Impactos Potenciais da Interpretação IFRIC 12 na Contabilidade das Concessionárias de Serviços Públicos

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Transcrição:

Impactos Potenciais da Interpretação IFRIC 12 na Contabilidade das Concessionárias de Serviços Públicos Autoria: Cláudia Ferreira da Cruz, Angelino Fernandes Silva, Adriano Rodrigues RESUMO Esse trabalho foi elaborado tendo em vista dois objetivos: apresentar as principais disposições contidas na Interpretação IFRIC 12, destinada a orientar a contabilização de empresas que operam serviços públicos em regime de concessão e discutir os impactos potenciais da adoção da norma em concessionárias que atuam no Brasil. Trata-se de uma pesquisa de finalidade exploratória, com abordagem teórica e qualitativa, baseada em documentos e material bibliográfico. A IFRIC 12 aborda questões relativas ao tratamento contábil dos direitos do operador sobre a infra-estrutura, do reconhecimento e mensuração de transações relativas aos contratos de concessão com ênfase nos seguintes aspectos: mensuração dos valores da concessão, contabilização dos serviços de construção ou melhoria e dos serviços de operação, tratamento dos custos de financiamentos, contabilização subseqüente do tratamento de ativos financeiros, intangíveis e itens cedidos ao operador pelo poder concedente. Considera-se que os potenciais impactos da adoção da IFRIC 12 por empresas concessionárias de serviços públicos que atuam no Brasil serão: alterações na estrutura de composição do Ativo, uma vez que a norma não permite o reconhecimento da infra-estrutura relacionada à concessão no ativo imobilizado das concessionárias, prática que é comum no Brasil e alterações nos critérios de reconhecimento das receitas relacionadas à concessão, uma vez que a norma orienta que direitos relacionados aos contratos de concessão poderão ser contabilizados como ativo de financeiro e ativo intangível, conforme as disposições contratuais referentes à parte que assume o risco pela demanda dos serviços públicos. 1. Introdução O desenvolvimento econômico de qualquer território passa indubitavelmente por investimentos em várias áreas, tanto a social quanto a de infra-estrutura. Atualmente, na maioria dos países, esse processo não é mais assumido de forma isolada pelo poder público, mas conta também com a participação de entidades privadas. Essas contribuem de várias formas para o desenvolvimento econômico de um país, tanto por meio da realização do seu negócio, gerando empregos e riqueza, quanto executando atividades em parceria com o poder público. Um das formas que as empresas têm de atuar em parceria com o poder público é através da prestação de serviços públicos por meio do regime de concessão, em que as empresas atuam em nome do poder público, mas não deixam de gerar empregos, riqueza e dividendos para seus acionistas. Apesar de atuarem em um segmento específico em parceria com o poder público, as empresas concessionárias de serviços públicos são entidades privadas com fins lucrativos, que possuem acionistas que investem recursos nas mesmas e esperam um retorno financeiro do negócio. Ou seja, essas empresas atuam em um mercado competitivo e estão sujeitas a diversas exigências quanto à divulgação de suas práticas contábeis e de seus resultados a diversos stakeholders, entre os quais os acionistas, os órgãos governamentais, os financiadores, os usuários dos serviços e outros. A divulgação de informações contábeis ao mercado passa por um momento histórico e bastante relevante. O processo de convergência internacional das normas contábeis, cujo objetivo principal é permitir a comparabilidade das informações, encontra-se em um estágio bastante avançado. Nessa perspectiva, em novembro de 2006 foi emitida a Interpretação IFRIC 12 pelo International Financial Reporting Interpretations Committee (IFRIC), órgão 1

auxiliar do IASB, que visa fornecer disposições para a contabilização de contratos de concessão de serviços públicos. De acordo com Bradbury (2007), muito tem sido discutido acerca do impacto da adoção das normas propriamente ditas (IAS e IFRS), porém tem-se dispensado menor atenção ao estudo das interpretações, apesar dessas apresentarem igual relevância e ainda melhor detalhamento da aplicação das normas a segmentos e contextos específicos. Como se trata de norma recente ainda não adotada no Brasil, justifica-se um estudo prévio que apresente as principais disposições da IFRIC 12, considerando que o Brasil encontra-se envolvido no processo de convergência e as empresas que atuam sob regime de concessão estarão sujeitas à mesma em um futuro muito próximo. Com as discussões realizadas pretende-se responder às seguintes questões: Quais os principais dispositivos apresentados na Interpretação IFRIC 12? Quais os potenciais impactos da adoção da IFRIC 12 por concessionárias de serviços públicos no Brasil? O objetivo do presente trabalho é apresentar as principais disposições contidas na Interpretação 12 do International Financial Reporting Interpretations Committee (IFRIC), emitida em novembro de 2006, destinada a orientar a contabilização de empresas que operam serviços públicos em regime de concessão, as discussões atuais em torno do tema, ilustrar a contabilização de um contrato de concessão de distribuição de energia elétrica por meio de um caso simulado e discutir os potenciais impactos da adoção da norma em empresas brasileiras. O estudo é de natureza teórica, baseado principalmente em informações de natureza qualitativa documentos (basicamente o texto da norma) e material bibliográfico. Segundo Martins e Theóphilo (2007), a pesquisa bibliográfica como estratégia de investigação científica é necessária à condução de qualquer pesquisa e tem como finalidade oferecer contribuições para a análise e explicação de determinado assunto. A finalidade dessa pesquisa é inicialmente exploratória, haja vista que a literatura sobre o assunto é escassa, pretendendose apresentar uma abordagem mais geral do tema. De acordo com Severino (2007) as pesquisas com finalidades exploratórias buscam apresentar determinado tema ou assunto, delimitando um campo de pesquisas, mapeando as condições e espaços de discussão do tema e ainda possibilitando o futuro levantamento de hipóteses acerca do tema explorado. Como já dito, essa estratégia de pesquisa foi adotada em decorrência do estágio inicial de discussão do assunto abordado, além do fato de tratar-se de uma norma ainda não adotada. Segunda a KPMG (2008), a interpretação IFRIC 12 figura entre os assuntos pendentes de endosso e, portanto, ainda não obrigatórios até mesmo para os países que já adotaram as normas do IASB para elaboração das demonstrações financeiras. 2. A convergência às normas internacionais de Contabilidade A abertura dos mercados e a internacionalização da economia propiciaram a atuação de grandes empresas em vários mercados, os quais possuem suas práticas contábeis estabelecidas. Assim, uma empresa que atua em dois ou mais países tem que elaborar tantos quantos relatórios for o número de países em que atua, visando atender a particularidades de cada um. Na opinião de Plöger (2008), a diversidade de práticas contábeis entre as diversas economias representa um significativo custo extra e uma dificuldade a mais para a indispensável troca de informações. A prática contábil sofre significativa influência dos aspectos culturais, históricos, políticos e econômicos do ambiente em que está inserida. Isso dá origem a muitas diferenças nas práticas contábeis de cada país e, conseqüentemente, dificulta a comparação das informações geradas pela contabilidade. 2

