers. The comparison among groups employed the Student t-test (p<0,05) and the ranking correlation among them, with the Spearman Ranking Correlation (rs). There were no significant statistical differences between groups as the answer s ranking shows a very high correlation (rs=0,96). The training situations closest to the game conditions were considered the highest motivation for the athletes. The bad conditions for training and preparation, and the injuries provided the perception of higher psychic strain in both groups. The data of this research help to guide the behaviour that coaches, managers, parents and family can have to reduce the effects of negative and stressing situations to which athletes are exposed. Keywords PSYCHOLOGICAL STRESS EVALUATION TEEN HEALTH. Saúde em Revista Estresse Psíquico no Voleibol 19

INTRODUÇÃO Em um grupo desportivo, sempre existe a possibilidade de atritos motivados pela convivência diária somadas a pressões de diferentes naturezas típicas do desporto. Aos profissionais envolvidos com esse trabalho, é preciso sensibilidade e amplo conhecimento para manter níveis saudáveis de estresse para o grupo. Certas condições e situações são menos ou mais favoráveis, pois são assim avaliadas conforme as reações de cada indivíduo. Noce 1 afirma que no esporte de alto rendimento pode-se observar que os atletas são submetidos a diversos tipos de pressão (torcida, resultado, cobranças do técnico e dos companheiros) e que o rendimento está relacionado com a capacidade de superação dessas situações. Entre os vários fatores psicológicos que fazem parte do contexto de uma equipe, o estresse é considerado um fator preponderante para o desempenho, 2 mas é preciso considerar também a influência da motivação, da coesão de grupo, da experiência, da autoconfiança, 3 as relações do indivíduo com o grupo e dos membros entre si, das formas de liderança. 4 Devem ser consideradas nesse contexto também a atenção e a concentração, necessárias para dar conta da complexidade dos aspectos táticos dos desportos coletivos. 5 O estresse psíquico no esporte pode ser definido como uma situação vivenciada e percebida de forma subjetiva pelo atleta, que tem um caráter de ameaça em função de sua interação com o ambiente, 6 sendo essa avaliação essencialmente individual. O estresse sempre se manifesta quando há um desequilíbrio substancial entre as demandas físicas e/ou psicológicas e a capacidade de resposta, e normalmente tem fontes situacionais e pessoais. 7 De Rose Jr. et al. 8 acrescentam que o esporte competitivo é um evento potencialmente provocador de stress por exigir do atleta um desempenho próximo ao ideal. Vários autores 1, 2, 3, 8, 9, 10, 11 estudaram atletas de esportes, níveis e faixas etárias diferentes e perceberam que certas condições e situações aparecem como fonte de carga psíquica considerável, especialmente aquelas ligadas à disputa competitiva. Existem ainda estudos 5, 12, 13 que chamam a atenção para o fato de que aspectos indiretamente ligados à competição também produzem um impacto sobre o desempenho esportivo. Entre esses, destacam-se algumas fontes específicas como amigos, dinheiro, família, escola e vida social. Obviamente, essas fontes têm mecanismos de atuação diferentes em atletas jovens e em atletas de alto rendimento. É preciso considerar que as situações cotidianas de treinamento acabam proporcionando determinados resultados na dinâmica de um grupo, já que sofrem influência de diversos fatores como a conduta de liderança do treinador, a estrutura social desse grupo, todas as formas de liderança presentes, o intercâmbio de relações entre os membros do grupo, 4, 9, 14 entre outros. Diante do contexto apresentado, das particularidades da modalidade voleibol e das muitas peculiaridades dos atletas dessa faixa etária (15 a 17 anos), procurou-se saber em que condições e situações a carga psíquica afeta o desempenho nos treinamentos, se existem diferenças significativas entre os gêneros para trazer informações relevantes para os que lidam com os atletas em treinos e competições. METODOLOGIA Tipo de Pesquisa Estudo exploratório enfatizando o estresse psíquico entre jogadores de voleibol da categoria infanto-juvenil (masculino e feminino) diante de condições e situações típicas de treinamento. Amostra Pesquisada Foram incluídos na amostra por critério intencional, 146 atletas integrantes de equi- 20 SAÚDE REV., Piracicaba, 9 (21): 19-26, 2007

