Cad biodivers. v. 6, n.2,jan ISSN

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Transcrição:

Cad biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 ISSN 1415-9112 Epífitos vasculares no Corredor de Biodiversidade Araucária, bacia do rio Iguaçu, Paraná, Brasil Annete Bonnel Osmir José Lavoranti 2 Gustavo Ribas Curcio 3 Foram registradas 125 espécies epifiticas vasculares nas áreas prioritárias do Corredor Araucária, distribuídas em 25 famílias e 62 gêneros. A riqueza epifitica é considerada elevada em comparação com os demais levantamentos realizados na Floresta Ombrófila Mista. Orchidaceae, Polypodiaceae e Bromeliaceae foram as famílias com maior riqueza, sendo Microgramma squamulosa e Pleopeltis pleopeltifolia as espécies com distribuição mais ampla por apresentar elevada frequência em todas as áreas estudadas. Há correlação positiva entre as cotas altimétricas e a riqueza epifitica, o que remete à presença de nevoeiro como fonte de umidade para os epífitos. Do mesmo modo, áreas legalmente protegidas e a existência de grandes indivíduos arbóreos também estão relacionadas com maior número de espécies. A presença de muitas taquaras se mostrou negativamente relacionado com os epífitos, demonstrando que os efeitos da intensa exploração das florestas perdura por muitos anos e que o histórico de uso das áreas é fator importante no estudo destas plantas. As. comunidades epifiticas registradas nas áreas de potreiros apresentam forte 1" tendência de diminuição devido à ausência de regeneração arbórea. Recomendase a reestruturação dos sistemas produtivos, além da implantação de práticas conservacionistas e de sistemas de monitoramento do componente epifitico na região. INTRODUÇÃO Epífitos vasculares são responsáveis por grande parcela da diversidade de florestas tropicais, perfazendo a maioria das espécies em locais onde a umidade relativa do ar se mantém elevada durante o ano (GENTRY & DODSON, 1987). Ofertam, nas florestas, água, nutrientes, microhábitats, abrigo, alimentação e sítio de reprodução para inúmeras espécies animais e vegetais (ROCHA et a!., 2004), o que as toma base de interações interespecíficas. Considera-se ainda que plantas epifiticas possam ser os primeiros indicadores bióticos de mudanças climáticas globais (LUGO & SCATENA, 1992; BENZING, 1998), pois apresentam uma dependência, praticamente exclusiva, das condições atmosféricas. Devido à grande necessidade de substrato arbóreo e do seu lento crescimento (ZOTZ, 1995), os epífitos podem ser relacionados a estágios de regeneração dos ambientes florestais após o impacto antrópico. Florestas conservadas ou em estágios mais avançados na sucessão, com grandes árvores, apresentam maior riqueza e abundância de epífitos (WOLF, 2005; FLORES-PALACIOS & GARCÍA- FRANCO, 2006; BONNET et a!., 2007), 1 Bióloga, pós-doutorada em Conservação da Natureza, UFPR. E-mail: a_bo=et@hotrnail.com 2 Estatístico, Dr., Embrapa Florestas. E-mail: osmir@cnpf.embrapa.br 3 Engenheiro Agrônomo, Dr., Embrapa Florestas. E-mai!: curcio@cnpf.embrapa.br 49

Cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 enquanto estágios iniciais de regeneração da floresta possuem, comumente, menor diversidade destas plantas (ALMEIDÁ et al., 1998, HOELTGEBAUM, 2003; BONNET & QUEIROZ, 2006; KERSTEN & KUNIYOSHI, 2009). O corredor Araucária, um dos três Corredores de Biodiversidade do estado do Paraná, localiza-se no terceiro planalto e apresenta paisagens e formas de uso e ocupação dos solos bastante diversificadas. Seu principal agente modelador é o rio Iguaçu, que se configura como ente físico central e comanda a formação de vales encaixados com encostas muito íngremes, onde predominam relevos ondulados e montanhosos e, mais especificamente, relevos suavemente ondulados nas regiões de maiores altitudes. A vegetação que ocupa esses ambientes pertence, principalmente, à Floresta Ombrófila Mista, representada por importantes remanescentes florestais, além da menor presença da Floresta Estacional Semidecidual no vale e das Estepes nas porções mais elevadas (STCP, 2006). A diversidade ambiental resultante deste quadro determina alto valor ecológico para os ecossistemas que formam o Corredor Araucária, motivando a execução de estudos aprofundados sobre componentes florestais específicos. No Brasil, os estudos com o componente epifítico concentram-se nas regiões Sul e Sudeste, em formações vegetacionais com forte influência do oceano, como a Floresta Ombrófila Densa. Em Floresta Ombrófila Mista os levantamentos limitam-se ao estado do Paraná, destacando-se CERVI et ai. (1988), DlTTRICH et al. (1999) e BORGO & SILVA (2003) em Curitiba, KERSTEN & SILVA (2002) em Araucária, KERSTEN et al. (no prelo) entre os municípios de Guarapuava e Pinhão, BONNET (2006) e KERSTEN & KUNIYOSHI (2009) em vários municípios nas planícies e encostas da bacia do rio Iguaçu e BONNET (2009) em vários municípios ao longo do rio Tibagi. No domínio do Corredor Araucária, no entanto, inexistem estudos com epífitos vasculares, o que o toma alvo singular e prioritário. O estudo do componente epifítico tem por fim a elucidação de parcela importante da biodiversidade existente em uma região; pode, inclusive, ser utilizada na avaliação do estado de conservação dos ambientes florestais. O número de espécies epifíticas existente nas Unidades de Conservação da região (Estação Ecológica do rio dos Touros e Refúgio de Vida Silvestre do Pinhão), pode fundamentar, em termos comparativos, a avaliação dos fragmentos florestais atualmente em uso pelo homem. Ademais, as relações entre as características ecológicas dos epífitos e as diversas formas de uso das florestas, associando-se os principais agentes de degradação, podem indicar ações efetivas para conservação e recuperação comunidades. Desse modo, considerando destas a inexistência de levantamentos de plantas epifíticas na região abrangida pelo Corredor Araucária e os poucos dados gerados para a região, esse estudo teve como objetivos inventariar as comunidades de epífitos vasculares em quatro áreas distintas, relacionando a riqueza aos principais fatores de degradação ambiental e às características da floresta. Com base nas relações estabelecidas, foram identificados os grupos sucessionais epifíticos e eleitas as espécies mais indicadas para monitoramento das comunidades. 50

Cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 MATERIAL E MÉTODOS Áreas de estudo Os locais selecionados para o desenvolvimento dos trabalhos compreenderam as Áreas Prioritárias 01 (AP 1), 02 (AP 2), 07 (AP 7) e 11 (AP 11), em diferentes regiões do Corredor Araucária (figura 1). Foram definidas, quanto aos seus limites geográficos, no documento Avaliação Ecológica Rápida do Corredor Araucária (STCP, 2006) e pertencem aos municípios de Bituruna, General Carneiro, Palmas, Pinhão e Reserva do Iguaçu, abrangendo encostas e segmentos das margens dos rios Iguaçu, Iratim, Lajeado Grande, São Pedro e dos Touros, estado do Paraná. Figura 1. Localização do Corredor Araucária e das áreas prioritárias estudadas (AP01, AP02, AP07 e AP1l), Paraná. Adaptado de STCP (2006). ~nr36'w 3<KlOOO 400000 0000.- ~Ift ~r-...".---±--+---------+----------+--------~-i-,-,,...+-,.,... ~ -t- GlI PAF!ljAVII ~ rooo/ojljact: ~+------=:!/-=~ +- ---;'-4--Tt!,...-+-._--!- + ~~.:.:.c.:~+ ~a~~ ~+-------+-,(:,;..-.--f=-----.:c--~::i_-57~~;ii_\-'-ft_'rt+---------+--7~"--'-c+ Legenda Std.sMu'*lpals DM unk\", l [..=JLlmHtdO Corredor c:=lare. Estr.~ I' " \ '-"'i\~_t ~ '~" r---- --\ \./ \, \ \,... <>:»:... '\,\ -+-----+----.,----"".,...".----t--%-f---+----+~,:. : \,,-.,,. I. ",-<; <; ~N\ClPNElt:IO C Unidades de Conservação \ \ 18 ~4 '" -, I--~....-... / ) o 3 5 12 I',-- """""Km \/ t ~:..L---,...-+_--+----------+---------+-,...-------+--+-r~! 1< ~ 3IlOOOO 400000 """'" li 51

Cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 o Corredor Araucária está localizado no Terceiro Planalto paranaense, muito próximo à segunda cuesta, em cotas altimétricas em tomo de 1.000 m s.n.m (tabela 1). Nas margens do rio Iguaçu, que se configura como ente geomórfico central do Corredor, as altitudes alcançam 600 m s.n.m. As rochas são ígneas efusivas, do Mesozóico, que compõem a Formação Serra Geral (Mineropar, 1989). O clima predominante é do tipo Cjb (temperado), com temperatura média do mês mais frio entre -3 C e 18 C e do mês mais quente abaixo de 22 C, verões frescos, invernos rigorosos, com ocorrência freqüente de geadas, sem estação seca definida (IAPAR, 2009). A precipitação média anual da região é de 1.800-2.000 mm, segundo as classes defmidas por IAPAR (2009). A cobertura vegetacional está sob domínio da Floresta Ombrófila Mista, com influência de elementos da Floresta Estacional Semidecidual na calha do rio Iguaçu (RODERJAN et al., 2002). Destacam-se duas Unidades de Conservação estaduais, Estação Ecológica do rio dos Touros e Refúgio de Vida Silvestre do Pinhão (figura 1). As áreas para levantamento florístico, em cada área prioritária, foram pré-eleitas com base em imagens de satélite e fotografias aéreas, interpretadas em estereoscopia. Considerou-se, principalmente, aspectos fitofisionômicos, além da distância e da homogeneidade na distribuição espacial dos pontos. A seleção foi finalizada em campo, considerando a existência de estradas e possibilidade de acesso aos locais, o estado de conservação da vegetação, a presença de grandes indivíduos arbóreos, a diversidade de superficies geomórficas em cotas altimétricas distintas (tabela 1). Em cada área prioritária, foram selecionadas 30 locais de amostragem da comunidade epifitica, à exceção da AP 2, onde apenas 23 locais foram eleitos. Tabela 1. Limites geográficos e altimétricos das áreas de amostragem nas Áreas Prioritárias (AP). Áreas Prioritárias APOl AP02 AP07 APll Coordenadas (UTM) 7078646-7093207 S; 445004-451182 W 7088159-7095260 S; 437464-443014 W 7125283-7142656 S; 410780-423495 W 7129929-7141582 S; 389816-408061 W Altitudes (m) 929 à 1.253 m 945 à 1.200 m 950 à 1.130 m 600 à 1.000 m Procedimento amostrai Nos locais selecionados para amostragem foi realizado levantamento florístico dos epífitos vasculares, no período de 2007-2008, através do método do caminhamento. Foram registradas todas as espécies observadas em um raio variável em tomo do ponto de parada, abrangendo, aproximadamente, um hectare por local de amostragem. Desse modo, em cada área prioritária foram verificados, aproximadamente, 30 hectares de florestas, à exceção da AP 02, onde apenas 23 hectares foram avaliados. As coordenadas geográficas e cotas altimétricas foram registradas com GPS (Garmin 76CSx, Garmin etrex) ou obtidas em cartas planialtimétricas da região, em escala 1:100.000. A identificação dos epífitos foi feita em campo, com observações a partir do chão e uso de binóculo (7 x 35 mm) quando necessário. Algumas espécies, cuja identificação não foi possível em campo, foram coletadas e 52

cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 comparadas com exsicatas de herbários, identificadas com auxílio de especialistas, ou mantidas in vivo para observação da floração e posterior determinação. O material coletado foi herborizado e depositado nos Herbários EFC e UPCB, respectivamente, dos Departamentos de Ciências Florestais e de Botânica da Universidade Federal do Paraná. Os nomes científicos foram verificados em IPNI (2009); para Orchidaceae, seguiu-se a classificação de Projeto Orchidstudium (2009). Caracterização dos locais de estudo As florestas de cada local de amostragem foram analisadas quanto aos fatores ambientais de impacto para as comunidades epifiticas, como a presença de grandes árvores, clareiras, taquaras e gado, sendo os dados registrados em campo. Exemplares de Arauearia angustifolia (Bert.) Kuntze de grande porte foram desconsiderados para o enquadramento em grandes indivíduos arbóreos por apresentarem características muito distintas quanto ao substrato para as epífitas, como os ramos de pequeno diâmetro concentrados no final do fuste e expostos à condições ambientais de alta luminosidade/temperatura, além de porções de ritidoma descamante. A quantidade de clareiras na área foi traduzida como grande ou pequena, em avaliação considerando a densidade de indivíduos arbóreos, estratificação e sombreamento no interior da floresta. A quantificação das clareiras teve o objetivo de representar áreas com maior ou menor impacto antrópico. A presença de taquaras, registrada tanto como agrupamentos de plantas vivas, quanto na forma de colmos secos no chão da floresta, também teve a pretensão de indicar estados de degradação da floresta. Finalmente, a presença de gado e sua estimativa, feita através da observação de fezes, é uma característica específica das florestas em uso pelo homem com sistemas produtivos, relacionando-se com os demais fatores ambientais e, conseqüentemente, com as epífitas. A despeito dos distintos níveis de intervenção antrópica nos ambientes do Corredor, os locais de amostragem foram avaliados, também, quanto à presença de florestas com sistemas produtivos (potreiros/faxinais) ou florestas protegidas, estas com vegetação em estágios diversos de regeneração. Foram consideradas sob proteção legal os locais inseridos na Reserva Legal da Swedish Match e na Estação Ecológica do rio dos Touros, áreas contíguas na AP 11 e no Refúgio de Vida Silvestre do Pinhão, na AP 07. As demais situações, em que o levantamento era coincidente com Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal, foram desconsideradas devido à intensidade de uso pelo homem e ao alto grau de degradação ambiental. Caracterização das plantas epifíticas As espécies e morfoespécies epifiticas foram classificadas, de acordo com sua relação com os forófitos, em cinco grupos ecológicos de plantas autótrofas, baseados em BENZING (1990). As espécies que se estabelecem e crescem sobre outras plantas são consideradas holoepífitas características; aquelas que, em uma mesma comunidade, vivem tanto como epífitas quanto como rupícolas ou terrícolas são holoepífitas facultativas e aquelas que,geralmente vivem como rupícolas ou terrícolas, mas são registradas em ambiente epifitico, são as holoepífitas acidentais. Os epífitos que, em alguma fase da sua vida, mantêm contato com o solo, são os hemiepífitos. Hemiepífitos primários germinam sobre outras plantas e depois estabelecem contato com o solo e hemiepífitos secundários, germinam no solo e depois criam contato com o forófito, eliminando a porção basal do sistema caulinar e/ou radicial. 53

Cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 Os epífitos, à exceção dos holoepífitos acidentais e das espécies pouco observadas, também foram qualificados quanto ao grupo sucessional em que as espécies se enquadram nas áreas estudadas. Assim, aquelas que ocupam o substrato em momentos iniciais da sucessão, de crescimento rápido e adaptadas à ambientes com elevado gradiente lumínico e térmico (pioneiras), aquelas que ocorrem em florestas bem desenvolvidas ou conservadas e toleram condições de pleno sombreamento (avançadas) ou, ainda, as consideradas intermediárias nesse processo (secundárias). Análise dos dados Baseando-se nos registros dos epífitos nas áreas de amostragem, foram calculadas, em cada área prioritária, as freqüências absolutas de ocorrência das especies, apresentadas em porcentagem na listagem florística. Para avaliar a similaridade floristica entre as áreas prioritárias foram calculadas as distâncias de Jaccard. Com esses resultados, foi confeccionado algoritmo de agrupamentos, baseando-se na metodologia hierárquicaaglomerativa das médias das distâncias do coeficiente de Jaccard. Para verificar o efeito dos fatores ambientais de impacto sobre a riqueza de epífitos, nas 113 áreas de amostragem, foi empregada a análise de regressão múltipla (DRAPER & SMITH, 1981). Os fatores ambientais utilizados foram presença de clareiras, de taquaras, de cabeças de gado, além das cotas altimétricas das áreas e da existência de proteção legal das florestas. As relações significativas foram verificadas utilizando-se o Sistema SAS, sendo as variáveis ambientais previamente padronizadas conforme a fórmula de ajuste de extensão (range extension), onde Y = X - XmmI(Xmax -Xmin). RESULTADOS E DISCUSSÃO Foi registrado um total de 125 especies epifiticas vasculares nas áreas prioritárias do Corredor Araucária, distribuídas em 25 famílias e 61 gêneros (tabela 2). Destas, 12 famílias, 18 gêneros e 37 espécies são pteridófitas e 13 famílias, 43 gêneros e 88 espécies pertencem às angiospermas. O número de espécies registrado é superior aquele encontrado nos demais levantamentos em Floresta Ombrófila Mista (CERVI & DOMBROWSKI, 1985; CERVI et al., 1988; BOLÓS et al., 1991; BRITEZ et al., 1995; DITTRICH et al., 1999; KERSTEN & SILVA, 2002; BORGO & SILVA, 2003; CERVI et al., 2007; KERSTEN et al., no prelo), mesmo considerando os estudos realizados em maiores extensões geográficas (BONNET, 2006; KERSTEN & KUNIYOSHI, 2009; BONNET, 2009), o que remete à necessidade urgente de ações efetivas para conservação das áreas que compõem o Corredor. Em levantamento anterior, realizado por Avaliação Ecológica Rápida na grande área do Corredor Araucária, foram registradas doze espécies epifiticas pertencentes, principalmente, às famílias Orchidaceae e Polypodiaceae (STCP, 2006), o que representa 9,5% da riqueza relacionada pelo presente levantamento. Do total de espécies, apenas uma, Tradescantia fluminensis, é considerada exótica invasora (I3N, 2009). Por outro lado, duas espécies, ambas orquidáceas, constam na lista vermelha de plantas ameaçadas de extinção do Paraná, Sophronitis cernua em pengo e Epidendrum caldense, considerada rara (Hatschbach & Ziller, 1995). Estes dados, associados à lista florística e à riqueza de epífitos vasculares, revelam parcela importante da diversidade florística em alguns dos maiores fragmentos remanescentes de Floresta Ombrófila Mista do estado do Paraná. 54

Cad. biodivers. v. 6, n.2, jan. 2009 Tabela 2. Espécies e morfoespécies de epífitas vasculares observadas do Corredor Araucária, PR, seguidas pelos grupos ecológicos (GE) e freqüências de ocorrência em cada área prioritária. Pi = pioneira; Se = secundária; Av = avançada; HLC = holoepífita característica; HLF = holoepífita facultativa; HLA = holoepífita acidental; HMP = hemiepífita primária; HMS = hemiepífita secundária, * = espécie indicadora. FAMÍLIAS (número de gêneros, número de espécies), Areas Prioritárias (AP) GE Espécies 2 7 11 ARACEAE (I, 3) Philodendron bipinnatifidum Schott * Se HMP 27 Philodendron loefgrenii Engl. Se HMP 7 17 Philodendron ochrostemon Schott * Av HMP 14 20 ARAUCARIACEAE (I, I) Araucaria angustifolia (Bertol.) Kuntze HLA 27 13 3 ASPLENIACEAE (1,6) Asplenium auritum Sw. Se HLF 20 30 27 27 Asplenium cuspidatum Lam. Se HLF 23 26 48 43 Asplenium harpeodes Kunze Av HLF 3 Asplenium martianum C. Chr. Av HLF 3 Asplenium mucronatum C. PresI Av HLF 3 Asplenium serra Langsd. & Fisch. * Av HLF 53 39 31 7 BEGONIACEAE (I, I) Begonia fruticosa A. DC. Av HLF 3 BLECHNACEAE (I, I) Blechnum binervatum (Poir.) C.V.Morton & Lellinger * Av HMS 17 26 10 10 BROMELIACEAE (4, 12) Aechmea cf. caudata HLC 7 Aechmea recurvata ( Klotzsch ) L.B.Sm. * Se HLC 63 83 86 73 Billbergia nutans H. Wendl. ex RegeI * Av HLC 53 65 45 40 Billbergia zebrina (Herb.) Lindl. Se HLC 3 Tillandsia geminiflora Brongn. Se HLC 13 Tillandsia recurvata ( L. ) L. Pi HLC 3 3 33 Tillandsia stricta Sol. ex Sims Pi HLC 3 9 34 43 55