A harmonização de normas internacionais da contabilidade vem sendo objeto de discussões durante anos. Diversos fatores são apontados pelos defensores desse processo de convergência, dentre os quais a necessidade de captação de recursos no mercado externo, a crescente globalização de negócios, a forte expansão do mercado financeiro internacional e a alta competitividade empresarial (SILVA, 2007). Na visão de Carvalho e Leme (2002, p. 63), a dificuldade que a Contabilidade tem em definir uma linguagem única de comunicação em nível mundial acaba sendo um empecilho inicial às empresas que, por vezes, sentem-se desestimuladas a recorrer a outros mercados, quando se deparam com as dificuldades em apresentar suas demonstrações financeiras sob outras normas. Com isso, o processo de internacionalização das normas contábeis, de acordo com o argumento dos autores referenciados, é necessário para favorecer a captação de recursos fora do mercado de origem das empresas. Ainda segundo Mueller (1994 apud Echternacht 2007), a internacionalização da Contabilidade é resultado direto da internacionalização do ambiente político e econômico. Considerando que a configuração do ambiente político e econômico exerce grande influência na prática contábil, esta deve estar atenta às mudanças que ocorrem nesse ambiente, tendo em vista assegurar a utilidade e relevância das informações que fornece. O International Accounting Standards Board (IASB) é um órgão internacional que tem por objetivo promover e apoiar o processo de convergência internacional das normas contábeis, o qual é formado por representantes de diversos países. Com efeito, muitos países já adotam os IFRS com seus próprios padrões, sem modificações ou com pequenas adições e exclusões. Com isso, a convergência das práticas contábeis no âmbito internacional tornou-se uma realidade neste início de século e se insere no contexto da globalização dos mercados e da presença do capital estrangeiro cada vez mais evidente no Brasil (KPMG, 2001). Para Braga e Almeida (2008, p. 6) é importante ressaltar que a Lei nº 11.638/2007 introduziu importantes modificações nas regras contábeis brasileiras, sendo o seu principal objetivo a convergência aos pronunciamentos internacionais de contabilidade, em especial os emitidos pelo IASB - IFRS (International Financial Reporting Standards) e IAS (International Accounting Standards). Além desses, há também a figura das interpretações (IFRIC), que segundo Bradbury (2007) têm por finalidade esclarecer a aplicação da norma em contextos e segmentos específicos. Em geral, as normas emitidas pelo IASB versam sobre diversas questões de contabilização necessárias para que as empresas que as adotam apresentem relatórios passíveis de comparação. No Brasil, o processo de convergência das normas internacionais está sendo conduzido pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O CPC é formado por representantes de entidades ligadas à contabilidade e ao mercado de capitais no Brasil e foi criado com o objetivo principal emitir normas contábeis, com vistas à convergência da contabilidade brasileira aos padrões internacionais. 3. A IFRIC 12 No final do ano de 2006, o International Financial Reporting Interpretations Committee (IFRIC) emitiu a Interpretação 12 (IFRIC 12). Essa interpretação fornece orientações sobre a contabilização de concessões de serviços públicos a operadores privados. Seu escopo engloba os princípios gerais de reconhecimento e mensuração das obrigações e direitos relacionados aos contratos de concessão de serviços. A norma está disposta em cinco seções: Interpretação, Apêndices, Notas informativas, Exemplos ilustrativos e Base para conclusões. 3

A primeira seção traz as disposições propriamente ditas, que incluem referências, antecedentes, alcance, temas, consenso, data efetiva e transição. Nas referências são listadas outras normas no âmbito do IASB que são auxiliares na aplicação do IFRIC 12. Na seção que trata dos antecedentes, argumenta-se em torno da contribuição do setor privado no desenvolvimento da infra-estrutura se serviços públicos em muitos países. Os principais setores em que os governos concedem a empresas privadas a operação de serviços públicos e que podem ser alcançados pela IFRIC 12 são: infra-estrutura rodoviária, ferroviária, aeroportuária, distribuição de água e energia, telecomunicações e outros. A maioria dessas infra-estruturas recebe inicialmente aporte de recursos do setor público e é mantida e ampliada com recursos privados. Os contratos de concessão alcançados pela IFRIC 12 envolvem necessariamente uma entidade privada (operador) que constrói ou executa melhorias em uma determinada infraestrutura para operá-la e mantê-la por um determinado período de tempo, mediante o pagamento de tarifas. As disposições da concessão são estabelecidas em um contrato que, de acordo com a norma, deve dispor sobre padrões de desempenho, mecanismos para ajustes de preços e condições para arbitramento das disputas. As principais características dos serviços concedidos, segundo a IFRIC 12 são: a) a obrigação assumida pelo operador de prestar serviços de natureza pública; b) a parte que concede o contrato de serviços (o concedente) é uma entidade do setor público; c) o operador é responsável por, pelo menos, parte do gerenciamento da infraestrutura e serviços relacionados e não atua meramente como um agente em nome do poder concedente. d) os contratos estabelecem os preços iniciais a serem cobrados pelo operador e regulam as revisões de preço durante o período da concessão de serviço. e) o operador é obrigado a devolver a infra-estrutura ao poder concedente em uma condição especificada no final do período do contrato, por pouca ou quase nenhuma contraprestação, independentemente de qual parte a financiou. A norma destaca também que seu alcance se refere à contabilização dos fatos relacionados a contratos de concessão de serviços públicos por entidades privadas (public-toprivate). E ainda que esse alcance está condicionado à existência de controle por parte do poder concedente a respeito de quais serviços devem ser prestados, a quem e a que preço e também controle relativo ao valor residual da infra-estrutura utilizada no final do período de concessão. O Quadro 1 apresenta um resumo das condições e características para um contrato de concessão de serviços públicos executado por uma empresa privada ser alcançado pelas disposições da Interpretação IFRIC 12, além de fornecer referências a outras normas emitidas pelo IASB que se aplicam a tais contratos. Categoria Tipos típicos de contrato Propriedade do ativo Investimento de capital Arrendatário Arrendamento (ex. o operador arrenda um ativo do concedente) Concedente Contrato de serviço e/ou manutenção (tarefas específicas) Prestador de serviço Melhorar-Operar- Transferir Concedente Construir-Operar- Transferir Operador Proprietário Construir-Ter propriedade - Operar 100% Operador Risco pela demanda Compartilhado Concedente Operador e/ou Concedente Operador Duração típica 8 a 20 anos 1 a 5 anos 25 a 30 anos Indefinido (ou pode ser limitado por uma licença) Interesse residual Concedente Operador IFRS relevante IAS 17 IAS 18 IFRIC 12 IAS 16 Quadro 1: Condições e características de um contrato de concessão para adoção das normas do IASB Fonte: IFRIC Interpretation 12 (Tradução Livre) 4