pes da categoria infanto-juvenil (15 a 17 anos de idade) de diversas equipes que disputam diferentes campeonatos no Estado de São Paulo. A amostra deste estudo teve um total de 80 jogadores do sexo feminino e 56 jogadores do sexo masculino. Instrumento Para formatação do instrumento de pesquisa, optou-se por utilizar o teste de carga psíquica desenvolvido por Frester, 15 tomando como referência os trabalhos de Brandão 9 e de Noce, 1 com alterações que incluíram algumas situações mais comuns na rotina de treinamentos, obtidas de técnicos que trabalham com as categorias estudadas. Após selecionar algumas delas, os autores recorreram a dados de Weinberg e Gould 7 e de De Rose Jr., Deschamps e Korsakas, 2 que serviram de referencial teórico para classificar essas situações em indicadores comuns, assim denominados: Indicador Questões Meios e métodos de treinamento 1 a 5 Percepção subjetiva de desempenho 6 a 10 Integridade física 11 e 12 Relacionamentos no grupo 13 e 14 Relação com as competições 15 a 18 Infraestrutura de treinamentos 19 e 20 Fatores externos 21 e 22 Pais e família 23 e 24 O instrumento tem duas partes distintas, a primeira, relacionada com a caracterização do perfil da amostra, e a segunda, relacionada com as condições e situações típicas de treino para serem analisadas subjetivamente pelos atletas em relação à influência delas sobre o desempenho. Cada um dos 24 itens deveriam ser analisados de acordo com uma escala de valores de cinco categorias, denominada de Likert-Scale, com a seguinte atribuição de pontos: +2 de forma positiva: muito; +1 de forma positiva: pouco; 0 neutro; -1 de forma negativa: pouco; e -2 de forma negativa: muito. Procedimentos Estatísticos Neste estudo, utilizou-se a estatística descritiva (média e desvio-padrão, além da distribuição de freqüências). A comparação de médias entre os dois grupos de atletas foi feita utilizando-se o Teste t de Student, adotando um nível de significância p < 0,05. Foi estabelecida também a correlação entre os rankings classificatórios das respostas em função dos gêneros, utilizando o Coeficiente de Correlação de Postos de Spearman. RESULTADOS A tabela 1 na página seguinte apresenta os resultados dos atletas da amostra, incluindo a média e o desvio-padrão. A comparação de resultados entre os dois grupos com o Teste t de Student indicou que não existem diferenças estatisticamente significantes entre eles. A figura 1 na página seguinte ilustra claramente essa condição. A ordem das respostas (ranking) dos dois grupos mostra uma altíssima correlação entre os dois grupos, análise feita utilizando o Coeficiente de Correlação de Postos de Spearman (r s =0,96; p<0,05). A tabela 2 na página 23, que segue abaixo, mostra em ordem decrescente as médias de cada um dos grupos. Nota-se que as situações que geram menor carga psíquica são as mesmas para os dois grupos, em ordem e com valores que são ligeiramente diferentes, porém com diferenças estatisticamente não-significantes. Vale destacar que os itens que representam maior carga psíquica (6, 8, 11, 12 e 20) aparecem com valores mais elevados para o grupo masculino em comparação com o grupo feminino; e exatamente o contrário para os itens (3, 4, 9 e 15), que representam menor carga psíquica. Saúde em Revista Estresse Psíquico no Voleibol 21