Cad. biodivers.v. 6, n.2,jan. 2009 ~ FAMÍLIAS (número de gêneros, número de espécies) Áreas Prioritárias (AP) GE Espécies 2 7 11 Tillandsia tenuifolia L. * Pi HLC 63 83 90 80 Tillandsia usneoides (L.) L. * Pi HLC 3 22 3 7 Vrieseafriburgensis Mez Se HLC 3 10 Vriesea platynema Gaudich. * Av HLF 14 Vriesea reitzii Leme & Costa, Andrea * Se HLC 47 30 62 13 CACTACEAE (2,9) Lepismium cruciforme (Vell.) Miq. Pi HLC 10 17 Lepismium houlletianum (Lem.) Barthlott * Se HLC 43 48 41 40 Lepismium lumbricoides (Lem.) Barthlott Pi HLC 23 52 59 67 Lepismium warmingianum (K. Schum.) Barthlott * Av HLC 3 40 Rhipsalis campos-portoana Loefgr. Av HLC 7 Rhipsalis cereuscula Haw. Pi HLC 10 Rhipsalis floccosa Salm-Dyck ex Pfeiff. * Se HLC 37 52 83 57 Rhipsalis puniceo-discus G. Lindb. Av HLC 20 30 Rhipsalis teres (Vell.) Steud. Se HLC 7 38 30 COMMELINACEAE (1, 1) Tradescantia fluminensis Vell. HLA 13 4 34 CUNONIACEAE (1, 1) Weinmannia humilis Engl. HLA 4 3 DENNSTAEDTIACEAE (I, I) Dennstaedtia sp. Av HLF 3 DRYOPTERIDACEAE (I, 1) Rumohra adiantiformis (G.Forst.) Ching * Se HLF 33 30 10 3 DYCKSONIACEAE (I, I) Dycksonia sellowiana Hook. HLA 10 22 GESNERIACEAE (1,1) Sinningia douglasii (Lindl.) Chautems * Av HLF 60 30 69 37 56

Cad. biodivers. v. 6, n.2, jan. 2009 FAMÍLIAS (numero de -gêneros, número de espécies) Áreas Prioritárias (AP) GE Espécies 1 2 7 11 GRAMMITIDACEAE (1, 1) Lellingeria schenckii (Hieron.) A.R.Sm. & R.C.Moran Av HLC 4 3 3 HYMENOPHYLLACEAE (2,4) Hymenophyllum hirsutum L. (Sw.) Av HLC 3 Hymenophyllum polyanthos (Sw.) Sw. Av HLC 30 48 31 10 Trichomanes angustatum Cannich. Av HLC 17 39 3 Trichomanes polypodioides L. Av HLC 17 35 7 LOMARIOPSIDACEAE (1,2) Elaphoglossum paulistanum Rosenst. Av HLF 7 Elaphoglossum sp. Av HLF 3 4 3 LYCOPODIACEAE (1,2) Huperzia sp. Av HLC 3 3 Huperzia taxifolia (Sw.) Trevis. Av HLC 3 9 10 7 MELASTOMATACEAE (2,4) Leandra sp. HLA 3 Leandra regnellii (Triana) Cogn. HLA 10 4 Leandra xanthocoma (Naudin) Cogn. HLA 3 Miconia selowiana Naudin HLA 3 MORACEAE (1, 1) Ficus sp. HMP 10 7 MYRSINACEAE (1, 1) Myrsine umbelata HLA 3 3 ORCHIDACEAE (26,44) Acianthera aphthosa (Lind1.) Pridgeon & M.W.Chase Av HLC 20 Acianthera cf. saundersiana (Rchb.f.) Pridgeon & Av HLC 3 3 M.W.Chase 57

Cad. biodivers. v. 6, n.2, jan. 2009 FAMÍLIAS (número de gêneros, número de espécies) Áreas Prioritárias (AP) GE Espécies 1 2 7 11 Acianthera luteola (Lind1.) Pridgeon & M.W.Chase Av HLC 3 Acianthera pubescens (Lind1.) Pridgeon & M.W.Chase Av HLC 3 Acianthera cf. recurva (Lind1.) Pridgeon & M.W.Chase Av HLC 3 Acianthera sonderana (Rchb.f.) Pridgeon & M.W.Chase Pi HLC 60 78 72 63 Anathallis linearifolia (Cogn.) Pridgeon & M.W.Chase Se HLC 10 43 Arthrosia hygrophila (Barb.Rodr.) Luer Pi HLC 57 70 83 63 Baptistonia riograndense (Cogn.) Chiron & V.P.Castro Av HLC 4 3 3 Barbosella cogniauxiana (Speg. & Krz1.) Sch1tr. Av HLC 3 3 Brasiliorchis cf. picta (Hook.) R. Singer Se HLC 41 27 Bras iliorch is porphyrostele (Rchb.f.) R. Singer Se HLC 37 70 Brasiliorchis sp. Se HLC 7 22 3 33 Bulbophyllum regnellii Rchb.f. Pi HLC 13 13 76 60 Campylocentrum aromaticum Barb.Rodr. Pi HLC 7 Capanemia mieromera Barb.Rodr. Pi HLC 10 4 7 3 Capanemia superflua (Rchb.f.) Garay Se HLC 7 9 52 50 Christensonella neowiedii (Rchb.f.) S. Koehler Av HLC 17 35 21 7 Christensonella vernicosa (Barb.Rodr.) Szlach., Mytnik, Av HLC 3 13 10 Gómiak & Smiszek Coppensia bifolia (Sims) Dumort. Av HLC 3 Dryadella liliputiana (Cogn.) Luer Av HLC 4 Epidendrum caldense Barb.Rodr. Se HLC 3 9 3 Eurystyles cotyledon Wawra Se HLC 7 Isabelia pulchella (Kraenz1.) C.Van den Berg & M.W.Chase Av HLC 10 48 7 Isabelia virginalis Barb.Rodr. Av HLC 17 Isochilus linearis (Jacq.) R.Br. Se HLC 7 Lankesterella ceracifolia (Barb.Rodr.) Mansf. Av HLC 3 Leptotes unicolor Barb.Rodr. Se HLC 7 Octomeria cucullata Porto & Brade Se HLC 3 4 3 Octomeria octomeriantha (Hoehne) Pabst Se HLC 70 39 21 3 Octomeria sp. Se HLC 3 4 3 Pabstiella mirabilis (Schltr.) Brieger & Senghas Av HLC 7 43 Pabstiella miragliae (Leite) Luer Se HLC 47 43 41 20 Panmorphia paranaensis (Sch1tr.) Luer Av HLC 3 Panmorphia sp. Se HLC 13 13 ~ 58