A norma se aplica tanto à infra-estrutura que o operador constrói ou adquire de terceiros para o objetivo do contrato de concessão, quanto à infra-estrutura existente que o concedente dá acesso ao operador para o objetivo de atender o contrato. As disposições da IFRIC 12 não alcançam infra-estrutura ou outros ativos pertencentes ao operador, mas não relacionados com contratos de concessão e também não orienta a prática contábil do poder concedente. No que tange aos aspectos contábeis propriamente ditos, as principais questões abordadas são: (a) tratamento dos direitos do operador sobre a infra-estrutura; (b) reconhecimento e mensuração dos valores da concessão; (c) serviços de construção ou melhorias; (d) serviços de operação; (e) custos de financiamentos; (f) contabilização subseqüente do tratamento de um ativo financeiro e de um ativo intangível; e (g) itens cedidos ao operador pelo concedente. Das questões contábeis abordadas na IFRIC, sem sombra de dúvida, a mais polêmica trata-se da que versa sobre o tratamento dos direitos do operador sobre a infra-estrutura, tanto que a questão já tem sido alvo de debates e preocupações antes mesmo da sua adoção no Brasil, por meio de pronunciamento técnico do Comitê de Pronunciamentos Contábeis. O tratamento dos direitos do operador sobre a infra-estrutura é apresentado no parágrafo 11 da IFRIC 12, que estabelece explicitamente que, para os contratos de concessão alcançados pela norma, a infra-estrutura relacionada ao contrato não deve ser reconhecida no Ativo Imobilizado do operador (empresa concessionária). Em entrevista concedida à Agência Estado em 20/10/2008, Iara Pasian, sócia da empresa de auditoria Deloitte, após participar do Painel Setorial de Energia Elétrica promovido pelo Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (IBRACON), disse que o modelo do IFRIC 12 não se adapta às particularidades do setor de energia no Brasil. De acordo com as disposições da IFRIC 12, as empresas do setor elétrico que possuem contrato de concessão (distribuição, geração ou transmissão) deixariam de apresentar ativo imobilizado em seus balanços, partindo da interpretação de que a companhia não tem a propriedade do bem, uma vez que ele deverá ser devolvido ao órgão concedente no final do prazo da concessão. Segundo Iara Pasian, no Brasil, entre 70% e 80% do ativo de uma distribuidora de energia elétrica é imobilizado, portanto a adoção da norma por essas empresas certamente causará impactos significativos em seus balanços. Segundo a representante da Deloitte, muitos dos países que já adotaram o IFRS, poucos utilizam o IFRIC 12 em decorrência das especificidades dos contratos de concessão que são comuns em cada país. Um exemplo é a Inglaterra, cujos contratos de concessão não são alcançados pela IFRIC 12, uma vez que os ativos não retornam ao poder concedente no final do prazo de concessão. Em relação ao reconhecimento e mensuração do contrato de concessão, a interpretação IFRIC 12, considerando que em muitos contratos são contemplados serviços de construção, ampliação ou melhoria e posterior operação, estabelece que o operador deverá reconhecer e mensurar as receitas de acordo com o IAS 11(Contratos de Construção) nos casos de serviços de construção e melhoria e conforme o IAS 18 (Receitas) em relação aos serviços que presta (operação). Outra questão abordada na interpretação refere-se à contrapartida dada ou garantida pelo poder concedente ao operador. Em termos gerais, a natureza da contrapartida dada pelo poder concedente ao operador será determinada de acordo com os termos do contrato e, quando existir, por legislação aplicável relevante. Porém, a IFRIC 12 apresenta duas situações que podem determinar o tratamento contábil a ser dado: a contrapartida poderá ser reconhecida como ativo financeiro ou como ativo intangível. 5