Tabela 1. Valores de média (M) e desvio-padrão (DP) para cada item, por gênero. Masc Fem M DP M DP 1 Treinamentos físicos 1,16 1,12 1,19 1,07 2 Treinamentos de força 1,23 1,03 1,09 1,02 3 Treinamentos táticos 1,52 0,87 1,78 0,62 4 Treinamentos coletivos 1,64 0,80 1,76 0,61 5 Amistosos de preparação 0,93 1,18 1,38 0,84 6 Quando você não foi bem no último treino -0,79 1,20-0,41 1,23 7 Quando você foi muito bem no último treino 1,20 1,13 1,31 1,12 8 Quando não treina bem em um fundamento -0,66 1,16-0,51 1,25 9 Quando treina um fundamento que você gosta muito de treinar 1,38 1,02 1,76 0,58 10 Quando treina um fundamento que você não gosta muito 0,21 0,85 0,32 0,92 11 Quando você está com resfriado, gripe, renite, asma etc. -0,81 1,27-0,73 1,15 12 Quando você está com dores no joelho, ombro, costas etc. -0,91 1,21-0,90 1,07 13 Quando você leva uma bronca do técnico ou de um colega 0,29 1,02 0,26 1,23 14 Quando um colega fala ou reclama demais -0,27 1,12-0,38 1,07 15 As vitórias anteriores 1,38 0,98 1,58 0,81 16 As derrotas anteriores -0,20 1,18-0,22 1,30 17 Pouco tempo entre um jogo e outro 0,18 1,12 0,22 1,16 18 Muito tempo entre um jogo e outro -0,41 1,29-0,29 1,26 19 Local onde não está acostumado a treinar 0,04 1,19 0,16 1,15 20 Local inadequado para treino -1,27 0,88-0,68 1,13 21 Folga durante a semana 0,11 1,14 0,54 1,19 22 Outros compromissos: escola, amigos etc. 0,05 0,97 0,00 1,08 23 Quando os pais e a família te cobram muito sobre os treinos e jogos 0,26 1,09-0,06 1,19 24 Quando os pais e a família não perguntam sobre os treinos e jogos -0,35 0,88-0,38 1,12 *p<0,05 Figura 1. Valores médios dos itens para cada categoria. 22 SAÚDE REV., Piracicaba, 9 (21): 19-26, 2007

Tabela 2. Ranking de carga psíquica, por gênero. Masculino Feminino (n=56) Média (n=80) Média 4 1,64 3 1,78 3 1,52 9 1,76 9 1,38 4 1,76 15 1,38 15 1,58 2 1,23 5 1,38 7 1,20 7 1,31 1 1,16 1 1,19 5 0,93 2 1,09 13 0,29 21 0,54 23 0,26 10 0,32 10 0,21 13 0,26 17 0,18 17 0,22 21 0,11 19 0,16 22 0,05 22 0,00 19 0,04 23-0,06 16-0,20 16-0,22 14-0,27 18-0,29 24-0,35 14-0,38 18-0,41 24-0,38 8-0,66 6-0,41 6-0,79 8-0,51 11-0,81 20-0,68 12-0,91 11-0,73 20-1,27 12-0,90 p < 0,05 As análises estatísticas realizadas confirmam que as situações de jogo incluídas no instrumento de pesquisa geram cargas psíquicas percebidas de maneira muito semelhante pelos atletas, independentemente do gênero. Gouvêa et al., 16 num estudo sobre carga psíquica em situações de competição, também não encontraram diferenças significativas entre os gêneros dessa mesma faixa etária, inclusive com instrumento, forma de coleta de dados e análise estatística idênticos. Esses mesmos autores salientam que a demanda competitiva dessa categoria é grande e torna o aspecto físico fundamental, embora nem todos os atletas pesquisados tenham mostrado que os treinamentos que envolvem preparação física sejam os seus favoritos ou os mais motivantes. Por outro lado, os treinamentos táticos e coletivos (itens 3 e 4) em que se treina em situações próximas das de jogo e os treinamentos específicos dos fundamentos que são de preferência dos atletas (item 9) foram apontados pelos dois grupos como muito motivantes. Em pesquisas anteriores, Gouvêa et al. 16, 17, 18 apontaram a importância de uma comunicação equilibrada e racional do técnico com os atletas como fator relevante para seu desempenho. Epiphanio e Albertini 19 apresentaram mais detalhes a respeito dessa interação reforçando essa necessidade. O item 13 e seus resultados nessa pesquisa mostra que no cotidiano de treinos uma abordagem mais agressiva para manter a atenção e a motivação em níveis satisfatórios não é prejudicial, pois os atletas não apontaram essa situação como fonte de carga psíquica. Reforçando essas informações, temos um estudo 4 em que jovens atletas apontaram situações nas quais o técnico que não age de maneira correta (não reconhece o esforço, só critica e privilegia determinado jogador) torna-se fonte importante de estresse. Segundo Dugdale, Eklund e Gordon, 10 atletas de alto nível não classificaram as instruções do técnico entre as fontes de estresse mais destacadas. Lopes, Samulski e Noce 4 mostraram que o comportamento instrutivo do treinador é considerado importante pelos atletas, e o item mais destacado indicava que o treinador que procura obter o máximo de rendimento de seus atletas cria um contexto favorável para a equipe. O item 15, referente às vitórias obtidas anteriormente, apresentou considerável destaque pelos atletas dos dois grupos, o que parece natural na medida em que mantém a motivação e a coesão grupal em níveis ótimos para os treinos. Por outro lado, o item 14, referente às derrotas, não parece ser uma fonte tão grande de carga psíquica, pois a Saúde em Revista Estresse Psíquico no Voleibol 23

