fls. 386 ACÓRDÃO Registro: 2017.0000407106 Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564, da Comarca de São Bernardo do Campo, em que é apelante/apelado JOSÉ RAFAEL DE SOUZA COSTA, é apelado/apelante ACS BETA EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso do autor e, afastada a preliminar, negaram provimento ao recurso da ré. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores COSTA NETTO (Presidente sem voto), PIVA RODRIGUES E GALDINO TOLEDO JÚNIOR., 6 de junho de 2017. [ANGELA LOPES] [Relatora] Assinatura Eletrônica
fls. 387 VOTO Nº 2182 Apelação n. 1018376-52.2015.8.26.0564 Origem: 2ª Vara Cível de São Bernardo do Campo Juiz: Dr. Maurício Tini Garcia Apelantes: JOSÉ RAFAEL DE SOUZA COSTA e ACS BETA EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. Apelados: os mesmos RESCISÃO CONTRATUAL - CORRETAGEM - PEDIDO DE RESTITUIÇÃO Preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela ré-apelante que se afasta Legitimidade da incorporadora para responder aos termos da ação em que se postula a restituição das verbas acima referidas que já foi reconhecida quando do julgamento dos Recursos Especiais 1.551.951-SP e 1.551.968-SP, pelo rito dos recursos repetitivos PRELIMINAR REJEITADA RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL POR CULPA EXCLUSIVA DA RÉ - ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA - PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS - Comprovado (e não controvertido) o atraso na entrega da obra, inafastável a mora da ré, após a data de entrega prevista no contrato - Alegação da ré de que não houve atraso injustificado, que não pode ser acolhida Ocorrência de aquecimento do mercado, com consequente escassez de mão de obra e materiais que constitui risco inerente às atividades, não configurando excludente da responsabilidade Leitura da Súmula 161-TJSP - Sentença reformada Devolução integral dos valores pagos pelo autor devida, inclusive daqueles despendidos à título de comissão de corretagem - RECURSO DA RÉ DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PROVIDO. Trata-se de ação proposta por JOSÉ RAFAEL DE SOUZA COSTA em face de ACS BETA EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, objetivando, ante o atraso para a entrega da obra, a rescisão do contrato de compromisso de compra e venda do imóvel, com consequente condenação da ré à restituição de 100% dos valores pagos, no total de R$ 109.900,74, sendo R$ 72.374,16 a título de parcelas relativas à unidade residencial, R$ 16.256,50 pela Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 2
fls. 388 vaga de garagem e R$ 21.270,08 de comissão de corretagem. Sobreveio sentença de parcial procedência, cujo relatório se adota, para condenar a ré a devolver ao autor os valores pagos, deduzida a retenção de 30% do valor atualizado do contrato, corrigidos e acrescidos de juros de mora, ambos a contar do desembolso. Pela sucumbência preponderante, a verba honorária a cargo da ré foi fixada em 10% sobre o valor atualizado da condenação (fls. 173/176, publicada em 26/11/2015). Apela o autor, sustentando, em síntese, que lhe é devida a restituição de 100% dos valores pagos, inclusive sobre a corretagem, uma vez que trata-se de hipótese de atraso na entrega da obra, extrapolado por período superior a seis meses. Aponta que o MM. Juiz foi contraditório, na medida em que referiu ter havido inadimplemento contratual por parte da ré, pelo que haveria dever de restituí-lo em R$ 109.900,74, para, ao final, julgar o pedido parcialmente procedente, determinando a retenção de 30% dos valores quitados. (fls. 187/199). Também apela a ré, defendendo, em preliminar, sua ilegitimidade passiva para responder pela devolução das verbas de corretagem. No mérito, insiste que as verbas pagas a título de SATI e corretagem o foram a terceiros, pelo que inexiste dever da ré de indenizar ao autor. Ainda quanto à corretagem, refere que não houve vício de consentimento e, ademais, os serviços foram efetivamente prestados (fls. 209/220). Maio de Recursos processados e respondidos às fls. 224/243 e 252/272. É o relatório. Cuida-se de ação movida por José Rafael de Souza Costa contra ACS Beta Empreendimento Imobiliários Ltda., objetivando a rescisão do contrato de compromisso de compra e venda da unidade imobiliária descrita na inicial. Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 3
