Avaliação etiológica da dor crônica após entorse do tornozelo

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ANEXO 1. Questionário

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Transcrição:

Artigo Original Avaliação etiológica da dor crônica após entorse do tornozelo Etiologic evaluating of chronic pain after ankle sprain João Luiz Vieira da Silva 1, Leandro de Albuquerque Schulhan 2, Bruno Arnaldo Bonacin Moura 3, Luiz Fernando Bonaroski 3, José Tarsio de Campos Filho 3, Sérgio Arthur Manfredinni Vianna 4 Resumo Introdução: O entorse lateral do tornozelo é a lesão mais comum na prática esportiva, tratada conservadoramente com evolução satisfatória em sua maioria. Entretanto, após um ano da lesão surgem dores esporádicas e intermitentes em até 40% dos pacientes. Objetivo: A proposta deste estudo foi avaliar, em pacientes com história de entorse de tornozelo e que evoluíram com dor crônica, a presença de instabilidade clínica e lesão osteocondral do tálus. Métodos: Entre janeiro e agosto de 2008, foram avaliados 18 pacientes com uma anamnese dirigida, avaliação clínica específica, radiográfica e tomográfica (TAC). O tratamento inicial e o escore American Orthopaedic Foot and Ankle Society (AOFAS) foram anotados. Resultados: Após a realização da tomografia computadorizada, diagnosticaram-se três lesões osteocondrais do tálus (17%). Foram observados cinco casos (28%) de instabilidade clínica persistente do tornozelo, sendo que nenhum desses pacientes tinha lesão osteocondral associada. O exame clínico e a TAC definiram a etiologia da dor em 45% dos pacientes. Conclusão: Os autores sugerem a utilização de métodos complementares de diagnóstico, como a ressonância nuclear magnética e artroscopia. Descritores: Entorses e distensões; Traumatismos do tornozelo; Dor/etiologia Abstract Introduction: An ankle sprain is the most common injurie in sports and is treated conservatively, with good results in the majority of cases. Therefore, after a year, sporadic and intermittent pain becomes in up to 40% of patients. Objective: The purpose of this study was to evaluate the ankle instability and osteochondral injuries of the talar dome in patients with ankle sprain history that had developed chronic pain. Methods: Between January and August of 2008, 18 patients were evaluated through a clinical history, physical specific examination, radiographic and axial computed tomography (ACT). Initial treatment and American Orthopaedic Foot and Ankle Society (AOFAS) score were recorded. Results: The ACT found three types of osteochondral injuries of the talar dome (17%). Ankle instability occurred in 28% of the patients, with no associated osteochondral injuries. Clinical examination and ACT has defined diagnosis in 45% of the patients. Conclusion: The authors suggest MRI and arthroscopy for diagnosis complementation. Keywords: Sprains and strains; Ankle injuries; Pain/etiology Correspondência João Luiz Vieira da Silva Rua Ângelo Sampaio, 670 Água Verde CEP 80250120 Curitiba (PR) Fone: (41) 3243-1900/8804-0966 Fax: (41) 3243-1900 E-mail dr.joaoluiz@ctea.med.br Data de recebimento 16/11/08 Data de aceite 28/03/09 Trabalho realizado no Serviço de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal do Paraná UFPR Serviço do Professor Doutor Luiz Antônio Munhoz da Cunha, Curitiba (PR), Brasil. 1 Doutor, Professor do Curso de Especialização em Traumatologia Esportiva e Artroscopia; Membro do Serviço de Ortopedia e Traumatologia; Membro do Grupo de Cirurgia do Pé e Tornozelo da Universidade Federal do Paraná UFPR Curitiba (PR), Brasil. 2 Médico Residente do Serviço de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal do Paraná UFPR Curitiba (PR), Brasil. 3 Médico Ortopedista; Membro do Serviço de Ortopedia e Traumatologia da e do Grupo de Cirurgia do Pé e Tornozelo da Universidade Federal do Paraná UFPR Curitiba (PR), Brasil. 4 Mestre, Membro do Serviço de Ortopedia e Traumatologia e do Grupo de Cirurgia do Pé e Tornozelo da Universidade Federal do Paraná UFPR Curitiba (PR), Brasil.