Cad. biodivers.v. 6, n.2,jan. 2009 FAMÍLIAS (número de gêneros, número de espécies) Áreas Prioritárias (AP) GE Espécies 2 7 11 Phymatidium hysteranthum Barb.Rodr. Se HLC 7 Pleurobotryum crepinianum (Cogn.) Hoehne Pi HLC 20 30 3 Pleurobotryum hatschbachii (Schltr.) Hoehne Se HLC 13 4 41 27 Rhinocidium macronyx (Rchb.f.) Baptista Se HLC 10 Rhinocidium raniferum (Lindl.) Baptista Pi HLC 27 17 31 10 Sophronitis cemua Lindl. Av HLC 7 Specklinia grobyi (Bateman ex Lindl.) F.Barros Av HLC 13 4 10 Orchidaceae 1 HLC 3 Orchidaceae 2 HLC 3 PIPERACEAE (1,9) Peperomia alata Ruiz & Pav. Av HLF 7 Peperomia catharinae Miq. * Pi HLC 37 30 69 13 Peperomia delicatula Henschen Se HLC 7 Peperomia martiana Miq. Av HLF 7 Peperomia rotundifolia (L.) Kunth Se HLC 3 Peperomia sp. Av HLC 3 Peperomia tetraphylla (G. Forst.) Hook. & Am. * Pi HLC 53 30 72 67 Peperomia trineura Miq. * Pi HLC 10 26 83 37 Peperomia urocarpa Fisch. & C.A.Mey. Se HLF 17 POLYPODIACEAE (5, 15) Campyloneurum angustifolium (Sw.) Fée * Pi HLC 83 96 97 70 Campyloneurum nitidum (Kaulf.) C.PresI Se HLF 37 61 59 57 Campyloneurum rigidum J.Sm. Se HLF 3 10 Microgramma squamulosa (Kaulf.) de la Sota * Pi HLC 97 100 100 90 Niphidium crassifolium (L.) Lellinger * Av HLC 10 13 Pecluma paradiseae (Langsd. & Fisch.) M.G. Price Av HLC 7 4 3 33 Pecluma pectinatiformis (Lindm.) M.G.Price Se HLC 60 70 79 43 Pecluma recurvata (Kaulf.) M.G. Price Se HLC 27 39 10 Pecluma sicca (Lindm.) M.G.Price * Se HLC 10 52 66 60 Pecluma singeri (de la Sota) M.G. Price Av HLC 3 Pleopeltis astrolepis (Liebm.) E. Fourn. Av HLC 10 4 Pleopeltis hirsutissima (Raddi) de la Sota * Pi HLC 97 100 100 87 59

Cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 FAMÍLIAS (número de gêneros, número de espécles) Espécies GE Áreas Prioritárias (AP) 2 7 11 Pleopeltis pleopeltidis Fée Pleopeltis pleopeltifolia (Raddi) Alston * Pleopeltis squalida (Vell.) de la Sota Se HLC 47 35 41 20 Pi HLC 27 52 79 87 Se HLC 17 14 57 PTERIDACEAE (2,2) Pteris lechleri Meti. Se HLF 3 Vittaria lineata (L.) Sm. * Av HLC 50 65 41 23 SELAGINELLACEAE (1, 1) Selaginella sp. Se HLF 4 Total 71 67 84 84 Total de espécies epifiticas vasculares 125 Considera-se que a elevada riqueza florística esteja relacionada com a localização geográfica dos fragmentos, os quais encontram-se em região com expressivos gradientes altimétricos e grande diversidade em feições geomórficas. As cotas altimétricas registradas nas áreas de estudo estão significativamente e positivamente relacionadas (p < 0,05),segundo a análise de regressão múltipla, à riqueza epifitica (tabela 3), ou seja, áreas com maiores altitudes apresentam maior número de espécies. As altitudes registradas nas áreas de amostragem, que alcançam 1.253 m s.n.m., são decorrentes da proximidade da cuesta da Serra Geral, ente geomórfico que separa o segundo do terceiro planalto paranaense. Os planaltos, que se sucedem de leste para oeste do Estado, são três regiões de paisagens naturais, defmidas por Maack (2002)com base na posição das escarpas, vales de rios e divisores de águas, além do caráter fisiográfico unitário destas paisagens. Florestas estabelecidas em grandes altitudes são recorrentemente envoltas por densos nevoeiros, principalmente quando as temperaturas diárias diminuem. O nevoeiro aumenta a disponibilidade hídrica para os epífitos, pois estas plantas absorvem a.umidade diretamente da atmosfera ou da superficie dos troncos depois da sua condensação. Além da água da chuva, o nevoeiro representa uma importante fonte de umidade para os epífitos que não possuem o solo como fonte de umidade e nutrientes. Sua presença foi relacionada com a riqueza epifitica nas florestas montanas do Equador (KÜPER et al., 2004) e na região da cuesta que separa o primeiro e o segundo planalto paranaense, nas margens do rio Tibagi (BONNET, 2009). 60

Cad. biodivers. v. 6, n.2, jan. 2009 Tabela 3. Nível de significância, estimativa e erros dos parâmetros do modelo de regressão para o efeito da riqueza epifitica. Coeficiente de determinação (R 2 ) = 0,9154; erro quadrático médio (EQM) = 6,83; número de observações (n) = 113. Fatores Ambientais Prob > t Estimativa Erro presença de grandes árvores < 0,0001 6,60805 1,33676 presença de muitas clareiras 0,4615 presença de taquara 0,0338-3,31894 1,54313 presença de muitas cabeças de gado 0,5571 proteção legal das florestas 0,0078. 4,61413 1,70080 altitude das áreas de estudo < 0,0001 18,92174 1,94045 Destaca-se que este mesmo efeito micro climático produz as corredeiras e cachoeiras, presentes nos principais afluentes do rio Iguaçu da região estudada, como os rios Lajeado Grande e o Iratim. Rios encaixados predominantemente sobre lineamentos geológicos incididos em rochas eruptivas da formação Serra Geral, com leito em substrato rochoso e ressaltos topográficos, formam, caracteristicamente, consecuções de corredeiras e cachoeiras que representam zonas de aspersão de água. O vapor de água produzido nos citados segmentos constitui fonte de umidade para os epífitos, que crescem em maior diversidade nas árvores que margeiam estas feições geomórficas. Este mesmo padrão foi observado e caracterizado no levantamento de epífitos vasculares ao longo do rio Tibagi, PR (BONNET, 2009), onde diques e soleiras de diabásio antepõem-se ao canal. Aspleniaceae, Bromeliaceae, Cactaceae, Orchidaceae, Piperaceae e Polypodiaceae foram as famílias com distribuição mais ampla no Corredor Araucária, ou seja, apresentaram mais de uma espécie com ocorrência em todas as áreas prioritárias (tabela 2). Polypodiaceae apresentou as maiores frequências, sendo a única família com espécies registradas em 100% das áreas de amostragem, simultaneamente, em duas áreas prioritárias. As citadas espécies com alta frequência de ocorrência apresentam características de pioneirismo nos ambiente, como será visto adiante. As famílias com maior riqueza foram Orchidaceae (35%), Polypodiaceae (12%) e Bromeliaceae (10%), ordenação que se repetiu em cada uma das áreas prioritárias (tabela 3). O resultado é semelhante àqueles obtidos em outros levantamentos de epífitos em Floresta Ombrófila Mista (DITTRICH et ai., 1999; BORGO & SILVA, 2003; KERSTEN & SILVA, 2002; KERSTEN et ai., no prelo; KERSTEN & KUNIYOSHI, 2006; BONNET, 2009). As diferenças entre os estudos aumentam quando se consideram famílias com menor riqueza florística, como Araceae, ausente em levantamentos realizados em planícies fluviais (KERSTEN & SILVA, 2002; KERSTEN et ai., no prelo), onde a presença de solos com elevada hidromorfia é conspícua. Considerando que aráceas estabelecem contato com o solo em algum período do seu ciclo de vida, ou seja, são hemiepífitas, solos com elevada saturação hídrica não permitem a sobrevivência destas plantas. Por outro lado, apenas 32% das espécies foram observadas em todas as áreas prioritárias e nenhuma espécie ocorreu em todas as áreas de amostragem. A grande quantidade de epífitos com distribuição restrita na área do corredor pode estar refletindo baixa plasticidade ecológica de algumas espécies, associada à heterogeneidade ambiental e ao alto nível de 61

Cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 degradação dos ambientes. No entanto, grande parte deste conjunto de espécies pertence à família Orchidaceae que apresenta, comumente, uma distribuição com pouca sobreposição de áreas de ocorrência (KÜPER et al., 2004; BONNET, 2009). Segundo Benzing (1990), esta caracteristica está relacionada com a elevada plasticidade evolutiva dos membros da família. As áreas prioritárias que possuem unidades de conservação protegendo os ecossistemas florestais, como a AP 7 e a AP 11, respectivamente, o Refúgio de Vida Silvestre do Pinhão (RVS Pinhão) e a Estação Ecológica do Rio dos Touros (EE Rio dos Touros), apresentaram as maiores riquezas floristicas, com 84 espécies epifiticas cada (tabela 2). Destas, 49 foram exclusivas prioritárias em questão, o que representa 39% de todas os epífitos observados no estudo e, em termos de biodiversidade, grande contribuição à riqueza florística total da região. Esta alta porcentagem de espécies exclusivas está representada no dendrograma (figura 1), onde a AP 07 e AP 11 apresentam baixa similaridade entre si e com as demais áreas. Figura 1. Dendrograma de similaridade entre as áreas prioritárias do Corredor Araucária, baseado no índice de Jaccard calculado com as espécies de epífitas vasculares. 62

Cad. biodivers.v. 6, n.2,jan. 2009 A proteção legal das áreas também foi detectado como sendo fator ambiental que apresenta relação significativa e positiva (p < 0,05) pela análise de regressão (tabela 3) com a riqueza epifítica, ou seja, as florestas protegidas no Corredor Araucária apresentam maior número de espécies de epífitos, ratificando sua singularidade e importância para a preservação de ecossistemas, em especial, preservação do componente epifítico. Para este grupo de plantas, o impacto antrópico nas florestas representa, em uma primeira análise, a perda de área e diversidade de locais para fixação, que são as árvores. Representa também a alteração nos padrões de luminosidade, umidade e temperatura do ambiente, além da oferta de recursos para a fauna, o que influencia negativamente na reprodução, dispersão e sobrevivência dos epífitos. Dentre as áreas protegidas, a RVS Pinhão, localizada predominantemente nas maiores altitudes registradas na AP 7 (figura I), foi registrado um total de 57 espécies epifíticas, riqueza que supera todas as outras áreas de levantamento. Destas, sete ocorreram apenas nesta unidade de conservação, dados este que confirmam sua importância na região e no Corredor Araucária, como área de conservação in situ da flora epifítica e como fonte de propágulos para regiões vizinhas. Nas AP 7 e AP 11, epífitos também foram registrados nas florestas que estão sendo utilizadas pelo homem, principalmente para criação de gado sob as árvores, os potreiros. Nas duas áreas observa-se também o cultivo da ervamate (Ilex paraguariensis A. St.-Hil.) em algumas propriedades, porém como atividade produtiva secundária. As lavouras quase inexistem na região, o que se deve à presença de relevos patamarizados, onde sobressaem solos rasos e afloramentos rochosos, mormente, em superfícies de inflexão. Menor riqueza de epífitos foi registrada nas áreas AP 1 e AP 2, com redução de até 20% em relação às áreas prioritárias onde existem Unidades de Conservação. Apresentam maior similaridade florística entre si (figura 2), provavelmente por conta da maior proximidade geográfica (figura 1). Este padrão, em que a similaridade florística está relacionada com a proximidade geográfica também foi detectado ao longo do rio Tibagi, PR (BONNET, 2009). As áreas AP I e AP 2 são integralmente utilizadas pelo homem, o que representa, para a comunidade epifítica, alterações profundas no hábitat. Ocupando extensas áreas estão os potreiros, arraigada prática cultural na regiao, impulsionada pelas condições geomorfológicas e pedológicas desfavoráveis para a cultura mecanizada. Áreas utilizadas como potreiros possuem árvores em densidades. variadas, que podem ser remanescentes de uma floresta mais conservada e, assim, de grande porte, ou ser resultantes de regeneração inicial ou média e apresentarem pequeno porte. Estas características estão profundamente relacionadas à riqueza de epífitos, pois a presença de grandes árvores se mostrou positivamente relacionada ao número de espécies registradas nas áreas de estudo (p < 0,05), pela análise de regressão (tabela 3). A relação entre a maior riqueza de epífitos e o grande porte das árvores suporte já foi demonstrada em diversos trabalhos (YEATON & GLADSTONE, 1982; HIETZ & HIETZ- SEIFERT, 1995; FONTOURA et al., 1997; VARASSIN, 2002; MARTIN et al., 2004; WOLF, 2005; FLORES-P ALACIOS & GARCÍA- FRANCO, 2006; BONNET et al., 2007; BONNET, 2009) e se confirma nas áreas estudadas. Grandes indivíduos arbóreos, na sua maioria, são antigos e, por isso, estão disponíveis para colonização pelas epífitas a mais tempo. Essas grandes árvores também apresentam maior superfície para colonização, ou seja, maior área de ritidoma para os epífitos se fixarem e crescerem. E, ao mesmo tempo, a presença de galhos em diversos tamanhos e várias posições dentro da 63