O texto da IFRIC 12 orienta que deverá ser reconhecido um ativo financeiro, de acordo com as normas internacionais aplicáveis aos ativos financeiros (IAS 32, IAS 39 e IFRS 7), se o contrato de concessão estabelecer que o operador tem um direito incondicional de receber caixa ou outro ativo financeiro do concedente pelos serviços de construção, expansão ou melhoria, ou ainda quando o contrato garante o direito incondicional do operador relativo a valores especificados ou determináveis ou o déficit, se houver algum, entre os valores recebidos dos usuários do serviço público e os valores especificados ou determináveis. Conforme o entendimento de Pratt (2007), o operador reconhece um ativo financeiro somente quando o seu direito de receber dinheiro não depende do uso da infra-estrutura. Ou seja, a natureza do ativo reconhecido pelo operador vai depender a atribuição do risco pela demanda dos serviços entre o operador e o concedente. Em termos simples, o operador reconhece um ativo financeiro na medida em que o concedente assume o risco pela demanda, e um ativo intangível na medida em que esse risco é assumido por ele, como discutido a seguir. Um ativo intangível deverá ser reconhecido pelo operador (conforme disposições do IAS 38) se o contrato estabelecer que a contrapartida consiste no direito (ou licença) de cobrar dos usuários uma tarifa pelo uso do serviço público prestado. O direito de cobrar dos usuários pelo serviço público não é um direito incondicional de receber caixa, pois os valores são condicionados à demanda do serviço pelos usuários. Embora a norma disponha sobre dois tratamentos possíveis, tanto quando for reconhecido um ativo financeiro ou um ativo intangível, ambos deverão ser reconhecidos a valor justo (fair value). Além disso, nos casos em que o contrato prevê pagamento ao operador por serviços de construção, ampliação ou melhoria em parte por um ativo financeiro e em parte por um ativo intangível, a IFRIC 12 recomenda que haja registros individualizados de cada tipo de ativo recebido. Embora recomende registros e controles individualizados de ativos, passivos e contas de resultado, principalmente receita, a Interpretação IFRIC 12 orienta apenas o reconhecimento e mensuração de transações relacionadas a contratos de concessão de serviços públicos. As orientações acerca da evidenciação dos fatos contábeis relevantes dos contratos de concessão de serviços públicos são dadas pela Interpretação SIC 29 Contratos de Concessão de serviços Evidenciação, emitida em 2001. 4. Discussões em torno das concessões e da adoção da IFRIC 12 Embora as discussões em torno do tratamento contábil de algumas questões específicas dos contratos de concessões tenham ganhado fôlego com a iminência da adoção da Interpretação IFRIC 12, algumas pesquisas e discussões já vêem sendo realizadas em vários países e também no Brasil em torno do assunto. Em decorrência da adoção obrigatória pelos países da Comunidade Européia da IFRIC 12 a partir do exercício financeiro iniciado em 1º de janeiro de 2008, o European Financial Reporting Advisory Group (EFRAG), um órgão criado em 2001 para auxiliar a Comissão Européia na aprovação dos IFRSs, tal como emitidos pelo IASB, fornecendo assessoria sobre a qualidade técnica dos IFRS, promoveu uma discussão pública entre seus membros para analisar a pertinência da adoção da Interpretação IFRIC 12 nos países membros. As conclusões dessa consulta apontam que as disposições da interpretação atendem ao critério da primazia da essência econômica das transações contábeis e também cumpre os critérios de inteligibilidade, relevância, confiabilidade e comparabilidade requeridos das informações financeiras necessárias para a tomada de decisões econômicas e avaliação da eficácia da gestão pelas partes interessadas. 6

A Comissão Européia também promoveu no início de 2008 um levantamento sobre a aplicabilidade, coerência e potenciais impactos na Contabilidade a partir da adoção da IFRIC 12 na visão dos profissionais envolvidos com empresas concessionárias de serviços públicos. Esse levantamento deu-se por meio de um questionário dirigido a esses profissionais com questões que versavam sobre os principais temas contábeis abordadas da norma. Essa iniciativa foi apoiada pelos órgãos representativos da profissão contábil e do mercado financeiro em vários países europeus, por meio da divulgação nos respectivos sites, a exemplo da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, órgão responsável pelo acompanhamento e fiscalização do exercício da profissão contábil em Portugal. Bradbury (2007) defende a relevância do estudo das interpretações, entre elas a IFRIC 12, no processo de adoção das normas do IASB. As chamadas IFRIC s fornecem esclarecimentos para pontos mais controversos das normas aplicados a segmentos e ambientes específicos e relevantes (ZEFF, 2007). No Brasil, as discussões em torno da adoção da Interpretação IFRIC 12 estão sendo feitas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e também pelo IBRACON, por meio de painéis setoriais envolvendo representantes dos principais setores que exercem atividades com base em contratos de concessão de serviços públicos, como energia elétrica, telecomunicações e infra-estrutura rodoviária. Além disso, pesquisas acadêmicas têm sido realizadas em torno do tema de aspectos contábeis relacionados à concessão: Canabarro (2001) investigou se as empresas concessionárias de serviços e obras públicas, detentoras de registro junto à CVM, têm divulgado em seus relatórios contábeis informações sobre questões associados ao risco do negócio e que envolvem práticas contábeis como: hipóteses de rescisão contratual e indenizações, inalienabilidade dos bens que compõem o acervo da concessão e a garantia do equilíbrio econômico das tarifas. Esse autor considerou que as concessionárias de serviços públicos possuem uma série de direitos e obrigações estabelecidos nas cláusulas contratuais e que a evidenciação adequada de tais informações subsidia a tomada de decisão. Ferreira (2005) investigou os critérios utilizados pela Concessionária da Ponte Rio - Niterói S/A para amortização dos investimentos comprometidos com o poder concedente e, também, confrontá-lo com a estrutura conceitual básica da contabilidade. No estudo, o autor verificou que a concessionária amortiza seus investimentos com base na vida útil efetiva dos bens ou no prazo estipulado para exploração da concessão, dos dois o menor e também que a adoção desse procedimento acarreta uma superavaliação da despesa de depreciação nos últimos anos da concessão, sobretudo no último, concluindo que o tema concessões ainda representa um grande desafio para a ciência contábil, devido às peculiaridades do negócio. Também jornais especializados em matéria financeira e econômica deram lugar a discussões relativas à contabilização de concessões: o jornal Gazeta Mercantil de 27/02/2002 exibiu uma reportagem a respeito da minuta de resolução do IBRACON que poderia mudar a forma de contabilização do direito de outorga dado às concessionárias de rodovias, as quais pagam ao Governo um valor definido em contrato pelo direito de exploração das rodovias; também o jornal Valor Econômico publicou uma matéria em 10/03/2003 tratando sobre a falta de definição sobre a polêmica do registro das concessões, destacando que os dois tratamentos então adotados: o que considera a concessão como um aluguel e o que a vê como um ativo da empresa, possuem lógica e base teórica, mas que até o momento não havia uma definição oficial, causando prejuízos à comparabilidade das informações divulgadas. Niyama e Silva (2008, p. 4) também se referem à polêmica em relação ao reconhecimento contábil das concessões. Segundo esses autores, pode-se reconhecer as concessões do Governo para as empresas como um ativo ou ainda pode-se considerar que não 7