análise dos desvios-padrão, juntamente com as médias de toda a amostra, indica que há uma heterogeneidade de respostas, ou seja, alguns atletas ficam um pouco desmotivados e outros assimilam a derrota como referencial para treinar e melhorar alguns aspectos de seu desempenho. Nesse ponto, é importante considerar as recomendações de Cratty 20 para que as discussões do grupo sejam voltadas para tarefas relevantes para que elas não se tornem prejudiciais. No estudo de Lopes, Samulski e Noce, 4 foi apontado que um dos comportamentos desejados pelos atletas em relação ao técnico é que este considere também as opiniões do grupo nas estratégias a utilizar em determinadas situações. Portanto, não basta apontar os motivos que levaram a vitórias ou derrotas, mas é importante que os atletas sejam ouvidos de alguma forma para que os treinamentos sejam conduzidos de maneira que a coesão do grupo e a motivação estejam sempre favoráveis ao alcance dos objetivos. As situações 6 e 8 foram apontadas como importante fonte de carga psíquica pelos integrantes da amostra desta pesquisa e estão ligadas diretamente à autoconfiança e à motivação. Embora apareçam com médias significativas, o desvio-padrão desses itens também é grande, revelando uma heterogeneidade nas opiniões e reforçando uma informação de Cratty 20 de que os níveis de autoconfiança são transitórios e variam em determinados momentos. Os itens 11 e 12, referentes à integridade física dos atletas, também receberam destaque de ambos os grupos como importante fonte de carga psíquica, indo de acordo com outros estudos 1, 2, 9, 11, 16, 17, 18 em que os atletas mostraram a percepção de que estar em boas condições físicas é importante. Ao analisar a tabela 1, talvez possa parecer surpresa ver que o item referente aos treinamentos físicos obteve médias relativamente altas e desvios-padrão altos também, o que mostra que embora os atletas não gostem muito desse tipo de treinamento, ao menos têm consciência de sua importância na preparação. Outros estudos 3, 9, 16, 17, 18, 21 detectaram um fenômeno semelhante. Em relação à situação 20, que recebeu bastante destaque de ambos os grupos, outros estudos 9, 16, 17, 18 mostraram que os atletas têm a percepção muito clara de que uma preparação adequada é importante para o desempenho. A motivação para os treinamentos também está diretamente ligada às condições que se apresentam para isso. De acordo com Machado, 22 nos treinos é preciso atenção e concentração polarizadas para intensificar a atividade e alcançar os objetivos predeterminados, sendo também necessário evitar distrações e reações dispersivas, além de excluir processos pouco rentáveis para o alcance desses objetivos. Se não estiverem num local apropriado para treinamento, esses atletas não conseguirão ter esse tipo de comportamento, pois sempre há preocupação em evitar lesões, por exemplo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Inicialmente, fica claro que os atletas têm maior preferência por métodos de treinamento que se aproximem ao máximo das condições e demandas de competição. Embora os treinamentos físicos não sejam os meios que trazem maior motivação, existe uma consciência da importância que representam para a integridade física do atleta. Quando o atleta tem a sua integridade física diminuída, seja por lesões, contusões diversas ou mesmo por moléstias como gripe, rinite e outros, existe a percepção clara de que essa é uma condição que interfere decisivamente no desempenho durante os treinos. Ficou muito evidente que a condução dos trabalhos de preparação são uma preocupação dos atletas, e se houver alguma oportunidade em que o local de treinamento não apresentar as condições ideais, esse acaba sendo mais um fator prejudicial no desempenho desses atletas em treinamento. 24 SAÚDE REV., Piracicaba, 9 (21): 19-26, 2007