Cad. biodivers.v. 6, n.2,jan. 2009 copa, proporcionam a formação de micro climas distintos para as epífitas. As áreas com grandes indivíduos arbóreos apresentaram maior riqueza epifitica, como na AP 1, onde 38 espécies foram registradas em um sistema de faxinal com poucas cabeças de gado, grandes exemplares arbóreos de várias espécies, regeneração do componente arbóreo e exemplares de xaxim (Dieksonia sellowiana) compondo o subosque. A proteção de áreas como esta, onde o nível de degradação ainda não é extremo, é essencial para a preservação das espécies epifiticas. Um manejo seletivo da floreta, preservando grandes árvores é sugerido por Wolf (2005) para conservar e facilitar a restauração da diversidade local epífitos no México. No Corredor Araucária, a quantidade de cabeças de gado, por outro lado, não se mostrou significativa na análise de regressão, indicando que a lotação atual nos potreiros não é indicadora do uso e exploração histórica da área, este sim um fator fundamental na análise do componente epifitico. É importantíssimo considerar, para a região, que existe uma forte tendência ao desaparecimento, ao longo do tempo, de grande quantidade de epífitos das áreas utilizadas como potreiros. Com a queda das árvores e a falta absoluta de regeneração arbórea, que funcionaria no futuro como suporte para os propágulos dos epífitos, a diversidade destas plantas diminuirá progressivamente. Além da falta de regeneração, outros fatores acompanham esses sistemas de criação de gado em florestas. Com a presença constante dos animais, instalam-se intensos processos de compactação dos solos, que podem ser visualizados através do ravinamento nas encostas e que estão relacionados com a erosão e prejuízos à regeneração da floresta. Ademais, o desfrute anual nestes sistemas é muito baixo, estabelecendo parcos rendimentos às famílias e manutenção da pobreza no campo. Se estes sistemas de cnaçao de gado em potreiros se mantiverem, é certo que as florestas diminuirão ano a ano, provocando a redução de todas as suas espécies constituintes, além da fauna associada. Sugere-se que a criação de gado, tanto para abate quanto para produção de leite, seja direcionada para áreas com pastagens plantadas em solos corrigidos e adubados. Considerando a alta saturação por bases dos solos que se formam sobre rochas eruptivas (EMBRAPA, 1984), a utilização de capineiras e leguminoseiras para silagem e fenação também é adequada para as áreas prioritárias. Respeitando as limitações do relevo, que se expressa fortemente na região, pode-se projetar sistemas de pastoreio rotacionados sobre pastagens de inverno e de verão. As áreas de maiores altitudes, como citado anteriormente, ricas em epífitos, poderiam ser destinadas para conservação das florestas, com exploração de espécies não madeiráveis para produção de fitoterápicos, inclusive Maytenus ilieifolia Mart. ex Reissek (espinheira-santa), para produção de mel a partir da inserção de espécies melíferas nativas e para cultivo de orquídeas e flores. Sugere-se o incentivo ao cultivo de flores e frutos valorizados no mercado, como Aeea sellowiana (O.Berg) Burret (goiabeira-serrana), espécie nativa da Floresta Ombrófila Mista, resistente a baixas temperaturas, que produz frutos muito apreciados e consumidos em outros lugares do mundo, como por ex., Austrália. Em síntese, deve-se aumentar a produtividade nos sistemas já existentes para salvaguardar maior quantidade de áreas de preservação. Em grande parte da AP 2 as florestas estão atualmente sendo protegidas, mas foram, no passado, muito exploradas para retirada de madeira. O corte intenso de árvores resultou em grandes vazios na floresta, com Arauearia angustifolia formando um estrato superior, acompanhada por poucos indivíduos arbóreos de outras espécies e de menor porte. Nestas florestas, onde o aumento da intensidade lumínica foi 64

Cad. biodivers.v. 6, n.2,jan. 2009 intensificado, ao longo do tempo, o estabelecimento de taquaras em densas reboleiras imprimiu forte pressão nos epífitos, determinando seu crescimento nas porções mais elevadas da floresta e, provavelmente, prejudicando seu crescimento nas alturas menores. Este dados são ratificados pela relação negativa entre a presença de taquaras e a riqueza (tabela 3), detectada pela análise de regressão. Taquaras têm, comumente, crescimento muito agressivo e rápido, provocando sombreamento para a regeneração arbórea e injúrias mecânicas nas árvores adultas (DOMANOWSK.I et ai., 2007) e nos epífitos, além de propiciar um substrato desfavorável para estas plantas. Devido ao florescimento e morte das taquaras em anos anteriores, atualmente, colmos secos cobrem o chão da floresta; nestas mesmas áreas, no entanto, brotos de coloração verde brilhante da espécie são observados concomitantemente aos fragmentos antigos. A grande maioria das espécies registradas no Corredor Araucária apresenta relação permanente com o forófito, ou seja, são holoepífitas (tabela 2). Dentre elas, estão as holoepífitas facultativas (16 % do total de espécies), como Asplenium serra, que também foi observada enraizada no solo, mas em baixa freqüência. Registrada comumente em áreas com grandes imbuias (Oeotea porosa Nees & C. Mart. Barroso) e sapopemas (Sloanea lasioeoma K. Schum.), A. serra é de grande beleza ornamental e faz comumente associações com Vittaria lineata, uma holoepífita característica, ocorrendo as duas espécies em estágios mais avançados da sucessão florestal. Foram registradas em grande parte das áreas estudadas na AP 01 e AP 02 (tabela 2), o que se deve, provavelmente, à presença de grandes indivíduos arbóreos isolados nas áreas de potreiros. Uma série de outras espécies consideradas avançadas na dinâmica sucessional também foram registradas sobre as grandes árvores dos potreiros, como Hymenophyllum polyanthos, Triehomanes angustatum (Hymenophyllaceae), Huperzia taxifolia (Lycopodiaceae), hristensonella neowiedii,!sabelia virginalis e Pabstiella mirabilis (Orchidaceae). Para reiniciar uma dinâmica de propagação e instalação dos epífitos, atualmente diminuída pela redução expressiva de substrato, recomenda-se a proteção de áreas com estes grandes indivíduos arbóreos, além do enriquecimento com árvores nativas. Deve-se considerar que a maior parte dos epífitos tem lento crescimento e pertence ao grupo das plantas avançadas na sucessão (tabela 2), o que toma ainda mais urgente a implantação de medidas para conservação deste grupo de plantas. Na AP 2 destacam-se as holoepífitas acidentais (8 % do total de espécies), que se estabelecem casualmente em locais de acúmulo de matéria orgânica, como forquilhas, ocos ou grandes ramos de árvores, sendo comumente compostas por espécies terrestres. Pode-se citar as espécies tipicamente arbóreas, como Arauearia angustifolia, Weinmannia humilis, Leandra xanthoeoma, Mieonia selowiana, Myrsine umbelata e Fieus sp. (tabela 2). Nas AP 01 e AP 02 foi registrada Dyeksonia sellowiana, também holoepífita acidental, que ocorreu comumente em solos hidromórficos, como cabeceiras de drenagem ou margens baixas de cursos d' água, mas também na forma epifitica, apresentando desenvolvimento expressivo sobre as árvores. O maior número de espécies hemiepífitas foi registrada na AP 11. Hemiepífitas podem germinar na árvore e depois estabelecer contato com o solo, como é o caso das espécies registradas do gênero Philodendron ou germinar no solo e viver epidendricamente, como Bleehnum binervatum. Essa epífita ocorre muito comumente associada à D. sellowiana, portanto em ambientes com maior umidade, principalmente em áreas com alto grau de conservação. As hemiepífitas, que neste levantamento representam 4 % do total de 65