há ativo, não havendo necessidade de reconhecimento. Como exemplo, citam o caso da Companhia de Concessões Rodoviárias, que atua no Brasil com concessões de infra-estrutura de rodovias, a qual no exercício de 2001 apresentou um patrimônio líquido negativo de R$198 milhões, reconhecendo um ativo e sua amortização, se não o fizesse, seu patrimônio seria de R$ 265 milhões positivos. Mais recentemente, o jornal Gazeta Mercantil veiculou uma matéria sobre as alterações que sofrerão os balanços das empresas que são concessionárias de serviços públicos (FELTRIN, 2009). De acordo com a matéria, as principais alterações nas demonstrações contábeis, se a norma IFRIC 12 for aplicada conforme o texto original, se darão na forma de reconhecer ativos e receitas das empresas, podendo alcançar também a forma como os contratos de concessão são formatados. A falta de definições oficiais para questões conflituosas causa prejuízos em diversas áreas. Em contabilidade, as conseqüências são inúmeras. Como já exposto anteriormente, a comparabilidade e consistência das informações prestadas por empresas sujeitas a questões contábeis com tratamento conflituoso ou não definido, ficam prejudicadas, o que acaba por comprometer até mesmo os objetivos da ciência contábil, entre os quais fornecer informações úteis, comparáveis, consistentes e oportunas para a tomada de decisões econômicas. 5. Ilustração do reconhecimento e contabilização de um contrato de concessão de distribuição de energia elétrica nos termos da IFRIC 12 (caso simulado) Com base no trabalho de Pratt (2007), a seguir é apresentado um caso para ilustrar o reconhecimento contábil de um contrato de concessão nos termos da Interpretação IFRIC 12. Os detalhes e valores descritos não se referem a nenhuma empresa ou contrato em particular. Um contrato de concessão foi celebrado entre o governo do Estado X e a empresa Y para construir e operar uma área de 120 Km 2 ainda não atendida por linhas de distribuição de energia elétrica. A construção está prevista para durar dois anos, após esse período a empresa operará as linhas por 20 anos. Pela construção das linhas de distribuição, a empresa receberá R$ 3,6 milhões, em quatro parcelas a vencer ao final de cada um dos semestres compreendidos no prazo de construção. No final do contrato, as linhas de distribuição serão transferidas para a responsabilidade do poder concedente. O sistema de distribuição será operado para atender consumidores cativos, ou seja, não haverá nenhuma outra empresa fornecendo energia na área concedida. No entanto, a empresa assume o risco pela demanda manifestada pelos usuários do serviço. O contrato estabelece ainda que as tarifas por KWh de energia consumida serão definidas pelo método do preço-teto, no qual o órgão regulador estabelece um preço limite, abaixo do qual a empresa tem liberdade para agir conforme sua conveniência (FIANI, 2008). O preço-teto será revisado pelo órgão regulador a cada quatro anos e as tarifas serão ajustadas anualmente pela variação do Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M). A taxa de juros semestral praticada no mercado é de 8%. A seguir apresenta-se a aplicação do caso simulado em relação às questões abordadas na Interpretação IFRIC. a) Alcance Em relação ao alcance do contrato de concessão pela interpretação IFRIC 12, a partir das informações disponíveis no caso simulado, verifica-se que o mesmo se enquadra nas disposições da IFRIC 12, uma vez que: (a) o poder concedente tem o controle dos serviços a serem prestados usando a infra-estrutura e dos preços a serem cobrados pelos mesmos; e (b) o poder concedente controla o interesse residual relevante sobre a infra-estrutura (linhas de distribuição de energia elétrica) a ser revertida para o poder concedente no final do contrato. b) Características de um contrato de concessão de serviço público para empresas privadas 8

O contrato de concessão para construção e operação de linhas de distribuição de energia elétrica pela empresa Y possui as principais características desse tipo de contrato, segundo os termos da IFRIC 12, quais sejam: refere-se a um item de infra-estrutura, linhas de distribuição de energia elétrica, a ser construída e operada; há um contrato de concessão que especifica os serviços a serem prestados pelo operador; os serviços a serem prestados incluem serviços de execução inicial (construção de linhas de distribuição de energia elétrica) e posterior operação dos serviços; e no final do contrato, a propriedade das linhas de distribuição será revertida para o concedente sem retribuição adicional. c) Reconhecimento da infra-estrutura Na questão relativa ao reconhecimento da infra-estrutura relacionada à concessão, encontra-se o ponto de maior impacto da IFRIC 12, uma vez que o operador não deverá reconhecer a infra-estrutura em seu Ativo Imobilizado, como atualmente faz a maioria das empresas no Brasil que operam sob o regime de concessão (KPMG,2008). Dessa forma, pode-se considerar que os investimentos feitos pelo operador para operar a infra-estrutura objeto da prestação de serviço definida no contrato de concessão não serão ativados, mas reconhecidos como despesa no resultado do exercício. Essa posição da IFRIC 12 tem base na norma que trata de Ativo Imobilizado (IAS 16), a qual esclarece que é o controle sobre o direito de uso de um ativo que determina o seu reconhecimento no grupo Ativo Imobilizado, o qual está sob a responsabilidade do poder concedente e não do operador, que tem apenas o que a norma determina de direito de acesso para prestar o serviço. No entanto, a norma especifica outros caminhos de reconhecer no ativo os direitos que o operador adquire em decorrência do contrato de concessão. d) Reconhecimento da receita de implantação das linhas Em se tratando de reconhecimento de receita relativa a contratos de concessão, é preciso considerar qual das partes signatárias do contrato assume o risco pela demanda pelos usuários dos serviços previstos no contrato. Isso porque a natureza do ativo a ser reconhecido depende da parte que assumiu esse risco. No caso do reconhecimento de uma receita pela realização de construção, ampliação ou melhorias em infra-estrutura, o contrato definiu um valor exato a que o operador tem direito, portanto, não há risco de demanda para esse. Assim, pelo serviço de construção, a empresa Y reconhecerá um ativo financeiro, de acordo com as disposições do IAS 11 Contratos de Construção e IAS 39 Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração. O reconhecimento dos custos e despesas é feito com referência ao estágio de conclusão da atividade. Como sugere Pratt (2007), o valor justo pode ser estimado pelo método dos fluxos futuros de caixa descontados de R$ 900.000,00 recebíveis ao final de cada semestre, durante os dois anos a uma taxa de desconto de 8% ao semestre. Aplicando nas parcelas recebíveis o método dos fluxos futuros de caixa descontados, se obtém o montante a ser registrado como ativo financeiro de R$ 2.981.000,00. e) Reconhecimento da receita da operação dos serviços, de acordo com as condições especificadas em contrato. A orientação da IFRIC 12 é que as receitas decorrentes da prestação de serviços ou operação da infra-estrutura sejam reconhecidas nos termos do IAS 18 Receitas. No caso apresentado, a remuneração pelo serviço de distribuição de energia elétrica fornecido pela empresa Y está condicionada à demanda manifestada pelos usuários do serviço, portanto é o operador que assume o risco pela demanda. Nessas condições, a IFRIC 12 orienta que se reconheça um ativo intangível, conforme as disposições do IAS 38, uma vez que a natureza desse fato consiste no direito de cobrar tarifas dos usuários pelos serviços prestados. De acordo com o IAS 38, o operador reconhece o ativo intangível ao custo, isto é, o valor justo da contrapartida recebida ou recebível. Corroborando essa interpretação, Feltrin (2009) destaca a 9