Silva JLV, Schulhan LA, Moura BAB, Bonaroski LF, Campos Filho JT, Vianna SAM INTRODUÇÃO O entorse lateral do tornozelo é a lesão musculoesquelética mais comum na prática esportiva. Esses casos geralmente são tratados de modo conservador com evolução satisfatória na maioria dos casos. Entretanto, um ano após a lesão, surgem dores esporádicas intermitentes em até 40% dos pacientes (1). Entre as causas de dor crônica deve-se considerar o impacto de partes moles, a presença de instabilidade do tornozelo e a lesão osteocondral do tálus, sendo que apenas a instabilidade pode ser definida pelo exame clínico inicial e as outras causas, através de exames complementares (2,3). A lesão osteocondral do tálus é geralmente causada por um trauma torcional do tornozelo, levando a um quadro de dor crônica na maioria dos pacientes. Em alguns casos, o diagnóstico pode ser realizado com radiografias convencionais, mas, geralmente, somente pode ser diagnosticada através da tomografia computadorizada (TAC) ou ressonância nuclear magnética (RNM) (4-8). A dor crônica em tornozelos com instabilidade ocorre em até 30% dos pacientes com história de entorse em inversão do tornozelo, geralmente situada no complexo ligamentar lateral. Nesses casos, a incompleta recuperação ligamentar pode gerar alteração na função de propriocepção da articulação tibio-társica; outra hipótese para a permanência da dor crônica é a instabilidade da articulação subtalar devido à lesão combinada do ligamento talofibular anterior e do ligamento calcâneo-fibular (9-11). Os pacientes que apresentam impacto de partes moles não têm alterações específicas ao exame físico, dificultando o diagnóstico clínico. Nesses casos, existe a necessidade de exames complementares, como tomografia computadorizada, ressonância magnética e artroscopia (3,12). O objetivo deste trabalho foi avaliar, em pacientes que evoluíram com dor crônica após entorse do tornozelo, a presença de lesão osteocondral do tálus e de instabilidade clínica. MÉTODOS Este trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Brasil. Entre janeiro e agosto de 2008, foram selecionados 18 pacientes que apresentaram dor crônica no tornozelo após entorse e mantiveram acompanhamento no Ambulatório de cirurgia do pé e tornozelo do Hospital do Trabalhador da UFPR, Brasil. Critérios de inclusão Foram incluídos neste estudo os pacientes que apresentaram história de entorse em inversão do tornozelo, tratados de modo conservador e que persistiram com dor por um período mínimo de três meses. Avaliação clínica Os pacientes foram submetidos a uma anamnese direcionada na qual se pesquisou: o mecanismo do trauma, o tempo de evolução, o número de episódios e o tipo de tratamento inicial. Além disso, foi detectada a presença de instabilidade clínica por meio do teste da gaveta anterior e do estresse em varo. A localização da dor também foi estabelecida (ântero-medial, ântero-lateral, postero-medial e postero-lateral). Na mesma ocasião, foi obtido o escore American Orthopaedic Foot and Ankle Society (AOFAS) (13) para tornozelo/retropé, considerando-se ruim quando abaixo de 60 pontos, razoável entre 61 e 80, bom entre 80 a 90 e excelente acima de 90 pontos (13). Avaliação radiográfica Todos os pacientes realizaram radiografias simples do tornozelo nas posições em ântero-posterior e perfil para afastar a possibilidade de fratura e rastrear possíveis lesões osteocondrais. Avaliação tomográfica Todos os pacientes realizaram tomografia computadorizada, com tomógrafo Siemens do Hospital do Trabalhador, para se detectarem as lesões osteocondrais do tálus, sua localização e também afastar a possibilidade de lesão de sindesmose tibio-fibular distal. Forma de tratamento inicial Os pacientes foram submetidos a três formas de tratamento inicial: imobilização gessada, imobilização não gessada e tratamento clínico sintomático. Análise estatística Foi realizada uma análise descritiva dos resultados, pois não houve possibilidade de comparação entre as variáveis devido ao pequeno número de pacientes da amostra (14). RESULTADOS Foram incluídos 18 pacientes no estudo, dos quais 7 eram do sexo masculino e 11 do sexo feminino, com média de idade de 37,4 anos (21 a 68). O tempo de evolução do trauma 37