Cad. biodivers. v. 6, n.2,jan. 2009 epífitas registradas, são consideradas avançadas na sucessão, se estabelecendo, portanto, em momentos tardios na floresta. Como era esperado, a grande maioria das espécies consideradas pioneiras (tabela 2) ocorre em todas as áreas prioritárias, pertencem às famílias com distribuição mais ampla no Corredor e são holoepífitas características (72 % do total de espécies). Na região de estudo, Microgramma squamulosa e Pleopeltis pleopeltifolia, espécies registradas em 100% das áreas de amostragem, simultaneamente, em duas áreas prioritárias, além de Pleopeltis hirsutissima, caracterizam-se por apresentar resistência a condições de elevada amplitude lumínica e térmica devido a adaptações específicas. As espécies poiquilohídricas, como Pleopeltis hirsutissima e P. pleopeltifolia, perdem água rapidamente em períodos de seca, mas são tolerantes à dissecação e retomam à forma e atividades com o molhamento ou umidificação (BENZING, 1990). Este resultado foi registrado anteriormente no alto rio Iguaçu (KERSTEN & KUNNOSHI, 2009) e ao longo do rio Tibagi (BONNET, 2009). Campyloneurum angustifolium, outra epífita pioneira, ocorreu comumente associada à duas orquidáceas, Arthrosia hygrophila e Acianthera sonderana. Colonizaram várias espécies arbóreas, inclusive erva-mate, além de Luehea divaricata Mart., Matayba elaeagnoides Radlk. e Vitex megapotamica (Spreng.) Moldenke, espécies comumente representadas por indivíduos de grande porte. É importante destacar que as espécies epifiticas consideradas pioneiras na sucessão, de modo geral, ocorrem tanto nas comunidades de florestas com maior intervenção antrópica, em estágios médios de sucessão do componente arbóreo (BONNET & QUEIROZ, 2006), como naquelas mais conservadas, principalmente sobre os forófitos das margens de rios e nas porções mais altas da copa, ambos segmentos das florestas onde a intensidade lumínica é maior. E~ considerados avançados na dinâmica sucessional, por outro lado, exigem condições propiciadas pela comunidade arbórea, como maior sombreamento e umidade, além do acúmulo de matéria orgânica sobre galhos e bifurcações. A instalação de um programa de monitoramento das áreas do Corredor Araucária é necessidade relevante frente à alta riqueza de epífitos registrada nesse estudo, associada à pluralidade ambiental e singularidade dos remanescentes de Floresta Ombrófila Mista. Para isso, sugere-se um grupo de 25 espécies, pertencentes a 10 famílias botânicas, que poderão ser utilizadas como indicadoras da dinâmica da comunidade epifitica (tabela 2), em observações periódicas, por longo intervalo de tempo. Os epífitos foram selecionados, principalmente, com base nos grupos sucessionais à que pertencem, tendo sido escolhidas plantas do grupo das espécies pioneiras, secundárias ou avançadas. Deste modo, as espécies podem ser empregadas como indicadoras tanto nas áreas onde as florestas estão em recuperação, quanto naquelas em uso e naquelas mais conservadas. A grande maioria das espécies selecionadas ocorre em todas as áreas prioritárias, o que também facilita seu emprego. Concomitantemente, foram considerados o tamanho das plantas/facilidade de visualização na floresta, freqüência de floração, posição mais comum de crescimento nas árvores e famílias botânicas à que pertencem. Orquidáceas, devido a sua distribuição espacial com pouca sobreposição de áreas de ocorrência e, comumente, dificuldade de visualização devido ao tamanho reduzido, foram excluídas da seleção. O monitoramento deverá ser realizado anualmente, em áreas com florestas em diversos estados de conservação e intensidades de uso, distribuídas de modo mais equidistante possível no Corredor. Os forófitos serão marcados e registrados quanto às suas características morfométricas, relacionando-os às espécies epifiticas indicadoras. De posse destes 66

Cad. biodivers. v. 6, n.2, jan. 2009 dados, será possível acompanhar a sobrevivência e o ingresso de epífitos nas comunidades monitoradas, provavelmente variável conforme o estado de conservação e intensidade de uso da floresta. CONCLUSÕES É alta a riqueza de especies epifiticas vasculares nas áreas de Floresta Ombrófila Mista do Corredor Araucária. Maior número de espécies foi registrado nas áreas protegidas, sendo várias delas exclusivas. A proteção destas áreas, associada com a manutenção de grandes indivíduos arbóreos, também relacionados positivamente com a riqueza, são fundamentais para a conservação das comunidades epifíticas na região. Da mesma forma, maior riqueza existe nas maiores cotas altimétricas do Corredor, devido, principalmente, a presença de nevoeiros e aumento da disponibilidade hídrica para os epífitos. Neste sentido, as áreas com maiores altitudes poderiam ser destinadas à conservação da vegetação. As florestas em uso pelo homem mantém riqueza epifitica importante para o estado do Paraná, mas com grande probabilidade de perda com a continuidade dos processos de degradação atuais. Nesse sentido, é urgente a reestruturação dos sistemas produtivos da região, além da implantação de práticas conservacionistas e de sistemas de monitoramento do componente epifitico. Orchidaceae, Polypodiaceae e Bromeliaceae são as famílias com maior número de representantes no Corredor Araucária e, associadas com Aspleniaceae, Cactaceae e Piperaceae, formam o grupo das famílias com mais elevado número de registros nas áreas prioritárias. Os epífitos com distribuição mais ampla apresentam relação permanente com o forófito e são consideradas espécies pioneiras na sucessão. AGRADECIMENTOS Às pessoas que possibilitaram e auxiliaram nas viagens a campo, em especial, a Celso Araújo do IAP e aos grupos da Emater e IAP de União da Vitória e Curitiba. À Swedish Match do Brasil, Força Verde e Copel, além de proprietários administradores das propriedades. Aos especialistas Achilles Cone, Americo Docha Neto, Cássia M. Sakuragui, Dalton H. Baptista, Jorge L. Waechter, Marcus A. Nadruz Coelho, Marília Borgo e Paulo H. Labiak Evangelista. REFERÊNCIAS BmLIOGRÁFIcAS ALMEIDA, D.R., CARVALHO, L.C. & ROCHA, C.F.D. As bromeliáceas da Mata Atlântica da Ilha Grande, RJ: composição e diversidade de espécies em três ambientes diferentes. Bromélia, v.5, p.55-65, 1998. BENZING, D.H. Vascular epiphytes. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.354 p. BENZING, D.H. Vulnerabilities of tropical forests to climate change: the significance of resident epiphytes. Climatic Change, v. 39, p.5l9-540, 1998. BOLOS, O.; CERVI, A.C. & HATSCHBACH, G. Estúdios sobre la vegetacion Del estado de Paraná (Brasil meridional). Collectanea Botânica, v. 20, p. 79-180,1991. BONNET, A. Caracterização fitossociológica das bromeliáceas epifiticas e suas relações com os fatores geomorfológicos e pedológicos da planície do rio Iguaçu, Paraná, Brasil. Curitiba: UFPR, 2006. 289f. Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Paraná. e 67

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