fls. 389 Argumenta, para tanto, que firmou contrato em 03 de janeiro de 2012, sendo que a entrega da obra estava prevista, inicialmente, para setembro de 2014. Todavia, em 2013, as partes pactuaram, mediante aditivo contratual, que a entrega da obra se daria somente em maio de 2015, prazo que, da mesma forma, não foi observado, pelo que pede o autor a rescisão contratual, com reconhecimento da culpa da ré pelo inadimplemento e sua condenação na obrigação de restituir-lhe a integralidade dos valores pagos, inclusive a título de corretagem. Com efeito, o autor comprova que o prazo previsto no contrato, para conclusão da obra, era 31 de março de 2014, prevista tolerância de 180 dias (fl. 34). Todavia, foi firmado aditivo contratual, que alterou a data prevista para 31 de março de 2015, extensível por mais 60 dias. É de se observar que com tal acréscimo concordou o autor, sendo que a data de entrega do imóvel e os prazos de prorrogação não foram impugnados, certo que o próprio requerente apontou que, após o aditivo, o termo final para entrega do imóvel passou a ser maio de 2015. Em sua contestação, a ré não negou o atraso. Ao contrário, justificou o atraso, aduzindo circunstâncias imprevisíveis e força maior, consubstanciada na grande demanda do setor. Pois bem. Dito isso, deve ser dado provimento ao recurso do autor e negado provimento ao recurso da ré. Primeiramente, contudo, cumpre afastar as Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 4
fls. 390 preliminares arguidas pela ré. A ré reclama ser parte ilegítima para responder à pretensão autoral tocante à devolução da verba de corretagem. Todavia, é certo que tal questão já restou pacificada por decisão proferida sob o rito dos recursos repetitivos pelo E. Superior Tribunal de Justiça, em 24/08/2016, quando foram julgados recursos especiais representativos de controvérsias tocantes ao tema, sendo, por conseguinte, fixadas teses aplicáveis aos processos contendo pretensão de repetição da taxas SATI e da comissão de corretagem. Os Recursos Especiais 1.551.951-SP e 1.551.968- SP trataram da questão relativa à legitimidade passiva da incorporadora (promitente vendedora) para responder pela restituição das verbas. Nestes, foi fixa a tese de seguinte redação: '1. TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 1.1. Legitimidade passiva 'ad causam' da incorporadora, na condição de promitente-vendedora, para responder pela restituição ao consumidor dos valores pagos a título de comissão de corretagem e de taxa de assessoria técnicoimobiliária, nas demandas em que se alega prática abusiva na transferência desses encargos ao consumidor.' (redação segundo o Resp 1.551.951-SP). Ainda quanto ao tema, é relevante transcrever o seguinte trecho do julgado proferido nos autos do Recurso Especial 1.551.968 SP: À primeira vista, pode parecer que caberia ao corretor figurar no polo passivo da relação processual, pois foi quem recebeu os valores diretamente do consumidor. (...) A questão suscitada pelos consumidores se limita a estabelecer quem deve assumir o encargo da restituição dessa Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 5