As vitórias obtidas durante a competição se mostraram, naturalmente, algo importante para a confiança e coesão do grupo. Porém, no desporto não se vive apenas de vitórias, e as derrotas são algo que deve ser esperado e, mais do que isso, é preciso saber lidar com elas. Existe a possibilidade de utilizar as derrotas como uma forma de motivar os atletas a buscar um aprimoramento cada vez maior de suas qualidades, já que os problemas específicos de ordem técnica e tática costumam ser bem detectados nessas situações. Além disso, nem todos os atletas parecem ter muitas dificuldades em assimilar as derrotas. Nesta pesquisa, não foi dada atenção maior aos conflitos entre componentes da equipe, pois, a princípio, as reações a essas situações são extremamente individuais. Cabe aqui um aprimoramento que permita uma abordagem desse tema com maior profundidade em futuros estudos. Por fim, é importante destacar a importância do técnico no contexto de treinamento e na condução desses trabalhos que, na verdade, visam a um objetivo principal: a obtenção de resultados nos jogos e nas competições. Se o treinamento em si não agrada a todos os atletas, há uma conscientização de que ele é um meio importante para o alcance dos objetivos competitivos e que é importante saber planejar e organizar o andamento desse processo. Não se pretendeu buscar soluções definitivas, mas sim trazer à luz o ponto de vista dos atletas sobre situações cotidianas de quem integra uma equipe de voleibol. Este trabalho trouxe importantes colaborações para orientar o tipo de conduta que os técnicos, preparadores, dirigentes, pais e familiares podem ter para minimizar os efeitos de situações negativas e estressantes a que são submetidos esses jovens atletas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Noce F. Análise do estresse psíquico em atletas de voleibol de alto nível: um estudo comparativo entre gêneros [dissertação]. Belo Horizonte (MG): Escola de Educação Física da Universidade Federal de Minas Gerais; 1999. 2. De Rose Junior D, Deschamps SR, Korsakas P. O jogo como fonte de stress no basquetebol infanto-juvenil. Revista Portuguesa de Ciências do Desporto 2001;1(2):36-44. 3. Pujals C, Vieira LF. Análise dos fatores psicológicos que interferem no comportamento dos atletas de Futebol de Campo. Revista da Educação Física/UEM 2002;13(1):89-97. 4. Lopes M, Samulski DM, Noce F. Análise do perfil ideal do treinador das seleções brasileiras juvenis. Revista Brasileira de Ciência e Movimento 2004;12(4):51-5. 5. De Rose Junior D, Deschamps SR, Korsakas P. Situações causadoras de stress no basquetebol de alto rendimento: fatores extracompetitivos. Revista Brasileira Ciência e Movimento 2001;9(1):25-30. 6. Samulski D. Psicologia nos esportes: teoria e aplicação prática. Belo Horizonte: Imprensa Universitária- UFMG; 1992. 7. Weinberg RS, Gould D. Fundamentos da psicologia do esporte e do exercício. 2. ed. Porto Alegre: Artmed Editora; 2001. 8. De Rose Junior D, Vasconcelos EG, Simões AC, Medalha J. Padrão de comportamento do stress em atletas de alto nível. Revista Paulista de Educação Física 1996;10(2):139-45. 9. Brandão MRF. Equipe nacional de voleibol masculino: um perfil sócio-psicológico à luz da ecologia do desenvolvimento humano [dissertação]. Santa Maria (RS): Universidade Federal de Santa Maria; 1996. 10. Dugdale JR, Eklund RC, Gordon S. Expected and unexpected stressors in major international competition: appraisal, coping and performance. The Sport Psychologist 2002;16(1):21-7. 11. Samulski D, Chagas MH. Análise do stress psíquico na competição em jogadores de futebol de campo das categorias infantil e juvenil (15-18 anos). Revista Brasileira Ciência e Movimento 1992; 6(4):12-8. 12. De Rose Junior D, Vasconcelos EG. Situações de stress específicas do Basquetebol. Revista Paulista de Educação Física 1993;7(2):25-34. Saúde em Revista Estresse Psíquico no Voleibol 25

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