Avaliação etiológica da dor crônica após entorse do tornozelo no momento da avaliação ocorreu entre 4 e 120 meses após o trauma, com um duração total do estudo de oito meses. Em relação às causas da dor, cinco deles (28%) tinham instabilidade clínica (Figura 1). Dois pacientes apresentavam teste da gaveta anterior positivo (instabilidade anterior), um paciente apresentou estresse em varo positivo (instabilidade lateral) e dois pacientes tiveram ambos os testes positivos (instabilidade anterolateral). O número médio de episódios de entorse do tornozelo nesses pacientes foi de 6,2 (de 2 a 15 ocorrências). Em nenhum desses pacientes, observou-se lesão osteocondral associada. Três (17%) tinham lesão osteocondral do tálus (Figuras 1 e 2). O número médio de episódios de entorse do tornozelo nesses pacientes foi de 1,66 (1 a 3 casos). Em 55% dos pacientes (n=10), a causa da dor crônica após entorse do tornozelo não foi estabelecida. O número médio de episódios de entorse do tornozelo nesse grupo de pacientes foi de 1,6 (1 a 5 casos). Quanto à localização da dor, observou-se: ânteromedial em 38%, anterolateral em 17%, ântero-medial e ântero-lateral em 28% dos pacientes e póstero-lateral em 17%; não houve queixa de dor na topografia postero-medial (Figura 2). Na avaliação do critério AOFAS, a média de pontos obtida de todos os pacientes foi de 71,5, variando de 52 a 90. O escore médio nos pacientes com instabilidade clínica foi de 64 pontos, variando de 52 a 75. Nos pacientes com lesão osteocondral do tálus, o escore médio foi de 71, variando de 55 a 90, enquanto nos pacientes sem causa definida de dor crônica o escore médio foi de 75,5 pontos, variando de 57 a 90. Os pacientes sem causa de dor definida foram aqueles que apresentaram os melhores valores do AOFAS, sendo que 50% deles obtiveram resultados considerados bons. Nas Figuras 3A e 3B, apresenta-se o caso de um paciente de 45 anos com dor crônica há dois anos e cinco episódios de entorse de tornozelo. DISCUSSÃO A entorse do tornozelo corresponde a 7 a 10% dos atendimentos em prontos socorros de trauma e pode gerar dor crônica em até 40% dos pacientes, sendo que a maioria apresenta dor no complexo ligamentar lateral (1). Konradsen et al. (15), observaram que 32% dos pacientes que persistiram com dor crônica tinham instabilidade clínica, o que foi também encontrado no presente estudo, no qual 28% (cinco) dos pacientes tinham instabilidade clínica, justificando a presença da dor crônica. Como citado por Hintermann (16), acredita-se que a incompleta recuperação ligamentar possa gerar alteração na função proprioceptiva da articulação tibiotársica, perpetuando o quadro de dor. Dentre esses cinco pacientes, a gaveta anterior foi positiva em quatro, assim como reportado na literatura, que a lesão do ligamento talofibular anterior é a causa mais comum de instabilidade após o entorse do tornozelo (17). Não foi encontrado, através da tomografia computadorizada, nenhum caso de lesão da sindesmose, também considerada como uma das possíveis causas de dor crônica após entorse do tornozelo (3). As lesões osteocondrais do tálus são uma causa relativamente comum de dor crônica e são observadas em 6,5% dos pacientes com história de entorse do tornozelo (18-20). Em nosso estudo, foram encontradas três lesões (17%) em 18 casos; essa diferença pode ser explicada devido a um número menor de pacientes da amostra. Todas as lesões osteocondrais foram anteriores, sendo duas mediais e uma lateral. lesão osteocondral (17%) instabilidade (28%) não estabelecidas (55%) A B Figura 1- Causas de dor crônica após entorse do tornozelo (n=18). ântero-lateral (17%) póstero-lateral (17%) ântero-medial (38%) AM+AL (28%) Figura 2 - Localização da dor em pacientes com dor crônica após entorse do tornozelo. Figura 3 - A) Radiografia em ântero-posterior da articulação tibio-társica sem lesão osteocondral aparente; B) Tomografia computadorizada da articulação tibio-társica evidenciando lesão osteocondral talus. 38