fls. 391 remuneração. Sob a ótica dos consumidores, a corretagem foi contratada pela incorporadora de modo que ela é quem deveria responder por esse encargo. Por decorrência lógica, para que o encargo recaia sobre a incorporadora, deve-se admitir o ajuizamento da demanda contra esta, ou seja, reconhecer a legitimidade passiva ad causam. Observe-se o raciocínio acima se limita à questão da legitimidade passiva, pois a análise da efetiva obrigação de ressarcir os consumidores é questão de mérito, a ser enfrentada em outra oportunidade. De outra parte, com relação aos custos do serviço de assessoria imobiliária (SATI), os consumidores também alegam que se trata de serviço contratado pela incorporadora, mas com encargo transferido para consumidores. (...) As alegações deduzidas pelos consumidores com relação à SATI, portanto, são semelhantes, às afirmações feitas a respeito da comissão de corretagem, devendo-se adotar, portanto, a mesma solução, admitindo-se a legitimidade passiva da incorporadora. Destarte, fica plenamente justificado o afastamento de referida questão preliminar, devendo ser aplicado integralmente o entendimento acima esposado. Passa-se, então, ao mérito dos recursos, os quais não prosperam. No caso dos autos, tendo havido atraso na entrega da obra, deve ser reconhecido o inadimplemento contratual por parte da ré, o que, diga-se, é incontroverso. Quanto à alegada ausência de culpa da ré, que imputa a ocorrência à escassez de mão de obra, ocasionada pelo aquecimento do mercado, tem-se que não há como se acolher tal justificativa. Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 6
fls. 392 O contrato contou com previsão de dilação do prazo de entrega, de 180 dias, voltado este período justamente para acomodar eventos que poderiam acarretar atraso da obra. Ainda, esperando-se o atraso, houve, ainda, alteração da data de entrega, estampada no aditivo contratual. Tal aditivo contou, da mesma forma, com previsão de prazo de tolerância. E o risco de a obra sofrer atraso em razão dos eventos acima citados é inerente à sua atividade. E por se tratar de risco inerente à atividade empresarial, ficam afastadas tais alegações, de modo que o prazo de entrega deveria ter sido cumprido conforme avençado. E a matéria já se encontra pacificada no âmbito deste E. Tribunal: Súmula 161: Não constitui hipótese de caso fortuito ou de força maior, a ocorrência de chuvas em excesso, falta de mão de obra, aquecimento do mercado, embargo do empreendimento ou, ainda, entraves administrativos. Essas justificativas encerram res inter alios acta em relação ao compromissário adquirente. Uma vez que houve inadimplemento do contrato por parte da ré, fica justificado o pedido de rescisão contratual. Acrescente-se que a rescisão do contrato é direito inquestionável do comprador, que mesmo inadimplente - o que não foi suscitado, não sendo, portanto, o caso - faz jus à devolução da quantia paga pelo negócio. E, repita-se, a rescisão foi pleiteada antes do recebimento das chaves, não tendo o autor obtido a posse dos imóveis. Neste sentido é a redação da Súmula 01 deste E. Tribunal de Justiça que dispõe que O Compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 7
fls. 393 propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem. Na hipótese em que a culpa pela rescisão é da vendedora, a jurisprudência tem entendido pela restituição integral dos valores pagos pelos compradores. É o que se infere do teor da Súmula 543 do c. STJ, que assim dispõe: Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. (g/n). Destarte, de rigor a reforma da r. sentença neste tocante. Quanto à restituição da verba destinada ao pagamento da corretagem, é certo que, no caso dos autos, a devolução não se deve à impugnação específica da cláusula que impôs o ônus do pagamento ao comprador, mas, sim, decorre da rescisão contratual por culpa da ré, pelo que esta é, de fato devida, sendo imperioso a restituição da compradora ao 'status quo' anterior à contratação. Assim, deve a ré restituir ao autor inclusive o preço pago pelo serviço de corretagem, tudo devidamente corrigido desde o desembolso e acrescido de juros de mora desde a citação. Considerando-se que o MM. Magistrado de Primeira Instância já havia imputado o ônus pela sucumbência à ré, mantém-se a r. sentença, neste tocante. Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 8
fls. 394 Do exposto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso do autor e, afastada a preliminar, nego provimento ao recurso da ré. ANGELA LOPES Relatora Apelação nº 1018376-52.2015.8.26.0564 -Voto nº 2182 9