relevância das disposições contratuais para definição do tratamento a ser dado às receitas do contrato de concessão. Assim, haverá reconhecimento de ativos financeiros quando o poder concedente definir com a concessionária um valor a ser pago pelo serviço e quando a receita depender das tarifas pagas pelos serviços, haverá contabilização de ativos intangíveis (direito a receber), recuperados em forma de tarifa. A Figura 1 apresenta as alternativas de remuneração dos serviços prestados em regime de concessão, segundo a IFRIC 12. Remuneração dos Serviços Concedidos Valor fixo determinado em contrato Variável de acordo com a demanda Risco pela demanda assumido pelo concedente Risco pela demanda assumido pelo concessionário Figura 1: Remuneração de serviços operados em regime de concessão Fonte: Elaboração própria A Interpretação IFRIC 12 apresenta exemplos ilustrativos de aplicação dos dispositivos nela constantes. Um dos exemplos, que ilustra a situação de reconhecimento de ativo intangível, orienta que durante a fase de construção do contrato de concessão, o ativo do operador (representando o seu direito acumulativo de ser pago por prestar serviços de construção) é classificado como um ativo intangível (licença para cobrar os usuários da infraestrutura ou serviços). O operador pode estimar que o valor justo da contrapartida recebida ou recebível seja igual ao custo de construção previsto mais 5% de margem, além de poder capitalizar também, nos termos do IAS 23 Custos de Empréstimos, os custos de empréstimos obtidos para investimentos para fins de estimativa do ativo intangível a ser reconhecido. O total do ativo intangível reconhecido pode ser amortizado pelo método da linha reta (straight-line), alocado em partes iguais ao total do período em que a infra-estrutura estará disponível para prestação do serviço pelo operador. As receitas decorrentes do uso efetivo dos serviços de distribuição de energia elétrica são auferidas à medida que os usuários utilizam o serviço. Assim, o operador pode reconhecer as receitas das tarifas à medida que as recebe pelo fornecimento de energia elétrica. O Quadro 2 apresenta um sumário da ilustração do caso simulado e sua conformidade às principais disposições da Interpretação IFRIC12. Ponto Relevante Conformidade com a IFRIC 12 Alcance Controle do uso da infra-estrutura, dos preços dos serviços e de interesse residual no final do contrato pelo poder concedente. Características Refere-se a uma infra-estrutura a ser construída e operada; Um contrato de concessão especifica os serviços a serem prestados; Os serviços englobam duas fases distintas: construção e operação; Ao final do contrato, a infra-estrutura é revertida para o poder concedente. Reconhecimento da Infra-estrutura Reconhecimento da receita de Construção Reconhecimento da receita de Operação Não deve ser feito no Ativo Imobilizado do operador. Deve ser feita nos termos do IAS 11 e, por tratar-se de montante definido no contrato, reconhece-se um ativo financeiro a fair value nos termos do IAS 39. Deve ser feita nos termos do IAS 18 e, como o operador assume os riscos pela demanda, deve-se reconhecer um ativo intangível a fair value conforme o IAS 38; Amortização dos valores registrados no Ativo Intangível pelo método da linha reta, durante o período da concessão. Quadro 2: Conformidade da ilustração do caso simulado às disposições da Interpretação IFRIC12. Fonte: Elaboração própria. 6. Impactos potenciais da norma IFRIC 12 na contabilidade de empresas concessionárias de serviços públicos 10

As grandes empresas que atuam no Brasil, nos mais diversos segmentos de atuação vivem um momento de intenso debate em torno da convergência internacional das normas contábeis. Até mesmo para as empresas que já publicam em outros padrões contábeis, como o IFRS ou US-GAAP, muitas mudanças ocorrerão com a revisão de normas já emitidas e emissão de normatização em outras matérias. O segmento de empresas que atuam sob o regime de concessão, por meio da celebração de contratos com órgãos reguladores, é um dos segmentos, cuja normatização recente está na iminência de ser adotada por empresas concessionárias de todo o mundo. Como o Brasil encontra-se no processo de convergência, as empresas que aqui operam também serão alcançadas pela normatização. Segundo Ferreira (1999), impacto pode ser definido como um forte efeito que força uma mudança. A iminente adoção da norma IFRIC 12 por empresas concessionárias que atuam no Brasil tem despertado a preocupação com os impactos que a referida norma acarretará na estrutura dos balanços das concessionárias, pelas fortes mudanças que se acredita serem inevitáveis. No Brasil, as empresas que atuam sob o regime de concessão são reguladas pelos órgãos específicos dos setores em que operam, tais como a Agência Nacional de Energia Elétrica, Agência Nacional de Telecomunicações, Agência Nacional de Transportes Terrestres e outros. Embora esses órgãos reguladores há muito venham emitindo orientações contábeis para as empresas sob sua jurisdição, a partir da adoção das orientações da Interpretação IFRIC 12, a tendência é a definição de um tratamento padrão para transações comuns, dentro das especificidades de cada segmento de atuação. A partir do entendimento das disposições contidas na IFRIC 12, destaca-se que os pontos que mais impactados serão o reconhecimento de ativos e o reconhecimento de receitas, o que é confirmado por Feltrin (2009): caso a IFRIC 12 seja aprovada no Brasil conforme o texto original, os conceitos de reconhecimento de ativos e receita das companhias terão alterações significativas. Como já enfatizado anteriormente, na questão relativa ao reconhecimento da infraestrutura relacionada à concessão, encontra-se o ponto de maior impacto da IFRIC 12, uma vez que o operador não deverá reconhecer a infra-estrutura em seu Ativo Imobilizado, como atualmente faz a maioria das empresas no Brasil que operam sob o regime de concessão (KPMG, 2008). Dessa forma, considera-se que a estrutura de composição do Ativo será sensivelmente alterada quando da adoção da Interpretação IFRIC 12 pelas empresas que atuam como concessionárias de serviços públicos. Setores como telecomunicações, energia elétrica e exploração de rodovias são típicos no regime de concessão no Brasil há alguns anos. Atualmente, a grande maioria das empresas desses setores assinam contratos de concessão que variam, em média, de 20 a 30 anos, os quais contemplam serviços de construção ou ampliação de infra-estrutura e posterior operação da mesma para prestação de serviços públicos. Por investirem na construção e ampliação da infra-estrutura para prestação dos serviços definidos nos contratos de concessão, pela ausência de instrumento impeditivo e também em decorrência de cláusulas permissivas nos contratos de concessão, as concessionárias no Brasil registram os bens da infra-estrutura em seu Ativo Imobilizado. No entanto, como já esclarecido, baseada no IAS 16, a IFRIC 12 propõe um tratamento diferente para esses ativos, por entender que os mesmos não são de propriedade dos operadores, mas a eles é apenas concedido acesso para prestar serviços. A título de ilustração, escolheu-se o segmento de Exploração de rodovias do setor econômico Construção e transporte, de acordo com a classificação setorial definida pela 11