Silva JLV, Schulhan LA, Moura BAB, Bonaroski LF, Campos Filho JT, Vianna SAM Na literatura, há um consenso de que a maioria delas são ântero-laterais e que as lesões posteriores são raras (15). A avaliação inicial por meio de radiografia simples é o método mais utilizado no atendimento inicial dos pacientes com entorse do tornozelo, mas, como relatado por Nash e Baker (21), de 40 a 50% das lesões osteocondrais do tálus não são diagnosticadas nos serviços de emergência. Em nosso estudo, dois casos de lesões osteocondrais concorriam com radiografias normais, sendo diagnosticadas somente através da tomografia computadorizada. Segundo Stroud (5), a tomografia computadorizada (TAC) é o método diagnóstico preferido para lesões grau II, III, e IV de Berndt e Harty (22), sendo que a ressonância magnética é preferível para lesões grau I, em que há apenas compressão do osso subcondral (7,23). É possível que, em função de contarmos apenas com a tomografia computadorizada no serviço de emergência onde o estudo foi realizado, lesões menores não detectadas pudessem ser visualizadas através da ressonância magnética. Apesar disso, a TAC constituiu um bom método para rastreamento das possíveis causas de dor crônica pós-entorse. Dos 18 pacientes, 8 (55%) não apresentavam causa aparente de dor. Acreditamos que nesses indivíduos a dor crônica seja devido ao impacto de partes moles, que tem início após um entorse do tornozelo, ocorrendo a formação de um tecido cicatricial que gera irritação, sinovite e dor local (24). O diagnóstico pode ser estabelecido através da ressonância magnética (RNM) e da artroscopia, sendo que esta última permite o tratamento concomitante da patologia (23). Em função de não dispormos de RNM em nosso serviço, acreditamos que um número significativo de pacientes poderiam se beneficiar desse procedimento. Ao tentarmos relacionar o escore AOFAS às causas de dor crônica, observamos uma variedade de valores, sendo que nos pacientes com instabilidade houve um valor médio do escore AOFAS menor; entretanto, não foi possível avaliar estatisticamente essa diferença devido ao tamanho da amostra (cinco). Nos pacientes com lesão osteocondral, foram encontrados resultados ruins, razoáveis e bons; não houve modo estatístico de relacionar essas variáveis. Os pacientes sem causa definida de dor crônica apresentaram um valor médio do AOFAS maior, mas, do mesmo modo, não foi possível relacionar o escore AOFAS e a lesão devido ao tamanho da amostra. Apesar disso, tem-se o valor do escore AOFAS como método de avaliação funcional dos pacientes com dor crônica em tornozelo pelo fato de permitir uma avaliação objetiva (exame físico) e subjetiva (dor e função). A presença de um grande número de pacientes que persistem com dor após episódio de entorse de tornozelo foi o que motivou a realização deste estudo. Apesar da aparente normalidade radiográfica, métodos diagnósticos, como a tomografia computadorizada, auxiliaram na investigação. Devem ser levadas em consideração as limitações de cada método e, principalmente, o conhecimento dos diagnósticos diferenciais da dor crônica após a entorse do tornozelo. CONCLUSÕES Ao fim do estudo, foi possível determinar a presença de lesão osteocondral e de instabilidade clínica em 45% dos pacientes que tinham dor crônica pós-entorse de tornozelo. Para o restante, para a definição do fator causal da dor, sugere-se a utilização de métodos complementares de diagnóstico como a ressonância nuclear magnética e a artroscopia. Referências 1. Marsh JL, Saltzman CL. Fraturas do tornozelo. In: Rockwood G. Fraturas em adultos. São Paulo: Manole; 2006. p. 2078-83. 2. Merian M, Easley M. Diagnosis and treatment of osteochondral lesion of the talus. Der Orthopade. 2008;37(3):204, 206-11. 3. Ogilvie-Harris DJ, Mahomed N, Demazière A. Anterior impingement of the ankle treated by arthroscopy removal of bony spurs. J Bone Joint Surg Br. 1993;75(3):437-40. 4. Canale ST, Belding RH. Osteochondral lesions of the talus. J Bone Joint Surg Am. 1980;62(1):97-102. 5. Stroud CC, Marks RM. Imaging of osteochondral lesions of the talus. Foot Ankle Clin. 2000;5(1):119-33. 6. Bohndorf K, Imhof H, Schibany N. Diagnostic imaging of acute and chronic osteochondral lesions of the talus. Der Orthopade. 2001;30(1):12-9. 7. Ragozzino A, Rossi G, Esposito S, Giovine S, Tuccillo M. Computerized tomography of osteochondral disease of the talus dome. Radiol Med (Torino) 1996;92(6):628-6. 8. Farmer JM, Martin DF, Boles CA, Curl WW. Chondral and osteochondral injuries. Diagnosis and management. Clin Sports Med. 2001;20(2):299-320. 9. Hintermann B, Valderrabano V. The effectiveness of rotation stabilization in the conservative treatment of severe ankle sprains: a long-term investigation. Foot Ankle Surg. 2001;7(4):235-9. 39

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