Bovespa (2009), para apresentar o quanto o ativo será impactado pela exclusão das rubricas do ativo imobilizado ligados a concessão. O segmento exploração de rodovias foi escolhido por ser um setor típico que opera via regime de concessão, destacado entre os segmentos de alcance da IFRIC 12, e também por sua importância econômica. O segmento de exploração de rodovias contém 13 empresas listadas na Bovespa, porém uma empresa foi excluída da análise por apresentar o grupo ativo imobilizado zerado e não apresentar balanço consolidado e também por declarar em suas notas explicativas que se trata de uma companhia exclusivamente de participações. As demonstrações das empresas foram obtidas no site da Bovespa por meio do programa Sistema Divulgação Externa ITR/DFP/IAN versão 9.0 (Janeiro/2009), desenvolvido pela CVM e pela Bovespa. Além do balanço patrimonial e da demonstração do resultado do exercício, foram analisadas também as notas explicativas referentes ao ativo imobilizado de cada empresa. Tabela 1: Ativo Total e Ativo Imobilizado de empresas concessionárias de serviços públicos no segmento de exploração de rodovias Nº Empresas Ativo Total (AT) Ativo Imobilizado (AI) AT/AI 1 Concessionária do Sistema Anhangueras-Bandeirantes S.A. 1.234.815 962.929 77,98% 2 Companhia de Concessões Rodoviárias S.A. 4.228.700 2.602.025 61,53% 3 Concessionária Rio - Teresópolis S.A. 77.100 61.294 79,50% 4 Concessionária da Rodovia Osório-Porto Alegre S.A. 366.066 336.318 91,87% 5 Empresa Concessionária de Rodovias do Norte S.A. 268.830 253.531 94,31% 6 Empresa Concessionária de Rodovias do Sul S.A. 42.745 38.352 89,72% 7 Concessionária Ecovias dos Imigrantes S.A. 1.136.395 1.041.837 91,68% 8 Investimentos e Participações em Infra-Estrutura S.A. 212.798 150.925 70,92% 9 Concessionária Rodovia Presidente Dutra S.A. 663.486 576.522 86,89% 10 Obrascon Huarte Lain Brasil S.A. 1.845.761 1.562.171 84,64% 11 Triunfo Participações e Investimentos S.A. 1.513.192 1.149.978 76,00% 12 Concessionária Rodovia do Oeste de S. Paulo S.A. 1.052.962 639.701 60,75% Fonte: Dados da pesquisa, Jan. 2009. Os valores do Ativo Total e Ativo Imobilizado referem-se ao exercício findo em 31/12/2007 e estão expressos em milhares de reais. Tabela 2: Relação Ativo Imobilizado/Ativo Total das empresas do segmento de exploração de rodovias listadas na Bovespa Parâmetro Média Mínimo Máximo Desvio Padrão Valor 80,48% 60,75% 94,31% 0,115 Fonte: Dados da pesquisa, Jan. 2009. Os dados da Tabela 1 e 2 permitem observar que uma parcela significativa dos bens e direitos das empresas selecionadas é composta de bens imobilizados. As 12 concessionárias do segmento de exploração de rodovias analisadas apresentam a média 80,48% de ativos imobilizados entre as contas do Ativo. A Empresa Concessionária de Rodovias do Norte S.A. chega a ter 94,31% do seu ativo total no grupo Imobilizado e a Concessionária Rodovia do Oeste de S. Paulo S.A. é que apresenta menor percentual de ativo imobilizado (60,75%). Considerando que a norma IFRS 1, que trata da primeira adoção das normas do IASB, orienta que entre os procedimentos da adoção inicial estão: baixar as contas de ativos, passivos e patrimônio líquido cujo reconhecimento não é permitido pelo IFRS e reclassificar os itens reconhecidos de acordo com os princípios contábeis anteriores, mas que são classificados de forma distinta segundo o IFRS, os balanços das empresas apresentarão uma significativa redução no montante dos seus ativos totais. 12

As notas explicativas relativas ao Ativo Imobilizado das empresas não explicitam que tais bens são exclusivamente relacionados aos contratos de concessão, mas a nomenclatura e a descrição da natureza dos mesmos revelam que grande parte do ativo imobilizado registrado nos balanços das empresas concessionárias selecionadas está relacionada aos contratos de concessão que possuem. Assim, considera-se que esse grupo de contas é o que mais será impactado com a adoção da norma. As principais observações verificadas nas notas explicativas relativas ao Ativo Imobilizado das concessionárias analisadas abordam que: Com a extinção do período de concessão, os bens, direitos e privilégios vinculados à exploração do sistema rodoviário retornam ao poder concedente; O contrato de concessão prevê para a concessionária um direito à indenização correspondente ao saldo não amortizado ou depreciado dos bens ou investimentos, cuja aquisição ou execução, autorizada pelo poder concedente, tenha ocorrido nos últimos cinco anos do prazo da concessão; Os serviços ou obras de melhorias mais relevantes são ativados e os gastos pequenos com manutenção e reparos são debitados no resultado, quando incorridos. Os custos com projetos de expansão, construção e melhorias, enquanto não finalizados, são contabilizados como obras em andamento; Adoção da prática contábil de não ativar o direito de outorga, tratando-o como uma espécie de arrendamento operacional (aluguel), não reconhecendo passivo relativo a obrigações futuras de pagamentos de direito de outorga ao poder concedente; Adoção da alternativa contábil de ativar o direito de concessão e os bens recebidos na concessão, na rubrica de Direito de outorga da concessão, no ativo imobilizado. Os encargos financeiros relacionados a empréstimos e financiamentos, destinados à construção de bens do imobilizado, são apropriados aos custos das obras e são amortizados proporcionalmente à realização desses bens; Ajuste ao valor de mercado por reavaliação de ativos, suportada por laudo técnico elaborado por empresa especializada. As observações verificadas nas notas explicativas revelam que os contratos de concessão de exploração de rodovias das empresas analisadas são alcançados pelos dispositivos da IFRIC 12 e ainda revelam a adoção de práticas não permitidas pela interpretação e pelas demais normas do IASB. Isso conduz à constatação de os balanços de tais empresas quando da adoção integral das normas IFRS e suas interpretações sofrerão significativas mudanças, notadamente nas contas do ativo imobilizado. Outro ponto a ser potencialmente impactado pela adoção da IFRIC 12 por concessionárias de serviços públicos é o reconhecimento de receitas. No Brasil, o registro de receitas relativas à concessão se dá pelo lançamento do montante das tarifas recebidas. A partir das disposições da IFRIC 12, os termos do contrato de concessão adquirem relevância na definição do tratamento a ser dado às receitas do contrato de concessão. Assim, de acordo com a interpretação, haverá reconhecimento de ativos financeiros quando o poder concedente definir com a concessionária um valor a ser pago pelo serviço e quando a receita depender das tarifas pagas pelos serviços, haverá contabilização de ativos intangíveis (direito a receber), recuperados em forma de tarifa. Segundo a IFRIC 12, os termos do contrato de concessão darão as diretrizes para o reconhecimento de outros ativos (financeiro e/ou intangível), de acordo com as partes signatárias do contrato de concessão que assumem o risco pela demanda dos serviços previstos no contrato. Dessa forma, é a análise das disposições contratuais que permitirá definir se é um ativo financeiro ou um ativo intangível que será reconhecido e evidenciado no 13

balanço. As metodologias de mensuração de tais ativos não são determinadas na interpretação, mas apenas ilustradas nos exemplos anexos à norma. No entanto, independente da metodologia adotada para o reconhecimento e mensuração dos ativos financeiros e intangíveis relacionados aos contratos de concessão, certamente esses grupos de contas adquirirão maior relevância e representatividade no conjunto das contas que compõem o Ativo nos balanços das empresas concessionárias de serviços públicos que atuam no Brasil e serão alcançadas pela Interpretação IFRIC 12. 7. Considerações finais O objetivo dessa pesquisa é apresentar as principais disposições contidas na Interpretação IFRIC 12, destinada a orientar a contabilização de empresas que operam serviços públicos em regime de concessão, e discutir os impactos potenciais da adoção da norma em concessionárias de serviços públicos que atuam no Brasil. A norma IFRIC 12, por tratar-se de uma interpretação, estabelece suas disposições com base em outras normas de aplicação geral para aplicação específica em contratos de concessão de serviços públicos que envolvem uma entidade privada (operador) que constrói ou executa melhorias em uma determinada infra-estrutura para operá-la e mantê-la por um determinado período de tempo, mediante uma contraprestação e também existe controle por parte do poder concedente a respeito de quais serviços devem ser prestados, a quem e a que preço e também controle relativo ao valor residual da infra-estrutura utilizada no final do período de concessão. A interpretação IFRIC 12 orienta apenas o reconhecimento e mensuração de transações relacionadas a contratos de concessão de serviços públicos. As questões relativas à evidenciação dos fatos contábeis relevantes dos contratos de concessão de serviços públicos são dadas pela Interpretação SIC 29 Contratos de Concessão de serviços Evidenciação. A norma aborda questões relativas ao tratamento contábil dos direitos do operador sobre a infra-estrutura, do reconhecimento e mensuração dos valores da concessão, da contabilização dos serviços de construção ou melhoria e dos serviços de operação, tratamento dos custos de financiamentos, contabilização subseqüente do tratamento de ativos financeiros, intangíveis e itens cedidos ao operador pelo poder concedente. Embora, as discussões em torno das concessões e da IFRIC 12 tenham se avolumado com iminência da adoção dessa norma, verificou-se que pesquisas e discussões já vinham sendo feitas no Brasil com a finalidade de esclarecer questões polêmicas, sobretudo relativas ao reconhecimento contábil das concessões. Considera-se que os impactos potenciais da adoção da Interpretação da IFRIC 12 por empresas concessionárias de serviços públicos que atuam no Brasil serão verificados principalmente por meio de alterações na estrutura de composição do Ativo, uma vez que a norma não permite o reconhecimento da infra-estrutura relacionada à concessão no Ativo Imobilizado das concessionárias, prática que atualmente é comum no Brasil. Possivelmente se verificará também uma maior representatividade e relevância das contas de ativos financeiros e ativos intangíveis entre as contas do Ativo, decorrente dos critérios de reconhecimento de receita dispostos na norma. A IFRIC 12 orienta que direitos relacionados aos contratos de concessão poderão ser contabilizados em tais rubricas, conforme as disposições contratuais referentes à parte que assume o risco pela demanda dos serviços públicos, verificando-se dessa forma alterações nos critérios de reconhecimento das receitas relacionadas à concessão. Para pesquisas futuras, recomenda-se a realização de estudos de caso em concessionárias com o objetivo de aprofundar a análise dos impactos decorrentes da adoção da norma, uma vez que as informações contidas nos relatórios financeiros divulgados ao público não oferecem o nível de detalhamento necessário a tal análise. 14